Deus no Centro
Há bem mais de um século que os sacerdotes, os pastores,
os catequistas e as mais altas autoridades das religiões cristãs no mundo de
Deus acusam o Espiritismo de Invenção Diabólica e o Centro Espírita de Casa do
Diabo. Mas, no ocorrer do tempo, essa situação ingrata foi se modificando. As
artimanhas do Diabo foram gradativamente vencendo os escrúpulos dos Ministros
de Deus. Padres e freiras, monges e monjas, sacristãos e coroinhas, pastores e
ovelhas começam a perceber que os espíritas também são filhos de Deus e merecem
a benção do Pai. Assim aliviado do peso das maldições e da pressão dos
preconceitos, o Centro Espírita deixou de ser o espantalho dos crentes e passou
mesmo a atraí-los. O Centro Espírita caluniado, humilhado e humilde, muitas
vezes de pés descalços (como Anchieta em Meritiba) começou a cair nas graças do
povo. Porquê? Porque era apenas uma parcela do povo e nele não se exaltava ao
Diabo, mas a Deus. “Quem vive de mãos dadas com Demônio não tem o direito de
proferir o Santo Nome de Deus”, gritava um padre sincero, cheio de indignação
divina, no púlpito de sua igreja, aqui mesmo em São Paulo, nos idos de 1930.
Mas o tempo, que tudo cura e tudo prova, curou a fúria do padre e provou que
Deus está também no Centro Espírita. Suprema heresia que ninguém pode evitar,
pois Deus não pede licença a ninguém para estar em toda parte e em tudo,
segundo o próprio dogma da Onipresença Divina, sustentado pelas Igrejas.
Hoje, como nos disse certa vez o Dr. Romeu do Amaral Camargo:
“Deus está no Centro”. Custou muito para as Igrejas aceitarem essa
possibilidade, através de apenas alguns de seus profitentes. Mas isso não é de
espantar a ninguém, pois também somente agora, em recente declaração do Papa
Paulo VI, divulgado pela imprensa mundial, o Vaticano reconheceu oficialmente
que há uma presença de Deus no Judaísmo. Mas se Deus está na Bíblia e se esta é
a palavra de Deus, sobre a qual se assentam todas as religiões cristãs, como só
agora se percebeu que Deus está na Sinagoga? Na Costa do Pacífico, nos Estados
Unidos, país ciosamente cristão, existem várias Igrejas do Diabo. Quem poderá
reconhecer oficialmente a presença do Diabo nessa Igrejas, agora que o
Espiritismo provou ser de Deus e não do Diabo? Com o correr do tempo, tornou-se
mais fácil provar a existência de Deus em algum lugar do que a presença do
Diabo. Não devemos perder muito tempo com essas curiosidades, mas como a
memória humana é fraca, precisamos assinalar esse fatos. O trocadilho “Deus
está no Centro” encerra uma verdade que todos os espíritos conhecem de perto.
No centro do Universo está Deus, não em figura mas em realidade, pois se Deus é
o Todo em Essência e tudo provém dele, tudo pertence a Ele, tudo é Ele e Ele
dirige e governa tudo, é evidente que o Centro Espírita, onde tudo se faz em
nome de Deus, não pode estar sem Deus. Giovani Papini, o famoso escritor
católico italiano, autor da famosa obra II Diavolo, causou escândalo na Santa
Sé ao sustentar que o Diabo reverterá a Deus. Mas os teólogos aturdidos com as
atrocidades da II Guerra Mundial resolveram declarar ao Mundo que: “Deus morreu”.
Se isso realmente aconteceu, a situação das Igrejas é insolúvel e toda a
Teologia das Igrejas veio abaixo. Pois se Deus morreu, não era imortal, e se o
Diabo ficou em apuros, pois não tem quem o perdoa, continua vivo após a morte
de Deus e é mais invulnerável que Deus.
No Centro Espírita a notícia dessa morte não causou o menor
abalo, porque todos sabem, até os adeptos de inteligência mais modesta, que
Deus está ali, talvez sentado liberalmente entre eles, sorrindo da Sua morte
impossível. Numa atitude puramente humana, os teólogos quiseram colocar Jesus,
provisoriamente, segundo dizem, no Trono de Deus, como legítimo herdeiro do
Trono Supremo. E então surgiu esta situação embaraçosa: se Deus morreu e o
filho só pode substituí-lo eventualmente – pois não é Deus – então a morte de
Deus deixou o trono sob simples regência e com isso surgiu na Terra o
Cristianismo Ateu. Precisamos saber essas coisas para sabermos a quem
entregaremos as nossas almas na hora da morte. O ateísmo cristão nos deixa em
dificuldades e só temos um jeito de buscar Deus: no Centro Espírita. Porque
somente ali, na antiga morada do Diabo, não se acredita que Deus morreu e se
continua a falar em seu nome. Porque ali se sabe e se prova, diariamente,
através dos processos Kardecianos. que nem o homem morre, quanto mais Deus. A
Teologia, arrogante e vaidosa Ciência de Deus, fechou as suas portas doiradas
com o balanço total da sua falência. Se Deus morreu, acabou-se o negócio.
