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terça-feira, 9 de julho de 2013

Muitas vidas de Herminio Miranda


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Muitas vidas de Herminio Miranda

Aos olhos estreitos do mundo, a biografia de Herminio Miranda não daria o menor trabalho. Poderia ser resumida neste parágrafo. Filho de portugueses, nasceu em 5 de janeiro de 1920, em Volta Redonda, RJ. Depois de formar-se contador, trabalhou 38 anos na Companhia Siderúrgica Nacional, CSN, até se aposentar. Escritor espírita nas horas vagas, publicou mais de 30 livros, que já passaram de um milhão de exemplares vendidos.

Todavia, para os espíritas, sua biografia não tem nada de pequena. É milenar e se estende por muitas existências. Todas as vidas de Herminio estão sutilmente relatadas na sua obra.

Durante quatro décadas, Herminio participou de grupos mediúnicos pequenos, mas de grande qualidade. Essa foi sua luneta, com a qual examinou, questionou e depois relatou a vida dos Espíritos; seus hábitos, caminhos de sofrimento, descobertas, arrependimentos e alegrias. Suas histórias estão contadas em Diálogo com as Sombras, a série Histórias que os Espíritos Contaram, e tantos outros. Um guia interessante, seguro e prático de suas experiências é Diversidade de Carismas. Ideal para grupos de estudos da mediunidade.

Outro instrumento de pesquisa utilizado por Herminio é o sonambulismo provocado. Herminio, talvez o mais importante e legítimo magnetizador de nosso tempo, aprendeu pelos livros de Albert de Rochas como, por meio de seu princípio vital, conduzir o magnetizado ao estado sonambúlico – descoberto por Mesmer no Magnetismo Animal, ciência irmã do Espiritismo. Allan Kardec conhecia esse fenômeno muito bem, pois estudou o sonambulismo por 35 anos. O livro dos Espíritos tem todo um capítulo sobre o assunto.

Herminio percorreu os arquivos psíquicos de seus magnetizados, e depois relatou os casos e conclusões em suas obras. A mais impressionante experiência foi Eu sou Camille Desmoulins. O autor despertou a lucidez sonambúlica de Luciano dos Anjos e descobriu uma vida anterior de Luciano na França, como o mordaz e ousado jornalista Camille Desmoulins, um dos artífices da Revolução Francesa.

A habilidade de Herminio, em libertar-se do tempo linear e percorrer os arquivos da alma, deu-lhe uma hábil intuição. Como num quebra-cabeça, ele deixou pistas registradas em seus escritos. Um leitor cuidadoso pode pinçar facilmente de seus livros o roteiro das vidas passadas. A obra de Herminio Miranda é uma imensa autobiografia. Os fatos históricos pesquisados por ele relatam sua própria trajetória espiritual, junto ao grupo de Espíritos que lutou pela verdade e liberdade contidas nos ensinamentos do Cristo. Sua dedicação à pesquisa da reencarnação, mediunidade e aos conceitos doutrinários foi laboriosamente construída em diversas vidas.

Cristianismo a mensagem esquecida.

Tudo começou centenas de anos antes de Cristo. Uma de suas sonâmbulas identificou Herminio como sacerdote no Egito. Naquele tempo, uma posição que significa conhecer os mistérios da mediunidade, do magnetismo animal, da cura psíquica e da filosofia sagrada. Mas, seguindo as regras de seu povo, esse conhecimento era mantido apenas aos privilegiados de uma pequena casta. O povo subjugado ficava escravizado pela ignorância. Como esclareceu Emmanuel em A Caminho da Luz os sábios egípcios vieram de outros planetas. Certamente, essa não foi a primeira encarnação de Herminio. Para ter esse conhecimento, no inicio da civilização, veio de outros orbes, com tantos outros, para auxiliar a humanidade, ainda criança.

Passaram-se alguns séculos, o antigo sacerdote despertou com o exemplo de Jesus. 

A doutrina secreta é para todos. 
Vem daí sua admiração pelo mestre. E seu caminho de libertação. Durante o período do Cristianismo Primitivo, a vida cotidiana de Herminio já estava impregnada pelos ensinamentos de Jesus. “Tenho a impressão de haver vivido lá, naquela época”, talvez entre os gnósticos, afirmou o autor em As Duas Faces da Vida. Os primeiros escritos cristãos ficaram perdidos nos pergaminhos destruídos pelo tempo, e, por outro lado, sobreviveram na escrita indelével do registro mental daqueles que vivenciaram os acontecimentos. Essa história – que investigou por sua própria regressão – Herminio ficou nos devendo. Ele não terminou a investigação.
Os detratores do Cristo começaram a combater e deturpar a mensagem da Boa Nova. Foi então que o antigo sacerdote egípcio uniu-se a outros trabalhadores. Pôs sua pena a serviço da resistência consciente diante da luta sangrenta contra a mensagem libertadora. Isso ocorreu na época dos Cátaros (Idade Média). “Não há dúvida de que o catarismo foi um dos mais convincentes precursores do Espiritismo. (...) Seu propósito era o de um retorno à pureza original do Cristianismo”, contou Herminio, em As Duas Faces da Vida.

O caminho, a verdade e a vida
Tempos depois, quando a falsa interpretação tomou as rédeas da Igreja na Idade média, ressurgiu Herminio ao lado de Lutero, na figura de Melanchton, auxiliando a corajosa Reforma Protestante. Redigiu então a confissão de Augsburgo, ponto de referência da separação entre católicos e protestantes. Ao concluir esse texto, assinado pelos príncipes germânicos, Melanchton definiu a firme resolução de restaurar a doutrina cristã: “Pedro proíbe que os bispos dominem e coajam as igrejas. Pede-se apenas o seguinte: que permitam seja o Evangelho ensinado de maneira pura. Se não fizerem isso, então vejam lá eles mesmos como responderão perante Deus pelo fato de com essas teimosias darem causa a cisma”, escreveu na Confissão.
Mas essa tarefa restauradora, anunciada por Jesus como a vinda do Consolador Prometido, cabia a Allan Kardec. Herminio estava lá. E nesse tempo viveu um papel anônimo, como inglês, pai do poeta Robert Browning. Nessa encarnação, Herminio passou seus últimos anos de vida em Paris e desencarnou em 1866. Dialogou com o Codificador, propôs algumas questões. Estava realizando a tarefa de compreender as explicações científicas e filosóficas esclarecedoras da Doutrina Espírita, para continuar sua missão.

