Revista Espírita 1865, julho. Estudos Morais.
A comuna de Koenigsfeld, mundo futuro em miniatura
Lê-se no Galneur de Colmar:
“A
comuna de Koenigsfeld, perto de Villingen, na Floresta Negra, que tem
cerca de 400 habitantes, forma um estado modelo em miniatura. Há
cinquenta anos, que é o tempo de existência dessa comuna, jamais
aconteceu que um só habitante tivesse tido envolvimento com a polícia;
jamais houve casos de delitos ou de crimes; durante cinquenta anos,
jamais houve hasta pública ou nasceu um filho natural. Jamais foi aberto
um processo nessa comuna. Também ali não há mendigos.”
Esta interessante notícia foi lida na Sociedade de Paris e deu lugar à seguinte comunicação espontânea:
“É
belo ver a virtude num centro restrito e pobre; ali todos se conhecem,
todos se veem; a caridade ali é simples e grande. Não é o mais
expressivo exemplo da solidariedade universal essa pequena comuna? Não
é, em miniatura, o que um dia será o resultado da verdadeira caridade,
quando esta for praticada por todos os homens? Tudo se resume nisto,
espíritas: a caridade, a tolerância. Entre vós, a não ser o socorro ao
infortúnio, que é exequível, as relações inteligentes, isentas de
inveja, de ciúme e de dureza, o são sempre.”
LAMENNAIS
(Médium: Sr. A. Didier)
Qual
a causa da maior parte dos males da Terra, senão o contacto incessante
dos homens maus e perversos? O egoísmo mata a benevolência, a
condescendência, a indulgência, o devotamento, a afeição desinteressada e
todas as qualidades que fazem o encanto e a segurança das relações
sociais. Numa sociedade de egoístas não há segurança para ninguém,
porque cada um, buscando apenas o próprio interesse, sacrifica sem
escrúpulos o do vizinho. Muitas pessoas se creem perfeitamente honestas
porque são incapazes de assassinar e de assaltar pelas estradas. Mas
será que aquele que, por cupidez e dureza, causa a ruína de um indivíduo
e o leva ao suicídio; que reduz toda uma família à miséria, ao
desespero, não é pior que um assassino e um ladrão? Ele assassina em
fogo lento, e porque a lei não o condena, porque os seus semelhantes
aplaudem a sua maneira de agir e a sua habilidade, julga-se isento de
censuras e caminha de cabeça erguida! Além disto, os homens sempre
desconfiam uns dos outros; sua vida é uma ansiedade perpétua; se não
temem a espada nem o veneno, estão às voltas com a astúcia, a inveja, o
ciúme, a calúnia, numa palavra, com o assassinato moral. Que seria
preciso para fazer cessar esse estado de coisas? Praticar a caridade.
Tudo se resume nisto, como diz Lamennais.
A
comunidade de Koenigsfeld nos oferece em miniatura o que será o mundo
quando for regenerado. O que é possível em pequena escala sê-lo-á em
grande escala? Duvidar seria negar o progresso. Dia virá em que os
homens, vencidos pelos males engendrados pelo egoísmo, compreenderão que
seguem o caminho errado, e Deus quer que eles encontrem o caminho à sua
custa, porque lhes deu o livre-arbítrio. O excesso do mal lhes fará
sentir a necessidade do bem, e eles se voltarão para este lado, como
para a única tábua de salvação. Quem os levará a isto? A fé séria no
futuro, e não a crença no nada após a morte; a confiança num Deus bom e
misericordioso, e não o medo dos suplícios eternos.
Tudo
está submetido à lei do progresso; os mundos também progridem
fisicamente e moralmente; mas, se a transformação da Humanidade deve
esperar o resultado da melhora individual; se nenhuma causa vier
apressar essa transformação, quantos séculos, quantos milhares de anos
serão ainda necessários? Tendo a Terra chegado a uma de suas fases
progressivas, basta que não seja mais permitido aos Espíritos atrasados
aqui encarnarem e que, na medida das extinções, Espíritos mais
adiantados venham tomar o lugar dos que partem, para que em uma ou duas
gerações o caráter geral da Humanidade seja mudado. Suponhamos, pois,
que em vez de Espíritos egoístas, a Humanidade seja, num dado tempo,
formada de Espíritos imbuídos de sentimentos de caridade. Em vez de
procurarem prejudicar-se, eles se ajudarão mutuamente. Viverão felizes e
em paz. Não mais ambição de povo a povo e, portanto, não mais guerras.
Não mais soberanos governando ao seu talante. A justiça em vez do
arbítrio, portanto, não mais revoluções. Não mais os fortes esmagando e
explorando o fraco. Equidade voluntária em todas as transações,
portanto, não mais querelas nem trapaças. Tal será o estado do mundo
depois de sua transformação. De um mundo de expiação e de provas, de um
lugar de exílio para os Espíritos imperfeitos, ele se tornará um mundo
feliz, um lugar de repouso para os bons Espíritos; de um mundo de
punição, passará a ser um mundo de recompensa.
A
comuna de Koenigsfeld incontestavelmente é composta de Espíritos
adiantados, ao menos moralmente, senão cientificamente, e que praticam
entre si a lei da caridade e do amor ao próximo. Esses Espíritos se
reúnem por simpatia nesse recanto abençoado da Terra, para aí viver em
paz, esperando que possam fazê-lo em toda a sua superfície. Suponhamos
que alguns Espíritos embusteiros, egoístas e malévolos aí venham
encarnar-se. Em breve semearão a perturbação e a confusão; ver-se-ão
reviverem, como alhures, as querelas, os processos, os delitos e os
crimes. Assim aconteceria com a Terra, após a sua transformação, se Deus
a abrisse ao acesso dos maus Espíritos. Progredindo a Terra, aí eles
estariam deslocados. É por isso que eles irão expiar seu endurecimento e
refazer sua educação moral em mundos menos adiantados.