A onipotência e a onipresença de Deus são dois
mistérios teológicos admitidos por quase todas as religiões. Porquê só pode
existir um Deus, único e soberano quando seria muito mais fácil compreender-se
a multiplicidade dos deuses e a sua disciplinação hierárquica, como nas
Mitologias? A resposta a está pergunta, agora reformulada pelos neopoliteístas,
nos leva diretamente para o centro do problema cristão e para o centro da
mundividência espírita. No Judaísmo arcaico, herdeiro das velhas concepções
mesopotâmicas, a existência de Deus Único era uma necessidade orgânica.
Derivada do antropomorfismo mais remoto – em que o homem era a síntese e o
modelo de todas as coisas – essa concepção figurava o Cosmo como um grande Ser
que abrangia em sua conformação ideal a totalidade das coisas e dos seres
existentes. O isoloísmo grego, teoria do mundo como um ser vivo, dotado de
corpo e alma, confundia a natureza divina com a natureza humana. Ajustando essa
idéia estática ao movimento incessante das coisas, Zoroastro, na Pérsia,
apresentava a imagem de Deus no fogo, nas labaredas, que são ao mesmo tempo
estáveis e instáveis. O Judaísmo, nascido das entranhas da concepção mitológica
dos povos da Antigüidade, avançava além dessa concepção, apresentando Deus como
um Ser Humano de dimensões inimagináveis, mas dotado do poder (pois possuía
todos os poderes de revelar-se aos homens em dimensões humanas). Proibia que se
fizesse figuras de Deus, mas na Arca Sagrada havia oculta a sua imagem pintada
por mãos humanas. Na Bíblia, essa contradição é bem marcante. Se manifesta na
forma humana de Iavé, com todas as imperfeições humanas do amor e do ódio, da
ambição e do ciúme, da voracidade cruel e brutal de Baal e da preferência pelo
seu povo, com inteiro desprezo pelos demais povos, considerados impuros. O
protecionismo a Moisés – tão assassino e ciumento como Caim – lembra as
preferências dos deuses mitológicos da Grécia por seus pupilos. Deus local,
como os deuses nomos egípcios, mas sem possuir terra própria, leva os judeus à
conquista brutal e impiedosa de Canaã, para ali estabelecer o seu feudo, sem a
menor contemplação para com o povo cananita. Não é de admirar que Cristianismo
igrejeiro, apegado ferozmente à Bíblia, se atrelasse mais tarde ao carro das
iniqüidades romanas, massacrando e explorando povos mais fracos. É das
entranhas desse Deus humaníssimo, vingativo e mau como os homens, exclusivista
e contraditório, que nasce a idéia do Deus Único.
Mas, apesar de tudo isso, a unicidade de Deus é tão
necessária como a unicidade do homem. A esquizofrenia nos mostra o que é um
homem alienado, um espírito dividido em si mesmo, incapaz de coordenar as suas
faculdades e controlar os seus poderes. Um Deus partido em três, segundo o
dogma da Trindade, seria um Deus esquizofrênico e sua desordem divina, sua
insegurança interna se refletiria no casos de um Universo absurdo. Assim, da
dialética das concepções contraditórias a respeito de Deus é que vai nascer a
lógica da concepção monoteísta. Deus só pode ser Um, solitário e soberano no
inefável, na solidão vazia do Cosmo. Nessa solidão ele cresce em seus poderes
até o momento em que, estremecendo e acordando da sua hibernação espantosa,
toma a consciência de Si mesmo e realiza, com apenas uma palavra, o fiat da
Criação Universal e total. E como a criação preenche os espaços vazios, em
todas as direções, Deus permanece no centro, dirigindo e controlando os seus
domínios inacessíveis à imaginação humana. Eis porque Deus é Único e só pode
ser Único, apesar de poder tudo. As contradições do Politeísmo provinham da
concepção caótica do Universo, não permitindo à mente humana uma concepção
harmoniosa da realidade. No monoteísmo temos apenas uma contradição, que é a de
Deus consigo mesmo, e esta gerar a síntese do Todo, para dar ao homem a
possibilidade de compreender a realidade e estruturá-la no conhecimento, sem o
qual nada saberíamos nem poderíamos.