Em 1920, atravessou o oceano, finalmente nasceu no Brasil, pátria atual da Doutrina Espírita –que anda esquecida na sua terra natal, França. A primeira geração de pesquisadores, Albert de Rochas, Crookes, Wallace, tiveram a preocupação de provar ao mundo a existência do espírito. Herminio não. Toma os postulados espíritas como lei natural. O Espiritismo segue o caminho do conhecimento humano, sua doutrina se confunde com a vida, e dela brota a verdade. Eis aí ressurgida a palavra original do Cristo: caminho, verdade e vida.
Sua obra se explica pelas palavras de Platão: “Aprender é recordar”. É o que fez Herminio nos últimos 50 anos. Lembrou os estudos, pesquisas e fatos vividos em sua história multimilenar. O antigo sacerdote do Egito rendeu-se à liberdade de consciência. De detentor do conhecimento passou a divulgar a Doutrina. Trocou o poder pela educação. Não estamos aqui idolatrando ou endeusando Herminio. Ele não se destaca de todos nós. É apenas um escriba fiel e consciente, de ontem, hoje e amanhã.

As Duas Faces da Vida, sua mais recente produção, é um livro que reúne textos, conferências e entrevistas recolhidos nos arquivos minuciosos do autor. É uma amostra, em parte inédita, de sua trajetória literária. Aos leitores que já o conhecem, a obra acrescenta novas histórias e conceitos, em seu estilo inconfundível. Ao novo leitor, é uma apresentação atual que certamente o encaminhará para as outras obras de seu acervo.

FONTE: Revista Universo Espírita nº 19, encarte Universo Literário nº 2

Entrevista com Herminio Miranda - Parte 2

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O herege
Herminio Miranda retorna a estas páginas para falar de sua produção literária e acabamos descobrindo que seus livros mostram a história do cristianismo e também a das diversas vidas do escritor

Quase um ano depois da primeira entrevista com Herminio C. Miranda finalmente você vai ler um pouco mais sobre os conhecimentos deste que é considerado um dos mais importantes escritores e pesquisadores do Espiritismo. Daquela primeira vez, na Universo Espírita 34, exploramos o tema obsessão. Só para lembrar, Herminio foi doutrinador em reunião de desobsessão por 28 anos. As histórias que relatou são impressionantes, fantásticas e reais. O que ficou marcado, pelo menos para esta leitora interativa aqui, foi a frase do Espírito Emmanuel que Herminio destacou: “O ódio é o amor que enlouqueceu”. Bonito, não é? Herminio gosta mesmo de falar em amor – como você poderá conferir nas respostas dele –, e ele é uma pessoa amorosa. Ao transcrever outros trechos da entrevista, todo aquele dia foi revivido. Foi uma tarde agradável; feliz. Apesar do medo que senti em entrevistar aquele espírito tão antigo, nosso diálogo não se caracterizou como um trabalho para mim, mas sim como uma conversa. Herminio é bem-humorado, educado, gentil. Na primeira vez foi difícil para mim escolher apenas partes de tudo o que falamos. Minha vontade era conciliar as páginas disponíveis com todo aquele conhecimento. Não deu. Então, separei por assunto, e, se naquela ocasião foi o amor que enlouqueceu, nesta eu queria enfocar sua produção literária; porém, conforme eu transcrevia nossas falas descobri algo maravilhoso: apesar de termos começado falando dos livros, acabamos por enveredar para a história do Cristianismo, desde o antigo Egito. Surpreso? Não, não há nenhum equívoco em minha afirmação. E você descobrir o por quê nas linhas abaixo. Essa mudança de rumo foi natural. Diversos livros do Herminio enfocam diferentes épocas do Cristianismo, e você pode se sentir privilegiado, pois aqui há uma síntese de tudo que Herminio descobriu na jornada desta vida dele; mas claro que com pinceladas de todas as suas existências. Agora, é só seguir o caminho das letras.

