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domingo, 16 de julho de 2017

Aprendendo com o Livro dos Espíritos questão 201

 
Comentário de Miramez
 
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 Conversas familiares de além-túmulo - Sra. Ida Pfeiffer, célebre viajante
(SOCIEDADE, 7 DE SETEMBRO DE 1859)

O relato seguinte foi extraído da Segunda Viagem ao Redor do Mundo, da Sra. Ida Pfeiffer, pág. 345:
“Já que vou falar de coisas muito estranhas, é preciso mencionar um acontecimento enigmático, passado em Java, há alguns anos, e que causou tal sensação que chegou a chamar a atenção do governo.
“Na residência de Chéribon havia uma casinha, na qual, segundo dizia o povo, apareciam Espíritos. Ao cair da noite, chovia pedras no quarto, vindas de todas as direções e por todos os lados cuspiam siri[1]. Tanto as pedras quanto as cusparadas caiam junto às pessoas que estavam no aposento, mas nem as atingiam, nem as feriam. Parece que tudo isso era dirigido particularmente contra uma criança. Tanto se falou desse caso inexplicável que o governador holandês encarregou um oficial superior de sua confiança de examiná-lo.
O oficial determinou que se postassem em torno da casa homens sérios e fiéis, com ordem de vedar a entrada e a saída de quem quer que fosse. Examinou tudo, escrupulosamente e, tomando em seu colo a criança designada, sentou-se na sala fatal. Ao anoitecer começou, como de costume, a chuva de pedras e de siri. Tudo caía perto do oficial e do menino, sem atingi-los. Novamente examinaram cada recanto, cada buraco. Nada, porém, foi descoberto. O oficial não podia compreender. Mandou juntar as pedras, marcá-las e escondê-las num recanto bem afastado. Foi tudo em vão. As mesmas pedras caíram novamente na sala, à mesma hora.
“Por fim, e para pôr termo a essa história inconcebível, o governador mandou demolir a casa”.
A pessoa que colheu este fato em 1853 era uma senhora realmente superior, menos por sua instrução e por seu talento do que pela incrível energia de seu caráter. Além dessa ardente curiosidade e dessa coragem indômita, que a tornaram a mais admirável viajante que jamais existiu, a Sra. Pfeiffer nada tinha de excêntrico. Era uma senhora de uma piedade suave e esclarecida e que provou muitas vezes estar longe de ser supersticiosa. Tinha como lei só contar aquilo que ela mesma tivesse visto, ou captado em fonte insupeita. (Veja-se a Revue de Paris, de 1º de setembro de 1856 e o Dictionnaire des Contemporains, de Vapereau).

1. ─ Evocação da Sra. Pfeiffer.
─ Aqui estou.
2. ─ Estais surpresa pelo nosso chamado e por vos encontrardes entre nós?
─ Estou surpresa com a rapidez da minha viagem.
3. ─ Como fostes prevenida de que desejávamos falar-vos?
─ Fui trazida aqui sem o perceber.
4. ─ Entretanto deveríeis ter recebido um aviso qualquer.
─ Um arrastamento irresistível.
5. ─ Onde estáveis quando do nosso chamado?
─ Junto a um Espírito que tenho a missão de guiar.
6. ─ Tivestes consciência dos lugares que atravessáveis para vir até aqui, ou aqui vos encontrastes subitamente, sem transição?
─ Subitamente.
7. ─ Sois feliz como Espírito?
─ Sim. Não se pode ser mais feliz.
8. ─ De onde vinha o vosso pronunciado gosto pelas viagens?
─ Eu havia sido marinheiro numa vida precedente. O gosto adquirido pelas viagens naquela existência refletiu-se nesta, a despeito do sexo que eu havia escolhido para me subtrair a isso.
9. ─ As viagens contribuíram para o vossa progresso como Espírito?
─ Sim, porque eu as fiz com espírito de observação, que me faltou na existência anterior, em que não me ocupei senão do comércio e das coisas materiais. Eis porque supunha que pudesse progredir mais numa vida sedentária. Mas Deus, tão bom e tão sábio em seus desígnios para nós impenetráveis, permitiu que eu utilizasse as minhas inclinações em favor do progresso que eu solicitava.
10. ─ Das nações que visitastes, qual a que vos pareceu mais adiantada e qual preferis? Não dissestes em vida que colocáveis certas tribos da Oceania acima das mais civilizadas nações?
─ Era uma ideia errada. Hoje prefiro a França, porque compreendo sua missão e prevejo o seu destino.
11. ─ Que destino prevedes para a França?
─ Não vos posso dizer o seu destino, mas sua missão é de semear o progresso e as luzes e, portanto, o Verdadeiro Espiritismo.
12. ─ Em que vos pareciam os selvagens da Oceania mais adiantados que os americanos?
─ Eu via neles, abstraídos os vícios do estado selvagem, qualidades sérias e sólidas que não encontrava em outros lugares.
13. ─ Confirmais o fato passado em Java e relatado numa de vossas obras?
─ Confirmo-o em parte. O caso das pedras marcadas e novamente atiradas merece uma explicação. Eram pedras semelhantes, mas não as mesmas.
14. ─ A que atribuís esse fenômeno?
─ Não sabia a que atribuí-lo. Eu me perguntava se o diabo existiria de fato, e respondia para mim mesma que não. Não passei disso.
15. ─ Agora que percebeis a causa, poderíeis dizer-nos de onde vinham essas pedras? Eram transportadas ou fabricadas especialmente pelos Espíritos?
─ Eram transportadas. Para eles era mais fácil trazê-las do que aglomerá-las[2].
16. ─ E de onde vinha aquele siri? Era feito por eles?
─ Sim. Era mais fácil e mesmo inevitável, pois que impossível lhes era encontrá-lo já preparado.
17. ─ Qual era o objetivo dessas manifestações?
─ Como agora, atrair a atenção e fazer constatar um fato do qual se tinha de falar e procurar a explicação.

