Tiago, 1: 3 a 5
…pois sabeis que a vossa fé, bem
provada, leva à paciência; mas é preciso que a paciência produza uma
obra perfeita, a fim de serdes perfeitos e íntegros sem nenhuma
deficiência.
Este versículo traça o projeto de evolução desejado.
Àquele tempo ele falava para judeus convertidos ao Cristo. Ninguém mais
do que o povo judeu sabia o valor das provações. Este foi um povo que
sofreu; e os que tiveram a compreensão de Jesus como sendo o Messias que
libertava pela transformação moral, foram os que aproveitaram as
provações na edificação de sua fé. Assim, a expressão pois sabeis…, é bastante coerente no texto.
Nós temos aprendido isto também à custa de muitas dores. O Evangelho traz para nós a possibilidade de participar deste sabeis, minorando os nossos sofrimentos. Cabe a cada um de nós “não recalcitrar contra os aguilhões”.
Como dissemos, este versículo traz para nós o projeto de evolução
desejado. É que o Alto quer para nós a vitória espiritual, assim, nos
envia Espíritos, que como Tiago, pela instrução encurta-nos o caminho
evolutivo adiantando-nos o progresso.
A vossa fé, bem provada, leva à paciência; a fé já foi dito, é força que nasce com a própria alma, certeza instintiva na Sabedoria de Deus…1
Podemos dizer que a fé é a lembrança da presença de Deus em nós. Ela
existe em todas as criaturas, porém, é desperta através da evolução, e
cada um a tem num determinado grau de acordo com suas conquistas
individuais.
Do mesmo modo que o aluno matriculado em uma escola precisa se
exercitar para fixar a lição, precisa da prova para sua promoção, o
Espírito, que é um aluno da escola da vida, precisa exercitar a sua fé
para fazê-la crescer e esta precisa ser provada, e bem provada, para
projetar o Espírito em níveis mais elevados. Portanto, a fé bem provada
produz a paciência, que é conquista daqueles que já se elevaram a um
patamar de maior espiritualidade.
A paciência, que é a ciência da paz, ou ciência da pá (significando
instrumento de trabalho), já dissemos, é conquista do Espírito e é uma
conquista imprescindível para a evolução.
A vida vinculada a mundos materiais é um instrumento didático para
trazer ao Ser criado por Deus a verdadeira educação, que nada mais é do
que o despertamento de possibilidades espirituais nele existentes.
Contudo é preciso compreender que este processo é lento, é como o
cultivo de uma determinada semente. Ela é lançada ao solo e só após um
processo que demanda tempo e perseverante trabalho transforma-se em
fruto útil para alimentação do homem. O Educador é como o lavrador, e do
mesmo modo que para este a paciência é uma necessidade, também é para
aquele. E não esqueçamos, todos somos educadores, de outros Espíritos, e
principalmente de nós mesmos. Como consequência precisaremos sempre
deste valioso recurso: paciência; portanto, alegremo-nos ao sermos submetidos às múltiplas provações.
Todavia o apóstolo vai mais além, só ter paciência não basta, é preciso que ela produza uma obra perfeita. É que a paciência ainda é um meio, não o fim. Há grandes Espíritos que ainda não despertaram para o bem que
são já pacientes, e que também usam este recurso para atingirem os seus
fins. Toda virtude tem de ter produtividade no campo do bem, se, portanto, a luz que em ti há são trevas, quão grandes serão tais trevas!2 Ensinou Jesus.
Portanto, busquemos produzir uma obra perfeita, não com preciosismo ou
perfeccionismo, mas em tudo que fizermos, fazer bem feito, este tem que
ser o diferencial do cristão verdadeiro, e acima de tudo que a obra mais
importante que fazemos, que é a nossa própria iluminação, seja esta
também uma obra de perfeição. Este é o recado do final do versículo:
…a fim de serdes perfeitos e íntegros sem nenhuma deficiência.
Mensagem semelhante nos deixou Jesus no “Cantar do Monte”:
Sede vós, pois, perfeitos, como é perfeito o vosso Pai, que está nos céus.3
Ninguém pode no estágio atual de nossa evolução exigir de si mesmo a
perfeição, porém podemos exigir aperfeiçoamento, ser a cada dia melhor.
