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sábado, 27 de outubro de 2012

O Consolador


Juvanir Borges de Souza
Seria grande erro supor que a Mensagem do Cristo de Deus terminara com sua passagem pela Terra.
O Mestre não se limitou a deixar à Humanidade seu Evangelho que ilumina os caminhos humanos.
Sabia Ele que as imperfeições e rebeldias dos homens não seriam removidas somente com seu serviço ativo e com a dedicação dos primeiros discípulos e seguidores, a trabalhar nos corações e nas mentes.
Ele mesmo declarou que não viera para ensinar tudo aos homens, que não possuíam ainda as condições necessárias ao entendimento de lições que transcendiam à compreensão de então.
O caminho que indicou foi o do amor, o do esforço individual, o do sacrifício em prol da elevação moral de cada um.
Ficaria para o futuro a complementação da Boa Nova.
São palavras do Mestre incomparável:
"Tenho ainda muitas coisas a dizer-vos, mas presentemente não as podeis suportar."
E acrescenta:
"Se me amais, guardai os meus mandamentos - e eu pedirei ao meu Pai
e ele vos enviará outro Consolador a fim de que fique eternamente convosco: - o
Espírito de Verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê; vós, porém, o conhecereis, porque permanecerá convosco e estará em vós - mas o Consolador, que é o Espírito Santo, que meu Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e fará vos lembreis de tudo o que vos tenho dito."
(João, 14:15-17 e 26).
O que as palavras de Jesus, registradas pelo evangelista, deixam muito claro é que Ele não ensinara tudo a seus discípulos, pela simples razão de que não podiam, não tinham condições de compreender o que estivesse acima de sua capacidade de entendimento.
Torna-se evidente, na passagem evangélica, confirmada pelos fatos, que o Mestre não esgotou seus ensinamentos naquele pequeno período de vivência entre os homens.
Ao contrário, tornou claro que sua Mensagem se desdobraria em etapas: o Consolador prometido complementaria suas lições de há dois mil anos, e lembraria tudo o que fosse esquecido ou desvirtuado, restabelecendo as verdades ensinadas.
As religiões tradicionais que se baseiam nos Evangelhos, ao lado dos muitos desvios interpretativos, cometeram o grave erro de considerar os ensinamentos de Jesus como completos e definitivos, em contraposição às próprias palavras do Mestre.
Esqueceram do papel importantíssimo do Consolador, que viria futuramente, mas que dependeria dos desígnios do Alto, para complementar a grande Mensagem.
Com esse posicionamento as igrejas denominadas cristãs tornaram imutáveis e estratificadas suas Doutrinas. Decorridos os séculos, essas doutrinas foram se desvirtuando não só diante da verdadeira Mensagem
Crística, mal interpretada em muitas de suas passagens, mas também perante os conhecimentos novos trazidos pelas Ciências. Apenas os ensinos morais do Cristo permaneceram incólumes.

REFORMADOR, ABRIL, 1998
A reconsideração da Igreja Romana quanto ao tristíssimo Tribunal do Santo Ofício, no tocante à Inquisição, nos episódios que envolveram muitos sábios e escritores como Galileu Galilei e Charles Darwin, Giordano Bruno e Dante, Descartes e Diderot, Erasmo e Fénelon, João Huss e Lutero, Montesquieu, Pascal, Rousseau, Voltaire e muitos outros são alguns dos muitos enganos em que incorreu a milenar instituição, que se tornaram insuportáveis por ela mesma.
Para os estudiosos e seguidores do Espiritismo não há dificuldade de compreensão da promessa do Cristo, já que os acontecimentos mostraram claramente que a Doutrina dos Espíritos é o próprio Consolador prometido.
Eis alguns sinais que confirmam não a presunção, mas a certeza da vinda do Consolador com a Terceira Revelação ("A Gênese" - A. Kardec - Cap. XVII):
- Desde a vinda do Cristo até meados do século XIX, nenhuma outra revelação significativa apareceu no mundo que tenha completado os Evangelhos e elucidado suas passagens obscuras.
- Com "O Livro dos Espíritos" (1857) e as demais obras da Codificação corporificou-se a Doutrina Espírita, a Terceira Revelação.
- A Nova Revelação, obra coletiva, caracterizando o "Espírito Santo" - os Espíritos do Senhor - tem à sua frente o Espírito de Verdade.
- Toda a Nova Revelação se ocupa do Evangelho de Jesus, interpretando-o em espírito e não somente na letra.
- Coisas novas são anunciadas pelos Espíritos reveladores, especialmente no que concerne à Vida Espiritual e ao Mundo Invisível.
- A Nova Revelação está destinada a ficar eternamente com os habitantes deste Planeta, o que corresponde à promessa do Cristo.
- A Doutrina dos Espíritos, além de toda a parte moral da Doutrina do Cristo, é profundamente consoladora, inspirada pelo Espírito de Verdade,
representando o Cristo.
- O Espiritismo, doutrina não individual, mas extremamente abrangente, é o resultado do ensino coletivo de muitos Espíritos, orientados pelo Espírito de Verdade.
- O Espiritismo, o Consolador, teve precursores, preparadores de seu advento.
Pela sua força moralizadora já está preparando o advento da Era da Regeneração.
Quanto ao fenômeno do dia de Pentecostes, que muitos entendem como sendo a manifestação do Espírito Santo e a vinda do Consolador, pode-se entender que as aptidões mediúnicas de muitos dos discípulos foram desenvolvidas pelos Espíritos, auxiliando-lhes as futuras tarefas e missões.
Entretanto, o fenômeno nada acrescentou aos ensinos de Jesus, não trazendo conhecimentos novos e nem aclarando o que se achava obscuro.
Por isso, o Pentecostes não se pode confundir com o Consolador, cujas características o Mestre enunciou com precisão, e só se corporificaria com um mínimo de progresso geral do mundo, com o avanço espetacular das ciências; a partir dos últimos séculos, e com o triunfo da liberdade, contra as imposições
dogmáticas dos poderes absolutistas dos governos e das religiões.
De outro lado, afirmando aos apóstolos que o Consolador vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito, Jesus proclama a doutrina da reencarnação, já que aqueles a quem se dirigia só poderiam aproveitar dos novos ensinos no futuro indefinido, naturalmente em outras vidas.
REFORMADOR, ABRIL, 1998 5
E a doutrina da reencarnação, tal como a apresenta a Doutrina Espírita, de suma importância para a compreensão das leis divinas do Amor e da Justiça, não poderia ser compreendida, em toda a sua abrangência, senão com o advento do Consolador prometido, que já está no mundo.
O caráter consolador da Doutrina dos Espíritos manifesta-se a todos os sofredores do mundo, mostrando-lhes a causa dos sofrimentos e dores, que reside na ignorância, na maldade e nos transvios dos próprios homens com relação às leis naturais, ou divinas.
A Doutrina mostra a justiça dos sofrimentos sem esquecer a consolação  da busca da felicidade na vida presente ou futura.
Ela é inspiradora da fé viva e racional e da esperança, por pior que seja a situação individual. Afasta as dúvidas cruéis, decorrentes da descrença materialista e das crenças infundadas no inferno dos sofrimentos eternos.