OBSERVAÇÃO: Alguém observa que tal constatação não poderia conduzir a nenhum resultado sério entre aquela gente. Pode-se responder que há um resultado real, pois que, pelo relato e testemunho da Sra. Pfeiffer, o mesmo chegou ao conhecimento de povos civilizados, que o comentam e lhe tiram as conclusões. Aliás, os holandeses é que foram chamados a constatá-los.

18. ─ Haveria nesse caso um motivo especial, sobretudo quanto à criança atormentada por esses Espíritos?
─ A criança possui uma influência favorável, eis tudo, pois pessoalmente não sofreu sequer um arranhão.
19. ─ Desde que esses fenômenos eram produzidos por Espíritos, por que cessaram quando a casa foi demolida?
─ Cessaram porque foi julgado inútil continuar, mas não iríeis decerto perguntar se eles teriam podido continuar.
20. ─ Agradecemos a vossa vinda e a bondade de responder às nossas perguntas.
─ Estou inteiramente às vossas ordens.


[1] Preparação que os javaneses mascam continuamente e que dá à boca e à saliva a cor do sangue.
O nome de siris, do hindustani siris e do sânscrito sirisa, é dado a várias plantas do gênero Albizzia, especialmente à A. Iebbek e à A. Julibrissin. (Nota original, complementada pelo Tradutor).
[2] A expressão “aglomerá-las” equivale, no caso, a “fabricá-las”. O Espírito se refere ao processo de aglomeração dos elementos materiais do espaço para a produção de objetos materiais no fenômeno de materialização. (N. do R.)



Fonte: Revista Espírita 1859 -Dezembro 

sexta-feira, 30 de junho de 2017

Aprendendo com o livro dos Espíritos questão 198

 

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Comentário do Espírito de Miramez :

 
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Revista Espírita de 1859 -   Janeiro -  O Duende de Bayonne 

Em nosso número passado dissemos algumas palavras relativamente a essa estranha manifestação. As informações nos haviam sido dadas muito sucintamente e de viva voz por um de nossos assinantes, amigo da família onde ocorreram aqueles fatos. Tinha ele prometido detalhes mais circunstanciados e devemos à sua colaboração a disponibilização das cartas que contêm referências detalhadas dos fatos.
A família reside perto de Bayonne e as cartas foram escritas pela própria mãe da menina, uma criança de dez anos, a seu filho que mora em Bordeaux, pondo-o ao corrente do que se passava em casa. Este último teve o trabalho de transcrevê-las para nós, a fim de que se lhes não pudesse contestar a autenticidade. Por essa gentileza nós lhe somos infinitamente reconhecidos.
Compreende-se a reserva com que cercamos os nomes das pessoas, reserva que para nós é sempre uma lei a observar, a não ser que recebamos autorização formal. Nem todos gostam de atrair multidões de curiosos. Àqueles para quem tal reserva constitui motivo de suspeitas diremos que é necessário estabelecer uma diferença entre um jornal eminentemente sério e os que apenas visam distrair o público. Nosso objetivo não é contar casos para encher páginas, mas iluminar a Ciência. Se fôssemos enganados, sê-lo-íamos de boa-fé. Quando aos nossos olhos uma coisa não é formalmente demonstrada, damo-la apenas a título de registro. Já o mesmo não se dá quando se trata de pessoas respeitáveis, cuja honorabilidade conhecemos e que, longe de ter interesse em induzir-nos em erro, também querem instruir-se.
A primeira carta é a do filho ao nosso assinante, enviando-lhe as cartas de sua mãe.

“Saint-Esprit, 20 de novembro de 1858.
“Meu caro amigo,
“Chamado para junto de minha família por motivo da morte de um de meus irmãos menores, que Deus houve por bem tirar-nos, esta circunstância, afastando-me por algum tempo de minha casa, é o motivo do atraso de minha resposta. Ficaria muito triste se vos fizesse passar por um contador de histórias junto ao Sr. Allan Kardec, por isso quero dar-vos alguns pormenores sumários sobre as coisas que se passam em minha família. Penso que já vos disse que as aparições cessaram há algum tempo e não mais se manifestam à minha irmã. Aí vão as cartas que a respeito me escreveu minha mãe. Devo observar que muitos dos fatos foram omitidos, embora não sejam os menos interessantes. Escreverei novamente para completar a história, caso não o possais fazer recordando-vos daquilo que vos disse de viva voz.”

23 de abril de 1855.

