XI -
EXISTÊNCIA DA ALMA
André Luiz
EVOLUÇÃO MORFOLÓGICA E MORAL – A evolução morfo16gica prosseguiu,
emparelhando-se com a evolução moral.
O crânio avançou, com vagar, no rumo de aprimoramento maior, os braços
refinavam-se, as mãos adquiriam excelência táctil não sonhada, e os
sentidos, todos eles, progrediam em acrisolamento e percepção.
Todavia, com o advento da responsabilidade que o separara da orientação
direta dos Benfeitores da Vida Maior, entregou-se o homem a múltiplos
tentames de progresso no campo do espírito.
No regime interior de livre indagação, conferia asas audaciosas ao
pensamento, e, com isso, mais se lhe acentuava o poder de imaginar,
facilitando-se-lhe a mentalização e o desprendimento do corpo espiritual,
cujas células em conexão com as células do corpo físico se automatizavam
assim, na emancipação parcial, através do sono, para acesso da alma a
ensinamentos de estrutura superior.
Guarda a criatura humana, então, consigo, na tessitura dos próprios
órgãos, a herança dos milhões de estágios diferentes, nos reinos
inferiores, e, no fundo, sente-se inclinada a viver no plano dos outros
mamíferos que lhe respiram a vizinhança, com o instinto absoluto dominando
sem restrições; no entanto, com a evolução irreversível, o amor
agigantou-se-lhe no ser, sugerindo-lhe novas disposições à pr6pria
existência.
NOÇÃO DO DIREITO – Em razão do apego aos rebentos da própria
carne, institui a propriedade da faixa de solo em que se lhe encrava a
moradia e, atendendo a essa mesma raiz de afetividade, traça a si próprio
determinadas regras de conduta, para que não imponha aos semelhantes
ofensas e prejuízos que não deseja receber.
Acontece, assim, o inesperado.
O homem que não pretende abandonar os apetites e prazeres da experiência
animal, fabrica para si mesmo os freios que lhe controlarão a liberdade, a
fim de que se lhe enobreça o caráter iniciante.
Estabelecendo a posse tirânica em tudo o que julga seu, desiste de
aproveitar o que pertence ao vizinho, sob pena de expor-se a penalidades
cruéis.
Nasce, desse modo, para ele a noção do direito sobre o alicerce das
obrigações respeitadas.
CONSCIÊNCIA DESPERTA – É assim que ele transformado interpreta,
sob novo prisma, a importância de sua presença na Terra.
Não mais lhe seduzem a despreocupação e o nomadismo, assim como para o
homem adulto é já passado o ciclo da infância.
Sabe agora que o berço carnal se reveste de significação mais profunda.
Compreende, a pouco e pouco, que a vida lhe registra as contas pessoais,
porquanto aprende que pode negar o braço ao companheiro necessitado de
apoio, sabendo, porém, que o companheiro poderá recusar-lhe o seu, no
momento em que o desequilíbrio lhe bata à porta.
Reconhece que dispõe de liberdade para matar o desafeto, mas não ignora
que o desafeto, a seu turno, pode igualmente exterminar-lhe o corpo ou
amargar-lhe o caminho.
Percebe que os seus gestos e atitudes, para com os outros, criam nos
outros atitudes e gestos semelhantes para com ele.
Com esse novo cabedal de observação, revela-se-lhe a vida mental mais
surpreendente e mais rica e, por essa mais intensa vida íntima, retrata
com relativa segurança as idéias dos Espíritos Abnegados que lhe custodiam
a rota.
Desde então, não guarda a existência circunscrita à romagem berço-túmulo,
por alongá-la, do ponto de vista de causa e efeito, para além do sepulcro
em que se lhe guarda o invólucro anulado ou imprestável.
Incorporando a responsabilidade, a consciência vibra desperta e, pela
consciência desperta, os princípios de ação e reação funcionam, exatos,
dentro do próprio ser, assegurando-lhe a liberdade de escolha e
impondo-lhe, mecanicamente, os resultados respectivos, tanto na esfera
física quanto no Mundo Espiritual.
A LARVA E A CRIANÇA – Nesse sentido, importa lembrar aqui, com as
diferenças justas, o símile que a vida assinala entre as alterações da
existência para a alma humana e para os insetos de metamorfose integral.