O sr. escreveu um livro que é considerado um guia da prática mediúnica, Diversidade de Carismas, o que é mediunidade Herminio?
Ah! Se eu soubesse, eu diria (rs). A definição é simples, é a que está em O Livro dos Espíritos: “O médium é o intermediário entre um mundo e outro, entre uma face da vida e outra, entre uma dimensão e outra”. Agora, há uma variedade tão grande de recursos mediúnicos... Em Diversidade de Carismas fiz uma tentativa de dizer o que eu entendia, mais ou menos, sobre mediunidade, quando me pediram esse livro – foram até as entidades mesmo que me pediram – eu disse: “Mas o que é que vou falar sobre mediunidade, já está tudo falado...” Mas aí comecei a estudar e vi que ainda tinha muita coisa para dizer. Não tenho a pretensão de afirmar que esgotei o assunto, de forma alguma. Ainda tem muita coisa que aprender sobre mediunidade. O caso do Luciano dos Anjos [protagonista de Eu sou Camille Desmoulins], por exemplo, nele é uma faculdade animista, é o espírito dele dizendo o que está acontecendo, o que viu no passado. Mediunidade é tão difícil de definir quanto o tempo. Até hoje não sei defini-lo e não tenho a pretensão de fazê-lo tão cedo. Acho que só quando eu estiver fora dele é que vou entendê-lo.
Nossos Filhos são Espíritos é um dos livros mais vendidos da literatura espírita, chegando a mais de 250 mil exemplares. Ao quê o sr. credita esse sucesso?
Faço todos os meus livros com muita emoção. Envolvo-me demais naquela atmosfera. Uma vez conheci o Érico Veríssimo lá nos Estados Unidos e disse-lhe que o meu preferido dele era o Olhai os Lírios do Campo, uma obra lírica, muito bonita, eu lhe disse que esse livro tinha carga emocional muito grande e ele confirmou minha afirmação. Então, acho que isso se aplica no meu caso, ao Nosso Filhos São Espíritos. Coloquei nele todo o meu coração e não procurei me dirigir aos espíritas especificamente; sempre achei, desde que comecei a escrever, que nós, do meio espírita, tínhamos que escrever também visando o público não espírita. Porque o não espírita não pega para ler O Livro dos Médiuns, dos Espíritos, de Emmanuel; raramente lê os de André Luiz, e quando o faz é como romance e não como obra didática que é. Então, chegou a um ponto em que eu tinha de dizer as coisas, a minha experiência pessoal, como se eu tivesse conversando, contando as emoções do nascimento de minha primeira filha, se aparecerem fenômenos mediúnicos na criança como ela deve ser tratada, etc. Então, uma pessoa que não pega um livro espírita para ler, pega Nosso Filhos São Espíritos; Autismo também. Um livro com este tema interessa a muita gente que não é espírita. Claro que há uma visão espírita e não faço segredo disso. “Você não acredita? Tudo bem”. Não é nem problema de fé. Reencarnação não é uma questão de você acreditar ou não, é a Lei. Tanto faz. Você já reencarnou e ainda vai reencarnar.
As quais conclusões chegou após pesquisar sobre o autismo?
O autismo é um problema muito interessante. Muito curioso. Às vezes, uma pequena frase que você lê num livro lhe desperta um mundo interior de coisas. Eu estava lendo um livro que a médica, uma psicóloga de vanguarda que começou a fazer experiência de regressão com muita competência, disse que o autismo era uma rejeição à reencarnação. Essa frase acendeu uma luzinha na minha cabeça. Se é uma rejeição da reencarnação, isso faz sentido, por que a pessoa se reencarna e não quer participar, interagir com ninguém. O autismo é uma síndrome extramente complexa e muito difícil de entender se não se levar em conta o mundo espiritual. Por que crianças sadias, perfeitas, lindas, não interagem? Geralmente ocorre tudo bem até os dois, três, primeiros anos e, de repente, ela para de falar e começa a se isolar; é um drama terrível. Aí comecei a comprar livros; queria saber. Só depois de muita leitura, muita meditação, decidi escrever. Autismo é um livro muito lido fora do meio espírita. Acho que o autista não é uma pessoa perturbada, nem um doente mental, é apenas uma pessoa que tem um conflito qualquer, precisa ser entendida como ela é. Você não pode arrastá-la para o seu mundo. Afinal, o que é ser normal? Para o autista o normal é aquilo. No livro procurei dar essa visão de que a criança está diferente porque ela tem uma outra visão da vida e precisa ser respeitada. A nossa “normalidade” é a única possível? De jeito nenhum.
Houve algum livro que lhe deu maior prazer na execução de sua tradução?
A História Triste [no prelo]. É um livro raríssimo, discutidíssimo, esquisitíssimo. Foi psicografado por uma médium americana e a entidade que se apresentou a ela se dizia uma mulher nascida na Inglaterra que migrou para os Estados Unidos no século 17. Este livro tem uma linguagem impressionante, antiga, arcaica, com estilo similar época de Shakespeare. Deu um trabalho... Mas em todo caso, foi um livro que traduzi com prazer. Quando ele foi lançado, o fenômeno interessou a jornalistas, pensadores, cientistas, filósofos. A jovem senhora, casada, que escreveu, não tinha a mínima condição para fazê-lo. A história se passa na Palestina, do dia em que Cristo nasceu até quando ele foi crucificado. O original tem 640 páginas. Levei dois anos trabalhando nele. O Espírito viveu lá. Conhece a história, a geografia, a política, a religião, o costume daqueles povos. Sabe de tudo. Tem um respeito e uma admiração incrível pelo Cristo. Ele teria sido uma escrava levada da Grécia pelos romanos, e César a deu de presente ao Tibérius – futuro imperador. Ela era uma mulher lindíssima, mas engravidou. Tibérius não queria complicação, pois já sabia que iria suceder Augusto no trono, então pediu que seus soldados sumissem com ela no mundo. E ela saiu pelo mundo afora e acabou na Palestina. Seu filho nasceu nas proximidades de Belém na mesma noite em que nasceu Jesus. O filho dela é terrível, se transformou num criminoso. Então, dá-se o contraste entre o Cristo, a luz, e ele, a sombra. Ela conta coisas inacreditáveis da época. Uma história muito bonita que despertou o grande interesse pela competência literária, mas o povo não estava preparado para aceitar a história fantástica que tinha por trás daquilo tudo. Esse livro me causou muita emoção. Envolveu-me muito com aqueles tempos também.
Você escreveu um livro sobre os “hereges” cátaros. O que foi o Catarismo?
Foi o Espiritismo do século 13. Era uma doutrina que tentava recuperar o Cristianismo primitivo. Eles tinham uma filosofia muito bonita. Era o Espiritismo puro. Foi uma pena o Cristianismo ter perdido aquela oportunidade de se refazer.
Qual foi a fonte que eles utilizaram para recuperar os verdadeiros ensinamentos de Jesus?
Eles vieram programados para isso. O Cristianismo começou a se desviar do que o Cristo pregou logo no principio, no fim do 1º século, quando começaram a inventar dogmas. A Dra. Elaine Pagels, que escreveu um livro sobre os Evangelhos Gnósticos, diz que o Cristianismo começou a mudar – e estou de acordo com ela – quando optou pelo poder terreno. Eles queriam o Cristianismo quantitativo e não qualitativo – uma expressão genial dela –, pois assim eles queriam uma Igreja que arrebanhasse gente e aí se inventou um monte de coisa, que Cristo era Deus, o Natal para comemorar o nascimento... Cristo não nasceu no dia 25 de dezembro, isso foi uma adaptação da Igreja para que conseguisse arrebanhar aqueles que comemoravam as festas pagãs. Cristo não fundou uma Igreja. Lamento dizer essas coisas, mas já fui herege tantas vezes que mais uma não tem diferença. Ele pregou uma doutrina de comportamento: como é que você deve se portar perante a vida, o seu semelhante, perante Deus, perante você mesmo. Cristo nunca pregou ritual nenhum; ao contrário, ritual por ritual, fizesse o que faziam os judeus da época. Ele não queria convencer ninguém a ser cristão. Ele não era cristão. O Cristianismo foi uma coisa posterior, a questão dos santos, por exemplo, veio para substituir os deuses do politeísmo. Bom, realmente a Igreja teve um grande sucesso na parte de quantidade, já na de qualidade subverteu. Então, entre o 3º e 4º séculos surgiu o gnosticismo, que, na verdade, não surgiu, ressurgiu.