Há cerca de três meses, uma tarde, tua irmã X teve necessidade de sair para fazer uma compra. Como sabes, o corredor da casa é longo e nunca iluminado; mas o velho hábito que temos de percorrê-lo sem luz faz com que jamais tropecemos nos degraus da escada. X já nos havia dito que cada vez que saía ouvia uma voz a lhe dizer coisas que a princípio não compreendia, mas que depois se tornaram inteligíveis. Algum tempo depois ela viu uma sombra e, no trajeto, não cessava de ouvir a mesma voz. As palavras ditas por esse ser invisível tendiam sempre a tranquilizá-la e a lhe dar sábios conselhos. Uma boa moral constituía a essência de tais palavras. X ficava muito perturbada e, segundo nos disse, por vezes não tinha forças para prosseguir. “Criança”, dizia-lhe o invisível cada vez que ela se perturbava, “nada temas, pois quero apenas o teu bem.” Ensinou-lhe um lugar onde por vários dias ela encontrou algumas moedas; de outras vezes nada encontrou. X conformou-se com a recomendação que lhe foi dada, e durante muito tempo ou encontrava dinheiro ou alguns brinquedos que verás. Certamente esses presentes lhe eram dados com o fito de encorajá-la. Não eras esquecido na conversa desse ser. Muitas vezes ele falava de ti e nos dava as tuas notícias por intermédio de tua irmã. Várias vezes ele nos pôs a par do que fazias à noite. Viu-te a ler em teu quarto; outras vezes nos disse que os teus amigos estavam reunidos em tua casa; enfim ele nos acalmava, sempre que a preguiça te impedia de nos escrever.
De algum tempo para cá, X tem contatos quase que contínuos com o invisível. Durante o dia ela nada vê. Ouve sempre a mesma voz que lhe dirige palavras sensatas, não cessando de estimulá-la ao trabalho e ao amor a Deus. À noite ela vê, na direção de onde parte a voz, uma luz rósea que não ilumina, mas que, em sua opinião, poderia ser comparada ao faiscar de um diamante na sombra. Agora ela perdeu o medo completamente. Se lhe manifesto dúvidas, diz-me: “Mamãe, é um anjo que me fala; e se, para te convenceres, te armares de coragem, ele me pede para dizer-te que esta noite fará com que te levantes. Se te falar, deverás responder. Vai ao lugar que ele te indicar; verás alguém em tua frente, mas não temas.” Eu não quis pôr à prova a minha coragem. Tive medo e a impressão que me ficou impediu-me de dormir. Muitas vezes, à noite, parecia-me ouvir um sopro à cabeceira de meu leito. As cadeiras moviam-se sem que ninguém as tocasse. Depois de algum tempo meus terrores desapareceram completamente e eu lamento muito não ter me submetido à prova que me fora proposta para ter ligações diretas com o invisível e também para não ter que lutar continuamente contra as dúvidas.
Aconselhei X a interrogar o invisível quanto à sua natureza.
Eis a conversa de ambos:
X. ─ Quem és tu?
Inv. ─ Sou teu irmão Eliseu.
X. ─ Meu irmão morreu há doze anos.
Inv. ─ É verdade. Teu irmão morreu há doze anos, mas havia nele, como há em todos os seres, uma alma que não morre e que neste mesmo instante se acha em tua presença, te ama e protege a todos.
X. ─ Gostaria de ver-te.
Inv. ─ Estou à tua frente.
X. ─ Contudo nada vejo.
Inv. ─ Tomarei uma forma visível para ti. Depois da cerimônia religiosa descerás; então tu me verás e eu te abraçarei.
X. ─ Mamãe também gostaria de conhecer-te.
Inv. ─ Tua mãe é minha mãe. Ela me conhece. Preferiria manifestar-me a ela do que a ti. Esse era o meu dever, mas não me posso mostrar a muitas pessoas, pois Deus não o permite. Lamento que mamãe não tenha tido coragem. Prometo dar-te provas de minha existência, e então desaparecerão todas as dúvidas.
À tarde, à hora marcada, X foi à porta do templo. Um rapaz apresentou-se a ele e disse: “Eu sou o teu irmão. Disseste que me querias ver. Estás satisfeita? Abraça-me, porque não posso conservar por muito tempo a forma que tomei.”
Como bem compreendes, a presença desse ser deveria ter espantado X a ponto de impedi-la de fazer qualquer observação. Assim que a abraçou, ele desapareceu no ar.
Na manhã seguinte, aproveitando o momento em que X deveria sair, o invisível se manifestou novamente e lhe disse:
“Deverias ter ficado muito surpreendida com o meu desaparecimento. Pois bem, eu te quero ensinar a elevar-te nos ares, para que me possas acompanhar.” Qualquer outra que não X teria ficado com medo de tal proposta. Ela, porém, aceitou-a com entusiasmo e logo sentiu que se elevava como uma andorinha. Em pouco tempo chegou a um lugar onde havia uma multidão considerável. Segundo nos contou, viu ouro, diamantes e tudo quanto na Terra satisfaz a nossa imaginação. Ninguém considerava essas coisas mais do que nós consideramos as pedras das calçadas por onde andamos. Reconheceu várias crianças de sua idade que moravam na nossa rua e que faleceram há muito tempo. Num apartamento ricamente decorado, onde não havia ninguém, o que mais lhe chamou a atenção foi uma grande mesa na qual, de espaço a espaço, havia um papel. Diante de cada papel havia um tinteiro. Ela via as penas molharem-se por si sós e traçarem caracteres sem que qualquer mão as movesse.
Quando voltou, censurei-a por se ter ausentado sem minha autorização e a proibi expressamente de retomar tais excursões. O invisível lhe manifestou pesar por me haver contrariado e lhe prometeu formalmente que, de então em diante, não a convidaria mais para ausentar-se sem que eu fosse avisada.

26 de abril.

O invisível transformou-se aos olhos de X. Tomou tua forma tão bem que tua irmã pensou que estivesses na sala. Para certificar-se, ela lhe pediu que tomasse sua forma primitiva. Pois assim que desapareceste, foste substituído por mim. Seu espanto foi grande: perguntou como eu me achava ali, sendo que que a porta do salão estava fechada a chave. Então ocorreu uma nova transformação: ele tomou a forma do irmão morto e disse a X: “Tua mãe e todos os membros da família não veem sem espanto e mesmo sem um certo receio todos os fatos que se realizam por minha intervenção. Meu desejo não é amedrontar; contudo, quero provar minha existência e te pôr ao abrigo da incredulidade de todos, pois que poderiam tomar como mentira tua o que seria da parte deles uma obstinação em não se renderem à evidência. A senhora C. é lojista; sabes que é preciso comprar botões; iremos ambos comprá-los. Eu me transformarei em teu irmãozinho (ele tinha então nove anos) e quando voltares para casa pedirás à mamãe que mande perguntar à senhora C. quem estava contigo no momento em que os botões foram comprados.” X observou as instruções. Eu mandei perguntar à senhora C. e ela respondeu que tua irmã estava com teu irmão, a quem muito elogiou, dizendo que, em sua idade, ninguém poderia pensar que tivesse respostas tão fáceis e, sobretudo, tão pouca timidez. É bom que saibas que o pequeno estava no colégio desde cedo e que só voltaria às sete horas. Além disso, é muito tímido e não tem aquela facilidade que lhe querem atribuir. É muito curioso, não achas? Creio que a mão de Deus não é estranha a essas coisas inexplicáveis.

7 de maio de 1855.

