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domingo, 2 de setembro de 2012

Matéria do Livro Estude E Viva

E – Cap. X – Item 16
L – Questão 943
Temas Estudados:
Bondade e discernimento
Compaixão
Necessitados-problemas
Problemas da dor
Provação Justiça
Recuperação
ACIDENTADOS DA ALMA
Compadeces-te dos caídos em moléstia ou desastre, que e apresentam no corpo
comovedoras mutilações. Inclina-te, porém, com igual compaixão para aqueles outros que
comparecem, diante de ti, por acidentados da alma, cujas lesões dolorosas não
aparecem. Além da posição de necessitados, pelas chagas ocultas de que são
portadores, quase sempre se mostram na feição de companheiros menos atrativos e
desejáveis.
Surgem pessoalmente bem-postos, estadeando exigências ou formulando complicações,
no entanto, bastas vezes trazem o coração sob provas difíceis; espancam-te a
sensibilidade com palavras ferinas, contudo, em vários lances da experiência, são feixes
de nervos destrambelhados que a doença consome; revelam-se na condição de amigos,
supostos ingratos, que nos deixam em abandono, nas horas de crise, mas, em muitos
casos, são enfermos de espírito, que se enviscam, inconscientes, nas tramas da
obsessão; acolhem-te o carinho com manifestações de aspereza, todavia, estarão
provavelmente agitados pelo fogo do desespero, lembrando árvores benfeitoras quando a
praga as dizima; são delinqüentes e constrangem-te a profundo desgosto, pelo
comportamento incorreto; no entanto, em múltiplas circunstâncias, são almas nobres
tombadas em tentação, para as quais já existe bastante angústia na cabeça atormentada
que o remorso atenaza e a dor suplicia...
Não te digo que aproves o mal sob a alegação de resguardar a bondade. A retificação
permanece na ordem e na segurança da vida, tanto quanto vige o remédio na defesa e
sustentação da saúde. Age, porém, diante dos acidentados da alma, com a prudência e a
piedade do enfermo que socorre a contusão, sem alargar a ferida.
Restaurar sem destruir. Emendar sem proscrever. Não ignorar que os irmãos transviados
se encontram encarcerados em labirintos de sombra, sendo necessário garantir-lhes uma
saída adequada.
Em qualquer processo de reajuste, recordemos Jesus que, a ensinar servindo e corrigir
amando, declarou não ter vindo à Terra para curar os sãos.
ASPECTOS DA DOR
Os soluços de dor são compreensíveis até o ponto em que não atingem a
fermentação da revolta, porque, depois disso, se convertem todos eles em censura infeliz
aos planos do Céu.
*
A enfermidade jamais erra o endereço para suas visitas.
*
As lágrimas, em verdade, são iguais às palavras. Nenhuma existe destituída de
significação.
*
Somente chega a entender a vida quem compreende a dor.
*
A evolução regula também o sofrimento das criaturas e nelas se evidencia mais
superficial ou mais profunda, conforme o aprimoramento de cada uma.
*
Se você pretende vencer, não menospreza a possibilidade de amargar, algumas
vezes, a aflição da derrota como lição no caminho para o triunfo.
*
Aprende melhor quem aceita a escola da provação, porquanto, sem ela, os valores
da experiência permaneceriam ignorados.
*
A dor não provém de Deus, de vez que, segundo a Lei, ela é uma criação de quem
a sofre.

Livro: Estude e Vida psicografado por Chico Xavier e Waldo Vieira ditados por André Luiz e Emmanuel.

sábado, 1 de setembro de 2012

As matrizes das enfermidades encerram suas genealogias no arcabouço psicossomático

Crônicas e Artigos
Ano 6 - N° 276 - 2 de Setembro de 2012
JORGE HESSEN
jorgehessen@gmail.com
Brasília, DF (Brasil)
 

 
Bethany Jordan, uma adolescente da cidade inglesa de Stourbridge, sofre da Síndrome de Ivemark, caracterizada, também, por problemas cardiovasculares, que é uma síndrome patológica de etiologia desconhecida. (1) Jordan nasceu com alguns de seus órgãos invertidos. O fígado, o intestino e o baço estavam posicionados de trás para frente. O fenômeno foi descoberto em exames de ultrassom enquanto ela ainda estava no útero de Lisa, sua mãe. Na época, os médicos disseram que Jordan teria poucas chances de sobreviver ao parto. A garota Bethany, além de ter os órgãos mal posicionados, também nasceu com outros problemas de saúde, como os dois pulmões que convergiam em um formato, apenas, do pulmão esquerdo, e um buraco no coração. Porém, os pesquisadores se surpreenderam ao constatar que a menina sobrevivera até completar seis anos de idade.

O fato nos leva a cogitações sobre o perispírito, a Lei da Causa e Efeito, reencarnação, suicídio, entre outros assuntos que a Doutrina Espírita nos apresenta. Antes de renascermos, examinando nossas próprias necessidades de aperfeiçoamento moral, muitas vezes, exoramos a limitação psicomotora na nova experiência física, para que essa condição nos induza à ascensão de sentimentos. Solicitamos aos Benfeitores a enfermidade de longa duração, capaz de nos educar os impulsos; esse ou aquele dano físico que nos exercite a disciplina; decidida mutilação que nos bloqueie o arrastamento à agressividade exagerada; o complexo psicológico que nos remova as ideias etc. É a lógica de justiça da Reencarnação, o que nos remete a analisar as patologias congênitas pelo Princípio de Causa e Efeito. Em verdade, já vivemos, aqui na Terra, inúmeras vezes e trouxemos armazenados os registros de nossas aquisições antecedentes e desvarios, quais suportes energéticos em núcleos de potenciação, e, na união do perispírito ao óvulo, espelharam, nessa célula feminina de reprodução, o nível do nosso processo evolutivo.

Nossa posição moral é que originará os renascimentos com anormalidades congênitas ou não. A partir da fecundação do óvulo, sob o comando da lei, o Espírito reencarnante transmite, através da ação do perispírito, a integração da sua própria herança espiritual com o espólio genético dos genitores. A formação do respectivo DNA individualizado – composto de genes dominantes e recessivos – conduzido pelas sagradas Leis da Hereditariedade, provindas do Criador, configurará o novo corpo físico daquele particular Espírito imortal, que "renascerá" conforme o programa, previamente estabelecido e subordinado, inicialmente e voluntariamente, a fatores como família, raça, etnia, nacionalidade, predisposições para determinados estados de saúde ou doença – física ou espiritual – e inúmeras outras especificidades individuais.

O mestre Chico Xavier opinou certa vez: "sobre as reencarnações mais difíceis, lembrando que, muitas vezes, encontramos determinados casos de suicídio, e, às vezes, suicídio acompanhado de homicídio, obrigando o autor a um angustiante complexo de culpa levado para além desta vida e, depois, esse trauma de culpa renascendo com ele, através da reencarnação". (2) O médium de Pedro Leopoldo explica o seguinte: "Muitas vezes, temos encontrado irmãos nossos suicidas que dispararam um tiro contra o coração e que voltam com a cardiopatia congênita ou com determinados fenômenos que a medicina classifica dentro da chamada Tetralogia de Fallow; nós vemos companheiros que quiseram morrer pelo enforcamento e que voltam com a Paraplegia Infantil; nós vemos muitos daqueles que preferiram o veneno e que voltam com más formações congênitas; outras pessoas que violentaram o próprio ventre e que voltam, também, com as mesmas tendências e que, às vezes, acabam desencarnando com o chamado enfarto mesentérico. Nós vemos, por exemplo, aqueles que preferiram morrer pelo afogamento, num ato de rebeldia contra as leis de Deus e que voltam com o chamado enfisema pulmonar. Vemos, ainda, aqueles que dispararam tiros contra o próprio crânio e voltam com fenômenos dolorosos, como, por exemplo, a idiotia, quando o projétil alcança a hipófise; todas essas consequências, porque estamos em nosso corpo físico, mas subordinados ao nosso corpo espiritual. Então, principalmente os fenômenos decorrentes do suicídio, por tiro no crânio, são muito dolorosos, porque vemos a surdez, a cegueira, a mudez, e vemos esse sofrimento em crianças também, o que nos afigura incompatíveis com a misericórdia de Deus, porque nós sabemos que Deus não quer a dor". (3)

Os pesquisadores, que reduzem os fenômenos da vida ao exclusivo universo da matéria densa, insistem em explicar a vida como uma complexa reação química, e nada mais do que isso, prestes a penetrar nos seus profundos mistérios e propiciar a sua criação pela mão do homem, assim como, até hoje, creem ser o pensamento mera excreção do cérebro e que todas as funções psíquicas morrem com o corpo físico. Os fenômenos vitais não podem ser atribuídos à exclusiva ação mecânica da hereditariedade genética, no comando da montagem dos três bilhões de nucleotídeos que constituem os degraus do DNA humano. Infelizmente, "não há ainda lugar para o espírito na ciência pesquisacional acadêmica, empírico-indutiva, a qual, por isso, continua tomando como causa o que é efeito, fazendo das leis da hereditariedade genética as únicas presentes ao ato da vida, juízas exclusivas e inconscientes do futuro patrimônio apolíneo e saudável, ou disforme e enfermiço do ser humano, apenas concedendo algumas influências aos efeitos ambientais e ao psicossomatismo, ainda que cerebral, calcadas nas predisposições genéticas". (4)

As matrizes das moléstias têm suas raízes na estrutura do psicossoma. Ainda que esteja aparentemente saudável, uma pessoa pode trazer, nos seus Centros Vitais (chacras para os hindus), disfunções latentes adquiridas nesta ou em outras vidas, que, mais cedo ou mais tarde, virão à tona no corpo físico, sob a forma de doenças mais ou menos graves, conforme a extensão da lesão e a posição mental do devedor. Somos herdeiros de nossas ações pretéritas, tanto boas quanto más. O "Carma" (5) ou "conta do destino criada por nós mesmos" está impresso no corpo psicossomático. (6) Esses registros fluem para o corpo físico e culminam por determinar o equilíbrio ou o desequilíbrio dos campos vitais e físicos. "Só o reconhecimento – que um dia chegará – da primazia do espírito sobre a matéria, associada essa primazia ao princípio reencarnacionista, isto é, a integração da herança espiritual à hereditariedade genética, comandada pelo Espírito, via perispírito, regida pela Lei de Causa e Efeito, é que permitirá que se identifiquem, no Espírito imortal, as causas verdadeiras dos desequilíbrios que eclodem no corpo físico, mata-borrão e fio-terra que ele é, sob o nome de doenças, incluindo-se os distúrbios da psique humana." (7)

Quando forem descobertas tecnologias muito mais sofisticadas, que nos possibilitem um exame aprofundado da estrutura funcional do perispírito, a medicina transformar-se-á, radicalmente. Os hospitais, possuindo instrumentos de altíssima resolução, muito além daqueles que existem hoje, os diagnósticos serão, inequivocamente, precisos, o que possibilitará a cura real das doenças. Os profissionais da saúde trabalharão muito mais de forma preventiva, evitando, assim, por exemplo, as intervenções cirúrgicas alargadas, invasivas, realizadas, abusivamente, nos dias de hoje. Os médicos terão oportunidade de conhecer, com detalhes, a estrutura transdimensional do corpo perispiritual, compreendendo melhor o modo como se imbricam as complexas estruturas do psicossoma, nas chamadas sinergias, para melhor auxiliar na terapia e manutenção da saúde mento-física-espiritual de seus pacientes.
 