O testemunho da verdade

“Não nasci e não vim a este mundo senão para dar testemunho da verdade.”
(João, 18:37.)
JUVANIR BORGES DE SOUZA
Essas palavras de Jesus, registradas no Evangelho de João, são parte do diálogo do Mestre com Pilatos, o governador romano que quis ouvir aquele que era perseguido pelos detentores do poder religioso, os
quais prenderam e tudo fizeram para o condenar à morte na cruz infamante.
A fraqueza do representante do poder romano ficou evidenciada por não ter encontrado nenhuma
transgressão de parte do acusado, conforme declarou, e, mesmo assim, cedeu às acusações infundadas
dos perseguidores fanáticos, que demonstraram sua profunda ignorância, diante não só de suas
próprias crenças, mas também perante um ser superior que viera a este mundo, então mais atrasado
que na atualidade, “para dar testemunho da verdade”.
O Mestre sabia perfeitamente da profunda ignorância daqueles que já haviam sido beneficiados
pela revelação mosaica, pela presença de diversos profetas, pela libertação da escravidão no Egito e
pelo encontro da terra prometida, que já habitavam há séculos.
Pela palavra do Mestre, sua excepcional missão, que abrange inúmeros aspectos da vida de
todos os habitantes da Terra, tanto dos que aqui viveram antes de sua vinda, quanto dos que renasceriam
após sua presença entre os homens, foi por Ele resumida numa afirmação, que encerra as mais vastas consequências para a renovação deste mundo e de todos os homens que o habitam.
“Dar testemunho da verdade” corresponde à reafirmação de um ser superior, o Governador espiritual
da Terra, de que seus habitantes de todos os tempos necessitam retificar inúmeras concepções,
crenças, ideias, sentimentos e tudo mais que constitui a vida em um mundo inferior, ajustando-os
à realidade e à verdade.
Sua missão foi a continuação dos esforços que já vinham sendo feitos por outros missionários a
seu serviço, desde tempos imemoriais, para que os habitantes deste orbe alcançassem melhores estágios
evolutivos.
Na época em que o Mestre resolveu estar presente entre seus irmãos menores, após a anunciação
de sua vinda pelos profetas, com cerca de oito séculos de antecedência, a Humanidade, muito
atrasada em suas ideias e crenças, era dominada pelo politeísmo multiforme e por costumes variados,
com a predominância da força entre os povos, como é prova o domínio do Império Romano sobre
grande parte das nações.
Vindo no seio do povo judeu, o único que acreditava na existência de um só Deus, mesmo assim
teve de enfrentar a profunda ignorância dos mandatários dos poderes temporal e religioso.
Sua luta foi constante e poucos foram os que compreenderam sua missão, seus ensinos superiores e
seus exemplos.
Procurou entre as pessoas simples e sinceras aqueles que se tornaram seus discípulos e continuadores
de sua obra excepcional.
O testemunho da verdade, a que se referia o Mestre, era o cumprimento das leis de Deus, que os
judeus já conheciam através das revelações recebidas por Moisés, mas que nem o povo hebreu e muito
menos os demais habitantes do mundo de então, com suas crenças politeístas e pagãs, conseguiam entender
no seu real sentido.
A base para o início do entendimento da lei suprema estava nos deveres e no amor para com o
Criador, o Deus único, e para com o próximo.
Jesus a formulou sinteticamente, de forma simples, para ser entendida sem a menor dificuldade
naquela época, nos dias atuais e no futuro:“Amar a Deus sobre todas as
coisas e ao próximo como a si mesmo”. (Mateus, 22:37-39.)
A autoridade e a sabedoria do Mestre ressaltam, ao formular esse ensinamento para a Humanidade
de todos os tempos, uma lei suprema, ao mesmo tempo geral, inteligível, simples, profunda e aplicável
a todas as criaturas.
A essa síntese admirável Jesus acrescenta que nela estão toda a lei e os profetas, antecipando futuros
enganos interpretativos, práticas exteriores e deformações que, mesmo dentro do Cristianismo,
foram inevitáveis, pelo atraso dos homens.
Em outra oportunidade, Jesus deixou claro que as leis divinas devem ser cumpridas integralmente,
em toda parte e em toda a sua pureza.
Por isso, podemos compreender que mundos atrasados, como o nosso, habitado por populações muito
diversificadas em suas crenças, conhecimentos e, sobretudo, no desconhecimento da vida e da verdade,
evoluem tão lentamente.
É que as leis divinas não são privilégio das minorias que as conhecem e as praticam, mas precisam
ser entendidas e cumpridas por toda a população de determinado mundo, para que todos possam
evoluir.
Daí a existência de diferentes esferas, tanto materiais quanto espirituais, num mesmo mundo como a Terra.
Foi o próprio Cristo que declarou: “O céu e a Terra não passarão sem que tudo esteja cumprido até
o último iota”. (Mateus, 5:28.)
Podemos deduzir dessas palavras que é um erro grave a falta de compreensão e de solidariedade
entre os indivíduos, assim como entre os povos e nações, em diferentes condições de adiantamento,
de conhecimentos, de riqueza e de pobreza, todos vivendo em um mesmo mundo, o que
não impede o progresso individual e coletivo.
Daí a dedução lógica de que o mundo regenerado só será alcançado quando as leis divinas forem
conhecidas e praticadas pela grande maioria da população planetária, exceção feita a uma pequena
minoria de Espíritos rebeldes, que serão encaminhados a outro mundo condizente com suas
condições evolutivas.
A presença do Consolador no mundo já é indício de nova orientação e compreensão sobre a verdade
e a vida, como o foi a vinda do Cristo, há cerca de dois mil anos.
Vivemos tempos novos em que os ensinos e os exemplos do Governador espiritual deste orbe precisam ser entendidos e vivenciados em seu verdadeiro sentido.
As ciências e as religiões, em vez de se complementarem e se entenderem reciprocamente, em geral se repelem, impulsionadas pelos prejuízos do materialismo multifário, de um lado, e por crenças e interpretações distorcidas, de outro.
Agora, com o avanço dos conhecimentos das leis universais, dos mundos e das esferas espirituais,
que os colocam em relacionamento com o mundo material em que vivemos, um novo entendimento,
uma nova luz é percebida, aproximando a fé e a razão e fortalecendo a ambas.
Cumpre restabelecer a verdadeira doutrina do Cristo, cujos princípios essenciais encontram-se em seu Evangelho e foram profundamente alterados pelo entendimento infeliz dos homens e por interesses
imediatistas, com a criação de um Cristianismo dogmatizado, em que o culto exterior quase sempre
abafa a fé verdadeira.
Para Jesus, uma só palavra poderia resumir toda a filosofia e todas as religiões: o Amor
Tudo se resume no amor a Deus sobre todas as coisas e no amor ao próximo como a si mesmo.
O Espiritismo, o Consolador prometido, vem para restabelecer o entendimento de tudo o que ensinara
o Mestre, sem as distorções interpretativas, além de nos trazer o conhecimento de coisas novas,
mostrando-nos forças e inteligências atuantes na Natureza e dando outra compreensão da vida, através
da fenomenologia espiritual.
Essas novas percepções do Espírito imortal, que tanto pode estar livre da matéria, nas esferas espirituais,
como renascer múltiplas vezes, ligado a um corpo especial, material, que lhe permite novas experiências
e adiantamentos, é outro ângulo da realidade, da qual o Mestre continua dando testemunho a todos
aqueles que despertam para o conhecimento da verdade.