Não sou mais crédula do que se deve ser e não me deixo dominar por ideias supersticiosas. Contudo não posso recusar-me a crer em fatos que se realizam sob minhas vistas. Eram-me necessárias provas muito evidentes para não mais infligir à tua irmã os castigos que lhe dava, às vezes com pesar, receando que nos quisesse ludibriar e abusar de nossa confiança.
Ontem, por volta das cinco horas, o invisível disse a X: “É provável que a mamãe te mande a algum lugar, para dar um recado. No caminho serás agradavelmente surpreendida pela chegada da família de teu tio”. Imediatamente X me transmitiu o que o invisível lhe havia dito. Eu estava longe de esperar tal visita e fiquei ainda mais surpresa por ficar sabendo dessa maneira. Tua irmã saiu e as primeiras pessoas que encontrou foram realmente meu irmão, sua mulher e seus filhos, que nos vinham ver. X apressou-se em dizer que eu tinha uma prova a mais da veracidade de tudo quanto ela me dizia.

10 de maio de 1855.

Hoje não posso mais duvidar de que algo de extraordinário acontece em casa. Vejo sem medo se realizarem todos esses fatos singulares, dos quais, entretanto, não posso extrair nenhum ensinamento, porque esses mistérios me são inexplicáveis.
Ontem, depois de ter arrumado toda a casa, e sabes que é uma coisa a que ligo especial atenção, o invisível disse a X que, a despeito das provas que havia dado de sua intervenção em todos os fatos curiosos que te contei, eu ainda tinha dúvidas que ele queria eliminar por completo. Sem que se tivesse ouvido qualquer ruído, um minuto foi bastante para pôr os quartos em completa desordem. Uma substância vermelha, que acredito fosse sangue, tinha sido derramada no soalho. Se tivessem sido apenas algumas gotas, eu teria pensado que X se tivesse cortado ou sangrado pelo nariz; mas fica sabendo que o soalho ficou inundado. Esta prova esquisita deu-nos um trabalho considerável para restituir ao piso do salão o seu primitivo brilho.
Antes de abrir as cartas que nos escreves, X conhece o conteúdo. É o invisível quem lho transmite.

16 de maio de 1855.

X não aceitou uma observação que a irmã lhe fez, não sei a propósito de quê. Deu uma resposta inconveniente e teve a merecida reprimenda. Castiguei-a e ela foi deitar-se sem jantar. Antes de dormir ela tem o hábito de rezar a Deus. Essa noite ela esqueceu. Mas alguns instantes depois de deitada o invisível lhe apareceu. Exibiu-lhe um castiçal e um livro de orações semelhante ao que ela habitualmente usava, e lhe disse que, apesar da punição que ela merecera, não devia esquecer-se de cumprir sua obrigação. Então ela se levantou, fez o que ele ordenara e tudo desapareceu quando a prece terminou.
Na manhã seguinte, depois de me haver abraçado, X me perguntou se o castiçal que se achava sobre a mesa no andar superior do seu quarto tinha sido retirado. Ora, esse castiçal, semelhante ao que lhe havia sido apresentado na véspera, não tinha mudado de lugar, assim como o seu livro de preces.

4 de junho de 1855.

De algum tempo para cá nenhum fato digno de menção ocorreu, a não ser o seguinte: Eu estava resfriada nestes últimos dias; anteontem todas as tuas irmãs estavam ocupadas e eu não dispunha de ninguém para mandar comprar um unguento. Disse a X que quando ela tivesse acabado a sua tarefa seria bom ir à farmácia mais próxima comprar-me alguma coisa. Ela esqueceu minha recomendação e eu mesma não pensei mais no caso. Tenho certeza de que ela não saiu, nem deixou o trabalho senão para ir buscar uma sopeira de que necessitávamos. Com grande surpresa, ao abri-la encontramos um pacote de balas de cevada que o invisível tinha trazido, para poupar uma caminhada e também para satisfazer um desejo meu, que havia sido olvidado.
Evocamos esse Espírito numa das sessões da Sociedade e lhe dirigimos as perguntas abaixo. O Sr. Adrien o viu com a fisionomia de um menino de 10 a 12 anos: bela cabeça, cabelos negros e ondulados, olhos negros e vivos, pálido, lábios irônicos, caráter leviano, mas bondoso. O Espírito disse ignorar por que o evocavam.
Nosso correspondente estava presente à sessão e disse que seus traços correspondem perfeitamente aos que a menina lhe descreveu em várias circunstâncias.

1 ─ Ouvimos contar a história de tuas manifestações numa família de Bayonne e, a tal respeito, gostaríamos de fazer-te algumas perguntas.
─ Façam e eu responderei. Mas façam rapidamente, pois tenho pressa de ir embora.
2 ─ Onde apanhaste o dinheiro que davas à tua irmã?
─ Tirei do bolso dos outros. Os senhores compreendem que eu não me iria divertir em cunhar moedas. Pego daqueles que podem dá-las.
3 ─ Por que te ligaste àquela menina?
─ Por grande simpatia.
4 ─ É certo que foste seu irmão, falecido aos quatro anos?
─ Sim.
5 ─ Por que és visível para ela e não para tua mãe?
─ Minha mãe deve estar impedida de ver-me, mas minha irmã não necessita de punição. Aliás foi por concessão especial que lhe apareci.
6 ─ Poderias explicar como, à vontade, te tornas visível ou invisível?
─ Não sou suficientemente elevado e estou muito preocupado com o que me atrai, para que possa responder a tal pergunta.
7 ─ Se quisesses poderias aparecer em nosso meio, assim como te mostraste à dona da loja?
─ Não.
8 ─ Nesse estado serias sensível à dor, se apanhasses?
─ Não.
9 ─ Que aconteceria se a dona da loja te houvesse batido?
─ Teria batido no vácuo.
10─ Sob que nome podemos te designar, quando falarmos de ti?
─ Podem chamar-me de Duende, se quiserem. Mas deixem-me ir; é preciso que eu vá.
11 ─ (A São Luís). Seria útil termos às nossas ordens um Espírito assim?
─ Muitas vezes os tendes junto a vós, a vos assistir sem que o suspeiteis.
  