Referências bibliográficas:

(1) A Síndrome de Ivemark consiste de más formações de diferentes órgãos, e a expectativa de vida depende de como cada órgão, principalmente o coração, é afetado.

(2) Xavier, Francisco Cândido. Pinga Fogo, São Paulo: Ed. Edicel, 1975.

(3) idem.

(4) Artigo de Raphael Rios, intitulado Lei de Causa e Efeito, determina os Efeitos da Hereditariedade usando os Registros do Perispírito, publicado na Revista Internacional de Espiritismo – dez/2000.

(5) Carma, ou Karma (do sânscrito karman, em pali, kamma), significa ação. O termo tem um uso religioso dentro das doutrinas budista, hinduísta e jainista. Foi posteriormente utilizada também pela teosofia, pelo Espiritismo e por um subgrupo significativo do movimento New Age.

(6) Sugerimos leitura do livro Ação e Reação, ditado pelo Espírito André Luiz, todo ele dedicado ao estudo do compromisso cármico das vidas sucessivas.

(7) Artigo de Raphael Rios, intitulado Lei de Causa e Efeito, determina os Efeitos da Hereditariedade usando os Registros do Perispírito, publicado na Revista Internacional de Espiritismo – dez/2000.

Quebrando a Casca

Artigo extraído do livro "Horizontes da Vida", pelo Espírito Miramez - 2ª Edição - Ano 1991 - Editora Espírita Cristã Fonte Viva.

Em se falando de conhecimento espiritual, estamos envolvidos em um cascão grosseiro, que não deixa passar para o consciente as mensagens elevadas, cujas interpretações, por isso, sempre são deficientes. Para surgir do ovo, o pinto luta com todo o seu esforço, e, em muitos casos, precisa da ajuda da mãe, embora esse trabalho seja dele.

A vida, mesmo quando começa, exige esforço próprio daquele que vai viver os caminhos do mundo; ela se nos apresenta como que um empório, no qual devemos penetrar passo a passo, observando as condições e reunindo experiências. Podemos observar certos exemplos da natureza, em que podemos nos estribar com segurança: ainda que alguém coloque o alimento em nossa boca, nós é que temos de mastigá-lo e engoli-lo; se alguém nos oferece água para beber, somente nós é que temos condições de sorvê-la; os olhos são usados por nós, os pensamentos se expressam em forma de palavras, que temos de nos esforçar para articulá-las. Compreende-se daí que o esforço próprio haverá de ser acionado pelos nossos próprios impulsos. Cada um carrega a sua cruz e sobe o seu próprio calvário, porque a glória, em todos os rumos da vitória, é também de cada um.

A vida universal acionada pelas leis de Deus nos mostra uma graduação de valores espirituais, porém, não deixa de nos apontar o preço que deve custar. Se já conquistamos valores morais no tempo que nos foi confiado, não devemos alardear, como se estivéssemos em busca de glórias efêmeras; Alguém, no mais alto, se encarrega disso com sabedoria e desvelo. O nosso dever é realizar o melhor na cidade do coração, sem o azinhavre do egoísmo. Compete a todos nós aumentar a nossa fé, pois ela é produto da consciência do bem em que devemos permanecer, e dos valores morais que a nossa vida deve mostrar no silêncio. Apregoar o que fazemos de bom é desmerecer a grandeza da benevolência; toda exibição preconcebida se desmoraliza breve, principalmente quando não existe segurança moral do exibidor.

Avancemos fronteiras para alcançarmos horizontes mais amplos da vida, sem debitar na consciência os estragos do exibicionismo falso. O verdadeiro sábio não se desespera, não anda em carreira com seus deveres ante a vida, mas também não pára, nem distrai sua atenção rumo às realidades, por saber, pelo Evangelho, que quem perseverar até o fim será salvo.

Estamos sempre envolvidos em diversos cascões do orgulho e do egoísmo, donde são gerados todos os males da humanidade e, se estamos nascendo para a vida maior, é de nosso dever quebrá-los, na seqüência que o tempo nos pede, para respirarmos novas vidas e colhermos experiências diferentes, o que nos dá grandes esperanças.

A Terra é uma prisão, no entanto, ela pode ser uma porta para a espiritualidade maior, dependendo do modo que entendermos as lições; o mundo atual se encontra enriquecido de lições de porte dos mais elevados, que existem em planos distantes do planeta. E muitos clamam, em súplicas demoradas, pedindo aos Céus que enviem santos e sábios para ensinar-lhes, sem saber que se encontram entre muitos mestres, que sofrem para que a humanidade se eleve.

Os seres humanos andam a procura de atalhos e coisas fáceis, esquecendo-se que Jesus, o Governador da Terra, passou por caminhos estreitos, cheios de espinhos, nasceu no meio da ignorância, onde os condicionamentos da maldade eram tantos que chegavam a ponto da autodestruição, para garantir os erros milenares de sacerdotes ultrapassados em matéria de interpretações das leis do Divino Doador do universo.

Na verdade, devemos desconfiar das coisas fáceis, da bajulação e dos próprios impulsos de autopromoção. Para subir, é necessário crescer; para crescer é indispensável sacrifício e o sacrifício útil é aquele que se refere à suspensão das paixões inferiores.

Quebremos a casca do ovo interno em que estamos envolvidos, pela prisão da ignorância, que depois disso poderemos ver as estrelas brilharem com todos os sóis, nos céus da consciência.

E a Luz se Fez...

Artigo publicado no jornal Unificação - Ano XIII - Outubro de 1965 - Número 151

“ Enquanto tendes luz, crede na luz, para que sejais filhos da luz.
E ainda que tenha feito tantos sinais diante deles, não criam nele”.
(João, 12: 36-37).

“ E eis que lhes apareceram Moisés e Elias, falando com ele.
E Pedro, tomando a palavra, disse a Jesus: Senhor, bom é estarmos aqui; se queres, façamos aqui três tabernáculos, um para ti, um para Moisés, e um para Elias.
E estando ele ainda a falar, eis que uma nuvem luminosa os cobriu. E da nuvem saiu uma voz que dizia: “Este é o meu amado Filho, em quem me comprazo: escutai-o”.
E os discípulos, ouvindo isto, caíram sobre seus rostos, e tiveram grande medo.
E aproximando-se Jesus, tocou-lhes, e disse: Levantai-vos; e não tenhais medo.
E erguendo eles os olhos, ninguém viram senão unicamente a Jesus.
E, descendo eles do monte, Jesus lhes ordenou, dizendo: A ninguém conteis a visão, até que o Filho do homem seja ressuscitado dos mortos.
E os seus discípulos o interrogaram, dizendo: Por que dizem então os escribas que é mister que Elias venha primeiro?
E Jesus, respondendo, disse-lhes: Em verdade Elias virá primeiro, e restaurará todas as coisas.
Mas, digo-vos que Elias já veio, e não o conheceram, mas fizeram-lhe tudo o que quiseram. Assim farão eles também padecer o Filho do homem.
Então entenderam os discípulos que lhes falara de João Batista”.
(Mateus, 17: 1-13).