Revista O Reformador de agosto de 2009

Qual o Futuro do Homem para Lá do Túmulo?


Rodolfo Calligaris
Malgrado todos os espiritualistas cristãos (considerados como tais os que concebem a alma como um ser moral distinto do corpo físico, ao qual sobrevive) apontem as Escrituras Sagradas como base dos princípios fundamentais de sua fé, várias e contraditórias são as suas teorias acerca dessa magna questão.
Na opinião de uns, a sorte das almas decide-se no próprio instante da morte. As "eleitas" vão imediatamente para o céu, e as "rejeitadas", para o inferno. Isso até o dia do juízo universal, ocasião em que voltarão a unir-se a seus corpos ressurretos, sem os quais (dizem) nem aquelas conseguem ser completamente felizes, nem estas podem ser convenientemente castigadas.
Segundo outra concepção, além do céu e do inferno, existiria uma estância intermediária: o purgatório, lugar de expiação para as almas que, não estando inteiramente livres do pecado, tenham algumas penas a descontar antes de serem recebidas no céu. Também para os partidários desta crença, haverá, no juízo universal, uma religação das almas a seus antigos corpos para que, juntos, recebam sua sentença de glória ou de condenação.
No entender de outros, ocorrendo à morte, as almas trespassadas perdem a consciência de tudo e ficam como que em sono profundo, até o evento do juízo. Somente nesse dia é que os justos ressuscitarão para a vida eterna, sendo que os considerados maus ou serão destruídos ou descerão para as regiões onde há choro e ranger de dentes.
Há ainda quem afirme que o céu já está lotado por um número certo de almas santificadas, não havendo lá mais vaga para ninguém. No final dos tempos, os que merecerem a graça da salvação, terão seu futuro "habitat" aqui mesmo na Terra, que, devidamente expurgada, transformar-se-á em delicioso paraíso.
Essas doutrinas só se põem inteiramente de acordo em um ponto. E' quando dogmatizam que o homem vive apenas uma vez (ainda que, em certos casos, por apenas alguns minutos), depois do que sua boa ou má sorte será definitivamente selada, sem que lhe seja possível, além sepultura, arrepender-se e emendar-se.
Ora, o que se vê neste mundo é que, do selvagem ao civilizado, os dons se evidenciam assaz desproporcionados, o mesmo acontecendo com o nível de moralidade. Nem mesmo ao nascerem, as criaturas se apresentam igualmente dotadas. Assim, se o futuro de cada ser, na eternidade, dependesse realmente de uma só vida corpórea, então Deus devera ensejar a todos as mesmas aptidões e oportunidades de instruir-se, assim como igualar a duração da existência humana, porquanto premiar uns com deleites infinitos e condenar outros a torturas atrozes para todo o sempre, sem lhes haver assegurado uniformidade de condições para merecerem este ou aquele destino, constituiria a mais tremenda injustiça.
Outrossim, se os mortos não pudessem, mesmo, arrepender-se de seus erros, nem tomar novas resoluções, qual a utilidade da pregação do Evangelho feita a eles pelo próprio Cristo, corno se lê em I S. Pedro, 4 :6?
A Doutrina Espírita responde à indagação que serve de título a estas linhas dizendo que, como filhos de Deus, criados à Sua imagem e semelhança, todos os homens se destinam à perfeição, o que vale dizer, à felicidade.
Através das vidas sucessivas, todos hão de assenhorear-se da Verdade e, de progresso em progresso, vir a "amar o próximo como a si mesmos", conquistando destarte o "reino do céu", que é um estado (retidão de consciência) e não propriamente um lugar.
Com tal destinação, a alma deve caminhar sempre para frente e para o alto, crescendo em ciência e em virtude, rumo à Razão Infinita e ao Supremo Bem.
Cada uma das existências terrestres ou nos milhares de mundos que pontilham o Universo, não é senão um episódio da grande vida imortal. Em cada uma delas, vencemos um pouco da ignorância e do egoísmo que há em nós, depuramo-nos, fortalecemo-nos intelectuais e moralmente, até que, por merecimento próprio, adquiramos o acesso aos planos superiores da espiritualidade, moradas de eterna beleza, sabedoria e amor!
Leitor amigo: não é esta a doutrina que melhor se coaduna com a majestade e os excelsos atributos do Criador?
(Revista Reformador de março de 1964)