CONSIDERAÇÕES SOBRE O DUENDE DE BAYONNE

Se compararmos estes fatos com os de Bergzabern, dos quais os nossos leitores não perderam a lembrança, veremos uma diferença capital. O de Bergzabern era mais que um Espírito batedor; era ─ e ainda é neste momento ─ um Espírito perturbador, na exata acepção do vocábulo. Sem fazer mal, é um hóspede muito incômodo e muito desagradável, sobre o qual voltaremos a falar em nosso próximo número, à vista de novas e recentes proezas. Ao contrário, o de Bayonne é eminentemente benévolo e prestativo; é o tipo desses bons Espíritos serviçais, cujos feitos nos são transmitidos pelas lendas alemãs, nova prova de que nas histórias lendárias pode haver um fundo de verdade. Aliás, é de convir que a imaginação dependeria de pouco esforço para colocar estes fatos no plano de uma lenda e que poderiam ser tomados como uma história medieval, se não se tivessem passado, por assim dizer, sob nossos olhos.
Um dos traços mais notáveis do Espírito a quem demos o nome de Duende de Bayonne são as suas transformações. Que dirão agora da fábula de Proteu[1]? Entre o de Bayonne e o de Bergzabern há ainda a diferença de que este último só se mostrou em sonhos, enquanto que o nosso diabrete se tornava visível e tangível como uma pessoa real, não só para a irmã como para estranhos; testemunha-o a compra de botões na lojista. Por que não se mostrava a todos e a toda hora? Eis o que ignoramos. Parece que não tem tal poder e mesmo que não podia permanecer muito tempo em tal estado. Talvez para isso fosse necessário um trabalho íntimo, um poder da vontade superior às suas forças.
Novos detalhes prometidos sobre esses estranhos fenômenos permitirão que voltemos ao assunto.


[1] Deus marinho grego. Era filho de Poseidon (Netuno) e da deusa Fenícia; predizia o futuro e guardava os cardumes marinhos de Anfitrite, a deusa do mar. Morava numa ilha do Egito e podia tomar múltiplas formas, a fim de subtrair-se à curiosidade daqueles que pretendiam que lhes revelasse o futuro. (N. do T.)
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Livro : O que é o espiritismo? Cap. III
158. Qual, na vida futura, a sorte das crianças que morrem em tenra idade?
Esta questão é uma das que melhor provam a justiça e a necessidade da pluralidade das existências. Uma alma que só tiver vivido alguns instantes, sem fazer nem bem nem mal, não pode merecer prêmio nem castigo, pois, segundo a máxi­ma do Cristo — cada um é punido ou recompensado conforme suas obras — é tão ilógico como contrário à justiça de Deus admitir-se que, sem trabalho, essa alma seja chamada a go­zar da bem-aventurança dos anjos, ou que desta se veja priva­da; entretanto, ela deve ter um destino qualquer. Um estado misto, por toda a eternidade, seria igualmente uma injustiça. Uma existência logo em começo interrompida, não podendo, pois, ter conseqüência alguma para a alma, tem por sorte atual o que mereceu da existência anterior, e futuramente o que vier a merecer em suas existências ulteriores.
 

domingo, 21 de setembro de 2014

O lar de uma família espírita

O lar de uma família espírita

(Revista Espírita, setembro de 1859)

Há três anos a Sra. G... ficou viúva, com quatro crianças. O filho mais velho é um rapaz amável, de dezessete anos, e a filha mais moça uma encantadora menina de seis. Desde muito tempo essa família se dedica ao Espiritismo, e antes mesmo que esta crença se tivesse tornado tão popular como hoje, marido e mulher tinham uma espécie de intuição que diversas circunstâncias haviam desenvolvido. O pai do Sr. G... havia aparecido para ele várias vezes, na mocidade, sempre para preveni-lo de coisas importantes ou para lhe dar conselhos úteis. Fatos semelhantes também se haviam passado entre os seus amigos, de sorte que para eles a existência de além-túmulo não era objeto da menor dúvida, assim como não o era a possibilidade de nos comunicarmos com nossos entes queridos.
Quando o Espiritismo surgiu, foi apenas a confirmação de uma ideia bem assentada e santificada pelo sentimento de uma religião esclarecida, pois aquela família é um modelo de piedade e de caridade evangélica. Na nova ciência aprenderam os meios mais diretos de comunicação. A mãe e um dos filhos tornaram-se excelentes médiuns. Mas, longe de empregar essa faculdade em questões fúteis, todos consideravam-na precioso dom da Providência, do qual não era permitido servir-se senão para coisas sérias. Assim, jamais a praticavam sem recolhimento e respeito, e longe das vistas dos importunos e curiosos.
Nesse meio tempo o pai adoeceu. Pressentindo seu fim próximo, reuniu os filhos e lhes disse: “Meus caros filhos e minha amada mulher. Deus me chama para Ele. Sinto que vou deixar-vos daqui a pouco, mas também sinto que por vossa fé na imortalidade encontrareis força para suportar esta separação com coragem, assim como eu levo o consolo de que poderei sempre estar entre vós e vos ajudar com os meus conselhos. Assim, chamai-me quando eu não estiver mais na Terra. Virei sentar-me ao vosso lado e conversar convosco, como o fazem os nossos antepassados. Na verdade, estaremos menos separados do que se eu partisse para uma terra distante.
Minha cara esposa, deixo-te uma grande tarefa, mas quanto mais pesada for, mais gloriosa será. Tenho certeza de que os nossos filhos te ajudarão a suportá-la. Não é, meus filhos? Auxiliareis a vossa mãe; evitareis tudo quanto possa fazê-la sofrer; sereis sempre bons e benevolentes para com todos; estendereis a mão aos vossos irmãos infelizes, porque não haveis de querer estendê-la um dia pedindo em vão para vós. Que a paz, a concórdia e a união reinem entre vós. Que jamais o interesse vos separe, porque o interesse material é a maior barreira entre a Terra e o Céu. Pensai que estarei sempre junto a vós; que vos verei como vos vejo neste momento, e ainda melhor, pois verei o vosso pensamento. Não queirais, assim, entristecer-me depois da morte, do mesmo modo que não o fizestes durante a minha vida”.
É um espetáculo realmente edificante a vida dessa piedosa família. Alimentadas nas ideias espíritas, essas crianças não se consideram separadas do pai. Para elas, ele está presente. Temem praticar a menor ação que possa desagradá-lo. Uma noite por semana, e às vezes mais, é consagrada a conversar com ele. Existem, porém, as necessidades da vida, que devem ser providas, pois a família não é rica. É por isso que um dia certo é marcado para essas conversas piedosas e sempre esperadas com impaciência. Muitas vezes pergunta a pequenina: “É hoje que papai vem?” Esse dia transcorre entre conversas familiares e instruções proporcionadas à inteligência, algumas vezes infantis, outras vezes graves e sublimes. São conselhos dados a propósito de pequenas travessuras que ele assinala. Se faz elogios, também não poupa críticas, e o culpado baixa os olhos, como se o pai estivesse diante dele; pede-lhe perdão, que por vezes só é concedido depois de algumas semanas de prova. Sua sentença é esperada com febril ansiedade. Então, que alegria, quando o pai diz: “Estou contente contigo!” Entretanto, a mais terrível sentença é: “Não virei na próxima semana.”
A festa anual não é esquecida. É sempre um dia solene, para o qual convidam os avós e demais mortos da família, sem esquecer um irmãozinho, falecido há alguns anos. Os retratos são enfeitados de flores e cada criança prepara um pequeno trabalho, por vezes apenas uma saudação tradicional. O mais velho faz uma dissertação sobre assunto grave; uma das meninas toca um trecho de música; a menor conta uma fábula. É o dia das grandes comunicações, e cada convidado recebe uma lembrança dos amigos que deixou na Terra.
Como são belas essas reuniões, na sua tocante simplicidade! Como tudo, ali, fala ao coração! Como é possível sair delas sem estar impregnado do amor ao bem? Nenhum olhar de mofa, nenhum sorriso cético vem perturbar o piedoso recolhimento. Alguns amigos que partilham das mesmas convicções e que são devotos da religião da família, são os únicos admitidos a participar desse banquete do sentimento.
Ride quanto quiserdes, vós que zombais das coisas mais santas. Por mais soberbos e endurecidos que sejais, não vos faço a injúria de acreditar que o vosso orgulho possa ficar impassível e frio ante tal espetáculo.
Um dia, entretanto, foi de luto para a família, dia de verdadeiro pesar: o pai havia anunciado que durante algum tempo, longo tempo mesmo, não poderia vir. Ele havia sido chamado para uma importante missão longe da Terra. A festa anual não deixou de ser celebrada, mas foi triste, pois o pai lá não estava. Ao partir, ele havia dito: “Meus filhos, que ao meu retorno eu vos encontre todos dignos de mim”, e cada um se esforça por tornar-se digno dele. Eles ainda estão esperando.
ALLAN KARDEC.