No Livro de Malaquias (4:5) está contida a profecia: “E eis que vos envio o profeta Elias antes que venha o dia grande e terrível do Senhor”.
Fundamentados nessa predição, os judeus, e entre eles os apóstolos, compartilhavam da crença de que Elias seria o precursor de Jesus Cristo.
Por conformismo com os ditames da religião oficial ou por desconhecerem o mecanismo das vidas sucessivas, não souberam, entretanto, ver em João Batista a reencarnação do próprio Elias e, conseqüentemente, não se compenetrando de que o Precursor já estava entre eles, passaram implicitamente a ignorar que na personalidade inconfundível do Mestre estava o prometido e tão esperado Messias.
No desenrolar da majestosa manifestação espiritual ocorrida no Monte Tabor, narrada em Mateus, 17:1-13, os apóstolos tiveram a oportunidade de ver Jesus se transfigurar, o seu rosto se resplandecer como o sol e os seus vestidos se tornarem brancos como a luz. Não obstante isto, ouviram ainda o fenômeno de voz-direta que ressoou no espaço confirmando: “Este é o meu amado Filho, em quem me comprazo, escutai-o”, propiciando-lhes uma inequívoca prova de identidade do Mestre.
Entretanto, descendo do Tabor, a dúvida começou a solapar a convicção íntima dos apóstolos:
- Se ele é o Messias, Elias deveria estar encarnado!
- Como se explica vir o Espírito de Elias confabular com ele?
- Não dizem as escrituras que na frente do Messias viria Elias?
- Se Elias é Espírito somente, podem persistir duas alternativas: ou este não é o Cristo ou as escrituras falharam!
Podem as escrituras falhar em coisas tão transcendentais?
E o bichinho roedor da dúvida começou a solapar a fé dos assessores mais imediatos do Cristo.
Porém, o Mestre não se preocupou com as idéias conflitantes dos seus discípulos. A luz se faria dentro em breve.
E, realmente, a revelação de toda a verdade não tardou... Timidamente, um dos discípulos aventurou a indagação: Mestre! Como é que as predições das escrituras revelam que Elias deveria vir primeiro?
E o Messias, lançando o seu olhar fraternal, obtemperou: “Eu vos digo em verdade que Elias já veio e os homens fizeram dele tudo o que quiseram”.
E a luz se projetou como relâmpago. As mentes dos discípulos iluminaram-se com a compenetração de toda a verdade: “E então, compreenderam que era de João Batista que ele falava”.
Indubitavelmente, até mesmo os Espíritos mais elevados, quando em missão na Terra, sob o império da carne, vacilam muitas vezes diante dos fatos mais convincentes. E foi isso o que sucedeu com os apóstolos.
Todos os fenômenos operados por Jesus Cristo, todas as curas por ele produzidas, todos os ensinamentos transcendentais emanados de sua boca, não haviam sido suficientes para provar aos apóstolos que ali estava de fato o Messias Prometido. A despeito de tantos sinais operados diante de todos, os seus contemporâneos duvidavam de sua autoridade e mesmo os apóstolos alimentavam em seus corações alguns resquícios de vacilação.
O apego às letras das escrituras falava mais alto, a ponto de ofuscar a convicção de que na verdade estavam face-a-face ao Cristo de Deus.
Confirmando que João Batista era o Elias que havia de vir, o Mestre legou à Humanidade a mais decisiva e robusta prova sobre a lei da Reencarnação. A lei das vidas sucessivas ficou demonstrada de modo insofismável, propiciando também a seus discípulos se compenetrarem de que as verdades veladas das escrituras jamais podem ser interpretadas sem o bafejo do Espírito que vivifica.
Aqueles que se apegam à letra que mata têm a viva demonstração daquilo que afirmamos. Se o Nazareno não tivesse elucidado ser João Batista uma reencarnação do Espírito do Profeta Elias, seus pósteros passariam a esposar uma falsa opinião sobre a questão, conseqüentemente, não se pode ter apego à letra que mata sob pena de se defrontar com a dura contingência de caminhar por uma senda escusa que levará, inapelavelmente, a situações embaraçosas e a conceituações eivadas de falhas.
Até João Batista, que no dizer do Cristo foi “o maior dentre os nascidos de mulher”, se enquadrou entre os que viram os sinais, mas não se compenetraram completamente da verdade.
Realmente o precursor, quando viu Jesus Cristo pela primeira vez, nas margens do rio Jordão, teceu uma série de elogios ao Mestre afirmando ser ele o Cordeiro de Deus e acrescentando não ser digno de desatar suas sandálias. Não bastasse isso, viu o Espírito descer sobre o Cristo sob forma de pomba, seguido de fenômeno da voz direta que como trovão ressoou: “Este é meu Filho amado em quem me comprazo”.
Não obstante, apesar de todas essas manifestações que corroboraram a identidade do Filho de Deus, quando nas masmorras de Herodes, João enviou seus discípulos para se certificarem “se Jesus era realmente o Cristo ou se ele deveria esperar algum outro?”.

Paulo Alves de Godoy

Lições Espirituais: Obsessão

Artigo publicado no século 18, no jornal "O Paiz", no Rio de Janeiro

Já como temos provado que do espaço nos vêm revelar espíritos, que foram nossos conhecidos em vida; que não há nisso fraudes satânicas, porque Satã é uma invenção humana, temos a questão das comunicações espíritas colocadas em condições idênticas para o materialista, para o católico, para todo ser racional, os quais não procuram fugir ao conhecimento da Verdade.
Posto isto, a Verdade das manifestações dos mortos não é hoje um mistério; é patente a quem quiser ver, como temos dito e repetido à sociedade.
O mais refratário, se fizer a experiência, será convencido, porque dia-a-dia colherá diversas provas de ser o espírito desencarnado quem se manifesta.
Por este modo, teremos provado experimentalmente: 1º) que existe o espírito; 2º) que o espírito sobrevive à morte do corpo; 3º) que, separado do corpo, continua, ou pode continuar, em constante comunicação com os vivos.
Entretanto, cumpre fazer notar que o “eu” humano, desembaraçado da prisão corpórea, adquire maior lucidez para descortinar os horizontes da criação, cada um na esfera de seu progresso.
Assim ensinam as comunicações de além-túmulo; estas mostram criaturas, que foram estúpidas e ignorantes na vida, dando, do espaço, provas de muita compreensão e saber.
As lições dos espíritos têm, pois, um alcance que não pode ser comparado ao das lições dos nossos sábios terrenos: primus, (primeiro) porque eles falam o que vêm; sécundus, (segundo) porque os sábios da Terra falam o que conjecturam.
É desnecessário dizermos que nos referimos às coisas do mundo invisível ou dos espíritos.
A palavra dos espíritos tem, portanto, tanta ou maior autoridade sobre as coisas da outra vida, como tem a do sábio sobre as coisas da Ciência que professa.
Podem, ambos, enganar-se, mas ali está o corretivo que é o criterium (critério) absoluto da Verdade.
Além de que, tratando-se de um fato que afeta, pessoalmente, todos os espíritos, isto é, o de terem eles tido mais que uma existência, seu depoimento é de visu, (por ter visto) quando o parecer do sábio é baseado em conjecturas e provas indiretas.
Se, pois, não um, porém muitos, mas se todos os espíritos afirmarem que têm tido mais de uma experiência corpórea, a lei das reencarnações tem, ipso facto, (por isso mesmo) passado pela prova experimental.
A Doutrina Espírita é a codificação dos ensinos dados aos homens pelos espíritos desencarnados, que se dizem mensageiros das Verdades prometidas pelo Cristo a seus discípulos.
Nessa Doutrina, firmada no ensino dos espíritos reveladores, está o principio da pluralidade das existências, sem a qual, como foi demonstrado no principio desta exposição, nada se pode explicar da vida humana, sem se ferirem os divinos atributos.
Daí, vem-nos um valioso testemunho, uníssono e autorizado pela superioridade dos espíritos que o deram.
Como, porém, nosso fim, hoje, não é apelar para a autoridade de quem quer que seja, mas, sim, dar uma prova experimental ao alcance de quem quiser observar, falaremos do que temos visto e pode ser visto por quem duvidar.
O estudo das obsessões, se não aceitarmos o ensino que nos vêm dar os luminares do espaço, é o que mais, eficazmente, separa a questão.
Trata-se de uma moça de família muito conhecida na grande roda da Corte, e sofre perseguição da parte de um espírito perverso, o qual a levou ao estado de loucura.
Um dia, o espírito da pobre vítima desprende-se, momentaneamente, do corpo, que jaz em sono, e vai a um Centro manifestar suas dores e pedir proteção.
Ali conta a sua história, que é a seguinte:
“Há séculos era eu uma moça cristã, devotada à caridade, por índole, e porque seguia os exemplos de meu bom pai:
Um homem (dá o nome) abusou de minha inocência, e, coagido por meu pai, reparou o mal que me fez, porém me tratou de modo a reduzir-me ao desespero.
Por fim, levou sua danação a abusar da própria filha, de minha filha, que era a minha única felicidade!
Tinha resistido a tudo; mas aquele golpe prostrou-me; arrastou-me ao suicídio.
Sofri no espaço castigos indescritíveis, até que Deus foi servido compadecer-se de mim, dando-me outra existência, para nela eu reparar as faltas do passado.
Prometi fazê-lo, mas não tive a força de cumprir o que prometi.
Degradei-me a ponto de fazer-me à favorita do rei; mas não foi isso o pior. O pior foi ter abusado de meu poder para fazer mal aos meus inimigos, e, especialmente, ao que fora meu marido.
Morri nesse estado de reincidência e sofri torturas atrozes, até que, arrependida, obtive a graça da presente encarnação para resgatar por boas obras meu negro passado.
Minha missão foi sofrer tanto quanto fiz sofrer e hoje tremo em pensar que ainda posso desfalecer”
Aquele desgraçado espírito que, sem nenhum interesse, contou-nos a história de três das suas existências corpóreas, deixou-nos consternados.
Imediatamente, o obsessor, aquele que perseguia a pobre moça, para se vingar do mal que lhe fizera a favorita, apareceu pelo mesmo médium, jurando fazer o mal à sua vitima até a morte, e dizendo a razão de tanto ódio.
O que ele contou conferia, exatamente, com o que ela havia contado!
Qual o positivista que poderá resistir a uma prova destas, e a três e quatro provas iguais, se tanto julgar preciso?
Há, por aí, mais de um grupo que faz trabalhos de obsediados.
Não faltam, pois, a quem tiver boa vontade, meios de verificar por si a exatidão de nossos estudos experimentais.
Indicamos, de preferência, os trabalhos de obsessões, porque por eles a prova é certa, visto que a obsessão é sempre obra de vingança por ofensas de uma vida anterior.
Aí, o observador não tem muito que esperar.

Aritgo escrito por Bezerra de Menezes quando ainda encarnado.

Texto retirado do site Irmã Clara


A Mediunidade e a História


Artigo publicado na Revista Internacional de Espiritismo, Novembro de 1968.

