A
- Vigilância
"Todo pensamento impuro pode se originar de duas
fontes: a própria imperfeição da alma ou uma funesta influência
que sobre ela se exerça. Neste último caso, há sempre indício
de uma fraqueza, que nos torna aptos a receber essa influência, demonstrando
que somos almas imperfeitas. Dessa forma, aquele que falir não poderá
alegar como desculpa a influência de um Espirito estranho, desde que esse
Espírito não o teria induzido ao mal se o tivesse encontrado inacessível
à sedução."
(Allan Kardec. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Capítulo XXVIII. Coletânea
de Preces Espíritas. Para Resistir a Uma Tentação, 20.
Prefácio.)
A condição interior de atenção para com as próprias
emoções, desejos, impulsos, pensamentos, gestos, olhares, atitudes
e respostas verbalizadas consiste na preocupação em pautar nossas
reações dentro de padrões condizentes com o conhecimento
evangélico. A observação de nós mesmos deverá
ser aplicada de modo permanente, e não apenas quando já ocorreu
a transgressão. Entendemos claramente que a vigilância define um
trabalho preventivo e não corretivo.
A
vigilância tem, assim, sua atuação como meio de combate
aos defeitos, de algum modo já conhecidos ou identificados, para que,
com a devida antecedência e precaução, evitemos as ocorrências
dos mesmos. O trabalho preventivo, a exemplo do que se desenvolve na especializada
área da Segurança do Trabalho, procura relacionar numa atividade
os riscos de acidentes e seus graus. As causas de acidentes são muito
bem estudadas e todas as campanhas de prevenção visam à
conscientização do homem que executa um trabalho produtivo, para
que o desempenhe dentro de certas normas de segurança, específicas
a cada tipo de atividade.
Há dispositivos de proteção nas máquinas, há
cores e sinalização, há meios de prevenção
contra incêndios e há também os equipamentos de proteção
individual para uso do trabalhador. Estes são alguns dos meios para evitar
acidentes. Muito análogos ao que queremos aqui relacionar com a nossa
vigilância interior são, em Segurança do Trabalho, os chamados
"atos inseguros". Sabe o operário que, ao executar um "ato
inseguro", poderá lhe ocorrer um acidente, como por exemplo: trabalhar
na construção de edifício sobre andaimes sem guarda-corpo;
subir em postes sem o cinto de segurança; operar máquinas de desbaste
sem óculos de proteção; remover peças com as mãos
sem luvas em prensas de moldagem, etc.
Então,
o que poderá também acontecer àquele que, conhecendo as
suas fraquezas ou inseguranças, se arrisca a determinadas situações
de perigo? Estará se expondo a sofrer um deslize moral, a lhe ocorrer
um acidente de graves consequências. O que precisamos conhecer bem são
as nossas próprias situações de risco, para não
cometermos erros, caindo em tentações, e depois amargurar os arrependimentos
das nossas falhas.
As tentações são os nossos riscos; estamos a elas sujeitos,
e a nossa própria insegurança é resultado das imperfeições
que ainda temos. Contamos sempre com os meios de proteção e de
segurança individuais nos Espíritos Protetores, que, até
certo ponto, afastam-nos das influências perigosas. Cabe-nos, no entanto,
agir com firmeza, resistindo às tentações conhecidas.
Podemos
muito bem evitar os "atos inseguros", escapando das situações
de perigo, ou nos munindo dos meios de proteção para enfrentá-las.
Como formas de proteção, além do auxílio espiritual,
contamos com a prece, a vontade, o esclarecimento, o esforço próprio.
Ninguém melhor do que nós mesmos para precavermo-nos das situações
que representam riscos às nossas próprias inseguranças
morais.
Relacionemos algumas delas, talvez as mais comuns:
a) Diante dos convites de companhias que nos estimulam
ao fumo, ao jogo, ao álcool, ao tóxico;
b) Nas discussões de assuntos polêmicos,
que nos levam a intrigas, agressões, contendas;
c) Nas elaborações de pensamentos
eróticos, que nos predispõem aos condicionamentos do sexo;
d) Na direção dos olhares maliciosos,
que nos conduzem à cobiça;
e) Nas economias exageradas dos gastos, que se
resumem em avareza;
f) Nas absorções de ressentimentos
ou amarguras, que se cristalizam em intolerâncias, incompreensões;
g) Nos comentários desavisados, que nos
conduzem à maledicência;
h) Nos afloramentos das emoções fortes,
que nos fazem manifestar orgulho, presunção;
i) Nos ímpetos de defesa das nossas idéias,
que refletem o personalismo;
j)
Nas inquietações por algo desejado, que definem a impaciência;
l) Nos esquecimentos de obrigações
assumidas, que caracterizam a negligência;
m) Nos descansos prolongados, que indicam ociosidade.