Escravo do Pecado


Rodolfo Calligaris
“Dizia Jesus aos judeus que nele creram: se permanecerdes na minha palavra sereis verdadeiramente meus discípulos; conhecereis a verdade e a verdade vos libertará.
Responderam eles: Somos descendentes de Abraão e em nenhum tempo fomos havia motivos para preocupar-se.
Chocado e envergonhado, o soberbo rapaz disse:
- Oh, cara, eu lamento muito.
- Então, em memória de minha filha, eu, orgulhosamente, também uso esta pequena faixa rosa. Através dela, tenho tido oportunidades de elucidar as pessoas. Agora, vá para casa e converse escravos de alguém; como dizes tu que viremos a ser livres?
Retorquiu Jesus: Em verdade, em verdade vos digo, que todo aquele que comete pecado é escravo do pecado.”
(João, 8:31-34.)
Há quem imagine, baseado na letra de um ou outro texto escriturístico, que para salvar-se nenhuma outra coisa se faz necessária ao homem senão que ele creia em Jesus-Cristo.
“Crer em Jesus”, na opinião de tais criaturas, é aceitar como regra de fé que a “efusão do sangue generoso do Justo tem o poder de lavar todos os pecados do crente”.
Argumentam, conseqüentemente, que as boas obras são Jesus) não são filhos de Deus, mas sim filhos do Diabo, pré-condenados à perdição eterna, etc.
Quer-nos parecer, entretanto, que a lídima Doutrina Cristã é bem diferente.
Haja vista que, no lanço em epígrafe, Jesus se dirige a alguns dos que creram nele e, longe de acenar-lhes com privilégios especiais, diz-lhes claramente que só há um modo de se darem a conhecer como discípulos seus: “permanecerem na sua palavra”, isto é, seguirem-no fielmente imitando-lhe a vida de serviço em favor dos semelhantes.
Seus ensinos, calcados no amor a Deus ao próximo, são a mais pura expressão da Verdade. Conhecê-los e exercitá-los significa, pois libertar-nos da ignorância, da superstição e d egoísmo, que geram o sofrimento, ganhando aquele estado de alegria e de paz interior que caracteriza “o reino dos céus”.
A condição sine qua non para nos incluirmos entre aqueles definidos na segunda oração do versículo 31: “sereis verdadeiramente meus discípulos”, deu-a o Mestre na primeira: “SE permanecerdes na minha palavra”. Não há, por tanto, como sofismar: só é cristão, efetivamente aquele que permanece fiel à palavra do Nazareno, amando e servindo ao próximo, como que rena ser amado e servido.
A confirmação desta exegese, temo-la em profusão por todo o Evangelho, notadamente neste outro tópico de João (13:34-35), onde o Cristo nos diz: “Um novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros tanto como eu vos amei. NISTO (Em vos amardes uns aos outros) conhecerão todos que sois meus discípulos.”
Os recém-conversos não entenderam, porém, de pronto, a que tipo de libertação o Mestre se referia, e daí o lhe terem respondido daquele jeito: “nunca fomos escravos de ninguém; como, pois, nos dizes que seremos livres ?“
Ensinando-lhes, então, que “todo aquele que comete pecado é escravo do pecado”, Jesus reafirma a Lei de Causa e Efeito, que caberia ao Espiritismo elucidar minuciosamente, segundo a qual cada um se faz responsável pelos maus atos que pratique, devendo expiá-los na medida exata dos agravos ou danos causados a outrem.
Somos livres na semeadura do Bem ou do Mal; todavia, uma vez feita a escolha, as boas ou más conseqüências serão a “colheita obrigatória” daquilo que houvermos feito.
Se a opção foi pelo Bem, ficamos com um crédito da mesma espécie, que se manifestará infalivelmente em nossa vida, em moedas de bênçãos e felicidades; se, entretanto, a opção foi pelo Mal, ficamos necessariamente em débito com a Justiça Divina (escravos do pecado cometido), sendo que, neste caso, o preço do resgate se expressará em dores e aflições proporcionais ao que fizemos sofrer.
Se isso não se der na mesma existência, dar-se-á em outra ou outras, mas, de forma nenhuma ficaremos impunes, eis que “aquilo que o homem semear, isso mesmo há-de colher”.
Assim, pois, o fato de alguém pertencer a esta ou àquela religião, não o isenta, absolutamente, do cumprimento das Leis de Deus; pelo contrário, quanto melhor as conheça e compreenda tanto maior sua obrigação de observá-las, porque “a quem mais foi dado, mais lhe será pedido”.
(Revista Reformador – janeiro de 1965)