Pode a mediunidade influir na vida e nas atitudes históricas de certos homens públicos? Claro que pode. É verdade que os estudiosos e eruditos, na maioria, ainda não levaram em conta a participação do fator mediúnico na História. No entanto, há muitos fatos, e dos mais significativos, demonstrando que a mediunidade teve influência, às vezes decisiva, em determinados acontecimentos. São os tais fatores imponderáveis, a que os historiadores ainda não deram a devida importância. Mas a verdade é que alguns homens ilustres – guerreiros, condutores de massas e chefes de Estado – tiveram visões, receberam avisos do Alto, e houve casos em que, devido à interferência de espíritos, certos homens modificaram as suas posições ou tomaram outras direções, em momentos agudos da História.
Nem precisamos falar em Nabucodonosor, no Império Romano e noutras épocas da História antiga. Temos, aqui perto, um exemplo frisante: Abraham Lincoln, nos Estados Unidos. Quem é, hoje, que não sabe que o grande Presidente dos Estados Unidos fazia sessões mediúnicas no próprio Palácio? Pois bem, a mediunidade tem um papel importante na História política e social daquele país. Bastaria lembrar a repercussão que teve a Cabana do Pai Tomás na abolição da escravatura. E o Alto não trabalhou ali? Não foi um livro de inspiração extra-humana? E esse livro, ainda hoje lido e apreciado, não teve ação profunda na transformação sócio-política dos Estados Unidos?
São fatos históricos em que se verifica, de um modo bem positivo, a projeção da mediunidade, ora no encaminhamento, ora na solução de grandes crises nacionais. Muita gente nem sequer pensa nisto. E há quem diga, displicentemente, quando se fala nestas “coisas”; os espíritos, se eles existem mesmo, nada têm a ver com a História... Pois fiquem sabendo que os espíritos, os chamados mortos, tem a sua parte na formação da História.
Vejamos o caso de Lincoln. A este respeito, eu me permitiria simplesmente recomendar a leitura de um livro oportuníssimo, e que já está em circulação, graças ao louvável esforço da Casa Editora O Clarim, de Matão, Estado de São Paulo. O Livro chama-se Sessões Espíritas na Casa Branca, de autoria de Nettie Colburn Maynard e traduzido pelo nosso confrade Wallace Leal V. Rodrigues. Diversos episódios, inclusive a tragédia em que iria tombar o glorioso homem público norte-americano, foram previstos e devidamente confirmados.
O próprio ato de emancipação dos escravos, que foi, sem dúvida, um dos maiores acontecimentos, não apenas da História dos Estados Unidos, mas da própria História da América, tem relação direta com o mundo espiritual. Pouco importa que as Histórias oficiais, escritas muitas vezes para atender a convenções e conveniências, não se preocupem com este aspecto; mas o fato está documentado, e é quanto nos basta.
O livro de Nettie Colburn Maynard traz uma contribuição inestimável, porque revela particularidades impressionantes na vida de Lincoln, principalmente em sua carreira política, mostrando como essas particularidades tiveram influência no problema da escravatura e, por fim, noutras decisões notáveis. Dá, portanto, uma versão diferente de tudo quanto se escreveu, até hoje, no estilo convencional, sobre Abraham Lincoln e o seu fecundo e humanitário governo.
Não quero nem posso fazer comentários sobre o livro; em primeiro lugar, porque precisaria de muito espaço, talvez para dois ou três artigos; em segundo lugar, porque o melhor é deixar que o leitor conheça o livro e veja por si mesmo que a mediunidade é também um fator na História, queiram ou não queiram os indiferentes. Desejo, porém, pedir a atenção daqueles que vierem a ler Sessões Espíritas na Casa Branca, para a última parte, que é um trabalho de pesquisa e compilação de Wallace Leal Rodrigues.
Além de haver traduzido a obra, no que prestou excelente serviço à literatura espírita, Wallace Rodrigues ainda ofereceu uma contribuição pessoal, reunindo elemento de pesquisa histórica, demonstrando que outros presidentes dos Estados Unidos, e não apenas Lincoln, também tiveram as suas experiências mediúnicas, independentemente de suas crenças religiosas. E vem a lista, por ordem cronológica: George Washington, Millard Fillmore, W. Wilson, Roosevelt, Truman, Eisenhower. O trabalho de Wallace Rodrigues confirma, portanto, a assertiva de que a mediunidade tem influência na História.
Não seria justo registrar o aparecimento de um livro, e livro de tal ordem, sem uma referência especial à Editora. Os discípulos de Cairbar Schutel não arriaram a bandeira que ele deixou de pé, e bem alta. A Casa Editora O Clarim é uma forja de trabalho, ainda inspirada no exemplo de Cairbar. Agora mesmo, para comemorar o centenário do nascimento de Cairbar Schutel, em 22 de setembro, a Editora está lançando obras de grande utilidade. Ultimamente, saíram dois livros de Allan Kardec, aliás, bem pouco conhecidos no próprio meio espírita: Viagem Espírita em 1862 e Instruções práticas sobre as manifestações espíritas. (Este pequeno livro procedeu, O Livro dos Médiuns e, com este título, tomou feição definitiva).
Há, em Matão, um grupo de trabalhadores abnegados, um núcleo de idealistas, em cuja alma está sempre acesa a chama que Cairbar sustentou com amor, com sacrifício, com dignidade e humildade. O Brasil espírita precisa conhecer melhor a obra que se realiza em Matão. Manter uma editora espírita, nesta época, é ter muito amor à Causa.
Venho dizendo e repetindo que as editoras espíritas precisam de apoio cada vez maior, porque não são empresas comerciais no sentido comum; são organizações que têm objetivos diferentes, embora tenham à sua parte comercial, que é indispensável. É preciso ver as nossas editoras, nunca pelo lado exclusivamente comercial, que é apenas uma contingência terrena, mas pelo lado doutrinário, pelos frutos que elas espalham, instruindo, edificando, iluminando.
Em matéria editorial, no meio espírita, as edições de O Clarim já formam, hoje, um patrimônio apreciável, sobretudo pela preocupação, que sempre tiveram os seus dirigentes, de publicar a Doutrina em sua pureza, ou imprimir obras que realmente correspondem aos mais legítimos interesses da Doutrina. Uma prova disto é o fato de haver tomado a bem inspirada iniciativa de mandar traduzir e publicar Sessões Espíritas na Casa Branca. O esforço do infatigável tradutor e da Editora precisa e deve ser bem correspondido, porque é um serviço de natureza mais espiritual do que propriamente humana, uma vez que a leitura desse livro vai abrir novos rumos na alma daqueles que, ainda tendo dúvidas sobre a imortalidade espiritual, irão encontrar, na vida de Lincoln, provas convincentes de que os mortos sempre influíram e continuam influindo nos vivos.

Deolindo Amorim
Texto retirado do site Imã Clara

O Espiritismo e a Definição de Kardec


Artigo publicado pela :


Revista Internacional de Espiritismo:


Junho de 1954 - Número 5.


Dentro da definição que lhe deu Allan Kardec, o Espiritismo tem, ao mesmo tempo, um aspecto geral, como filosofia espiritualista, e os aspectos particulares, que são inerentes a seu caráter e sua organização. Quem o diz é o próprio Allan Kardec, na Introdução de O Livro dos Espíritos, ao ensinar que “todo espírita é espiritualista, mas nem todo espiritualista é espírita”. Realmente, há muitos espiritualistas que, embora admitam o fenômeno de além-túmulo, não aceitam os postulados do Espiritismo. São espiritualistas, mas, na realidade, não são espíritas.
Estas noções iniciais são muito conhecidas dos adeptos do Espiritismo, mas a verdade é que muitas pessoas julgam mal o Espiritismo, exatamente porque não conhecem as noções elementares da Doutrina. Daí, portanto, a necessidade, não mais para os espíritas, mas para o elemento leigo, de certos rudimentos indispensáveis a respeito do Espiritismo, sua definição, seu caráter, seus métodos, suas conseqüências.
O fenômeno, como se sabe, é o ponto de partida, tanto do Espiritismo, como de todas as escolas e correntes que se preocupam com o além-túmulo. É de notar-se, porém, que nem todos os que se dedicam à experimentação mediúnica entram nas indagações de ordem filosófica. Sob este ponto de vista, é claro que o Espiritismo ultrapassa a experimentação pura e simples, porque, além de tratar, também, da origem do fenômeno, tira conseqüências morais de grande influência, tanto na vida particular, como na vida social. Justamente por isso, foi que Allan Kardec definiu o Espiritismo como uma ciência que trata da origem e do destino dos espíritos, assim como de suas relações com o mundo terreno.
Aí estão, implicitamente, os três pontos básicos: a origem e o destino dos espíritos são questões transcendentais, de alta filosofia; a relação dos espíritos com o mundo terreno é assunto da ciência experimental, porque são os fenômenos que provam essas relações; o aspecto moral, porém, é fundamental para o Espiritismo. De que serve a experimentação apenas como assunto de curiosidade? De que serve entrar em comunicações com os espíritos ou provocar fenômenos, sem tirar desses fenômenos o que é essencial para o refinamento dos costumes, para a reforma interior do homem?
Para muita gente, Espiritismo é apenas fenômeno; mas quem conhece um pouco da Doutrina sabe muito bem que não é assim. Para certas escolas, por exemplo, o fenômeno é o fim, ao passo que para o Espiritismo o fenômeno é um meio. Mas, meio de quê? Meio de aperfeiçoamento, elemento de convicção para a aceitação da vida futura e, conseqüentemente, caminho para a crença em Deus.
Enquanto certos experimentadores levam anos e anos observando e provocando fenômenos, sem tirar conclusão alguma acerca dos altos e importantes problemas da vida futura e do destino humano, o experimentador espírita, quando bem orientado pela Doutrina, parte do fenômeno, sobe à indagação dos porquês, que é o terreno da filosofia e, depois, faz as necessárias aplicações à vida prática, isto é, ao comportamento do homem, às atitudes privadas e públicas, aos padrões de moralidade que a condição de espírita exige em qualquer situação. A não ser assim, a experimentação, por si só, é assunto simplesmente de curiosidade.

Deolindo Amorim.