É assim que a realidade cósmica, não acessível à
inspeção completa do homem, fica ao seu alcance graças à estrutura de leis
regulares e universais, que lhe facultam as ligações necessárias a uma visão
geral do Universo. Deus é o poder gerador e mantenedor dessa realidade sem
limites e o conceito de infinito, vaga suposição da Antigüidade, se torna
positivo pela revelação de unidade orgânica – e necessariamente orgânica – do
Cosmos. Note-se bem: unidade orgânica, semelhante à da nossa estrutura, que é
una apesar da multiplicidade dos seus órgãos e membros, porque todos a eles
pertencem a um organismo único. Da mesma maneira, a unidade orgânica do Cosmos
deriva de sua centralização em Deus, que mantém a unidade infinita através da
subordinação de todas as galáxias ou constelações de mundos, espaços etéreos
aparentemente vazios, mas cheios de força e plasma cósmicos. tudo formando o
organismo único.
Não seria isso uma ilusão? Os que consideram o Universo
como finito e fechado sobre si mesmo dizem que sim. Mas Kardec, já no século
passado, antes das conquistas científicas do nosso século, propôs uma teoria
que hoje tem a sansão de novas descobertas. Por mais que tentemos dar ao Universo
um limite, lembrou ele, por mais que avancemos em nossa imaginação, sempre
estaremos em face de espaços que se desenrolam além. Essa prova psicológica da
infinitude (baseada ao mesmo tempo em psicologia e lógica) tem hoje a
comprovação das conquistas parapsicológicas, que revelam a existência em nós de
um poder também sem limites, que é da percepção extra-sensorial de realidades
que escapam aos nossos sentidos físicos. Não se trata de simples intuição, mas
de captação de realidades que estão fora do alcance dos nossos sentidos e dos
nossos instrumentos. O homem sente e intui que o Universo é infinito. Teorias
físicas e cálculos matemáticos o contra-dizem. Mas a percepção extra-sensorial,
fundada em suas potencialidades inconscientes, continua a dizer-lhe que para as
dimensões do Cosmos não há limites.
No Centro Espírita a presença de Deus se faz sentir nas
manifestações mediúnicas que derrubam as barreiras da morte, pelas declarações
unânimes dos Espíritos Superiores, comprovadamente possuidores de conhecimentos
muitos superiores aos nossos, pela revelação, comprovada através de pesquisas e
experiências científicas de sábios eminentes do século passado e deste século,
de que existem no homem potencialidades muito superiores às que ele revela
quando encarnado, sujeito aos condicionamentos da vida carnal. Não se trata de
dogmas estabelecidos por concílios de cegos supostamente divinos, mas de
pesquisas objetivas e controladas pela metodologia científica. Deus não é uma
hipótese, mas uma realidade comprovada pelo princípio científico, segundo o
qual, dos efeitos remontamos às causas. Deus é a fonte causal de todas a
realidade. Kardec tirou desse princípio, por ilação lógica amparada pelos
fatos, a lei espírita segundo a qual: Não há efeitos inteligentes sem causa
inteligente e a grandeza dos efeitos revela a grandeza de causa. Esse o
raciocínio básico das provas espíritas da existência de Deus.
Mas além disso a presença de Deus no Centro Espírita se
comprova pelas manifestações dos seus mensageiros, os Espíritos Superiores a
seu serviço por todo o infinito. Essas manifestações não são constantes e gratuitas,
mas ocorrem de maneira inesperada e com finalidade certa. Mas é sobretudo no
coração dos humildes que Deus se afirma como realidade viva e atuante, nas
sessões de auxílio espirituais. Um coração angustiado de mãe que se alivia e
alegra ao receber a visita do filho que parecia morto para sempre, numa
comunicação mediúnica oral ou numa aparição pela vidência despertada na mãe.
Numa comprovação pela aparição tangível ou materialização, como no caso famoso
de Frederico Fígner e sua esposa, que, em Belém do Pará, através da mediunidade
de Ana Prado, uma mulher humilde, tiveram a oportunidade de retomar sua filha
Raquel novamente nos braços, sentá-la no colo e conversar com ela viva e
alegre, que censurava a mãe por se trajar de luto. Numa aparição tangível da
sua própria mãe, dada a um sábio famoso que combatia o Espiritismo como
superstição infundada, como aconteceu com César Lombroso em sessão com a médium
Eusápia Paladino, presidida pelo Prof. Chiaia, da Universidade de Milão.
