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sábado, 11 de agosto de 2012

As Almas Frágeis


O Centro Espírita é o refúgio das almas, encarnadas e desencarnadas. Substitui no presente os templos do passado, onde as pompas terrenas estimulavam as almas frágeis, sugerindo-lhes o amparo das potências celestes. A riqueza dos templos, o fulgor das luzes nos altares, os paramentos do sacerdote, os vitrais coloridos e a música sagrada reboando nas naves agiam ao mesmo tempo como anestésicos das angústia terrenas e excitantes esperanças celestes. Era toda uma técnica divina, provinda das origens humanas, do silêncio misterioso das selvas das matas, em que a densa folhagem das árvores enormes filtrava a luz do sol em gamas de coloridos arco-irisados. A idéia do Sagrado sugeria a transmissão dos poderes divinos através dos sacramentos e dos rituais. Mas o tempo passou a sua esponja mágica no séculos e nos milênios, amadurecendo as almas frágeis e despertando-as para a consciência de si mesmas. Na esteira das renovações surgiram as reuniões simples dos clãs e dos grupos familiais, junto às fontes murmurantes em que os oráculos e as pitonisas interpretavam a voz dos deuses na voz das coisas. Jesus de Nazaré, que os judeus esperavam como o cristo das novas guerras de conquista, surgiu humilde e simples, modesto filho de uma família operária. De suas mãos surgiram práticas novas, em que o fluxo divino dispensava os paramentos suntuosos dos canais oficiais da Divindade. E, com esse fluir espontâneo do amor e da bondade naturais, derramaram-se na terra dos corações as sementes da Boa-Nova. Foi dessa semeadura nos campos a nas praias, no próprio interior dos templos ou em seus pátios exteriores, ainda sob o fumegar das aras em que se queimavam as ervas sagradas e as carnes dos animais sacrificados, que surgiram os primeiros cultos pneumáticos do Cristianismo Primitivo, os cultos do Espírito.
Poder insuspeitado da Evolução, desencadeando os processos misteriosos da metamorfose, transformaram aos poucos as formas de relação do homem com a Divindade. O Centro Espírita nasceu como Jesus e com Jesus, sem os aparatos inúteis do formalismo religioso, restabelecendo nas almas a confiança em si mesmas, despertando-lhes a percepção de sua natureza divina. As almas frágeis tornaram-se fortes na fraqueza da simplicidade. Em vão se desencadearam os temporais da reação, em que as almas fracas amadureceram nas estufas brutais do martírio. Elas haviam decifrado o enigma, encontrando a pureza na impureza do mundo, a verdade nas palavras do Messias rejeitado e Deus no íntimo de si mesmas. O episódio de Pedro em Jope, recusando-se a atender o centurião Cornélios – impuro comandante de centúrias romanas – mas atendendo-o por mandato mediúnico de inesperada vidência, mostra-nos ainda hoje como se processou a metamorfose do judeu formalista em cristão fraterno. Pedro vai à casa de Cornélios e se surpreende com a família impura tomada pelo Espírito. A manifestação mediúnica em local profano lhe ensinava o que era o Batismo do Espírito que até então ele não pudera compreender. Nascia ali, aos seus olhos, o primeiro Centro Espírita numa casa de família. E Pedro voltou a Jerusalém para contar aos apóstolos o que vira com seus olhos e o que sentira em seus coração. O Céu baixava à Terra e nela se abria como se abrem as flores do campo, com o mesmo esplendor dos lírios que as vestes suntuosas de Salomão não podiam superar. Mas o tempo ainda haveria de fluir nas ampulhetas por quase dois milênios, até que a metamorfose anímica e consciencial se definisse na missão de Kardec.
O Espiritismo abalou as estruturas do mundo artificial dos homens, revelando-lhes assustadoras perspectivas de responsabilidade moral e espiritual. Subverteu a ordem extática das aparências convencionais e soltou sobre as Igrejas, as Academias, as Universidades, os gabinetes dos sábios e toda a estrutura vacilante das Ciências os seus fantasmas até então considerados como simples ficções literárias. Em vão, por toda parte, os conservadores de um passado já morto – embalsamadores de múmias culturais – se levantaram por todo o mundo tentando afugentar os fantasmas invasores. De nada valeram os conluios secretos, as decisões arbitrárias de juízes sem toga, as maldições de prelados poderosos. Os fantasmas não pediam licença para aparecer e tumultuaram o panorama cultural, suscitando polêmicas violentas entre figurões mundiais do saber. Em meio ao temporal as almas frágeis se refugiavam humildes nas reuniões familiais do velho culto pneumático ressuscitado. E dessas reuniões domésticas, como as do Cristianismo Primitivo, das tertúlias à sombra das figueiras de Betânia, com as figuras simples e amorosas de Lázaro, Marta e Maria ao redor do mestre, nasciam e se multiplicavam os Centros Espíritas.