A larva que se afasta do ovo ingressa em novo período de desenvolvimento,
que pode perdurar por muito tempo, como ocorre entre os efemerídeos,
mostrando, no começo, a membrana do corpo ainda amolecida e conservando no
tubo digestivo os remanescentes de gema da fase embrionária, para iniciar,
depois da excreção, os processos de alimentação e digestão.
A criança recém-nata retira-se do útero e entra em nova fase de evolução,
que se firma através de alguns anos. A principio, tenra e frágil, retém na
própria organização os recursos sanguíneos que lhes foram doados, por
manutenção endosmótica, no organismo materno, para, somente depois,
eliminar, quanto lhe seja possível, esses mesmos recursos, gerando os que
lhe são próprios.
Avançando na execução dos programas traçados para a sua existência, a
larva cresce e recorre a matérias nutritivas que lhe garantam o aumento do
corpo e, conforme a espécie, promove por si mesma a mudança de pele,
indispensável ao condicionamento de seu próprio volume.
Satisfazendo os imperativos da própria vida, a criança se desenvolve,
tomando o alimento preciso à expansão de sua máquina orgânica, passando a
realizar por si, isto é, ao comando da mente, a renovação celular dos
tecidos e órgãos que lhe constituem o campo somático, de maneira a que se
lhe ajuste a forma física aos moldes do corpo espiritual.
METAMORFOSE DO INSETO – A larva dos insetos de transformação
completa experimenta vários períodos de renovação para atingir a condição
de adulto, embora permaneça com o mesmo aspecto, porquanto apenas depois
da derradeira mudança de pele é que se torna pupa.
Em semelhante estágio, acusa progressiva diminuição de atividade, até que
não mais suporte a alimentação.
Esvaziam-se-lhe os intestinos e paralisam-se-lhe os movimentos.
A larva protege-se, então, no solo ou na planta, preparando a própria
liberação.
Permanece, assim, ó, e não se alimenta do ponto de vista fisiológico,
encrisalidando-se, segundo a espécie, em fios de seda por ela própria
constituídos com a secreção das glândulas salivares, agregados a
pequeninos tratos de terra ou a tecidos vegetais, formando, desse modo, o
casulo em que repousa, durante certo tempo, fixado em alguns dias e até
meses.
Na posição de pupa, ao impacto das vibrações de sua própria organização
psicossomática, sofre essencial modificação em seu organismo, modificação
que, no fundo, equivale a verdadeiro aniquilamento ou histólise, ao mesmo
tempo que elabora órgãos novos pelo fenômeno da histogênese, valendo-se
dos tecidos que perduraram.
A histólise, que se efetua por ação dos fermentos, verifica-se
notadamente nos músculos, no aparelho digestivo e nos tubos de Malpighi,
com reduzida atuação no sistema nervoso e circulat6rio.
Pela histogênese, os remanescentes dos músculos estriados desfazem-se das
características que lhes são próprias, perdendo, gradativamente, a sua
estriação, até que se convertam, qual se obedecessem a processo
involutivo, em células embrionárias fusiformes, com um núcleo exclusivo,
ou mioblastos, que se dividem por segmentação, plasmando novos elementos
estriados para a configuração dos órgãos típicos.
Somente então, quando as ocorrências da metamorfose se realizam, é que o
inseto, integralmente renovado, abandona o casulo, revelando-se por falena
leve e ágil, com o sistema bucal transformado, como acontece na borboleta
de tipo sugador, na qual as maxilas se alongam, convertendo-se numa
trompa, enquanto que o lábio superior e as mandíbulas se atrofiam.
Entretanto, embora magnificentemente modificada, a borboleta alada e
multicor é o mesmo indivíduo, somando em si as experiências dos três
aspectos fundamentais de sua existência de larva-ninfa-inseto adulto,
HISTOGÊNESE ESPIRITUAL – Assim também, a criatura humana, depois
do período infantil, atravessa expressivas etapas de renovação interior,
até alcançar a madureza corpórea, não obstante apresentar-se com a mesma
forma exterior, porquanto somente ap6s o esgotamento da força vital no
curso da vida, através da senectude ou da caquexia por intervenção da
enfermidade, é que se habilita à transformação mais profunda.