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

O lar de uma família espírita

O lar de uma família espírita

(Revista Espírita, setembro de 1859)

Há três anos a Sra. G... ficou viúva, com quatro crianças. O filho mais velho é um rapaz amável, de dezessete anos, e a filha mais moça uma encantadora menina de seis. Desde muito tempo essa família se dedica ao Espiritismo, e antes mesmo que esta crença se tivesse tornado tão popular como hoje, marido e mulher tinham uma espécie de intuição que diversas circunstâncias haviam desenvolvido. O pai do Sr. G... havia aparecido para ele várias vezes, na mocidade, sempre para preveni-lo de coisas importantes ou para lhe dar conselhos úteis. Fatos semelhantes também se haviam passado entre os seus amigos, de sorte que para eles a existência de além-túmulo não era objeto da menor dúvida, assim como não o era a possibilidade de nos comunicarmos com nossos entes queridos.
Quando o Espiritismo surgiu, foi apenas a confirmação de uma ideia bem assentada e santificada pelo sentimento de uma religião esclarecida, pois aquela família é um modelo de piedade e de caridade evangélica. Na nova ciência aprenderam os meios mais diretos de comunicação. A mãe e um dos filhos tornaram-se excelentes médiuns. Mas, longe de empregar essa faculdade em questões fúteis, todos consideravam-na precioso dom da Providência, do qual não era permitido servir-se senão para coisas sérias. Assim, jamais a praticavam sem recolhimento e respeito, e longe das vistas dos importunos e curiosos.
Nesse meio tempo o pai adoeceu. Pressentindo seu fim próximo, reuniu os filhos e lhes disse: “Meus caros filhos e minha amada mulher. Deus me chama para Ele. Sinto que vou deixar-vos daqui a pouco, mas também sinto que por vossa fé na imortalidade encontrareis força para suportar esta separação com coragem, assim como eu levo o consolo de que poderei sempre estar entre vós e vos ajudar com os meus conselhos. Assim, chamai-me quando eu não estiver mais na Terra. Virei sentar-me ao vosso lado e conversar convosco, como o fazem os nossos antepassados. Na verdade, estaremos menos separados do que se eu partisse para uma terra distante.
Minha cara esposa, deixo-te uma grande tarefa, mas quanto mais pesada for, mais gloriosa será. Tenho certeza de que os nossos filhos te ajudarão a suportá-la. Não é, meus filhos? Auxiliareis a vossa mãe; evitareis tudo quanto possa fazê-la sofrer; sereis sempre bons e benevolentes para com todos; estendereis a mão aos vossos irmãos infelizes, porque não haveis de querer estendê-la um dia pedindo em vão para vós. Que a paz, a concórdia e a união reinem entre vós. Que jamais o interesse vos separe, porque o interesse material é a maior barreira entre a Terra e o Céu. Pensai que estarei sempre junto a vós; que vos verei como vos vejo neste momento, e ainda melhor, pois verei o vosso pensamento. Não queirais, assim, entristecer-me depois da morte, do mesmo modo que não o fizestes durante a minha vida”.
É um espetáculo realmente edificante a vida dessa piedosa família. Alimentadas nas ideias espíritas, essas crianças não se consideram separadas do pai. Para elas, ele está presente. Temem praticar a menor ação que possa desagradá-lo. Uma noite por semana, e às vezes mais, é consagrada a conversar com ele. Existem, porém, as necessidades da vida, que devem ser providas, pois a família não é rica. É por isso que um dia certo é marcado para essas conversas piedosas e sempre esperadas com impaciência. Muitas vezes pergunta a pequenina: “É hoje que papai vem?” Esse dia transcorre entre conversas familiares e instruções proporcionadas à inteligência, algumas vezes infantis, outras vezes graves e sublimes. São conselhos dados a propósito de pequenas travessuras que ele assinala. Se faz elogios, também não poupa críticas, e o culpado baixa os olhos, como se o pai estivesse diante dele; pede-lhe perdão, que por vezes só é concedido depois de algumas semanas de prova. Sua sentença é esperada com febril ansiedade. Então, que alegria, quando o pai diz: “Estou contente contigo!” Entretanto, a mais terrível sentença é: “Não virei na próxima semana.”
A festa anual não é esquecida. É sempre um dia solene, para o qual convidam os avós e demais mortos da família, sem esquecer um irmãozinho, falecido há alguns anos. Os retratos são enfeitados de flores e cada criança prepara um pequeno trabalho, por vezes apenas uma saudação tradicional. O mais velho faz uma dissertação sobre assunto grave; uma das meninas toca um trecho de música; a menor conta uma fábula. É o dia das grandes comunicações, e cada convidado recebe uma lembrança dos amigos que deixou na Terra.
Como são belas essas reuniões, na sua tocante simplicidade! Como tudo, ali, fala ao coração! Como é possível sair delas sem estar impregnado do amor ao bem? Nenhum olhar de mofa, nenhum sorriso cético vem perturbar o piedoso recolhimento. Alguns amigos que partilham das mesmas convicções e que são devotos da religião da família, são os únicos admitidos a participar desse banquete do sentimento.
Ride quanto quiserdes, vós que zombais das coisas mais santas. Por mais soberbos e endurecidos que sejais, não vos faço a injúria de acreditar que o vosso orgulho possa ficar impassível e frio ante tal espetáculo.
Um dia, entretanto, foi de luto para a família, dia de verdadeiro pesar: o pai havia anunciado que durante algum tempo, longo tempo mesmo, não poderia vir. Ele havia sido chamado para uma importante missão longe da Terra. A festa anual não deixou de ser celebrada, mas foi triste, pois o pai lá não estava. Ao partir, ele havia dito: “Meus filhos, que ao meu retorno eu vos encontre todos dignos de mim”, e cada um se esforça por tornar-se digno dele. Eles ainda estão esperando.
ALLAN KARDEC.

