Subsídios para questões do livro dos espíritos 93-94-95
I. NATUREZA E PROPRIEDADES DOS FLUIDOS
Elementos fluídicos
1. - A Ciência resolveu a questão dos milagres que mais particularmente
derivam do elemento material, quer explicando-os, quer lhes demonstrando a
impossibilidade, em face das leis que regem a matéria. Mas, os fenômenos em que
prepondera o elemento espiritual, esses, não podendo ser explicados unicamente
por meio das leis da Natureza, escapam às investigações da Ciência. Tal a razão
por que eles, mais do que os outros, apresentam os caracteres aparentes do
maravilhoso. É, pois, nas leis que regem a vida espiritual que se pode encontrar
a explicação dos milagres dessa categoria.
2. - O fluido cósmico universal é, como já foi demonstrado, a matéria
elementar primitiva, cujas modificações e transformações constituem a inumerável
variedade dos corpos da Natureza. (Cap. X.) Como princípio elementar do
Universo, ele assume dois estados distintos: o de eterização ou
imponderabilidade, que se pode considerar o primitivo estado normal, e o de
materialização ou de ponderabilidade, que é, de certa maneira, consecutivo
àquele. O ponto intermédio é o da transformação do fluido em matéria tangível.
Mas, ainda aí, não há transição brusca, porquanto podem considerar-se os nossos
fluidos imponderáveis como termo médio entre os dois estados. (Cap. IV, nos 10 e
seguintes.)
Cada um desses dois estados dá lugar, naturalmente, a fenômenos especiais: ao
segundo pertencem os do mundo visível e ao primeiro os do mundo invisível. Uns,
os chamados fenômenos materiais, são da alçada da Ciência propriamente dita, os
outros, qualificados de fenômenos espirituais ou psíquicos, porque se ligam de
modo especial à existência dos Espíritos, cabem nas atribuições do Espiritismo.
Como, porém, a vida espiritual e a vida corporal se acham incessantemente em
contacto, os fenômenos das duas categorias muitas vezes se produzem
simultaneamente. No estado de encarnação, o homem somente pode perceber os
fenômenos psíquicos que se prendem à vida corpórea; os do domínio espiritual
escapam aos sentidos materiais e só podem ser percebidos no estado de Espírito.
(1)
(1) A denominação de fenômeno psíquico exprime com mais exatidão o
pensamento, do que a de fenômeno espiritual, dado que esses fenômenos repousam
sobre as propriedades e os atributos da alma, ou, melhor, dos fluidos
perispiríticos, inseparáveis da alma. Esta qualificação os liga mais
intimamente à ordem dos fatos naturais regidos por leis; pode-se, pois,
admiti-los como efeitos psíquicos, sem os admitir a título de milagres.
3. - No estado de eterização, o fluido cósmico não é uniforme; sem deixar de
ser etéreo, sofre modificações tão variadas em gênero e mais numerosas talvez do
que no estado de matéria tangível. Essas modificações constituem fluidos
distintos que, embora procedentes do mesmo princípio, são dotados de
propriedades especiais e dão lugar aos fenômenos peculiares ao mundo invisível.
Dentro da relatividade de tudo, esses fluidos têm para os Espíritos, que
também são fluídicos, uma aparência tão material, quanto a dos objetos tangíveis
para os encarnados e são, para eles, o que são para nós as substâncias do mundo
terrestre. Eles os elaboram e combinam para produzirem determinados efeitos,
como fazem os homens com os seus materiais, ainda que por processos diferentes.
Lá, porém, como neste mundo, somente aos Espíritos mais esclarecidos é dado
compreender o papel que desempenham os elementos constitutivos do mundo onde
eles se acham. Os ignorantes do mundo invisível são tão incapazes de explicar a
si mesmos os fenômenos a que assistem e para os quais muitas vezes concorrem
maquinalmente, como os ignorantes da Terra o são para explicar os efeitos da luz
ou da eletricidade, para dizer de que modo é que vêem e escutam.