"Reconhece-se que um pensamento é mau quando ele se distancia da
caridade — base de toda moral verdadeira; quando tem por princípio
o orgulho, a vaidade e o egoísmo; quando sua concretização
pode prejudicar alguém; quando, enfim, nos induza a coisas diferentes
das que quereríamos que os outros nos fizessem."
B - Abnegação
"A piedade, quando bem sentida, é amor; o
amor é devo lamento; devotamento é esquecimento, esquecimento
de si mesmo, e este esquecimento é a abnegação em favor
da criatura menos feliz, é a virtude por excelência, praticada
pelo Divino Mestre e ensinada em sua doutrina tão santa e sublime; quando
essa doutrina for restabelecida em sua pureza primitiva, quando for admitida
por todos os povos, fará a Terra feliz, fazendo reinar em sua face a
concórdia, a paz e o amor."
(Allan Kardec. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Capítulo XIII. Que
a Mão esquerda Não Saiba o Que Faz a Direita. Item 17. A Piedade
- Michel.)
A abnegação é indicativa daquilo que fazemos em favor de
alguém, ou de alguma causa, sem interesse próprio, com esquecimento
de nós mesmos, ou até com sacrifício do que possa nos pertencer.
Há alguns exemplos na História das Civilizações
de criaturas abnegadas, que se dedicaram ao bem-estar do próximo, trabalhando
de alguma forma para deixar aos homens uma contribuição marcante
nas áreas do conhecimento, das descobertas científicas, das investigações,
das religiões, dos direitos humanos, da moral, da caridade, etc. Por
esse espírito de sacrifício próprio deixaram seus nomes
aureolados de respeito e admiração.
Na própria História do Brasil rendemos homenagens aos personagens
cívicos que colocaram o interesse da nação brasileira acima
dos seus e dos das elites da época.
É o que muito nos falta hoje: pureza de intenções, abnegação,
sacrifício de interesses, renúncia a proveitos pessoais, amor
às causas nobres, dedicação às criaturas na miséria,
desprendimento dos valores materiais. Devemos reconhecer, também, que
há inúmeros corações vivendo em silêncio dando
extraordinários exemplos de abnegação, sem fazer qualquer
menção ao que realizam, ou sem serem identificados publicamente.
Todos temos, no entanto, possibilidades de praticar a abnegação,
se não integralmente dedicados a uma obra mas, em nosso tempo disponível,
procurando algo realizar sem remuneração, com desprendimento,
dedicados a certas benemerências ao próximo, de qualquer natureza.
A prática da abnegação concretiza o exercício da
caridade, dever humano que não podemos dispensar de nossas obrigações.
O benefício desinteressado é o único agradável a
Deus. Quem presta sua ajuda aos pequeninos que nada têm, sabe de antemão
que não receberá deles agradecimentos ou retribuições.
Por essa razão os serviços dedicados aos mais carentes devem caracterizar
a caridade autêntica.
Admitimos que também podemos treinar a abnegação nas pequenas
coisas, todas as vezes que voluntariamente renunciamos a algo nosso em favor
do próximo.
A abnegação é o oposto do egoísmo. Praticando-a,
o combatemos naturalmente.
Vejamos, em nossas atividades corriqueiras, algumas das muitas oportunidades
que temos de praticar a abnegação:
a) Dedicando algumas horas do nosso lazer numa
atividade assistência!;
b) Ministrando esclarecimentos evangélicos
às criaturas em aprendizagem;
c) Oferecendo graciosamente os próprios
serviços profissionais, onde possam ser mais úteis, aos que não
os possam pagar;
d) Ensinando, sem interesse financeiro, os conhecimentos
que detemos em quaisquer áreas;
e) Trabalhando no próprio lar, em algumas
horas livres, na confecção de roupas e agasalhos para famílias
carentes;
f) Contribuindo, com trabalho pessoal, no plantão
vigilante a familiares ou amigos em convalescença;
g) Procurando conduzir o que realizarmos na esfera
política ou social em benefício da maioria desprivilegiada, mesmo
sacrificando
interesses próprios;
h) Indagando sempre, em nossas deliberações
administrativas, se estamos atendendo aos princípios de justiça,
tolerância e bondade para com o próximo;
i) Pautando tudo que fizermos nas produções
diárias dentro do ideal de perfeição, aprimorando sempre
para o melhor ao nosso alcance.
"A beneficência é bem compreendida, quando se limita ao círculo
de pessoas da mesma opinião, da mesma crença ou do mesmo partido?
— Não, é imperioso sobretudo abolir o espírito de
seita e de partido, pois todos os homens são irmãos. O verdadeiro
cristão vê irmãos em todos os seus semelhantes, e para socorrer
o necessitado não busca saber a sua crença, a sua opinião,
seja ela qual for." (Id., ibid. Item 20. Luís.)
Ney P. Peres