sábado, 3 de novembro de 2012

Ditados Espontãneos. Parabola

Parábola.
(Sociedade, 9 de dezembro de 1859 Méd Sr Roze.)
Um velho navio, em sua última travessia, foi atacado por uma tempestade terrível. Levava,
além de grande quantidade de passageiros, uma multidão de mercadorias estrangeiras ao
seu destino, que a avareza e a cupidez de seus patrões havia acumulado. - O perigo era
iminente; a maior desordem reinava a bordo; os chefes recusavam lançar sua carga ao mar;
suas ordens eram desconhecidas; perderam a confiança da tripulação e dos passageiros. Era
necessário pensar em abandonar o navio; colocaram-se três embarcações no mar; na
primeira e a maior, se precipitaram estouvadamente os mais impacientes, e os mais
inexperientes, que se apressaram em dar força aos remos até a luz que perceberam na costa,
ao longe. Caíram nas mãos de uma horda de provocadores de naufrágios, que os despojaram
dos objetos preciosos que juntaram às pressas, e os maltratou sem piedade.
Os segundos, mais clarividentes, souberam distinguir um farol redentor no meio das luzes
enganosas que se acendiam no horizonte, e, confiantes, abandonaram seu barco ao capricho
das ondas; foram se quebrar nos recifes, bem ao pé do farol que não escapara de seus olhos,
e foram tanto mais sensíveis à sua ruína e à perda de seus bens quanto entreviram a
salvação.
Os terceiros, pouco numerosos, mais sábios e prudentes, guiaram com cuidado seu frágil
barquinho no meio dos escolhos e abordaram, corpos e bens, sem outro mal que a fadiga da
viagem.
Não vos contenteis, pois, em vos colocar em guarda contra os fogos dos provocadores de
naufrágios, contra os maus Espíritos; mas sabei também evitar a falta dos viajores indolentes
que perderam seus bens e foram naufragar no porto. Sabei guiar vosso barco no meio dos
escolhos das paixões, e abordareis felizes o porto da vida eterna, ricos de virtudes que
adquiristes em vossas viagens.
SÃO VICENTE DE PAULO.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