O que é o gnosticismo?
Ele ensina ideias, que são coisas religiosas, como reencarnação, imortalidade, preexistência, comunicabilidade dos Espíritos. Essas ideias precisam fazer parte de qualquer religião que se preze. Não se pode ter religião fora disso, pois como dá para entender um Deus injusto que cria pessoas saudáveis e outras não? Como dizia Santo Agostinho, ou Ele não sabia o que estava fazendo ou então Ele é muito mal. Criar um sujeito para ir para o inferno?! Essas são as coisas que questiono. Estes conceitos fundamentais – reencarnação, imortalidade, etc. – aparecem, em primeiro lugar, em Jesus. Em segundo lugar, nos gnósticos, que não era uma religião, mas uma filosofia. A palavra gnosticismo quer dizer conhecimento, uma busca do conhecimento, não importa se religioso ou não. Os neoplatônicos [corrente filosófica do 3º século] também lidavam com essas ideias. O gnosticismo passou a ser, no tempo dos neoplatônicos um tipo de filosofia. Oferece a salvação pelo conhecimento, pelo progresso espiritual, pela ampliação da observação que dá para se fazer sobre o mundo. Nesse sentido, os gnósticos tentaram reverter o Cristianismo, e foram excluídos sumariamente. Mas não foi com violência. Os gnósticos não se juntaram à Igreja, eles pegaram de Jesus aquilo que fazia sentido para eles: as vidas sucessivas, a comunicação dos Espíritos, essas coisas. Falhou o gnosticismo.
Foi uma tentativa de resgatar os verdadeiros ensinamentos de Jesus, né? Neste sentido vieram outras tentativas posteriores?
No século 7, conforme conta Emmanuel, Maomé veio para cá com o projeto de recomeçar todo o Cristianismo. Nasceu numa tribo que não tinha muita ligação com o mundo, tudo para recomeçar a pregação de Jesus. Segundo diz Emmanuel, Maomé se desviou dessa missão. Então veio o Islamismo, que é uma religião muito respeitável. Eu não tenho nenhuma restrição, absolutamente. Essa foi uma outra alternativa. Veio, então, o catarismo. Começou no ano 1000. Tenho um palpite que começou como programação para encontrar qual a melhor maneira de apresentar aquela filosofia dos gnósticos sem combater as religiões institucionalizadas. Enfim, os mesmos conceitos sempre ressurgem. Por causa de alguma perseguição metem eles debaixo da terra, daqui a pouco eles aparecem lá na frente.
Após o catarismo veio a Reforma. Ela também foi uma tentativa para a retomada do verdadeiro Cristianismo?
Sim, e isso quem diz é o próprio Emmanuel. No livro A Caminho da Luz ele conta que o mundo espiritual estava muito preocupado em ver como o Cristianismo estava mal interpretado e que isso precisava mudar. Então, ele cita uma turma que veio para cá para esse recomeço: Lutero, Calvino, entre outros. Para recomeçar, pelo Evangelho do Cristo. Era preciso voltar àqueles tempos e recomeçar. Mas não deu certo de novo. Lutero pregou suas teses na porta da Igreja. Ele era sensacional e tinha todos os recursos. Inclusive, achei que ele era a encarnação de Paulo. Não quero convencer o leitor; mas são tantas coincidências (digo que coincidência é um dos pseudônimos de Deus, quando Ele não quer assinar). Lutero veio com esse propósito, mas depois acabou se envolvendo em outras coisas... A Reforma não foi suficientemente reformista. Também começaram a se separar em seitas; uns acreditavam numa coisa, outros noutra. Ficaram ainda lidando com o problema da fé; mas não mudaram nada na substância do Cristianismo, foi muito pouco. E hoje ainda estamos vemos isso aí, né? O Cristianismo cada vez mais perdido.
Depois veio o Espiritismo?
Aí, desta vez, foi planejado tudo de maneira diferente. O próprio Jesus foi a liderança principal do movimento. Tinha de ser. Muita gente ainda tem dúvida se o Espírito de Verdade é o próprio Cristo. É. Aquela comunicação do Espírito de Verdade a Kardec: “Espíritas, amai-vos (...). Instruí-vos (...)”, figura em O Livro dos Médiuns assinada por Jesus e aparece também em O Evangelho Segundo o Espiritismo, com ligeiras modificações de redação, assinada como Jesus. Então o próprio Cristo resolveu retomar o assunto. Ele disse que estaria à disposição do Kardec durante 15 minutos, se não me engano, por semana, para responder as dúvidas dele. Revelou a Kardec, mas Kardec mesmo não disse, pois lhe respeitou o desejo, que queria mesmo ficar como Espírito de Verdade.
Da mesma forma que planejou movimentos para o resgate do verdadeiro Cristianismo, como o sr. acha que a espiritualidade está fazendo isso atualmente?
Em todos os tempos a espiritualidade passa o recado para nós. A visão de Fátima, por exemplo, foi uma coisa dramática, não tem como negar; assim como a de Guadalupe. É a espiritualidade chamando nossa atenção. Recentemente me perguntaram se eu acreditava numa reunião entre as diversas crenças, eu disse que não, pois é uma guerra de poder e todas precisariam ceder um pouco; deixar de ser o que são, enfim. Criar uma concepção nova. E é ela que o Espiritismo vem trazer. Mas não é uma peculiaridade do Espiritismo, existe e vem há milhares e milhares de anos. São conceitos que os sacerdotes egípcios sabiam de cor e salteado, pois a religião egípcia tinha sua parte iniciática e tinha a versão popular, simbólica, que tinha sua razão de ser, mas não era a religião dos grandes sacerdotes. Era a mensagem do Cristo, que é a mesma de sempre. E ele, aliás, deve estar por trás disso tudo, pois Jesus ficou incumbido de dirigir o nosso planeta, desde a criação, conforme nos contam entidades respeitáveis.
Na sua próxima encarnação o que gostaria de encontrar de diferente neste mundo?
O amor. Com “A” bem grande. Estamos disputando espaços, gente que só quer ganhar dinheiro, só quer ocupar posições de comando. O poder é uma coisa perigosíssima. Acho provações mais difíceis o poder, a riqueza, a beleza física, a inteligência... Falta o componente da afetividade, do bom relacionamento com o mundo. O planeta está sendo demolido, destruído, isso é a falta de uma visão amorosa das coisas: dos seres e do ambiente em que vivemos. A grande mensagem do Cristo é esta. E Pedro foi muito feliz em dizer que “o Amor cobre uma multidão de pedaços”.
Como você vê os caminhos do Espiritismo hoje?
Acho que ele corre dois riscos: o de ser deturpado e o de ficar engessado. Acho um pouco exagerada a fixação dos divulgadores espíritas de conversarem apenas entre si. Os grandes filósofos do passado foram grandes comunicadores, falavam para todos e todos entendiam. Com todo respeito, se você pega o livro de um filósofo contemporâneo, não dá para entender nada; parece que escrevem uns para os outros! Acho que essa espécie de síndrome prevalece em alguns setores espíritas. Não precisa se preocupar com a doutrina espírita, se ela falhar agora – e por nossa causa – ela volta depois. Um Espírito disse a Kardec que o Espiritismo será “com os homens, sem os homens ou a despeito dos homens”. Mesmo que o rejeitemos ele vai renascer em outro lugar. Não é o movimento espírita são os conceitos fundamentais do Espiritismo que vem de milhares de anos.