4. - Os elementos fluídicos do mundo espiritual escapam aos nossos
instrumentos de análise e à percepção dos nossos sentidos, feitos para
perceberem a matéria tangível e não a matéria etérea. Alguns há, pertencentes a
um meio diverso a tal ponto do nosso, que deles só podemos fazer idéia mediante
comparações tão imperfeitas como aquelas mediante as quais um cego de nascença
procura fazer idéia da teoria das cores.
Mas, entre tais fluidos, há os tão intimamente ligados à vida corporal, que,
de certa forma, pertencem ao meio terreno. Em falta de observação direta, seus
efeitos podem observar-se, como se observam os do fluido do imã, fluido que
jamais se viu, podendo-se adquirir sobre a natureza deles conhecimentos de
alguma precisão. É essencial esse estudo, porque está nele a chave de uma
imensidade de fenômenos que não se conseguem explicar unicamente com as leis da
matéria.
5. - A pureza absoluta, da qual nada nos pode dar idéia, é o ponto de partida
do fluido universal; o ponto oposto é o em que ele se transforma em matéria
tangível. Entre esses dois extremos, dão-se inúmeras transformações, mais ou
menos aproximadas de um e de outro. Os fluidos mais próximos da materialidade,
os menos puros, conseguintemente, compõem o que se pode chamar a atmosfera
espiritual da Terra. É desse meio, onde igualmente vários são os graus de
pureza, que os Espíritos encarnados e desencarnados, deste planeta, haurem os
elementos necessários à economia de suas existências. Por muito sutis e
impalpáveis que nos sejam esses fluidos, não deixam por isso de ser de natureza
grosseira, em comparação com os fluidos etéreos das regiões superiores.
O mesmo se dá na superfície de todos os mundos, salvo as diferenças de
constituição e as condições de vitalidade próprias de cada um. Quanto menos
material é a vida neles, tanto menos afinidades têm os fluidos espirituais com a
matéria propriamente dita.
Não é rigorosamente exata a qualificação de fluidos espirituais, pois que, em
definitiva, eles são sempre matéria mais ou menos quintessenciada. De realmente
espiritual, só a alma ou princípio inteligente. Dá-se-lhes essa denominação por
comparação apenas e, sobretudo, pela afinidade que eles guardam com os
Espíritos. Pode dizer-se que são a matéria do mundo espiritual, razão por que
são chamados fluidos espirituais.
6. - Quem conhece, aliás, a constituição íntima da matéria tangível? Ela
talvez somente seja compacta em relação aos nossos sentidos; prová-lo-ia a
facilidade com que a atravessam os fluidos espirituais e os Espíritos, aos quais
não oferece maior obstáculo, do que o que os corpos transparentes oferecem à
luz.
Tendo por elemento primitivo o fluído cósmico etéreo, à matéria tangível há
de ser possível, desagregando-se, voltar ao estado de eterização, do mesmo modo
que o diamante, o mais duro dos corpos, pode volatilizar-se em gás impalpável.
Na realidade, a solidificação da matéria não é mais do que um estado transitório
do fluido universal, que pode volver ao seu estado primitivo, quando deixam de
existir as condições de coesão.
Quem sabe mesmo se, no estado de tangibilidade, a matéria não é suscetível de
adquirir uma espécie de eterização que lhe daria propriedades particulares?
Certos fenômenos, que parecem autênticos, tenderiam a fazer supô-lo. Ainda não
conhecemos senão as fronteiras do mundo invisível; o porvir, sem dúvida, nos
reserva o conhecimento de novas leis, que nos permitirão compreender o que se
nos conserva em mistério.
Formação e propriedades do perispírito
7. - O perispírito, ou corpo fluídico dos Espíritos, é um dos mais
importantes produtos do fluido cósmico; é uma condensação desse fluido em torno
de um foco de inteligência ou alma. Já vimos que também o corpo carnal tem seu
princípio de origem nesse mesmo fluido condensado e transformado em matéria
tangível. No perispírito, a transformação molecular se opera diferentemente,
porquanto o fluido conserva a sua imponderabilidade e suas qualidades etéreas. O
corpo perispirítico e o corpo carnal têm pois origem no mesmo elemento
primitivo; ambos são matéria, ainda que em dois estados diferentes.