Jesus Apazigua a Tempestade


Rodolfo Calligaris
“Jesus tomou em seguida a barca, acompanhado pelos discípulos. E eis que se levantou no mar um tempestade tão grande que as ondas cobriam a barca. Ele, entretanto, dormia.
Os discípulos então se aproximaram dele e despertaram, dizendo: Senhor, salva-nos que perecemos.
Jesus lhes respondeu: Porque tendes medo, homens de pouca fé? E, levantando-se, mandou que o ventos e o mar se aquietassem, e grande bonança logo se fez.
Os homens, cheios de admiração, diziam: Quem é este a cujas ordens os ventos e o mar obedecem?"
(Mat, 8:23-27.)
Malgrado certas aparências em contrário, tudo, na Terra, obedece a leis naturais, concorrendo para um objetivo providencial: o aperfeiçoamento de suas condições de habitabilidade, simultaneamente, o progresso da Humanidade que a povoa.
A exemplo das incontáveis moradas do Pai celestial, disseminadas na incomensurabilidade do espaço, a Terra é governada e protegida por um Espírito perfeito, preposto de Deus: Jesus assessorado, se é que assim nos podemos exprimir, por falanges de entidades espirituais altamente evoluídas.
A essas entidades, como agentes da vontade divina, incumbe estabelecer e manter a harmonia das forças físicas da Natureza, em cujo mister contam com o concurso de enormes massas de Espíritos, dos quais uns dirigem e outros são dirigidos, como acontece entre nós.
Presidindo aos destinos deste mundo desde a sua formação, conforme nos instrui o evangelista João (1:9-10), Jesus tinha (como ainda tem) completo domínio sobre os que movimentam os elementos naturais, de sorte que, a uma manifestação de sua vontade potentíssima, tanto podia fazer cessar uma tempestade e serenar as ondas do mar, como promover outros fenômenos análogos, maravilhosos, sem dúvida, mas perfeitamente explicáveis, hoje, à luz do Espiritismo.
Sua ação no episódio em tela visava a despertar a fé, virtude preciosa, naqueles que o acompanhavam, pois, conhecedor profundo da psicologia humana, sabia que, sem o estímulo dessas demonstrações surpreendentes, poucos haveriam de perseverar no discipulado cristão.
Mas, que tais fatos não constituíam milagres, deu-o a entender o próprio Mestre ao afirmar: “Aquele que crer em mim (entenda-se: que se tornar uno comigo, em sabedoria e bondade, como eu o sou com o Pai) fará também as coisas que eu faço, e outras ainda maiores. (João, 14:12.)
Talvez nos objetem: como podem as tempestades, os furacões, as erupções vulcânicas, os terremotos e outros flagelos, concorrer para a evolução da Terra, como dissemos de início, se só causam destruição, desordem, sofrimento e morte?
E’ que nosso planeta, relativamente novo, ainda não alcançou as melhores condições de equilíbrio, e sendo, como é, um mundo de expiação e de provas, tais cataclismos, ao mesmo tempo que contribuem para aquele fim (embora não o percebamos, tão limitada é a nossa visão no tempo e no espaço), ensejam aos que são vitimados por eles o resgate de dívidas contraídas perante a Justiça Divina, sofrendo dores e aflições que a outrem fizeram sofrer. Servem, ainda, para que todos nós, no afã de prevenir­-lhes ou remediar-lhes os efeitos, nos desenvolvamos intelectualmente, e, pela compaixão que nos inspira, exercitemos o devotamento e a caridade para com o próximo.
Estejamos certos: nada ocorre no mundo à revelia de Deus, assim como nada, absolutamente nada, pode contrariar os seus altos e sábios desígnios.
As calamidades que atingem, ora um ora outro povo, têm, todas, uma razão justa, se bem que inacessível ao nosso pequenino grau de entendimento atual.
Portanto, quando venhamos a ser provados no sofrimento, lembremo-nos destas palavras das Escrituras: “Bem-aventurado o homem a quem Deus corrige, porque Ele dá o golpe, mas Suas próprias mãos operam a cura.” (Job, 5:17-18.)
(Revista Reformador de agosto de 1964)