Essa genealogia bimilenar do Centro Espírita, ao mesmo tempo humilde e grandiosa, atesta a sua origem humana e divina, conferindo a Kardec o título de herdeiro de Deus e co-herdeiro de Cristo, segundo a conhecida expressão do Apóstolo Paulo. Um título comum, que Paulo estendeu a todos os que aceitaram e acolheram a Boa-Nova em seus corações. Ninguém o fez com mais sacrifício e dedicação, com mais amor, confiança e fé, do que o Codificador do Espiritismo. E a genealogia prossegue na descendência espiritual de Kardec. Mas não há nisso nenhuma intenção de vaidade ou orgulho mundano, pois as sucessivas gerações espíritas não descendem do sangue, sim do espírito. A filiação à linhagem espiritual de Kardec não nos proporciona títulos honoríficos ou terrenos, mas obrigações muitas vezes dolorosas e sacrificiais, no decorrer de vidas de abnegação ao próximo e de fidelidade ao futuro.
O Centro Espírita, como a relva, nasce por toda parte, e quando os poderes temporais o decompõem ou esmagam, ele renasce com teimosia desafiante. Porque aqueles que viram e conheceram a Verdade, que a sentiram ao menos uma vez em seus corações, jamais a esquecem e jamais a negam. As almas frágeis se fizeram fortes ao sopro dos ventos proféticos. Criaturas ingênuas e desprovidas de tudo, órfãs da cultura secular, sentem-se apoiadas na rocha das experiências vitais do espírito e são capazes de enfrentar os titãs da cultura mundial com a firmeza dos estóicos. Nada as abala, nem sofismas nem maldições, porque experimentaram o toque da Verdade em si mesmas.
Os que dizem ter sido espíritas e deixado a Doutrina, nunca o foram. Se tivessem realmente penetrado no conhecimento doutrinário, de mente e coração, não poderiam voltar à ignorância do niilismo sem fundamento ou às fabulas do religiosismo contraditório e absurdo. Um marinheiro que deixou o mar nunca se esquecerá do marulho das ondas e jamais perderá a lembrança das amplidões marinhas em que navegou.
As almas frágeis são remanescentes dos rebanhos religiosos embalados ao longo dos séculos pelos pastores piedosos, herdeiros da flauta de Pã. Ao som melodioso e enganador das flautas adormeceram no tempo, vigiadas e protegidas. Não são as almas primitivas, pois estas são geralmente fortes e bravas, carregadas dos impulsos animais. Ao contrário destas, elas se acomodam nas sensações agradáveis da vida material e repetem encarnações sucessivas de acomodação e indolência, abusando de seu livre-arbítrio ao invés de utilizá-lo no processo evolutivo. Somente a dor, nas duras provações, consegue arrancá-las do círculo vicioso. Como diz Lázaro, numa das suas mensagens de O Evangelho Segundo o Espiritismo: só podem saltar o obstáculo e avançar “sob a dupla ação do freio e da espora”. As almas frágeis precisam ser constantemente vigiadas e orientadas no Centro Espírita, pois se entregam facilmente a um misticismo inferior, tentando alcançar a angelitude através de submissão interesseira a espíritos mistificadores, dirigentes de vistas curtas e médiuns pretensiosos. Gostam de Ordens, Fraternidade, Escolas Evangélicas, de sacristia e coisas semelhantes, onde possam usar distintivos, insígnias e serem classificadas em graus de evolução. Todas essas modalidades de agrupamentos exclusivistas, separatistas e pretensiosos servem para protegê-las na sua fragilidade. Não gostam de atitudes positivas e enérgicas e fariam do movimento espírita uma Irmandade do Senhor Morto, se conseguissem dominar o meio. Os presidentes e dirigentes de Centros precisam exercer rigorosa vigilância em suas instituições, para que essas almas infantis não deturpem santamente a Doutrina, com as melhores intenções de que o Inferno está cheio. Todas as formas de resíduos do passado igrejeiro agradam a essas almas traumatizadas, que são atraídas ao Espiritismo precisamente para se curarem nele e não para prejudicá-lo.