Texto retirado do site- Irmã Clara.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Swedenborg


Revista Espírita, novembro de 1859
Swedenborg é um desses personagens mais conhecidos de nome do que de fato, ao menos
para o vulgo; suas obras muito volumosas, e em geral muito abstratas, não são muito lidas
senão pelos eruditos: também a maioria daqueles que dele falam ficaria muito embaraçada
para dizer o que ele era Para uns, foi um grande homem, objeto de uma profunda veneração,
sem saber por quê: para os outros, foi um charlatão, um visionário, um taumaturgo. Como
todo homem que professa idéias que não são as de todo o mundo, quando essas idéias,
sobretudo, ferem certos preconceitos, ele teve, e tem ainda, seus contraditores, se estes
últimos se limitaram a refutá-lo, estavam em seu direito; mas o espírito de partido nada
respeita, e as mais nobres qualidades não têm graça diante dele: Swedenborg não poderia
ser exceção. Sua doutrina, sem dúvida, deixa muito a desejar: ele mesmo, hoje, está longe
de aprová-la em todos os pontos. Mas, por refutável que seja, não permanecerá menos como
um dos homens mais eminentes de seu século. Os documentos seguintes foram tirados de
interessante notícia comunicada pela senhora P.... à Sociedade Parisiense de Estudos
Espíritas.
Emmanuel Swedenborg nasceu em Stockholm, em 1688, e morreu em Londres, em 1772,
com a idade de 84 anos. Seu pai, Joeper Svedenborg, bispo de Skava, era notável por seu
mérito e por seu saber; mas seu filho suplantou-o de muito; ele sobrepuja em todas as
ciências, e sobretudo na teologia, na mecânica, na física e na metalurgia. Sua prudência, sua
sabedoria, sua modéstia e sua simplicidade valeram-lhe a alta reputação da qual goza ainda
hoje. Os reis o chamaram em seus conselhos. Em 1716, Charles XII nomeou-o assessor ao
Colégio metálico de Stockholm; a rainha Ulrique tornou-o nobre, e ele ocupou os postos mais
honrosos com distinção até 1743, época em que teve sua primeira revelação espírita. Tinha
então a idade de 55 anos e demitiu-se, não querendo ocupar-se senão de seu apostolado e
do estabelecimento da doutrina da Jerusalém nova. Eis como ele mesmo conta a sua primeira
revelação:
"Eu estava em Londres, onde jantei muito tarde, em minha estalagem ordinária, onde
reservara um quarto para ter a liberdade de nele meditar à vontade. Sentia-me pressionado
pela fome e comi com bom apetite. No fim do repasto, percebi que uma espécie de nevoeiro
se derramava sobre os meus olhos, e vi o soalho de meu quarto coberto de répteis
horrendos, tais como serpentes, sapos, lagartas e outros; fui tomado, tanto mais que as
trevas aumentavam, mas logo elas se dissiparam; então vi claramente um homem no meio
de uma luz viva e radiante, sentado num canto do quarto; os répteis haviam desaparecido
com as trevas. Eu estava só: julgai o pavor que se apoderou de mim, quando o ouvi
pronunciar distintamente, mas com um tom de voz bem capaz de imprimir o terror "Não
coma tanto!" A essas palavras, minha vista se obscureceu, mas se restabeleceu, pouco a
pouco, e vi-me só no meu quarto. Ainda um pouco assustado com tudo o que vira, tomei com
pressa à minha casa, sem dizer nada a ninguém do que me tinha acontecido. Ali, entregueime
às minhas reflexões, e não concebi que isso fora o efeito do acaso ou de alguma causa
física.
"Na noite seguinte, o mesmo homem, radiante de luz, se apresentou ainda diante de mim e
me disse: "Eu sou Deus, o Senhor, criador e redentor: eu te escolhi para explicar aos homens
o sentido interior e espiritual da Escritura Santa; eu te ditarei o que deves escrever."

"Dessa vez, não fiquei muito assustado, e a luz, embora viva e resplandecente, da qual
estava cercado, não produziu nenhuma impressão dolorosa sobre os meus olhos; ele estava
vestido de púrpura, e a visão durou um bom quarto de hora. Nessa mesma noite, os olhos do
meu homem interior foram abertos e dispostos para verem no céu, no mundo dos Espíritos e
nos infernos, e encontrei, por toda parte, várias pessoas de meu conhecimento, algumas
mortas há muito tempo, outras há pouco. Desde esse dia, renunciei a todas as ocupações
mundanas para não trabalhar senão nas coisas espirituais, para me conformar à ordem que
para isso recebera. Freqüentemente, ocorreu-me, na continuação, ver os olhos do meu
Espírito abertos, e de ver em pleno dia o que se passava no outro mundo, de falar aos Anjos
e aos Espíritos como falo aos homens."
Um dos pontos fundamentais da doutrina de Swedenborg repousa sobre o que ele chama as
correspondências. Segundo ele, o mundo espiritual e o mundo natural estão ligados entre si,
como o interior e o exterior, e disso resulta .que as coisas espirituais e as coisas naturais
fazem uma só, por influxo, e que há, entre elas, correspondência. Eis o princípio; mas o que
se deve entender por essa correspondência e esse influxo, é o difícil de compreender.
A Terra, diz Swedenborg, corresponde ao homem. Os diversos produtos que servem para
alimentar os homens, correspondem a diversos gêneros de bens e de verdades, a saber os
alimentos sólidos a gênero de bens e os alimentos líquidos a gênero de verdades. A razão
corresponde à vontade e ao entendimento, que constituem o mental humano. Os alimentos
correspondem às verdades e às falsidades, segundo a substância, a cor e a forma que
apresentam. Os animais correspondem às afeições; aqueles que são úteis e dóceis, às
afeições boas; e aqueles que são nocivos e maus, às afeições más; os pássaros dóceis e
belos às verdades intelectuais; os que são maus e feios, às falsidades; os peixes, às ciências
que tiram sua origem das coisas sensuais; e os insetos nocivos, às falsidades que prevêem
dos sentidos. As árvores e os arbustos correspondem a diversos gêneros de conhecimentos;
as ervas e a grama, a diversas verdades científicas. O ouro corresponde ao bem celeste; a
prata, à verdade espiritual; o bronze, ao bem natural, etc., etc. Assim, desde os primeiros
degraus da criação até o sol celeste e espiritual, tudo se liga, tudo se encadeia por influxo
que a correspondência produz.
O segundo ponto de sua doutrina é este: Não há senão um Deus, e uma só pessoa, que é
Jesus Cristo.
O homem, criado livre, segundo Swedenborg, abusou de sua liberdade e de sua razão. Ele
caiu; mas sua queda fora prevista por Deus; ela deveria seguir-se por sua reabilitação;
porque Deus, que é o próprio amor, não poderia deixá-lo no estado no qual sua queda
mergulhou-o. Ora, como operar essa reabilitação? Recolocá-lo no estado primitivo seria tirarlhe
o livre arbítrio, e por aí aniquilá-lo. Foi se conformando com as leis de sua ordem eterna,
que ele procedeu à reabilitação do gênero humano. Veio em seguida uma teoria muito difusa
dos três sóis libertados por Jeová, para se aproximar de nós e provar que ele é o próprio
homem.
Swedenborg divide o mundo dos Espíritos em três lugares diferentes: céus, intermediários e
infernos, sem todavia assinalar-lhes os lugares. "Depois da morte, diz ele, entra-se no mundo
dos Espíritos; os santos se dirigem voluntariamente a um dos três céus, e os pecadores a um
dos três infernos, de onde não sairão jamais." Essa doutrina desesperante anula a
misericórdia de Deus; porque recusa-lhe o poder de perdoar aos pecadores surpreendidos poruma morte violenta ou acidental.
Fazendo justiça ao mérito pessoal de Swedenborg, como sábio e como homem de bem, não
podemos nos constituir os defensores de doutrinas que o mais vulgar bom senso condena. O
que dela ressalta mais claramente, segundo o que conhecemos agora dos fenômenos
Espíritas, é a existência de um mundo invisível e a possibilidade de se comunicar com ele.
Swedenborg gozou de uma faculdade que pareceu sobrenatural no seu tempo; por isso,
admiradores fanáticos consideraram-no como um ser excepcional; em tempos mais recuados,ter-lhe-iam levantado altares; aqueles que nele não creram, tratam-no uns de cérebroexaltado, os outros de charlatão. Para nós era um médium vidente e um escrevente intuitivo,como os há aos milhares; faculdade que entra na condição dos fenômenos naturais.
Ele cometeu um erro, muito perdoável, tendo em vista sua inexperiência com as coisas do
mundo oculto, que foi aceitar muito cegamente tudo o que lhe era ditado, sem o submeter ao
controle severo da razão. Se tivesse pesado maduramente o pró e o contra, teria reconhecido
princípios inconciliáveis com uma lógica ainda pouco rigorosa. Hoje, provavelmente, não
cairia na mesma falta; porque teria os meios para julgar e apreciar o valor das comunicações
de além-túmulo; saberia que é um campo onde nem todas as ervas são boas para colher, e
que entre umas e outras o bom senso, que não nos foi dado por nada, deve saber escolher. A
qualidade que se atribuiu o Espírito que se lhe manifestou, bastaria para colocá-lo em
guarda, sobretudo considerando a trivialidade de seu início. O que ele mesmo não fez, cabe a
nós fazê-lo agora, não tomando em seus escritos senão o que é racional; seus próprios erros
devem ser um ensinamento para os médiuns muito crédulos, que certos Espíritos procuram
fascinar lisonjeando a sua vaidade, ou seus preconceitos, por uma linguagem pomposa ou de
enganosas aparências.
A anedota seguinte prova o pouco de boa-fé dos adversários de Swedenborg, que
procuravam todas as ocasiões para denegri-lo. A rainha Louise-Ulrique, conhecendo as
faculdades das quais estava dotado, encarregara-o um dia de saber do Espírito de seu irmão,
o príncipe da Prússia, por que, algum tempo antes de sua morte, não lhe respondera a uma
carta que lhe enviou, pedindo conselhos. Swedenborg, ao cabo de vinte e quatro horas,
narrou à rainha, em audiência secreta, a resposta do príncipe, concebida de tal modo que a
rainha, plenamente persuadida de que ninguém, exceto ela e seu irmão defunto, conhecia o
conteúdo dessa carta, foi tomada da mais profunda estupefação, e reconheceu o poder
miraculoso do grande homem. Eis a explicação que um de seus antagonistas deu a esse fato,
o cavaleiro Beylon , leitor da rainha.
"Considera-se a rainha um dos principais autores da tentativa de revolução que ocorreu na
Suécia, em 1756, e que custou a vida ao conde Barhé e ao marechal Hom. Pouco faltou para
que o partido do chapéu, que triunfou então, a tornasse responsável pelo sangue derramado.
Nessa situação crítica, ela escreveu ao príncipe da Prússia, para pedir-lhe conselho e
assistência A rainha não recebeu resposta, e como p príncipe morreu logo depois, ela jamais
soube a causa do seu silêncio; foi por isso que encarregou Swedenborg para interrogar o
Espírito do príncipe a esse respeito. Justamente, na chegada da mensagem da rainha, os
senadores, conde T... e H..., estavam presentes. Este último, que havia interceptado a carta,
sabia tão bem quanto seu cúmplice, o príncipe T..., porque essa missiva tinha ficado sem
resposta, e ambos resolveram se aproveitar dessa circunstância para fazerem chegar à
rainha seus avisos sobre muitas coisas. Eles foram, portanto, de noite, encontrar o visionário
e lhe ditaram a resposta. Swedenborg, à falta de inspiração, agarrando esta com zelo, correu,
no dia seguinte, à casa da rainha, e ali, no silêncio de seu gabinete, disse-lhe: que o Espírito
do príncipe lhe aparecera e lhe encarregara de anunciar-lhe seu descontentamento, e lhe
assegurar que se não havia respondido à sua carta, foi porque desaprovou sua conduta, que
sua política imprudente e sua ambição foram causas do sangue derramado, e que ela era
culpada diante de Deus, e que teria que expiar. Ele a convidava a não mais se misturar nos
negócios do Estado, etc., etc. A rainha, convencida por essa revelação, acreditou em
Swedenborg e abraçou sua defesa com ardor.
Essa historieta deu lugar a uma polêmica, sustentada entre os discípulos de Swedenborg e
seus detratores. Um eclesiástico sueco, chamado Malthésius, que se tornou louco, publicara
que Swedenborg, do qual era abertamente o inimigo, se retratara antes de morrer. Tendo o
boato se espalhado na Holanda, pelo outono de 1785, Robert Hindmarck fez uma enquete a
esse respeito, e demonstrou toda a falsidade da calúnia inventada por Malthésius.
A história da vida de Swedenborg prova que a visão espiritual, da qual estava dotado, em
nada prejudicou, nele, o exercício de suas faculdades naturais. Seu elogio, pronunciado
depois de sua morte, diante da Academia de Ciências de Stockholm, pelo acadêmico Landel,
mostra o quanto foi vasta a sua erudição, e se vê, pelos discursos pronunciados à dieta de
1761, a parte que ele tomava na direção dos negócios públicos no país.
A doutrina de Swedenborg fez numerosos prosélitos em Londres, na Holanda, e mesmo em
Paris, onde deu nascimento à Sociedade da qual falamos em nosso número do mês de
outubro, a dos Martinistas, dos Teósofos, etc. Se ela não foi aceita por todos, em todas as
suas conseqüências, teve sempre por resultado própagar a crença na possibilidade de se
comunicar com os seres de além-túmulo, crença muito antiga, como se sabe, mas até esse
dia escondida do público pelas práticas misteriosas da qual estava cercada. O mérito
incontestável de Swedenborg, seu profundo saber, sua alta reputação de sabedoria, foram de
um grande peso na propagação dessas idéias, que hoje se popularizam mais e mais, por isso
mesmo crescem abertamente, e que longe de procurarem a sombra do mistério, elas apelam
à razão. Apesar de seus erros de sistema, Swedenborg não é menos uma dessas grandes
figuras, cuja lembrança ficará ligada à história do Espiritismo, do qual foi um dos primeiros e
dos zelosos promotores.
(Sociedade, 23 de setembro de 1859).
Comunicação de Swedenborg na sessão de 16 de setembro.
Meus bons amigos e crentes fiéis, desejei vir para vos encorajar no caminho que seguis com
tanta coragem, relativamente à questão Espírita. Vosso zelo é apreciado do nosso mundo dos
Espíritos: prossegui mas não vos dissimuleis que obstáculos vos entravarão ainda algum
tempo; os detratores não vos faltarão, mais do que não me faltaram. Eu preguei o
Espiritismo há um século, e tive inimigos de todos os gêneros; tive também adeptos
fervorosos; isso sustentou a minha coragem. Minha moral Espírita, e minha doutrina, não
deixam de ter grandes erros, que hoje reconheço. Assim, as penas não são eternas; eu o
vejo: Deus é muito justo e muito bom para punir eternamente a criatura que não tem
bastante força para resistir às suas paixões. É o que digo igualmente do mundo dos Anjos,
que se prega nos templos, não era senão uma ilusão de meus sentidos: eu acreditei vê-lo;
estava de boa-fé e o disse; mas eu me enganei. Vós estais, vós, num melhor caminho,
porque estais mais esclarecidos do que se estava em minha época. Continuai, mas sede
prudentes para que os vossos inimigos não tenham armas muito fortes. Vedes o terreno que
ganhais cada dia, coragem, pois! porque o futuro vos está assegurado. O que vos dá a força,
é que falais em nome da razão. Tendes perguntas a me dirigir? Eu vos responderei.
SWEDENBORG.
1. Foi em Londres, em 1745, que tivestes a primeira revelação; vós a desejastes? Já vos
ocupáveis de questões teológicas? - R. Delas me ocupava; mas nunca desejei essa revelação:
Swedenborg
ela veio espontaneamente.
2. Qual era esse Espírito que vos apareceu, e que vos disse ser Deus, ele mesmo? Era
realmente Deus? - R. Não; eu acreditei naquilo que me disse, porque vi nele um ser sobrehumano,
e com isso estava lisonjeado.
3. Por que tomou o nome de Deus? - R. Para ser melhor obedecido.
4. Pode Deus se manifestar diretamente aos homens? - R. Certamente, ele poderia, mas não
o faz mais.
5. Portanto, ele o fez num tempo? - R. Sim, nas primeiras idades da Terra.
6. Esse Espírito, fazendo escrever coisas que reconheceis hoje como errôneas, fê-lo numa
boa ou em má intenção? - R. Não foi com má intenção: ele mesmo se enganou, porque não
estava bastante esclarecido; vejo também que as ilusões do meu Espírito o influenciavam
apesar dele. Entretanto, no meio de alguns erros de sistema, é fácil reconhecer grandes
verdades.
7. O princípio da vossa doutrina repousa sobre as correspondências. Credes sempre nessas
relações que encontráveis entre cada coisa material e cada coisa do mundo moral? - R. Não éuma ficção.
8. O que entendíeis por estas palavras: Deus é o próprio homem? - R. Deus não é o homem,
mas o homem que é uma imagem de Deus.
9. Quereis, eu vos peço, desenvolver o vosso pensamento? - R. Eu disse que o homem é a
imagem de Deus, naquilo que a inteligência, o gênio que ele recebe, algumas vezes, do céu é
uma emanação da Onipotência Divina: ele representa Deus na Terra pelo poder que exerce
sobre toda a Natureza, e pelas grandes virtudes que está em seu poder adquirir.
10. Devemos considerar o homem como uma parte de Deus? - R. Não, o homem não é uma
parte da Divindade: não é senão sua imagem.
11. Poderíeis nos dizer de qual maneira recebíeis as comunicações da parte dos Espíritos, e
se escrevestes o que vos foi revelado à maneira de nossos médiuns ou por inspiração? - R.
Quando eu estava no silêncio e no recolhimento, meu Espírito estava como arrebatado, em
êxtase, e via claramente uma imagem diante de mim que me falava e me ditava o que
deveria escrever; minha imaginação, algumas vezes, também nisso se misturou.
12. Que devemos pensar do fato narrado pelo cavaleiro Beylon, a respeito da revelação que
fizestes à rainha Louise-Ulrique? - R. Essa revelação é verdadeira. Beylon a desnaturou.
13. Qual é a vossa opinião sobre a Doutrina Espírita, tal como ela é hoje? - R. Eu vos disse
que estais num caminho mais seguro do que o meu, tendo em vista que vossas luzes, em
geral, são mais desenvolvidas, eu, tinha que lutar contra mais ignorância e, sobretudo,
contra a superstição.