O Endemoniado Geraseno


Rodolfo Calligaris
“Tendo atravessado o mar, desembarcaram no país dos gerasenos e, mal Jesus descera da barca, veio ter com ele um homem possuído do espírito imundo, homem esse que ninguém conseguia dominar nem mesmo com correntes, pois muitas vezes estivera com ferros aos pés e preso por cadeias, os quebrara. Vivia dia e noite nas montanhas e as sepulcros, a gritar e a flagelar-se com pedras. Ao ver Jesus, de longe, correu para ele e o adorou, exclamando em altas vozes: Que tens tu comigo, Jesus, filho de Deus Altíssimo? Eu te suplico, não me atormentes. Isso porque Jesus lhe ordenava:
Espírito imundo, sai desse homem. Perguntando-lhe Jesus: como, te chamas? - respondeu: Chamo-me Legião, porque somos muitos.
Ora, havia ali uma grande vara de porcos pastando na encosta do monte, e os demônios faziam a Jesus esta súplica: manda-nos para aqueles porcos, a fim de entrarmos neles. E como Jesus lhes desse permissão para isso, os Espíritos impuros, saindo do possesso, entraram nos porcos; toda a manada saiu a correr impetuosamente e foi precipitar-se no mar, onde se afogou.
Os que a apascentavam fugiram e foram espalhar na cidade e nos campos a notícia do que se passara. Logo acorreram muitos até onde estava Jesus e, encontrando o homem que ficara livre dos demônios sentado a seus pés, vestido e de perfeito juízo, se encheram de temor. Ouvindo, então, dos que presenciaram o fato, a narrativa do que sucedera ao possesso e aos porcos, todos pediram a Jesus que deixasse aquelas terras.”
(Dos EVANGELHOS.)
Temos aqui um caso impressionante de possessão, cuja vítima, subjugada por uma falange de Espíritos perversos, tornara-se o terror dos sítios em que vivia.
Pelo relato dos evangelistas, bem podemos imaginar-lhe a terrível figura: seminu e coberto de feridas sangrentas, olhos esfogueados, cabelos longos e em desalinho, pedaços de corrente a lhe penderem das pernas, mais haveria de parecer uma fera do que propriamente uma criatura humana.
Compadecido do infeliz, Jesus liberta-o de tão má influência, como que lhe restitui de pronto a razão, o domínio de si mesmo, e, convidando-o a sentar-se junto de si, põe-se a edificá-lo com seu verbo terno e esclarecedor, preparando-o para que viesse a ser mais um arauto da Boa Nova, e, ao voltar para a companhia dos familiares, ao contar-lhes que coisa estupenda o Senhor fizera por ele, estivesse habilitado anunciar-lhes também a doutrina de Amor, e Tolerância e de Justiça que estava sendo trazida ao mundo, cuja observância é o mais seguro remédio contra todos os males que afligem e infelicitam a Humanidade.
Quanto aos Espíritos obsessores, não entra nos porcos, como supuseram os circunstantes, coisa que hoje melhor se compreende; apenas se fizeram visíveis aos suínos e estes, espavoridos, se precipitaram do monte para baixo em tão desabalada carreira que, não podendo estacar ao chegarem à praia, introduziram-se no mar, perecendo afogados.
O episódio em tela, ao mesmo tempo que ressalta o extraordinário poder de Jesus (baseado na perfeição de seu caráter) e sua incomensurável piedade para com os sofredores, pôs em relevo, por outro lado, a mesquinhez de muitos homens, para os quais o interesse material a tudo sobreleva.
A cura daquele possesso que os trazia em sobressalto deveria ser, para os gera-se nos, motivo de se regozijarem e se mostrarem agradecidos àquele que operara tal maravilha. Ao invés disso, porém, só levaram em conta a perda de seus animais e, receosos de novos prejuízos pecuniários, despediram de suas terras, qual se fora um intruso indesejável, o próprio Filho de Deus que os honrara com sua augusta presença.
Agora meditemos.
Nós outros não estaremos agindo, ainda hoje, de igual maneira? Não continuamos colocando as conveniências mundanas acima dos galardões espirituais?
Conquanto nos pese reconhecê-lo, todas as vezes que contrariamos a Doutrina Cristã, porque seguir-lhe os preceitos nos custaria o sacrifício de algum lucro temporal, é como se, visitados pelo Mestre, o puséssemos para fora de nossa porta!
(Revista Reformador de fevereiro de 1966)