8. - Do meio onde se encontra é que o Espírito extrai o seu perispírito, isto
é, esse envoltório ele o forma dos fluidos ambientes. Resulta daí que os
elementos constitutivos do perispírito naturalmente variam, conforme os mundos.
Dando-se Júpiter como orbe muito adiantado em comparação com a Terra, como um
orbe onde a vida corpórea não apresenta a materialidade da nossa, os envoltórios
perispirituais hão de ser lá de natureza muito mais quintessenciada do que aqui.
Ora, assim como não poderíamos existir naquele mundo com o nosso corpo carnal,
também os nossos Espíritos não poderiam nele penetrar com o perispírito
terrestre que os reveste. Emigrando da Terra, o Espírito deixa aí o seu
invólucro fluídico e toma outro apropriado ao mundo onde vai habitar.
9. - A natureza do envoltório fluídico está sempre em relação com o grau de
adiantamento moral do Espírito. Os Espíritos inferiores não podem mudar de
envoltório a seu bel-prazer, pelo que não podem passar, a vontade, de um mundo
para outro. Alguns há, portanto, cujo envoltório fluídico, se bem que etéreo e
imponderável com relação à matéria tangível, ainda é por demais pesado, se assim
nos podemos exprimir, com relação ao mundo espiritual, para não permitir que
eles saiam do meio que lhes é próprio. Nessa categoria se devem incluir aqueles
cujo perispírito é tão grosseiro, que eles o confundem com o corpo carnal, razão
por que continuam a crer-se vivos. Esses Espíritos, cujo número é avultado,
permanecem na superfície da Terra, como os encarnados, julgando-se entregues às
suas ocupações terrenas. Outros um pouco mais desmaterializados não o são,
contudo, suficientemente, para se elevarem acima das regiões terrestres. (1)
(1) Exemplos de Espíritos que ainda se julgam deste mundo: Revue Spirite,
dezembro de 1859, pág. 310; - novembro de 1864, pág. 339; - abril de 1865,
pág. 177.
Os Espíritos superiores, ao contrário, podem vir aos mundos inferiores, e,
até, encarnar neles. Tiram, dos elementos constitutivos do mundo onde entram, os
materiais para a formação do envoltório fluídico ou carnal apropriado ao meio em
que se encontrem. Fazem como o nobre que despe temporariamente suas vestes, para
envergar os trajes plebeus, sem deixar por isso de ser nobre.
É assim que os Espíritos da categoria mais elevada podem manifestar-se aos
habitantes da Terra ou encarnar em missão entre estes. Tais Espíritos trazem
consigo, não o invólucro, mas a lembrança, por intuição, das regiões donde
vieram e que, em pensamento, eles vêem. São videntes entre cegos.
10. - A camada de fluidos espirituais que cerca a Terra se pode comparar às
camadas inferiores da atmosfera, mais pesadas, mais compactas, menos puras, do
que as camadas superiores. Não são homogêneos esses fluidos; são uma mistura de
moléculas de diversas qualidades, entre as quais necessariamente se encontram.
as moléculas elementares que lhes formam a base, porém mais ou menos alteradas.
Os efeitos que esses fluidos produzem estarão na razão da soma das partes puras
que eles encerram. Tal, por comparação, o álcool retificado, ou misturado, em
diferentes proporções, com água ou outras substâncias: seu peso específico
aumenta, por efeito dessa mistura, ao mesmo tempo que sua força e sua
inflamabilidade diminuem, embora no todo continue a haver álcool puro.
Os Espíritos chamados a viver naquele meio tiram dele seus perispíritos;
porém, conforme seja mais ou menos depurado o Espírito, seu perispírito se
formará das partes mais puras ou das mais grosseiras do fluido peculiar ao mundo
onde ele encarna. O Espírito produz aí, sempre por comparação e não por
assimilação, o efeito de um reativo químico que atrai a si as moléculas que a
sua natureza pode assimilar.