O Guia da senhora Mally

Revista Espírita, agosto de 1859
(Sociedade, 8 de julho de 1859).
1. Evocação do guia da senhora Mally. - R. Eu venho, isso me é fácil.
2. Sob qual nome quereis que vos designemos? - R. Como quiserdes; por aquele sob o qual vós já me conhecíeis.
3. Que motivo vos ligou à senhora Mally e às suas filhas? - R. Primeiro, um antigo relacionamento, e uma amizade, uma simpatia que Deus sempre protege.
4. Diz-se que foi a sonâmbula, senhora de Dupuy, que vos deu à senhora Mally; isso é verdade? - R. Foi ela quem lhe disse que eu estava perto dela.
5. É que dependeis dessa sonâmbula? - R. Não.
6. Ela poderia vos retirar de perto dessa senhora? - R. Não.
7. Se essa sonâmbula viesse a morrer, isso teria sobre vós uma influência qualquer? - R. Nenhuma.
8. Faz muito tempo que vosso corpo morreu? - R. Sim, vários anos.
9. Que éreis em vossa vida? - R. Criança morta aos oito anos.
10. Sois feliz ou infeliz como Espírito? - R. Feliz; não tenho nenhuma inquietação pessoal, não sofro senão pelos outros; em verdade, que sofro muito por eles.
11. Fostes vós quem apareceu, na escada, à senhora Mally sob a forma de um jovem que ela tomou por um ladrão? - R. Não; era um companheiro.
12. E uma outra vez, sob a forma de um cadáver? Isso poderia impressioná-la lastimosamente; foi uma má peça que não anuncia a benevolência. - R. Longe disso em muitos casos; mas aqui era para dar, à senhora Mally, pensamentos mais corajosos; o que tem um cadáver de apavorante?
13. Tendes, pois, o poder de tornar-vos visível à vontade? - R. Sim, mas disse-vos que esse não era eu.
14. Éreis igualmente estranho às manifestações materiais que se produziram em sua casa? - R. Perdão! Isso sim; foi isso que me impus para ela, como trabalho material; mas realizei-lhe um trabalho bem mais útil e bem mais sério.
15. Podeis tomar-vos visível a todo mundo? - R. Sim.
16. Poderíeis tornar-vos visível aqui, para um de nós? - R. Sim; pedi a Deus para que assim possa só eu o posso, mas não ouso fazê-lo.
17. Se não quereis tornar-vos visível, poderíeis ao menos fazer-nos uma manifestação, para trazer, por exemplo, alguma coisa sobre a mesa? - R. Certamente, mas para o que de bom? Junto dela testemunho a minha presença por esse meio, mas junto a vós é inútil, uma vez que conversamos juntos.
18. O obstáculo não seria faltar-vos aqui o médium necessário para produzir essas manifestações? - R. Não, esse é um obstáculo fraco. Não vedes, freqüentemente, manifestações súbitas a pessoas que não são de modo algum médiuns?
19. Todo o mundo, pois, está apto a ter manifestações espontâneas? - R. Uma vez que em sendo homem, se é médium.
20. O Espírito não encontra, entretanto, na organização de certas pessoas, uma facilidade maior para se comunicar? - R. Sim, mas eu vos digo, e deveríeis sabê-lo, os Espíritos são poderosos por si mesmos, o médium não é nada. Não tendes a escrita direta, e para isso é necessário um médium? Não; da fé somente e um ardente desejo, e, freqüentemente ainda, isso se produz com o desconhecimento dos homens, quer dizer, sem fé e sem desejo.
21. Pensais que as manifestações, tais como a escrita direta, por exemplo, se tomarão mais comuns do que o são hoje? - R. Certamente; como entendeis, pois, a divulgação do Espiritismo?
22. Podeis nos explicar o que a jovem da senhora Mally recebia em sua mão e comia durante a sua doença? - R. Maná; uma substância formada por nós, que encerra o princípio contido no maná comum e a doçura de um doce.
23. Essa substância é formada com a mesma matéria das vestimentas e outros objetos que os Espíritos produzem por sua vontade e pela ação que têm sobre a matéria? - R. Sim, mas os elementos são muito diferentes; as partes que formam meu maná não são as mesmas das que tomo para formar a madeiras ou uma vestimenta.
24. (A São Luís). O elemento tomado pelo Espírito, para formar o seu maná, é diferente daquele que tomou para formar outra coisa? Sempre nos foi dito que não há senão um elemento primitivo universal, do qual os diferentes corpos não são senão modificações. - R. Sim; quer dizer que esse mesmo elemento primitivo esparso no espaço, aqui sob uma forma, e ali sob uma outra; isso é o que ele quer dizer; ele toma seu maná de uma parte desse elemento, que crê diferente, mas que é bem sempre o mesmo.
25. A ação magnética pela qual se dá a uma substância, a água, por exemplo, propriedades especiais, tem relação com a do Espírito que cria uma substância? - R. O magnetizador não desdobra absolutamente senão a vontade; é um Espírito que o ajuda, que se encarrega de preparar e de concentrar o remédio.
26. (Ao Guia). Reportamos no tempo fatos curiosos de manifestações da parte de um Espírito que designamos sob o nome de Follet de Bayonne; conheceis esse Espírito? - R. Não particularmente; mas segui o que fizestes com ele, e foi somente assim que o conheci de início.
27. É um Espírito de uma ordem inferior? - R. Inferior quer dizer mau? Não. Quer dizer simplesmente: não inteiramente bom, pouco avançado? Sim.
28. Agradecemos-vos por consentir vir e pelas explicações que nos destes. - R. Ao vosso serviço.
Nota. Esta comunicação nos oferece um complemento ao que dissemos nos dois artigos precedentes, sobre a formação de certos corpos pelos Espíritos. A substância dada à criança, durante sua enfermidade, evidentemente, era uma substância preparada por eles e que teve por efeito dar-lhe a saúde. Onde hauriram eles os princípios? No elemento universal transformado para o uso proposto. O fenômeno tão estranho de propriedades transmitidas pela ação magnética, problema até o momento inexplicado, e sobre o qual se alegraram tanto os incrédulos, encontra-se agora resolvido. Sabemos, com efeito, que não são apenas os Espíritos dos mortos que agem, mas que os dos vivos também têm sua parte de ação no mundo invisível: o homem com a tabaqueira disso nos forneceu a prova. O que há de espantoso, pois, em que a vontade de uma pessoa agindo pelo bem possa operar uma transformação na matéria primitiva, e dar-lhe propriedades determinadas? Está aí, em nosso entender, a chave de muitos dos efeitos pretendidos sobrenaturais, e dos quais teremos ocasião de falar. Foi assim que, pela observação, chegamos a nos dar conta das coisas, deixando-lhes a parte da realidade do maravilhoso. Mas quem diz que essa teoria seja verdadeira? Seja; ela tem pelo menos o mérito de ser racional e perfeitamente de acordo com os fatos observados; se algum cérebro humano dela encontre uma que julgue mais lógica do que a dada pelos Espíritos, serão comparadas; talvez, um dia, ficaremos contentes por termos aberto o caminho do estudo raciocinado do Espiritismo.
"Gostaria muito, disse-nos um dia uma pessoa, ter assim um Espírito servidor às minhas ordens, sob a condição de suportar algumas pequenas travessuras de sua parte." É uma satisfação da qual a gente goza, freqüentemente, sem dela suspeitar, porque todos os Espíritos que nos assistem não se manifestam de um modo ostensivo; mas não estão menos ao nosso lado, e sua influência, por ser oculta, não é menos real.