BOX 1: Herminio C. Miranda
Herminio Correa Miranda nasceu no dia 5 de janeiro de 1920, em Volta Redonda - RJ. Formou-se em Ciências Contábeis e trabalhou na Companhia Siderúrgica Nacional até se aposentar. Nesse período morou, a trabalho, em Nova York, EUA, onde aprimorou seu inglês e tornou-se um exímio tradutor dessa língua. Conheceu o Espiritismo por intermédio de um amigo que o indicou a leitura dos livros da Codificação. “A surpresa começou com O Livro dos Espíritos. Inexplicavelmente, eu tinha a impressão de haver lido aquele livro antes. Mas onde, quando? Antecipava na mente o conteúdo de inúmeras respostas”, disse ele em uma entrevista à Folha Espírita. Seu primeiro livro, Diálogo com as Sombras, foi publicado em 1976. Depois vieram cerca de 40 obras, que contabilizam mais de um milhão de exemplares vendidos. A maioria se tornou best-seller e seus direitos autorais foram cedidos a instituições como FEB, Lar Emmanuel, O Caminho da Redenção, entre outras – ele mesmo possui uma assistência social numa favela no Rio de Janeiro. Herminio é um respeitado pesquisador, escritor, tradutor e homem de bem, não só no meio espírita como fora dele. Seu livro mais recente é Negritude e Genialidade, publicado pela editora Lachâtre. (Redação)