Resulta disso este fato capital: a constituição íntima do perispírito não é
idêntica em todos os Espíritos encarnados ou desencarnados que povoam a Terra ou
o espaço que a circunda. O mesmo já não se dá com o corpo carnal, que, como foi
demonstrado, se forma dos mesmos elementos, qualquer que seja a superioridade ou
a inferioridade do Espírito. Por isso, em todos, são os mesmos os efeitos que o
corpo produz, semelhantes as necessidades, ao passo que diferem em tudo o que
respeita ao perispírito.
Também resulta que: o envoltório perispirítico de um Espírito se modifica com
o progresso moral que este realiza em cada encarnação, embora ele encarne no
mesmo meio; que os Espíritos superiores, encarnando excepcionalmente, em missão,
num mundo inferior, têm perispírito menos grosseiro do que o dos indígenas desse
mundo.
11. - O meio está sempre em relação com a natureza dos seres que têm de nele
viver: os peixes, na água; os seres terrestres, no ar; os seres espirituais no
fluido espiritual ou etéreo, mesmo que estejam na Terra. O fluido etéreo está
para as necessidades do Espírito, como a atmosfera para as dos encarnados. Ora,
do mesmo modo que os peixes não podem viver no ar; que os animais terrestres não
podem viver numa atmosfera muito rarefeita para seus pulmões, os Espíritos
inferiores não podem suportar o brilho e a impressão dos fluidos mais etéreos.
Não morreriam no meio desses fluidos, porque o Espírito não morre, mas uma força
instintiva os mantêm afastados dali, como a criatura terrena se afasta de um
fogo muito ardente ou de uma luz muito deslumbrante. Eis aí por que não podem
sair do meio que lhes é apropriado à natureza; para mudarem de meio, precisam
antes mudar de natureza, despojar-se dos instintos materiais que os retêm nos
meios materiais; numa palavra, que se depurem e moralmente se transformem.
Então, gradualmente se identificam com um meio mais depurado, que se lhes torna
uma necessidade, como os olhos, para quem viveu longo tempo nas trevas,
insensivelmente se habituam à luz do dia e ao fulgor do Sol.
12 - Assim, tudo no Universo se liga, tudo se encadeia; tudo se acha
submetido à grande e harmoniosa lei de unidade, desde a mais compacta
materialidade, até a mais pura espiritualidade. A Terra é qual vaso donde se
escapa uma fumaça densa que vai clareando à medida que se eleva e cujas parcelas
rarefeitas se perdem no espaço infinito.
A potência divina refulge em todas as partes desse grandioso conjunto e, no
entanto, quer-se que Deus, não contente com o que há feito, venha perturbar essa
harmonia! que se rebaixe ao papel de mágico, produzindo efeitos pueris, dignos
de um prestidigitador! E ousa-se, ainda por cima, dar-lhe como rival em
habilidade o próprio Satanás! Não haveria modo de amesquinhar mais a majestade
divina e admiram-se de que a incredulidade progrida.
Tendes razão de dizer: «A fé vai-se.» Mas, a que se vai é a fé em tudo o que
aberra do bom-senso e da razão; é a fé idêntica à que outrora levava a dizerem:
«Vão-se os deuses!» A fé, porém, nas coisas sérias, a fé em Deus e na
imortalidade, essa está sempre vivaz no coração do homem e, por mais sufocada
que tenha sido sob o amontoado de histórias pueris com que a oprimiram, ela se
reerguerá mais forte, desde que se sinta libertada, tal como a planta que,
comprimida, se levanta de novo, logo que a banham os raios do Sol!
Efetivamente, tudo é milagre em a Natureza, porque tudo é admirável e dá
testemunho da sabedoria divina! Esses milagres se patenteiam a toda gente, a
todos os que têm olhos de ver e ouvidos de ouvir e não em proveito apenas de
alguns! Não! milagres não há no sentido que comumente emprestam a essa palavra,
porque tudo decorre das leis eternas da criação, leis essas perfeitas.
Livro= A Genese