Nesse período característico da caducidade celular ou da moléstia
irreversível, demonstra gradativa diminuição de atividade, não mais
tolerando a alimentação.
Pouco a pouco, declinam as suas atividades fisiológicas e a inércia
substitui-lhe os movimentos.
Protege-se, desde então, no repouso horizontal em decúbito, quase sempre
no leito, preparando o trabalho liberat6rio.
Chega, assim, o momento em que se imobiliza na cadaverização,
mumificando-se à feição da crisálida, mas envolvendo-se no imo do ser com
os fios dos pr6prios pensamentos, conservando-se nesse casulo de forças
mentais, tecido com as suas pr6prias idéias reflexas dominantes ou
secreções de sua própria mente, durante um período que pode variar entre
minutos, horas, dias, meses ou decênios.
No ciclo de cadaverização da forma somática, sob o governo dinâmico de
seu corpo espiritual, padece extremas alterações que, na essência,
correspondem à histólise das células físicas, ao mesmo tempo que elabora
órgãos novos pelo fenômeno que podemos nomear, por falta de termo
equivalente, como sendo histogênese espiritual, aproveitando os elementos
vivos, desagregados do tecido citoplasmático, e que se mantinham até
então, ligados à colméia fisiológica entregue ao desequilíbrio ou à
decomposição.
A histólise ou processo destrutivo na desencarnação resulta da ação dos
catalisadores químicos e de outros recursos do mundo orgânico que,
alentados em níveis de degenerescência, operam a mortificação dos tecidos
e, do ponto de vista do corpo espiritual, afetam principalmente a
morfologia dos músculos e os aparelhos da nutrição, com escassa influência
sobre os sistemas nervoso e circulatório.
Pela histogênese espiritual, os tecidos citoplasmáticos se desvencilham
em definitivo de alguns dos característicos que lhes são próprios,
voltando temporariamente, qual se atendessem a processo involutivo, à
condição de células embrionárias multiformes que se dividem, através da
cariocinese, plasmando, em novas condições, a forma do corpo espiritual,
segundo o tipo imposto pela mente.
DESENCARNAÇÃO DO ESPÍRITO -Apenas quando os acontecimentos da
morte se realizam, é que a criatura humana desencarnada, plenamente
renovada em si mesma, abandona o veículo carnal a que se jungia; contudo,
muitas vezes aprisionada ao casulo dos seus pensamentos dominantes, quando
não trabalhou para renovar-se, nos recessos do espírito, passa a revela-se
em novo peso específico, segundo a densidade da vida mental em que se
gradua, dispondo de novos elementos com que atender à própria alimentação,
equivalentes às trompas fluidico-magnéticas de sucção, embora sem perder
de modo algum o aparelho bucal que nos é característico, salientando-se,
aliás, que semelhantes trompas ou antenas de matéria sutil estão patentes
nas criaturas encarnadas, a se lhes expressarem na aura comum, como
radículas alongadas de essência dinâmica, exteriorizando-lhes as radiações
específicas, trompas ou antenas essas pelas quais assimilamos ou repelimos
as emanações das coisas e dos seres que nos cercam, tanto quanto as
irradiações de nós mesmos, uns para com os outros.
CONTINUAÇÃO DA EXISTÊNCIA - Metamorfoseada, pois, não obstante o
fenômeno da desencarnação, a personalidade humana continua, além-túmulo, o
estágio educativo que iniciou no berço, sem perder a própria identidade,
somando consigo as experiências da vida carnal, da desencarnação e da
metamorfose no plano extrafísico.
Perceberemos, desse modo, que a existência da criatura, na reencarnação,
substancializa-se não apenas na Terra, onde atende à plantação dos
sentimentos, palavras, atitudes e ações com que se caracteriza, mas também
no Mundo Espiritual, onde incorpora a si mesma a colheita da sementeira
praticada no campo físico, pelo desdobramento do aprendizado com que
entesoura as experiências necessárias à sublime ascensão a que se destina.
Uberaba, 5-3-58.
Livro “Evolução em Dois mundos”
Psicografia: Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira.
Autor Espiritual: André Luiz.