BOX 2: Algumas vidas de Herminio
Todas as vidas de Herminio estão sutilmente relatadas em seus escritos. Os fatos históricos pesquisados por ele relatam sua própria trajetória espiritual. Tudo começou centenas de anos antes de Jesus. Uma sonâmbula identificou Herminio como sacerdote no Egito. Passaram-se alguns séculos, e a doutrina que fora secreta no Egito agora é explicada para todos. Os detratores do Cristo começaram a combater e deturpar a mensagem de Jesus e foi então que o antigo egípcio pôs sua pena a serviço da resistência consciente, diante da luta contra a mensagem libertadora. Isso ocorreu na época dos movimentos heréticos, como os Cátaros. Tempos depois, quando a falsa interpretação tomou as rédeas da Igreja na Idade Média ressurgiu Herminio ao lado de Lutero. Era Melanchthon, auxiliando a corajosa Reforma Protestante. Considerado apóstolo por Pedro, Barnabé é citado em As Marcas do Cristo. A epístola de Barnabé, considerada apócrifa pela Igreja, tem o mesmo propósito e lógica da Confissão de Augsburgo, escrita séculos depois por Melanchthon. Barnabé era o auxiliar anônimo de Paulo. E exerceu a mesma função como Melanchthon – ainda auxiliar de Paulo, que renasceu como Lutero. O mesmo espírito, de tempos em tempos, restaurando o verdadeiro sentido da Doutrina, mas permanecendo no anonimato. Não é essa a personalidade atual de Herminio? Herminio estava também no surgimento da Doutrina Espírita, como pai do poeta Robert Browning. Como este inglês, Herminio passou seus últimos anos em Paris, dialogou com o Codificador, propôs algumas questões. Em 1920, atravessou o oceano e nasceu no Brasil. De detentor do conhecimento, o antigo sacerdote egípcio passou a divulgar a Doutrina. Herminio, um escriba fiel e consciente, de ontem, hoje e amanhã. (Redação)


FONTE: Revista Universo Espírita nº 42

Entrevista com Herminio Miranda - Parte 1

Entrevista com Herminio Miranda - Parte 1 PDF Imprimir E-mail
O conhecimento de um gigante

Nesta primeira parte da entrevista com o escritor Herminio C. Miranda ele fala sobre as experiências que teve em seu grupo mediúnico, histórias de amor, ódio, e obsessão

Falar sobre Herminio C. Miranda é fácil, o difícil foi encará-lo numa entrevista. Posso explicar. Herminio é um espírito antigo. Já está na Terra há mais de 10 mil anos, como você pode checar na biografia publicada no Universo Literário número 2. Imagine conversar com alguém que juntou conhecimentos por esses milênios todos... Foi tarefa árdua. A começar pela elaboração das perguntas. Que pontos eu iria abordar? Decidi ir pela trilha de suas próprias palavras, seu livros. Afinal são eles que contêm suas histórias, que condensam seus conhecimentos, que apontam, mesmo que sutilmente, suas vidas... Herminio já escreveu mais de 30 livros que juntos já ultrapassaram a barreira de 1 milhão de exemplares vendidos. Os assuntos foram os mais diversos, obsessão, cristianismo primitivo, heresias católicas, regressão, o tempo, a mente, histórias de Espíritos, autismo, realidade espiritual, reencarnação, Egito, morte, mediunidade, e por r aí vai. Então peguei esse caminho. Foram mais de 4 horas de entrevista, pessoalmente! Herminio é um senhor já. São 85 anos nesta vida. Começou a escrever tarde, tinha 38 quando ousou enviar um artigo para O Reformador, a revista da Federação Espírita Brasileira. O texto foi publicado e a partir dali colaborou assiduamente com o periódico. Seu primeiro livro, Diálogo com as Sobras surgiu em 1975, de lá para cá são dezenas... Herminio é um escritor espírita temporão. Ele conta que só quando se aposentou, pela Companhia Siderúrgica Nacional, pode realmente se dedicar à escrita e à leitura, verdadeira paixão em sua vida. Herminio lê e escreve em muitas línguas; essa capacidade deu-lhe a chave de muitas portas. “Cada língua que você aprende abre-se, para si, um novo mundo. Você começa a pesquisar uma obra e ela vem com uma bibliografia. Vai numa delas e é outro mundo que se abre”, afirma. A produção literária de Herminio é ativa ainda. Ele não esgotou sua curiosidade, muito menos deixou secar a fonte na qual transmite o que descobriu a nós, leitores. Herminio está produzindo de dois livros. Mas é segredo... Herminio sempre foi reservado. Deu poucas entrevistas, não participou de polêmicas espíritas, não foi ativo no movimento. Para você ter uma ideia, foi quase um ano de negociação para conseguirmos a entrevista com ele. Quando, finalmente, aceitou, foi quase um mês de pesquisa, e, confesso, de medo – claro – para eu fazer as perguntas. Mas consegui. Com coragem, conversei com esse espírito milenar. É... Ele transmite isso, não tenha nenhuma dúvida, o homem é um gigante. Abaixo você vai ler a primeira parte de nosso diálogo na qual Herminio vai fala sobre desobsessão. Decidi separar por temas, assim você não vai perder nada da fonte onde só brota uma coisa: sabedoria.