No mais a lição do Mestre é de grande sabedoria; ao nos instruir a ser perfeito como o vosso Pai, Jesus
se referia ao entendimento de cada um a respeito do Pai, portanto, é
cada um ser perfeito dentro de suas possibilidades, só que sem
comodismo. À medida que formos evoluindo, compreendendo melhor a
natureza divina, que nos façamos também melhor, sempre perfeitos, íntegros, conforme a perfeição de nosso Pai.
Tiago nos propõe uma melhoria continuada. Compreendamos as nossas
provações (que muitas vezes são tribulações), trabalhando a nossa fé,
assim geraremos a paciência que nos faz perseverar na construção do
homem de bem, a obra perfeita que o Criador espera que um dia sejamos, sem nenhuma deficiência.
Se alguém dentre vós tem falta de sabedoria, peça-a a Deus, que a concede generosamente a todos, sem recriminações…
O autor desta carta sabia que mesmo entre os irmãos de fé muitos não
tinham esta compreensão superior. Esta primeira frase deste versículo
talvez seja um chamamento de atenção para estes.
Sabedoria aqui não significa capacidade intelectual, há muitos
sábios no mundo que são verdadeiros mendigos na espiritualidade. Aliás,
já neste tempo Paulo afirmara:
Onde está o sábio?
Onde está o escriba? Onde está o inquiridor deste século? Porventura,
não tornou Deus louca a sabedoria deste mundo?4
Portanto, sabedoria significa amadurecimento espiritual, ter ciência de algo invisível aos olhos.
A literatura judaica anterior ao Novo Testamento já dizia:
Pois é IHVH quem dá a sabedoria; de sua boca procedem o conhecimento e o entendimento.5
E Salomão com toda a sua sensibilidade escreve sobre a sabedoria:
Ao me dar conta de
que somente a ganharia, se Deus me concedesse – e já era um sinal de
entendimento saber a origem desta graça -, dirigi-me ao Senhor e rezei,
dizendo de todo o coração:
Deus dos pais,
Senhor de misericórdia, que tudo criaste com tua palavra e com tua
sabedoria formaste o homem para dominar as criaturas que fizeste,
governar o mundo com justiça e santidade e exercer o julgamento com
retidão de vida, dá-me a sabedoria contigo entronizada e não me excluas
do número de teus filhos.6
Portanto era uma crença dos sábios judeus que a sabedoria autêntica era
dada somente por Deus, significando assim algo espiritual, além do
domínio da matéria. Por isso é que Tiago escreve: peça-a a Deus, que a concede generosamente a todos…
Generosamente significando sem condicionantes, a todos os que quiserem, simplesmente se ajustando aos Seus Sábios desígnios.
Porém, aqui cabe uma questão: Como Deus dá a sabedoria? Não somos nós quem a conquistamos?
Sim, somos nós quem a conquistamos, porém, só se tivermos a humildade
de saber que ela vem de Deus através das oportunidades de vida, das
experiências que promovem o amadurecimento, experiências estas que podem
significar tribulações para despertar em nós os valores do espírito.
São as vidas sucessivas, a reencarnação promovendo a oportunidade de
reajuste e a glória de melhor servir.
Assim, se tivermos falta de sabedoria, peçamos a Deus como fez Salomão, e Ele dará, nos informa o filho de Alfeu, generosamente.
Ainda vai mais além o apóstolo, Deus a concede, sem recriminações.
A teologia cristã após ter se tornado religião oficial impôs às nossas
mentes a questão do pecado, da culpa, e consequentemente do castigo.
Assim, apesar de Jesus ter nos mostrado um Pai que é Amor e
Misericórdia, insistimos no nosso entendimento de um Deus que pune, que
condena, que recrimina. Esta não era a idéia daqueles que estiveram
próximos de Jesus.
A Doutrina Espírita ao ampliar nossa compreensão de Deus nos mostra que
Ele nem perdoa nem condena, Deus simplesmente dá a oportunidade de
reconstruirmos o que foi destruído. Assim, tudo nos provê generosamente, concedendo-nos a oportunidade de nos fazermos sábios, sem recriminações. Apenas,
por ampliar a nossa consciência, pois a evolução é o despertamento
desta, nos faz mais responsáveis à medida que nos entendemos como
partícipes da criação imortal.
1 Pensamento e Vida, cap. 6
2 Mateus, 6: 23
3 Mateus, 5: 48
4 1 Coríntios, 1: 20
5 Provérbios, 2: 6
6 Sabedoria, 8: 21 e 9: 1 a 4