O Espiritismo não é uma Doutrina de passividade contemplativa. Sua finalidade, como os Espíritos Superiores disseram a Kardec, é revolucionar o mundo inteiro, modificado-o para melhor. A essência cristã do Espiritismo reflete as atitudes vigorosas do Cristo em luta com as estruturas asfixiantes do Mundo Antigo. O Espírita verdadeiro é um construtor do futuro. Cabe-lhe o dever inalienável de estudar a Doutrina, aprofundar-se no seu conhecimento, difundi-la com vigor e confiança para que a sua luz solar afugente as trevas de um passado contraditório de lamúrias, imprecações e louvores subservientes a Deus, como se Deus fosse um tirano injusto à espera do nossos rapapés para nos conceder a sua proteção.
A promessa evangélica do Consolador se cumpre na Doutrina Espírita de maneira positiva e não através de cantigas de ninar, de palavrório anestesiante. A própria dureza do mundo atual, com suas atrocidades, sua ganância, sua criminalidade aviltante, mostra-nos que o tempo dos Contos da Carochinha já passou, que a Humanidade entrou na fase da madureza e tem de aprender a enfrentar os seus problemas por si mesma. Não que Deus nos tenha abandonado ou esquecido, ou que tenha falecido de um enfarte divino – como querem os teólogos do Cristianismo Ateu – mas porque marcou os limites de nossa ilusão comodista, lançando-nos face a face com os resultados do nosso comportamento no mundo. Todas as dificuldades atuais são conseqüências dos abusos que cometemos no uso do nosso livre-arbítrio, apesar de todo o auxílio e de todas as advertências que recebemos do Alto nas etapas sucessivas da nossa evolução, por falta de uma tomada de consciência do que somos e da finalidade superior da nossa própria existência.
O consolo que o Espiritismo nos dá não é a proteção fictícia da fé cega, dos sacramento vazios de sentido, do socorro espiritual egoísta, em forma de privilégio injustificáveis, do paternalismo dos sacerdotes profissionais, dos agrados interesseiros de médiuns venais. O Consolador não se manifesta através de prodígios sobrenaturais, mas na forma de esclarecimentos positivos, de revelação científica das leis naturais que até agora olvidamos ou encaramos como crianças choramingas pedindo colo. O Espiritismo nos consola como o fez o Cristo, provando aos seus discípulos que cada um de nós é um ser imortal, de natureza divina, que nasce para morrer, pois a morte é o fim do aprendizado terreno, de maneira que morremos para ressuscitar em plano superior, a fim de prosseguirmos a nossa evolução em condições mais favoráveis. A Filosofia Existencial do nosso tempo sanciona essa verdade espírita, sustentando que o homem passa pela existência terrena como um viajante que atravessa uma região estranha, aprendendo a vencer por si mesmo as dificuldades, adquirindo experiências para depois avançar em nova direção. Até um cético, como Sartre, viu-se obrigado a admitir que nascemos como seres pré-existentes num plano metafísico, projetando-nos na existência física para fazer uma trajetória de experiências na busca da transcendência, desenvolvendo potencialidades que devem levar-nos à condição divina. Cego de um olho, não conseguiu ver a passagem do ser através da morte e considerou esta como o fim, a frustração dos anseios de transcendência. Mas Martin Heidegger enxergou mais longe e proclamou: “O homem se completa na morte”. Kierkegaard, teólogo dinamarquês protestante, fundador do Existencialismo, entendeu que o homem é o parceiro de Deus na Eternidade e por isso só pode, de fato, comunicar-se com Deus, que é o Outro, no diálogo das almas. O Espiritismo esclarece essas teorias filosóficas ainda confusas, mostrando que a realidade existencial do homem, aqui e no além, pode ser comprovada pelas pesquisas científicas, como na verdade já o foi.
No Centro Espírita as almas frágeis dos rezadores lamurientos encontraram os elementos necessários à recuperação de suas forças, de sua virilidade espiritual, para ressuscitarem-se a si mesmas das cinzas do passado. Percebendo isso de maneira vaga, envoltos ainda nas brumas de um misticismo igrejeiro, muitos espíritas querem transformar os Centro em escolas simplórias, retirando-lhes a prática espírita tradicional ou despindo-os de seus elementos fundamentais, que são as manifestações mediúnicas. Essa é uma tentativa de repetir no Espiritismo a supressão do culto pneumático, ou seja, as sessões mediúnicas em que se realizam os diálogos da doutrinação de encarnados e desencarnados. É esse um equivoco proveniente da ignorância da Doutrina ou do seu conhecimento superficial. Por outro lado, há nessa tentativa a influência do instinto de imitação, que leva criaturas afoitas a quererem renovar o Espiritismo, num tempo em que tudo se renova. Não, percebem, esses espíritas renovadores, que tudo se renova num mundo em que o Espiritismo é a fonte e a mola de todas as renovações. Se toda a cultura terrena está abalada e se renova, é porque estava errada e precisa ser corrigida. Mas o Espiritismo antecipou, nos seus postulados, todas essas renovações, previu-as, anunciou-as e até mesmo delineou-as, como se pode ver no confronto das novidades atuais com o vasto esquema de transformação oferecido ao mundo pelos Espíritos há mais de um século. Só um setor do conhecimento, nesta hora de transição, não necessita renovações, e esse setor é precisamente o Espiritismo. O que ele exige de nós não é renovação doutrinária, mas apenas expurgo de infiltrações espúrias nos Centros, produzidas pela leviandade de praticantes que se desvairam da orientação doutrinária, adotando atitudes, fórmulas e práticas antiquadas.