Como o Senhor conheceu o Espiritismo?
Minha formação foi católica. Minha mãe foi educada em colégio de freiras – era uma pessoa muito inteligente, escrevia muito bem, tinha uma cultura bastante razoável – éramos em 10 irmãos, eu fui o primeiro, e ela nos criou no catolicismo. A rigor eu seria um católico genético (rs). Ela, que vivia dentro do contexto dos dogmas, dizia que enquanto estivéssemos sob a responsabilidade dela seríamos católicos, depois cada um seguiria o seu rumo. Fui muito bem até determinado ponto, mas observando as coisas comecei a questionar, e minha mãe dava as explicações dela – era uma pessoa muito sensata; não era carola, mas era uma mulher convictamente religiosa. A principal mensagem dela foi o respeito e a admiração pelo Cristo, pelo Evangelho, e isso era o que mais me interessava. Lá pelos 16, 17 anos, comecei a ler; aí, não deu mais. Passei um tempo meio perdido porque comecei a ler filosofia, Shakespeare, Schopenhauer – que gostava muito apesar de ser pessimista e machista, mas era sujeito genial, tinha ideias incríveis, noções sobre reencarnação; por exemplo, se perguntassem a ele a diferença entre o ocidente e o oriente ele dizia: “É que no ocidente as pessoas dizem que se vive uma vez só”. Li mais coisas e comecei a distinguir Jesus do Cristo. Esse Cristo teológico não bate com o Jesus; é como diz o historiador inglês H.G. Wells: “A presença do homem na história é inegável. Ele realmente existiu, ensinou aquelas coisas, ainda que tenha havido deformações; mas o pensamento dele está no que ele disse e no que ele exemplificou” – isso mesmo com a biografia dele muito limitada dos textos evangélicos. Só depois de muitos anos passados, antes de escrever Cristianismo, A Mensagem Esquecida descobri que um historiador francês, especializado em religião, fez essa distinção. Escreveu um livro sobre Jesus e outro sobre o Cristo. E eu já tinha dessa distinção não sei por quê. Uma vez uma pessoa da família entrou em transe – não era minha intenção fazer regressão, era apenas dar uns passes – e me disse assim sobre o Cristianismo: “Muita coisa que você não aceita é por que você sabe que não é daquela maneira. Você sabe a maneira correta de ser”. Mas não comecei a ser espírita cedo, não. Costumo dizer que os que começam cedo são espíritos madrugadores. Eu não madruguei. Primeiro formei a base da carreira profissional. Formei-me em Ciências Contábeis, fui para os Estados Unidos, ficando lá por quase cinco anos, e só quando voltei, fim de 54, e em 55 eu já estava com algumas ideias, já estava procurando as coisas, e comecei a ler mais e questionar mais. Aí procurei uma pessoa que era reconhecidamente espírita, um homem muito culto, coronel, engenheiro, chefe da Companhia Siderúrgica em Paris, era de uma cultura enorme, eu sabia que ele era espírita e perguntei-lhe: “Por onde que eu começo?”. Ele me deu até um papelzinho com o nome dos livros, parecia prescrição médica (rs). Então li O Livro dos Espíritos em 1956, foi aí que comecei a estudar. No final daquele ano, escrevi um trabalhinho para O Reformador e, para minha surpresa, ele foi publicado. E eu acho que se não tivesse publicado, talvez eu teria perdido o interesse... Naquela prescrição tinha Kardec, Gabriel Delanne, Léon Denis, e Gustav Geley.
O Senhor já gostava de escrever?
Sempre gostei, desde pequeno. Tive sorte, pois minha mãe e meu pai escreviam muito bem. Tive excelentes professores de português. Então, se é que tenho uma herança do passado, ela foi bem aproveitada, pois tive muitas pessoas que me ensinaram a me expressar em português. Não sei se deu certo, mas acho que sim (rs).
Como foi o seu contato com o Carlos Imbassahy, Deolindo Amorim e Hernani Guimarães Andrade?
O Hernani trabalhava também na Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda. E nós fizemos uma amizade... Eu não sei o que ele via em mim, pois ele já era uma figura de relevo na siderúrgica – eu sabia do gênio que estava ali atrás, pois só de conversar com uma pessoa, você sabe. Foi uma amizade de mais de 50 anos, uma beleza. Poucos dias antes de morrer, ele me ligou e contou uma porção de histórias; parecia que ele sabia. Falou sobre o livro do Dr. Stevenson, Biologia e Reencarnação: “Herminio, não tenho mais dúvidas, a reencarnação está provada!”. Hernani foi uma figura sensacional e Deolindo também, muito amigo meu. Trabalhamos juntos em grupos mediúnicos, grupos pequenos, pois eu nunca frequentei centro espírita e nem sei dizer como é o trabalho nos centros. Então, nosso grupo era formado de poucas pessoas, no máximo seis.
Como eram os trabalhos nesses grupos?
Geralmente líamos Emmanuel, fazíamos uma pequena observação sobre, e íamos ao trabalho. Foi desse trabalho que saiu Diálogo com as Sombras, As Histórias que os Espíritos Contaram, enfim, aprendi muito, meu Deus...
Esses livros falam sobretudo de obsessão...
A palavra obsessor não é uma palavra simpática, não é positiva. São criaturas muito interessantes... Apredi tanto com eles. Falamos sobre teoria e eles estão falam sobre a vida. Eles trazem os casos recortados, como tecido vivo. Foi um trabalho muito, mas muito, instrutivo.
Como o sr. chegou a ser doutrinador em reuniões de desobsessão?
Eu frequentava um grupo particular, doméstico, do qual fazia parte, inclusive, Deolindo Amorim. Primeiro começamos aquelas sessões informais, recebíamos uma entidade ou outra. Eu era apenas um dos participantes – estava numa espécie de vestibularzinho. Um dia, ao começar a reunião, disseram: “Olha vamos começar a botar ordem na casa, fulano vai receber o Espírito, fulano vai, tal e tal, e você, Herminio, vai fazer a doutrinação”. Eu disse: “Meu Deus, eu? (rs) Mas o que vou dizer?” (rs). Eu via como a coisa era complexa, e eu sem experiência nenhuma... Mas comecei. E fui indo. E foram 28 anos.
Nesse período houve alguma doutrinação que lhe marcou mais que as outras?
Todas elas. Olha, era uma choradeira... Rara era a reunião que não tinha choradeira. Foram casos muito comoventes. Você vê isso no livro As Histórias que os Espíritos Contaram. Mais na fase inicial de nosso trabalho, apareciam mais aquelas entidades da época do Cristianismo primitivo. Eram entidades romanas que perseguiram o Cristo, ou que se aborreceram com ele porque ele havia convertido a mulher ou a filha; enfim, esses casos pessoais. Tinha um que dizia: “Enquanto eu sentir na areia a pisada de um pé cristão, eu vou matar”. Era gente decidida, pois aquela mágoa ficou durante muitos anos. Aí começaram a acontecer outros casos. Não tratávamos só de obsessão; parece que o mundo espiritual dirigiu mais nosso trabalho para organizações espirituais que estavam do lado de lá e precisavam ser atendidas, digamos assim. Foram muitas histórias. Entidades que mexeram muito com minhas emoções. Gente que foi meu adversário no passado, gente que gostou de mim. Posso citar um caso. Foi a primeira vez manifestou-se um Espírito de origem árabe. Veio muito cauteloso, desejando que eu falasse mais do que o ouvisse. Então conversamos longamente, o recebi com grande respeito. Mas aquilo foi apenas um preparo. Ele vinha estudar o nosso grupo para saber como éramos, pois já estava prevendo algum contato conosco. Até que chegou a história As Três Dracmas, que está no livro Histórias que os Espíritos Contaram; foi muito emocionante.
Foi um caso diretamente relacionado ao sr.?
Sim. Mas não posso dizer-lhe, onde, nem por que, nem como, nem quem foi. Pois é uma história que mexe com muita coisa, inclusive com que está acontecendo hoje no mundo. Era uma entidade de grande capacidade intelectual, companheiro fantástico que tinha-se desviado na época do Cristo.
É um personagem que se destacou na história da humanidade?
Sim. Você me desculpa ser reticente; mas são histórias que se relacionam diretamente comigo, com pessoas que me conheceram...
O sr. é médium?
Hiii... (rs). Nada. Se dependesse de mim, Espírito não existiria (rs). Pois nunca vi um... Nunca frequentei sessão de materialização. Eu não sei... Parece que o meu trabalho foi muito dirigido para a escrita, então, tive que fazer a opção; se fosse fazer tudo não ia dar.
O sr. foi pioneiro em fazer regressão em Espíritos...
Comecei com a regressão na década de 60, era uma experiência sem o menor propósito psicológico. Eu só queria saber o que era memória; como é que funciona essa coisa chamada memória. Começamos a fazer regressões no grupo mediúnico, pois descobri que as pessoas que trabalham com mediunidade são mais fáceis de passar pelo transe anímico, que é a regressão. Então como eu já sabia fazer regressão com seres encarnados – toda essa experiência está em A Memória e o Tempo – um dia pensei que se podemos fazer num encarnado, talvez seja possível num Espírito incorporado em um médium. E comecei a tratar com passes. Ficava atrás do médium, que estava sentado, e dava uns passes, e a coisa começou acontecer. Tivemos muitas regressões no grupo, mas eu só recorria a esse recurso quando ficava muito difícil chegar às causas profundas. Teve até um caso que me deixou muito emocionado. Foi o de um cidadão que estava muito ligado a uma jovem encarnada. Ele tinha um ódio dela e ficava vigiando-a dia e noite. A moça nos escreveu pedindo ajuda. Eu lhe disse que não poderia garantir, mas que iria colocar o nome dela em nosso caderno e, quem sabe, ela seria atendida. Aí apareceu essa entidade; muito raivosa. Estava muito revoltado com a moça. O Espírito dizia: “Você não sabe. Aquilo é uma peste”. Falava numa linguagem áspera, muito rancorosa. Falava que ia continuar perseguindo-a e que nós não iríamos nos meter nisso, pois ele tinha os seus compromissos com ela. Ele foi muito severo. E, sabe aquelas coisas que estalam na cabeça? Estalou na minha, e eu disse: “Então quer dizer que você continua amando essa mulher, né?”. Ele parou, ficou um pouco meditativo, e teve a honestidade de confessar que realmente gostava dela. Emmanuel tem uma expressão que diz que o ódio é o amor que enlouqueceu. Na verdade ele era emocionalmente tão preso a ela que a perseguia tentando se vingar. E nós tentávamos explicar-lhe que o perdão liberta e a vingança não. A vingança confirma a ligação; amarra e faz sofrer os dois. Aquele Espírito foi de uma dignidade incrível, disse que sim, que a amava, e mudou o comportamento.