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Aspectos Positivos do Não


CLARA NATÉRCIA
“Todo não tem uma explicação.” Tal conceito nós o lemos, há tempos, em
um livro sobre psicologia infantil, no qual o autor orientava os pais, no sentido de
que, ao negar algo à criança, não se limitassem apenas a dizer-lhe NÃO.
Segundo o psicólogo, deveriam esclarecer-lhe o porquê de sua atitude contrária,
mostrando o dano que adviria se a deixassem fazer o que quisesse. Dava,
então, alguns exemplos. Digamos que a criança se encaminha em direção à janela
e seja proibida de ter acesso ao peitoril. Cumpre dizer-lhe do perigo de uma
queda a que ela se expõe. Ao observar o pequenino com um objeto cortante ou
perfurante na mão, como se fora um brinquedo, adverti-lo do risco de se ferir pelo
mesmo. Ao se aproximar de uma mesa ao seu alcance, evitar que o faça, dandolhe
a entender que o objeto pode cair-lhe sobre o corpinho. E assim por diante. O
psicólogo tentava lembrar aos pais e educadores, em geral, que, uma vez esclarecida,
a criança pode aceitar melhor as restrições ou recusas aos seus desejos
e vontades.
Reportando-nos a essa diretriz psicológica, passamos, então, a meditar sobre
o NÃO que nos tem sido dado através da palavra divina. No Decálogo, recebido
por Moisés no alto do Monte Sinai, constatamos que, dos Dez Mandamentos,
sete registram o NÃO. Há a predominância de proibição justamente com o
precípuo escopo de preservar-nos de quedas e falências ante as leis divinas.
Pelos Dez Mandamentos, nas Tábuas da Lei, somos induzidos a uma obediência
paradoxalmente negativa, mas, no fundo, em realidade, de sentido nítida
e essencialmente positivo, imunizador, preservativo. Posterior a Moisés, Jesus,
como o Messias prometido, trouxe-nos novos rumos ao encaminhamento de
nossas vidas, asseverando que não veio destruir a Lei Divina, mas, sim, dar-lhe
cabal cumprimento, pondo-nos em consonância com as determinações supremas
do Criador.
Com a sua didática sábia, segundo depreendemos dos seus
ensinos, o Mestre enunciou, bastas vezes, o NÃO, em sentido evidentemente
positivo, resguardando-nos de riscos e perigos a que estamos sujeitos.
Não obstante, de todo advertidos e bem orientados pela Palavra do Senhor,
ainda assim sentimos dificuldades em nossa adaptação aos parâmetros dos seus
ensinos. Claudicamos, com falhas e desvios de nossa estrada redentora, a cujas
sinalizações quase sempre estamos desatentos.
O Evangelho do Senhor sofreu desvirtuamentos e interpolações que o descaracterizaram
em sua simplicidade e pureza primitivas, contribuindo assim para
que os postulantes ao discipulado cristão se perturbassem e perdessem o rumo
certo da caminhada.
Tal situação de enganos e engodos, de logros e malogros, pressentida pelo
Mestre, levou-O a tranqüilizar-nos com a promessa do advento do Consolador,
que teve os prenúncios de seus albores em 18 de abril de 1857, mediante a publicação
por Allan Kardec de “O Livro dos Espíritos”, em Paris (França).
De então por diante, as obras da Codificação Kardequiana que se lhe seguiram
deixaram-nos vislumbrar a manhã nascente em todo o esplendor de sua claridade
solar. A Nova Revelação estava, sem dúvida, estruturada em suas bases,
desfazendo as brumas e nebulosidades que encobriam os marcos e sinalizações
da estrada, sem enganos e engodos.
A Doutrina dos Espíritos proscreveu o NÃO dos seus ensinos, no nortea mento dos nossos passos?
Não, dizemos nós agora. Prescreve proibições? Sim,
só nas entrelinhas do seu contexto doutrinário-evangélico. O NÃO está imanente,
intrinsecamente nelas embutido, como pérolas ocultas nas conchas das ostras.
Faz-se mister acuidade no olhar para depreendê-lo em sua feição positiva, que
salta, então, do texto para ficar conosco, ou seja, com o nosso senso de responsabilidade,
com o nosso cérebro e coração, com a nossa mente e consciência,
enfim, com o nosso livre-arbítrio.
Nós, espiritistas, quando verdadeiramente familiarizados com os ensinos da
Doutrina dos Espíritos, é que nos proibimos de falar ou não falar, de fazer ou não
fazer, de permitir ou não permitir, de aquiescer ou não aquiescer. Assim é que
permanecemos em estágio positivo, negando o que não nos convém ou quanto
venha em sentido contrário aos princípios e preceitos do nosso aprendizado haurido
nas fontes inconcussas das obras kardequianas. Nelas o NÃO prevalece
quando podemos detectá-lo para aplicá-lo em nós mesmos.

Revista O Reformador -Setembro de 2000

A PRECE REFRATADA : “– A prece refratada é aquela cujo impulso luminoso teve a sua direção desviada, passando a outro objetivo(...) a súplica que não age pode ser uma flor sem perfume"


 Revista O Reformador



JOSÉ JORGE
 
Setembro de 2000 

"A prece é uma elevação da alma até Deus, ou um ato de amor e adoração
para com Aquele a quem se deve esta maravilha a que se chama vida.”1*

“A verdadeira oração representa um estado místico em que a consciência
se absorve em Deus.”2*

“Para orar, basta somente o esforço de nos elevarmos até Deus; tal esforço, porém, deve ser afetivo e não intelectual.”3*

“Segundo São Luiz Gonzaga, o cumprimento do dever é equivalente à oração.”4*

“A oração feita por outrem é sempre mais fecunda do que a feita pela própria
pessoa.”5*

Léon Denis assim se manifesta sobre a oração:
“Orar é voltar-se para o Ser eterno, é expor-lhe nossos pensamentos e nossas
ações, para os submeter à sua Lei e fazer da sua vontade a regra de nossa
vida; é achar, por esse meio, a paz do coração, a satisfação da consciência.”6*

É ainda Léon Denis quem diz:
“Seria um erro julgar que tudo podemos obter pela prece, que sua eficácia implique em desviar as provações inerentes à vida. A lei de imutável justiça não se curva aos nossos caprichos. Os males que desejaríamos afastar de nós são, muitas vezes, a condição necessária ao nosso progresso.”7*

Jesus valorizava a oração e, por muitas vezes, deu o exemplo, também orando. É só consultarmos:
Mateus: 14:23; 26:39; 26:42; 26:44. Marcos: 1:35; 6:46; 14:32; 14:35. Lucas:3:21; 5:16; 6:12; 9:18; 9:28; 9:29; 22:41 e 44. João: 12:27-28 e 17:1-26.

A oração pode ser para um pedido, um agradecimento ou uma glorificação.
As preces de glorificação são as de mais alto grau, pois reconhecem o Amor e a Justiça de Deus. São próprias dos Espíritos mais evoluídos.

Em “O Livro dos Espíritos”, questões 658 a 666, encontramos vários ensinamentos
sobre a prece:
“O essencial não é orar muito, mas orar bem.” (660.)
“A prece não esconde as faltas.” É preciso mudar de proceder. (661.) A prece torna mais suportáveis nossas provas, mas não as evita. (663.)

A prece pelos mortos e pelos sofredores não muda os desígnios de Deus, mas dá alívio. (664.)