Entrevista com Hermínio C. Miranda


Folha Espírita
(Esta Entrevista foi publicada recentemente na Folha Espírita)
FE: Quando e como foi que o senhor fez sua opção pelo Espiritismo?
Hermínio Miranda: Não fui levado ao Espiritismo por crise existencial ou sofrimento, mas pela insatisfação com os modelos religiosos à minha opção. Alguém – mergulhado em transe anímico regressivo – me diria mais tarde que eu não aceitava tais propostas porque, de alguma forma que não me foi explicado, eu sabia que ali não estava a verdade que eu buscava. Essa atitude de reserva e até de rejeição contribuiu, acho eu, para retardar minha descoberta da realidade espiritual.
Um episódio irrelevante em minha vida desencadeou o processo. Eu quis, no entanto, entrar pela porta da frente. Consultei, para isso, um amigo de minha inteira confiança e ele me indicou com primeira leitura os livros da Codificação. Acrescentou os nomes de Gabriel Delanne e de Léon Denis e me disse, como que profeticamente: “Daí em diante, você irá sozinho”.
A surpresa começou com O Livro dos Espíritos. Inexplicavelmente, eu tinha a impressão de haver lido aquele livro antes, mas onde, quando? Antecipava na mente o conteúdo de numerosas respostas . Anos depois, ficaria sabendo que outras pessoas viveram experiência semelhante, entre elas, o respeitável e amado dr. Bezerra de Menezes.

FE: Desde quando o senhor escreve sobre o Espiritismo?
Hermínio Miranda: Comecei a escrever regularmente para o “Reformador e, em seguida, para outras publicações doutrinárias. Permaneci como colaborador assíduo do órgão oficial da FEB até 1980. Meus textos eram assinados nessa primeira fase, com as iniciais HCM. Posteriormente, o amigo dr. Wantuil de Freitas, presidente da FEB, me pediu que arranjasse um pseudônimo para evitar que dois ou mais artigos saíssem com o mesmo nome em um só número da revista. Foi assim que “nasceu” “João Marcus”.
A partir de 1976 começaram a sair os livros. Diálogo com as sombras foi o primeiro. Para alegria minha, foi bem recebido

FE: O senhor tem hoje quase 40 livros publicados. Como analisa sua obra?
Hermínio Miranda: Costumo dizer que boa parte de meus livros é voltada para o meio espírita. Diálogo com as sombras, Diversidade dos Carismas, bem como a série sob o título genérico Histórias que os espíritos contaram” são exemplos desse tipo de livro que dificilmente leitor e leitora não-espírita tomariam para ler. Sempre achei, contudo, de meu dever escrever livros que, sem excluir o leitor espírita, pudessem interessar também o leitor não-espírita. Estão nesse caso, A memória e o tempo, Alquimia da Mente, Autismo – uma leitura espiritual, Nossos filhos são espíritos, Condomínio espiritual e As mil faces da realidade espiritual. Parece que o plano deu certo, pois essas obras atendem a dois objetivos: o de mandar nosso recado para além das fronteiras espíritas e, ao mesmo tempo, abordar assuntos não especificamente espírita com enfoque doutrinário, sem contudo, fazer pregação ou com intuito meramente arregimentador. Na minha opinião, a gente deve ir ao Espiritismo se e quando quiser e por suas próprias pernas, ou seja, sem ser “arrastado”.