O sr. chegou a fazer regressão com esse Espírito?
Não cheguei. Esse foi um caso no qual conseguimos encontrar o caminho para chegar no coração da pessoa. Mas às vezes pegávamos Espíritos muito difíceis. Especialmente os de formação religiosa, pois tinham aqueles dogmas, aquelas crenças muito acirradas na mente e no coração. Houve um sacerdote interessante. Era um padre que chegava, benzia a gente, lia um livro de textos sobre exorcismos, e dizia que nós éramos coisas do demônio. Que eu era um transviado, pois tinha abandonado a igreja... [Herminio já foi clérigo em outras vidas]. Dizia que aquilo não podia continuar. Vinha muita gente da Igreja, do protestantismo, e de outras religiões que estavam completamente bloqueadas quanto às causa que provocaram aquele processo nelas. Então precisávamos ter paciência, recebê-los com muito carinho, ouvi-los. Pois quem faz esse tipo de trabalho com as entidades precisa ter muita paciência e muito carinho. Precisa entender que a pessoa que está ali está sofrendo porque tem algum problema, ela precisa de ajuda para resolver, pois não consegue sozinha. Então, em muitos casos foi feita a regressão, pois assim o Espírito ia recuperar no passado onde é que começou o conflito e via por que estava naquela situação e aí não tinha mais argumento. A regressão facilitou muito nosso trabalho.
O sr. tem uma estimativa de quantos espíritos foram atendidos?
Acho que milhares... Imagine, 28 anos, toda a semana...
Como o sr. se preparava para essas reuniões?
O preparo era comum. Nunca fui de beber, de fumar, não tinha nenhum problema dessa natureza. Era um dia no qual que eu procurava passar com mais calma; antes de ir para o grupo eu repousava. O trabalho começava, irremediavelmente, com uma prece. Num grupo pequeno também é mais fácil de haver harmonia. Para você ter uma ideia, éramos em quatro nos último 20 anos. Era um trabalho feito com muito amor, dedicação, e com muita entrega. Os Espíritos, às vezes, diziam coisas horríveis para nós, ameaçavam...
O sr. teve medo?
Eu não tinha medo, não sei por quê. Eu só dizia o seguinte: “Olha, tudo bem. Você só vai poder fazer comigo o que a lei te permitir, o que ela não permitir você não vai fazer, e não se esqueça que a responsabilidade é sua”. Como que uma pessoa iria, por exemplo, tornar-se obsessor do Dr. Bezerra de Menezes? Ele teve sofrimentos espirituais, e muito grandes, mas perseguir o Dr. Bezerra espiritualmente... Com o quê? A entidade não tinha onde pegá-lo; um espírito daquele porte... Eu não era o caso; pois sempre achei que a gente aprende mais com os erros do que com os acertos. Então sou muito consciente das minhas falhas. E dizia: “Bom, naquilo em que eu falhar você pode realmente me prejudicar, mas naquilo que for decorrência do nosso trabalho aqui, você não pode. Não vai conseguir”. Então precisa ter disposição para enfrentar com muito amor, mas também com energia quando for preciso.
O que é obsessão?
É o amor que enlouqueceu, de um modo geral. Ou então é, às vezes, uma disputa de poder. Vi muito isso em entidades que lidaram com política, com religiões. Religião e política são paixões muito complexas e muito marcantes. Poder é uma coisa terrível. Poder religioso, político, financeiro, de beleza, de inteligência; tudo isso é ônus se o espírito não souber administrar.
Qual o segredo para um trabalho eficiente de desobsessão?
Procurar, primeiro, ouvir muito – raramente eu começava contestando; eu ouvia, pacientemente, às vezes 20, 30 minutos. Deixa falar, deixa colocar tudo para fora, inclusive para se obter também informações do caso em si. Para saber como entrar no coração desse Espírito. Teve uma vez que o Espírito perguntou: “O que o sr. está querendo com isso?”. Respondi: “Muito simples, estou procurando o caminho para chegar ao seu coração”. O homem desarmou na hora. Dali em diante a conversa foi muito mais fácil. O segredo é esse, não tem outro.
Qual é a parte do tríplice aspecto da Doutrina que o sr. gosta mais: ciência, filosofia ou religião?
O religioso, sem dúvida. Agora, com importantes qualificações. O Espiritismo é um bloco de dez, com conceitos e sabedoria. É uma doutrina profundamente inteligente e competente. Então não se pode dizer que só se aceita a reencarnação ou só a comunicabilidade dos Espíritos; é aquele bloco inteiro. Eu acho até que a reencarnação é o cimento que mantém esses diversos aspectos ligados; pois uma vez que você demonstra a reencarnação você já prova a pré-existência do espírito; a sobrevivência; prova que há vida no além; que tem vida antes da vida, vida durante a vida, vida entre as vidas, e vida depois da vida. Tudo é vida. Precisa-se entender as entidades, precisa-se ouvi-las com bastante paciência, com carinho e com amor e depois então começar a contra-argumentar. Se existe muita resistência, então, parte-se para regressão.
Como o sr. aprendeu a técnica da regressão?
Com o Coronel Albert de Rochas, no livro As Vidas Sucessivas. Esse livro foi importantíssimo para mim.
O sr. acha que é possível evitar a obsessão?
Acho que, na obsessão, o tratamento é mais preventivo do que curativo. Se não errássemos, não teríamos essa consequência. Quando erramos, assinamos uma promissória em branco, e um dia vai chegar alguém cobrando: “Tá aqui e você vai ter que pagar”. Não é que a lei de Deus seja punitiva – sempre repito isso – a lei de Deus é educativa. Agora, obsessão é um problema delicado porque você lida com as emoções do obsediado e do obsessor. Não se pode deixar de reconhecer que o obsessor tem suas razões – não que ele esteja certo, mas ele tem suas razões. Então é necessário convencê-lo de que não é inteligente perseguir outra pessoa, que não é inteligente não perdoar. Isso é o núcleo principal. E depois de instaurado o processo da obsessão, existem alguns casos tão difíceis que podem durar séculos e até milênios. Ele dá aquele contexto e só sai dali ajudado. Sozinho ele não tem condições. Por isso tivemos muitas entidades em nosso grupo que chegavam com aquela fúria, dizendo que estávamos nos metendo em assunto particular, que não tínhamos nada com isso... Mas tínhamos que fazer algo para ajudá-los e não era explodindo com eles não, era procurando entender. Tive, então, a sorte e a felicidade de contribuir para muita gente se libertar; graças a Deus.
Quando os Espíritos compreendiam e se libertavam qual era a reação deles?
Ah! Coisa emocionantes aconteciam. Lindas! Porque aí a criatura cai no seu verdadeiro ser. Ela percebe que você não é inimigo e sim um amigo que está ali ajudando para que ela saia daquela dificuldade. Quantos deles foram gratos... Lembro-me de um caso que me deixou muito comovido. O Espírito era dirigente de uma instituição lá no mundo espiritual, era uma pessoa de bastante relevo – porque eles são inteligentes, são muito cultos, muito hábeis, e conhecem os mecanismos da lei; eles mexem com a lei divina – então ele veio com ameaças terríveis. Disse que ia acabar com aquele grupo e veio disposto a fazer qualquer negócio para efetuar seu intento. Então, aquela entidade chegou muito ameaçadora porque estava em perigo toda a estrutura dela, todo o seu poder, as coisas que ele montou lá – instituições, às vezes, milenares. O espírito estava muito indignado e compareceu cercado de várias pessoas – eu não via nada, mas ele dizia: “Me dá essa pasta aí” –, assistentes, e chegou um ponto em que ele saiu, desligou-se do médium ainda bastante indignado. Passado alguns dias, uma moça de nosso grupo disse que alguém muito aflito tocou sua campainha perguntando se tinha um serviço para dar a ele. Ela respondeu que tinha sim e pediu-lhe que desse uma olhada no chuveiro, era um rapaz, muito jovem ainda. Ela deu-lhe uma gratificação ultragenerosa para ele, que perguntou de onde tinha um supermercado perto; ela explicou-lhe e ele foi embora. Bom, passaram-se duas semanas e manifestou-se aquela entidade furiosa. Chorava sem parar. Ele dizia: “Aquele menino é a minha vida. Ele foi meu filho. Sofro de vê-lo nessas dificuldades todas. E ele foi lá, sem mais nem menos e vocês ajudaram”. E continuou: “Está aí o meu coração em cima da mesa. Façam dele o que vocês quiserem”.
Durante esses 28 realizando o trabalho desobsessão qual a maior lição que aprendeu?
A lição de que os Espíritos são pessoas iguais a nós; e que não há força maior que a do amor. São duas lições que me marcarão para sempre! O amor liberta você. Lá, às vezes chegavam entidades que traziam um rancor... E dávamos razão a elas em muitos aspectos. Pois a pessoa que passou por um conflito muito grande com uma outra, ou com uma instituição, enfim, qualquer problema mais grave, tem suas razões para estar magoada, não podemos deixar de reconhecer. Tem entidades que manipulam os outros quando estão encarnadas, e você acha que aquelas não tem razão? Tem sim. O problema está em você mudar a atitude: “Você tem razão, mas tem isso, isso, aquilo ...”. O Espírito acabava se convencendo que era pelo perdão que se chegava à libertação.


FONTE: Revista Universo Espírita nº 34