Lombroso abraçou a mãe, que falou com ele, e nos dias seguintes declarava num
artigo de retratação, pela revista Ombra e Luce, daquela cidade: “Nenhum
gigante da força e do pensamento poderia fazer para mim o que fez essa pobre
mulher analfabeta – arrancar minha mãe do túmulo e devolvê-la aos meus braços”.
Não eram aparições ocasionais, facilmente atribuíveis a fatores
psicoemocionais, mas aparições provocadas em nome de Deus, em sessões
experimentais em que o ingrediente Deus não havia sido desprezado. “Com a
permissão de Deus”, dizem sempre os espíritos agraciados com essa oportunidades
de reencontro após a morte.
O Centro Espírita se caracteriza, assim, como o centro
de comunicações com os que já deixaram a vida terrena, mas continuam vivos e
ativos na outra face da vida. Nada se paga para falar com os mortos, os
supostos mortos da nossa ignorância, porque os serviços de Deus são gratuitos
desde o nascimento, que é um prodígio de Deus, até a morte, que é a graça de
Deus libertando-nos da asfixia da carne, e além da morte, nas maravilhosas
possibilidades das manifestações mediúnicas.
Deus está no Centro Espírita em que as criaturas se
reúnem de coração puro, confiantes no seu poder infinito. O preço da comunicação
é geralmente o aparecimento do espírito ou dos que desejam reencontrá-lo. Os
dirigentes de centros precisam meditar diariamente nas responsabilidades que
assumem ao aceitar os seus cargos, que na verdade são encargos divinos. Deus
não exige de nós mais do que podemos dar. Não quer que nos apresentemos a Ele e
aos homens com as vestes nupciais da parábola, que ainda não possuímos. Não
podemos enganá-lo com sorriso de falsa bondade, de fraternidade fingida,
escondendo nas moitas do coração selvagem a serpente da inveja, da intriga, da
censura ao próximo, do julgamento desprezivo do irmão que se senta ao nosso
lado. Não vemos Deus no Centro porque não temos condições para isso, mas
podemos vê-lo no semblante sincero e ingênuo e no coração puro dos que não
alimentam vaidades e preconceitos negativos ao nosso redor. Deus não está ali,
diante de nós, como um Ser visível e corporal. Ele impregna o Centro, como
impregna o recinto de todos os templos freqüentados por criaturas sem maldade e
sem reservas. Mas podemos ver o seu rosto no semblante dos que se entregam com
amor ao serviço do bem, tocar as suas mãos nas mãos sinceras e boas dos que nos
amam sem restrições. E se os hipócritas nos cercam e nos olham com fingida
amizade, podemos ser para eles a mensagem do amor e da sinceridade que flui de
Deus para o nosso coração. Deus no Centro é Deus em nós, ajudando-nos a crescer
com o fermento da fraternidade, que ele pouco a pouco aumenta em nossa medida
de farinha, na proporção em que a farinha do nosso egoísmo absorve o fermento e
se transforma no pão que nos alimenta a alma.
Estas não são imagens líricas, mas a verdade espiritual
trocada em figuras e expressões de amor, como as que encontramos nos Evangelhos
de Jesus. Não é o autor do livro que as produz, mas os Espíritos benevolentes
que, em nome da fraternidade humana, as transmitem aos que desejam servir a si
mesmo e ao próximo. Porque aqueles que desejam servir-se na mesa do bem,
naturalmente repartem o seu pão com os irmãos famintos de bondade, como Jesus o
fez com os apóstolos nas estalagem da estrada de Emaús.
Deus no Centro não é a presença exclusiva para ninguém,
mas presença inclusiva para todos, a todos incluídos em Seu chamado para a vida
do espírito. Os que procurarem compreender e sentir a sua presença no Centro a
levarão consigo para casa. As pretensões de superioridade, o desejo egoísta de
ser impor aos demais, o ciúme corrosivo e o julgamento do próximo em nosso
íntimo ou em nossa língua não nos deixa perceber a bondade de Deus. Os que se
sacrificam para melhorar a Terra, dando de si o que podem e muitas vezes o que
não podem – esses fazem a Vontade de Deus. Os que batem a língua nos dentes
para destilar venenos de serpente não podem perceber a presença de Deus no
Centro e só percebem os espíritos malévolos e sofredores.
Livro: O Centro Espírita
Livro: O Centro Espírita
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