FE: O senhor tem idéia de quantos exemplares de seus livros foram vendidos até agora?
Hermínio Miranda: A repórter de uma grande revista semanal brasileira me fez, há tempos, essa mesma pergunta e muito se admirou por não ter eu condições de respondê-la. Continuo sem saber. Cheguei a tentar, mas não obtive a informação desejada. A razão disso está, em parte, no fato de que os direitos autorais da grande maioria de meus livros são doados a diversas instituições, como à FEB, ao Lar Emmanuel, do Correio Fraterno do ABC, a OCaminho da Redenção (Divaldo), ao Centro Espírita “Amantes da Pobreza, de “O clarim, ao Centro Espírita Léon Denis. Com os rendimentos auferidos pelos livros publicados pela Lachâtre mantemos nosso próprio serviço social numa favela do Rio de Janeiro.

FE: E quais os de sua preferência?
Hermínio Miranda: Creio ser difícil para qualquer autor dizer de que livro ou livros gosta mais. É como perguntar a um pai ou mãe, qual ou quais os filhos e filhas de suas preferências. Penso que a gente gosta de todos por motivos diferentes. Tanto quanto é possível considerar minha obra com um mínimo de objetividade e isenção, gosto de Nossos filhos são espíritos, pela surpreendente aceitação que encontrou dentro e fora do movimento espírita, o que também aconteceu com Autismo – uma leitura espiritual. Livros como Cristianismo – a mensagem esquecida, As marcas do Cristo, O evangelho gnóstico de Tomé, Os cátaros e a heresia católica, pela forte ligação emocional que tenho com a temática do cristianismo primitivo. Sobre as explorações intelectuais em território fronteiriço com o do Espiritismo, citaria A memória e o tempo, Alquimia da Mente e, novamente, por motivação diferente da anterior, Autismo – uma leitura espiritual.
Como se vê, isto não é propriamente uma lista de preferências, mas uma análise de cada grupo de livros, classificados por assuntos de minha preferência. Sobre a qualidade e o conteúdo dos livros, no entanto, prefiro que fale o público leitor.

FE: Além de seus próprios livros, o senhor tem feito algumas traduções. Qual o critério adotado na seleção das obras traduzidas?
Hermínio Miranda: Tenho dito que prefiro escrever meus próprios livros do que traduzir os alheios. É verdade, mas, às vezes, me vejo envolvido numa tradução motivado por fatores que diria imponderáveis, circunstanciais ou subjetivos. Não sei definir os critérios que me levaram a esse envolvimento. Cada caso é um caso.

FE: O que pensa o senhor do Espiritismo na sua interação com o mundo contemporâneo?
Hermínio Miranda: Prefiro reformular a pergunta: O que se pode dizer acerca da interação da realidade espiritual com o mundo contemporâneo? Isso porque, no meu entender, não há uma rejeição ou indiferença em relação ao Espiritismo especificamente, mas à realidade que a Doutrina dos Espíritos ordenou e colocou com simplicidade e elegância. O Espiritismo continua sendo um movimento minoritário, até mesmo no Brasil, justamente considerado o país mais espírita do mundo. Como se percebe, a massa maior das pessoas ainda prefere uma das numerosas religiões institucionalizadas e tradicionais. Ou a aparente liberdade que proporcionaria a descrença, que não tem compromisso com coisa alguma senão com a própria negação. O que, no fundo, e também uma crença (na descrença).

FE: O senhor tem algum projeto literário em andamento?
Hermínio Miranda: Acho que projetos o escritor sempre os tem. Eu também; talvez mais do que deveria ou poderia ter. No momento, traduzo The sorry tale, discutido livro mediúnico da autora espiritual que se identificou como Patience Worth, ao escrevê-lo através da médium americana conhecida como Sra. Curran, a partir de 1918. Além de ser um fenômeno literário, a história se passa no tempo do Cristo, da noite em que ele nasceu até o dia em que foi crucificado. É espantoso o conhecimento que a autora espiritual revela da época: a geopolítica, os costumes, a sociologia, a religião, a história e tudo o mais. O tratamento respeitoso e amoroso que ela dá à figura de Jesus é comovente. O livro é considerado um fenômeno exatamente por esse grau de erudição histórica e pelo fato de ter sido escrito num inglês um tanto arcaico, o elizabetano do século 17, que faz lembrar Shakespeare e, por isso mesmo, um desafio para o tradutor. A entidade justifica essa linguagem arcaica exatamente para provar que a obra não era da médium, uma jovem senhora dotada de escassos conhecimentos.

FE: Como o senhor escolhe os temas que desenvolve em seus livros, considerando-se a variedade dos assuntos neles abordados?
Hermínio Miranda: Outra pergunta para a qual não tenho resposta objetiva. Às vezes (Ou sempre?) me fica a impressão de que não fui eu que escolhi os temas; eles é que me escolheram.

FE: Seu livro mais recente – Os cátaros e a heresia católica – aborda uma doutrina medieval bastante parecida com o Espiritismo. Diga-nos algo sobre isso.
Hermínio Miranda: O estudo sobre os cátaros esteve em minha agenda cerca de 25 anos. Até que chegou o momento em que a própria obra “entendeu” que chegara a hora de ser escrita. Em parte, porque o tema exigia extensas e aprofundadas pesquisas na historiografia especializada francesa. Além disso, procurei sempre obedecer nos meus estudos uma escala de prioridades.
Não há dúvida de que o catarismo foi um dos mais convincentes precursores do Espiritismo. Antes dele, o mais promissor e bem articulado foi o movimento gnóstico. A inteligente doutrina cátara foi elaborada a partir do Evangelho de João, de Atos dos Apóstolos e das Epístolas, principalmente as de Paulo. Tive algumas surpresas como a de encontrar referências ao Consolador, que, com tanto relevo figura na Doutrina dos Espíritos. E mais: reencarnação, comunicabilidade entre as duas faces da vida, o despojamento dos cultos, sem rituais e sem sacramentos a não ser o do “consolamentum”. Seu propósito era o de um retorno à pureza original do cristianismo. E por isso, morreram nas fogueiras da Inquisição.

FE: O senhor tem obras não-espíritas publicadas?
Hermínio Miranda: No início de minha atividade literária, na distante mocidade, escrevi alguma ficção. Nada de que me possa orgulhar, ainda que tenha sido premiado em concursos literários e ter tido acesso a importantes publicações brasileiras. Um desses escritos mereceu crítica bastante lisonjeira de significativos escritores como Eloy Pontes (O Globo), Monteiro Lobato e o temido e respeitado Agripino Griecco (estes dois em cartas ao autor). Logo compreendi, contudo, que meu caminho não passava por ali, embora o instrumento de trabalho – a palavra escrita – fosse o mesmo.

FE: Sabe-se de sua limitada atividade como orador, expositor, palestrante ou conferencista. Por que isso?
Herminio Miranda: Considero-me orador medíocre. E nem me esforcei em desenvolver esse improvável talento, por duas razões: Primeira – sempre sonhei e desejei tornar-me escritor. Sinto-me à vontade com as letras. Segundo – que, no meu entender, não faltam bons oradores, expositores e conferencistas no meio espírita. Eu nada teria a acrescentar ao excelente trabalho que eles e elas têm feito nesse sentido.

FE: Como tem sido sua atividade em grupos mediúnicos?
Hermínio Miranda: Durante quase 40 anos participei de trabalhos mediúnicos em pequenos grupos. A parte mais importante de minha obra surgiu da experiência adquirida nessa tarefa. Sou grato aos amigos espirituais que guiaram meus passos nessa nobre e difícil atividade, bem como aos companheiros encarnados – médiuns e demais participantes – e às numerosas entidades com as quais dialogamos no correr de todo esse tempo. Costumo dizer com toda sinceridade e convicção que muito mais aprendi com os chamados “obsessores” do que lhes ensinei, se é que o fiz.

FE: Dispomos hoje de computadores, Internet, e-mail e outras tecnologias destinadas a facilitar a pesquisa. De que forma o senhor deu conta de seu trabalho sem o aparato de hoje?
Hermínio Miranda: O computador me tem sido valioso instrumento de trabalho. Não tanto nas pesquisas, mas na tarefa mesma de escrever. No tempo da falecida máquina de escrever, os textos eram penosamente datilografados, corrigidos à mão ou na própria máquina e posteriormente passados a limpo, duas ou três vezes.
Não uso muito a Internet para pesquisa, a não ser quando se torna necessária alguma informação adicional especializada. Ou quando à cata de livros. Isso porque, no meu entender, nada substitui o livro como objeto de estudo, consulta e citação. Obras como as que escrevi sobre o autismo, por exemplo, ou sobre os cátaros ou Alquimia da mente, exigiram preparo maior que só uma boa bibliografia em várias línguas poderia suprir. Em suma, por mais que os entendidos da informática desaprovem, o computador é, para mim, uma excelente e sofisticada máquina de escrever.

FE: Qual deve ser a postura espírita diante da antiga dicotomia e até confronto entre religião e ciência?
Hermínio Miranda: De serenidade e confiança. Não há o que temer. Ao lado de cientistas que têm procurado minimizar ou até demolir aspectos fundamentais da realidade espiritual, temos também, outros tantos que produziram e continuam a produzir impressionante volume de trabalhos científicos que demonstram a validade do modelo adotado pela Doutrina dos Espíritos. Dizem nossos amigos advogados, que o ônus da prova cabe a quem acusa. Que se prove, então, que essa realidade é uma balela ou uma fantasia. Kardec teve a corajosa serenidade de ensinar que a Doutrina teria de estar preparada até para mudar naquilo que fosse demonstrado estar em erro. O que não aconteceu em quase século e meio. Deixou igualmente claro que o Espiritismo é uma doutrina evolutiva e, portanto, aberta e atenta a todos os ramos do conhecimento. Ou seja, não deve deixar-se congelar dentro de um rígido modelo ou procedimento que o isole do que se passa “lá fora” de seu território ideológico.