O terror místico proveniente de um longo passado religioso de mistérios e ameaças não tem mais razão de ser. Não obstante, encontramos no meio espírita um pesado lastro desse terror em forma de traumatismos inconscientes que geram comportamentos antiespíritas. Chegou-se recentemente a introduzir numa grande instituição espírita paulista o princípio do jejum sexual, mesmo para casais. Marido e mulher deviam privar-se de relações impuras, se quisessem preparar-se para uma vida espiritual superior. O tabu do sexo foi sempre um abantesma nos meios religiosos, mas isso jamais impediu os escândalos e as perversões sexuais que o Apóstolo Paulo já denunciava na Igreja de Corinto. A repressão sexual leva fatalmente a situações patológicas. Sexo é lei, é lei básica da Natureza. Querer suprimi-la é querer suprimir a vida. Condená-la é condenar o homem, a criatura humana, é censurar a Deus que a estabeleceu de maneira irrevogável. Se a relação sexual é pecado, somos todos filhos de pecado. Nada e ninguém nasce por geração espontânea, pois mesmo os vírus hoje indicados como prova dessa forma de geração, resultam de forma sexuais específicas das formações cristalinas. Lei dialética de síntese e reprodução, o sexo influi na manutenção de todo o equilíbrio da Natureza. A função sexual não é apenas reprodutora, mas também diretora do equilíbrio orgânico e psíquico da criatura humana. Estabelecer sistemas de abstinência sexual nos Centros, como forma de comportamento espiritual para os espíritas, é simplesmente negar toda a Doutrina, que tem por fundamentos a evolução humana através da reencarnação, dos processos afetivos entre homem e mulher, da criação e educação dos filhos, da formação familial como célula básica de todas as estruturas sociais e raciais. O celibato religioso contradiz os fundamentos da religião. É uma violência contra as fontes da vida. Apague-se o sexo do mundo e voltaremos aos espaços vazios de mundos mortos na mecânica fria dos tempos anteriores à Gênese. Por isso, a Historia Religiosa está povoada de íncubus e súcubus, os espíritos vampirescos que, durante a Idade Média atormentavam freiras e frades na suposta santidade dos mosteiros e conventos. E ainda hoje a ação desses espíritos se faz sentir por toda parte, em manifestações espantosas que, em geral, permanecem ocultas nos arquivos da pesquisa psíquica mundial.
O Centro Espírita não pode pactuar com esses resíduos criminosos de um passado estúpido. Claro que não se quer o abuso, pois isso é naturalmente condenado pelos princípios espíritas da moral evangélica. Essa moral, como vemos nos textos evangélicos, não é condenatória nem repressiva do sexo. O que ela pretende é moralizar o sexo e não condená-lo ou suprimi-lo.
O ensino de Jesus a Nicodemos: “E preciso nascer de novo”, o caso de Madalena, a cortesã compreendida pelo Mestre, o episódio da mulher adúltera que os hipócritas queriam apedrejar mostram de sobejo que a posição de Jesus em face desse problema era de compreensão e respeito pela condição humana. As almas frágeis do meio espírita devem atirar no caminho a bagagem pesada dessas condenações do passado, sem temer as ameaças do Céu nem entregar-se às fascinações da Terra. O espiritismo esclarece a questão sexual em termos racionais, levando em conta a naturalidade das funções humanas na vida terrena. São criminosos inconscientes os que pretendem implantar no meio espírita sistemas que já mostraram sua inconveniência na própria História do Cristianismo. Assim como o homem não regride na sua evolução, a Ciência Suprema do homem que é o Espiritismo, não pode regredir no seu desenvolvimento, tão penosamente realizado na Terra. Os moralistas de vistas curtas nunca perceberam as conseqüências negativas de sua atitudes. A verdadeira moral não se constitui de proibições absurdas, pois estas são a negação de toda moral, em favor dos grandes surtos de imoralidade.

Livro: O Centro Espírita
Professor Herculano Pires

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