FE: Assuntos como clonagem, que vêm ganhando espaço na mídia, devem ser tratados pelos espíritas?
Hermínio Miranda: Não tenho dúvidas de que a temática da clonagem nos interessa para estudo e tomada de posição, mesmo porque perguntas sobre esse fenômeno estão sendo dirigidas a nós. “O que você acha disso?” – perguntam-nos.
Em artigo intitulado “Xerox de gente” (“Reformador”, julho de 1980) cuidei do assunto, bem como, em outras oportunidades, da criogenia e do transplante. Este, por exemplo, foi tema proposto por Deolindo Amorim, em estudo, do qual participei, no Instituto de Cultura Espírita.
Antes disso, em dois artigos intitulados “O homem artificial”, publicados no antigo “Diário de Notícias”, do Rio, entendia eu o seguinte, em conclusão “...o que se chama um tanto pomposamente de criação do homem em laboratório, se reduz, a uma análise fria do problema, à criação de condições materiais à atuação de um espírito reencarnante.” (Ver De Kennedy ao homem artificial, de Luciano dos Anjos e meu, FEB 1975, p. 285).
O problema, portanto, situa-se no açodamento irresponsável de interferir nos mecanismos naturais testados, aprovados e consolidados ao longo dos milênios. Irresponsável porque não estão sendo levados em conta os aspectos éticos necessariamente envolvidos em tais pesquisas. Pensa-se, por exemplo, em criar com a clonagem, um “estoque” de “peças de sobressalentes” destinadas a repor as que se desgastarem pelo uso e abuso praticados no corpo da pessoa que forneceu o material genético.
A técnica de congelar cadáveres – criogenia – parte do pressuposto de que a ciência venha a desenvolver no futuro, procedimentos e medicamentos capazes de curar as mazelas de que morreram as pessoas. E os espíritos? “Onde” ficam? Sob que condições? Até quando? Disso, ninguém cuida, pois a entidade espiritual acoplada àquele corpo é totalmente ignorada. Por ignorância mesmo, aquela que não sabe e não quer saber, por mais cultos que sejam os que realizam tais experimentações.
Sobre esse tema, escrevi, ainda, há cerca de 30 anos – não tenho, no momento, como precisar a data – um artigo intitulado “Uma ética para a genética”—uma espécie de pressentimento sobre o que estamos agora testemunhando.
Em resumo: os espíritas devem, sim, acompanhar a movimentação de idéias, fatos, estudos e pesquisas, no mínimo para se informarem do que se passa e para que continuem confiando nas estruturas doutrinárias que adotaram.

FE: Gostaríamos que falasse sobre Chico Xavier e seu papel no contexto espírita.
Hermínio Miranda: Não há muito que dizer. Chico é uma unanimidade. Portou-se com bravura e digna humildade. Anulou-se como pessoa humana, para que por ele falassem seus numerosos amigos espirituais. Não há dúvida de que ampliou os horizontes desvelados pela Doutrina dos Espíritos, sem por em questionamento nenhum de seus princípios básicos; pelo contrário, os confirmou, sempre olhando para frente. O trabalho que nos chegou através dele demonstra que se pode expandir os horizontes da Doutrina dos Espíritos sem a mutilar.

FE: Que acha o senhor do movimento espírita brasileiro? Vai bem?
Hermínio Miranda: Não me considero com autoridade suficiente para uma avaliação do movimento espírita. Por contingências profissionais, não me foi possível participar dele como o desejaria, mas não apenas por isso. Tive de fazer uma opção e toda opção tem certo componente limitador, porque exclui outras. Minha prioridade era escrever. Isso tem sido uma espécie de compulsão, por ser, creio eu, a principal tarefa que me teria sido confiada ao me reencarnar. E para escrever, você precisa ler, ler muito, estudar, pesquisar, meditar, organizar suas idéias e expô-las de modo consistente. Não me teria sido possível fazer tudo isso em adição ao intenso trabalho profissional e às tarefas que, porventura, me fossem confiadas no movimento.

FE: Os princípios básicos da Doutrina Espírita já eram conhecidos na Antiguidade. Quais as civilizações que mais contribuíram para a formação desse patrimônio cultural?
Hermínio Miranda: A pergunta é muito ampla para as limitações de uma simples entrevista. É certo, porém, que os fenômenos de que se ocupa a doutrina são tão antigos quanto o ser humano. O aspecto que me parece mais relevante, neste caso, é o de que a realidade espiritual sobre a qual se assenta a Doutrina dos Espíritos já estava contida nos ensinamentos de Jesus e foi ele próprio que dirigiu a equipe que trabalhou com Kardec.

FE: Como o senhor considera o papel de Allan Kardec na elaboração dos livros básicos da Codificação?
Hermínio Miranda: Seria ocioso repetir o que já sabemos. O papel dele foi fundamental na elaboração dos livros básicos. Sua percepção da relevância do que estava acontecendo com as mesas girantes, sua capacidade para ordenar todo o material que lhe foi entregue, digamos, em estado bruto, em simples cadernos de anotações e a sensibilidade para formular suas perguntas dentro de um esquema racional e seqüencial, evidenciam o acerto de sua escolha para delicada tarefa.

FE: Fala-se e se escreve muito no meio espírita sobre os três aspectos da Doutrina dos Espíritos. Qual a sua posição nessa questão?
Hermínio Miranda: Não me sinto atraído por debates ou polêmicas, como o que às vezes se armam em torno de questões como essa. Está claro, para mim, que o Espiritismo tem sua vertente filosófica, a científica e a religiosa. Ao falar sobre isso, tenho em mente Religião com maiúscula; com todo o respeito devido, não me refiro às várias denominações cristãs contemporâneas. Mesmo porque o Cristo não fundou religião alguma – ele se limitou a pregar e exemplificar uma doutrina de comportamento, ou seja, como deve o ser humano portar-se perante o mundo, a vida, seus semelhantes e, em última análise, diante de si mesmo e da divindade. Ao que sabemos, jamais o Cristo cogitou de saber se sua doutrina devia ou não ser caracterizada como religião. E, no entanto, é religião, no seu mais puro e amplo sentido, de vez que cuida de nossa relação com as leis divinas. Minha opção prioritária, por assim entender, é pelo aspecto religioso do Espiritismo, sem, contudo, ignorar ou minimizar os demais. Nada tenho e nem poderia ter, contra os que pensam de modo diferente. Não vejo como nem por que disputar coisas como essa. Tenho eu de desprezar, combater, hostilizar, odiar e até eliminar aquele que não pensa exatamente como eu?
Se você prefere cuidar do vetor científico ou do filosófico, tudo bem.
Solicitado, certa ocasião, a um pronunciamento dessa natureza, entreguei pessoalmente ao eminente e saudoso companheiro dr. Freitas Nobre, um pequeno texto sob o título “Problema inexistente”, que ele mandou publicar em “Folha Espírita”. Por que e para quê todo esse debate? Começa que a posição a ser assumida ante o problema depende da conceituação preliminar do que se entende por religião. De que tipo de religião estaríamos falando?

FE: Como o senhor situa o pensamento do Cristo no contexto da Doutrina Espírita?
Hermínio Miranda: Kardec sabia muito bem o que fazia ao adotar a moral do Cristo. Afinal de contas e, ainda repercutindo a temática da pergunta anterior, o Espiritismo nos pede mais, em termos de comportamento e reforma íntima, do que a ciência e a filosofia. Há quem me considere místico, mas o rótulo não me incomoda; ao contrário, acho-o honroso e o aceito assumidamente. Não consigo imaginar minha vida – e a vida, em geral – sem os ensinamentos do Cristo. Como sou um obstinado questionador, tenho, pelo menos, duas perguntas a formular: “Que é ser místico?” E, antes dessa: “O que é misticismo?” Um amigo meu, muito querido, costumava dizer-me isso, naturalmente, sem a mínima conotação crítica, como quem apenas enuncia um fato. Regressou antes de mim ao mundo espiritual. Passado algum tempo, manifestou-se em nosso grupo mediúnico e entre outras coisas, me disse: “Você é que estava certo.”

FE: Qual é a sua formação profissional?
Hermínio Miranda: Minha formação profissional é em Ciências Contábeis, função que exerci na Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda, a partir de 1948, em Nova York (entre 1950 e o final de 1954) e, posteriormente, no Rio de Janeiro, de 1957 a 1980, quando me aposentei. Devo acrescentar que no decorrer dos últimos 22 anos, estive sempre no exercício de cargos executivos no primeiro escalão da empresa ou no segundo.

FE: Deixamo-lo à vontade para algo mais que queira acrescentar.
Hermínio Miranda: Certa vez fui convidado por uma freira, amiga da família, para um encontro com seus alunos de teologia numa universidade brasileira. No dia e hora marcados, lá estava eu. Ela é doutora em teologia e sabia, naturalmente, de minhas convicções, e foi por isso mesmo que me convidou, concedendo-me oportunidade de verificar o quanto sua mente é arejada e despreconceituosa. Perguntei-lhe sobre o que ela desejava que eu falasse. Ela propôs dois pontos: a reencarnação e como o Espiritismo considerava a figura de Jesus. Dito isso, foi sentar-se modestamente entre seus alunos e, como eles e elas, formulou várias perguntas. Passamos ali, umas duas horas numa conversa fraterna, animada e desarmada.
Digo que ela escolheu bem os temas, porque, na minha maneira de ver, a reencarnação é o cimento que mantém os diversos aspectos da realidade espiritual consolidados num só bloco. Uma vez admitida a reencarnação, tudo o mais se encaixa no seu lugar com precisão milimétrica. Isso porque, sendo como é uma realidade por si mesma, uma lei natural e não objeto de crença ou de fé, a reencarnação pressupõe existência, preexistência e sobrevivência do ser à morte corporal, bem como a lei de causa e efeito, que regulamenta nossas responsabilidades perante a vida. Mais: a reencarnação exclui do modelo dito religioso, qualquer possibilidade ou necessidade de céu, inferno ou purgatório como “locais” onde se gozam as benesses da vida póstuma ou se sofrem as conseqüências de erros e equívocos cometidos. Do ponto de vista da teologia dita cristã contemporânea, portanto, a reencarnação é uma doutrina subversiva, no sentido de que desmonta todo um sistema teórico de idéias e conceitos tidos por irremovíveis.
Quanto ao Cristo, não há o que discutir, é a mais elevada entidade que passou pela terra.
Acho que a ilustrada irmã gostou da minha fala, dado que algum tempo depois, me convidou novamente, desta vez para falar a um grupo de sacerdotes católicos já ordenados e seminaristas em final de curso. Que também foi uma conversa amena, fraterna e franca.
(Publicado no Boletim GEAE Número 460 de 29 de julho de 2003 )
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