Existe, ainda, um tipo de prece bem diferente das conhecidas:
a Prece Refratada.
A refração é uma lei física que consiste no desvio que os raios de luz, calor ou som sofrem em sua direção, quando passam de um meio para outro, isto é, mudam de direção quando encontram um meio diferente durante seu percurso.
André Luiz nos dá uma interessante explicação sobre a Prece Refratada.
Num diálogo entre Hilário e Clarêncio, este lhe fala da referida prece.
Curioso, Hilário lhe pede maiores esclarecimentos que Clarêncio prontamente transmite:
“– A prece refratada é aquela cujo impulso luminoso teve a sua direção
desviada, passando a outro objetivo.”8*
Mais adiante, Clarêncio ilustra sua explicação: “(...) Evelina recorre ao espírito materno que não se encontra em condições de escutá-la, mas a solicitação
não se perde... Desferida em elevada freqüência, a súplica de nossa irmãzinha
vara os círculos inferiores e procura o apoio que lhe não faltará.”9*

Noutro trecho, esclarece ainda o autor:
“(...) a súplica que não age pode ser uma flor sem perfume. Peçamos o socorro do Senhor, algo realizando para contribuir em seu apostolado divino...”10* 

Referências Bibliográficas:

1. CARREL, Alexis, A Oração, Livraria Tavares Martins, Porto, 1945.
2. Idem, p. 17.
3. Idem, p. 19.
4. Idem, p. 20.
5. Idem, p. 35.
6. DENIS Léon, O Grande Enigma. Rio de Janeiro: FEB. 11. ed. 1999, cap. VII, p. 98.
7. DENIS Leon. Depois da Morte. Rio de Janeiro: FEB. 20. ed. 1997, cap. LI, p. 297.
8. XAVIER Francisco Cândido. (André Luiz). Entre a Terra e o Céu. Rio de Janeiro: FEB, 17. ed.
FEB 1997, cap. II, p. 14.
9. Idem, p. 16.
10. Idem, cap. XXV, p. 157.

Terapia do Evangelho


Amigos,
Lícito é que procuremos a cura de nossos males físicos, empregando os recursos
terapêuticos que a bondade de Deus coloca ao nosso dispor através dos profissionais da
saúde. Não olvidemos que o socorro dos Mentores Espirituais, em se tratando da saúde
humana, nem sempre se faz por meio de recursos estranhos à metodologia médica,
principalmente porque seus representantes, quando conscientes da responsabilidade que
assumiram perante o Médico das Almas, constituem-se em instrumentos da Vontade
Divina junto aos necessitados da jornada terrena.
Todavia, é preciso considerar a responsabilidade do doente ante as causas
desencadeadoras do mal que o infelicita. Originando-se todas no campo moral, o
principal agente terapêutico será unicamente a aplicação em si do remédio salvador, que
outro não é senão o Evangelho de Nosso Senhor Jesus-Cristo.
Indubitavelmente, nas atitudes de egoísmo, de orgulho e de vaidade extremados,
cultivados por anos e anos nas diversas etapas reencarnatórias, encontraremos as
causas dos desajustes vibratórios expressos na estrutura do perispírito, a ofertarem aos
desafetos e comparsas do passado as condições de afinização vibratório-magnética que
podem, de per si, não só desencadear os processos patológicos como também agravar
os já existentes.
Quando a criatura alia aos recursos terapêuticos da medicina humana – quer os
de natureza homeopática ou alopática, quer os da chamada medicina alternativa – o
esforço constante em buscar o autoconhecimento para melhor reeducar-se nas lições da
Boa-Nova, tais recursos terão sua ação potencializada e seus efeitos sobre a saúde
serão mais sentidos.
Ao reeducar-se à luz das lições imorredouras do Médico das almas, ao aceitar as
dificuldades da vida como um reflexo dos desmandos do passado, encarando-as como
oportunidades preciosas para o progresso rumo à Luz Maior, a criatura se furtará a
muitos males evitando agravamentos do seu estado físico.
Por mais eficazes possam ser os recursos da tecnologia da saúde colocados à
nossa disposição, é preciso também considerar o mérito de cada um perante a Medicina
Divina, bem como o papel regularizador das vibrações perispirituais desajustadas pelas
infrações às Leis Divinas, manifestadas na doença física. Esta, muitas vezes, é o agente
rearmonizador do ser com a própria consciência, e, neste caso, os recursos tecnológicos
representarão apenas a Bondade Celestial agindo para fornecer à criatura as condições
materiais que lhe permitam expiar seus débitos morais até o fim e, desse modo, libertarse
não apenas do mal físico mas, sobretudo, do mal vibratório que gerou o primeiro em
nível perispiritual.
Em todas as circunstâncias difíceis de nossa saúde, amigos, recorramos ao
Mestre, aplicando o seu Evangelho como recurso terapêutico por excelência.
Supliquemos-lhe forças para tudo suportar com mansidão e paciência.
Peçamos-lhe a coragem com que lutemos contra nossas más tendências e sigamos seus
exemplos.
Muita paz!
DIAS DA CRUZ
__________
(Mensagem recebida psicograficamente pela médium Tânia
de Souza Lopes, em reunião pública de 19-9-97,
na Sede Seccional do Rio de Janeiro-RJ.)

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Tema muito importante que constitui o caráter dos indivíduos nos fazendo refletirmos o quanto temos que nos vigiarmos e orientarmos as nossas crianças.

Em dia com o Espiritismo.
Por que mentimos?

“Da mesma boca provém bênção e maldição.” (Tiago, 3:10.)

MARTA ANTUNES MOURA


Por definição, a mentira é um engano, falsidade ou fraude. Algo que é contrário à verdade e à caridade. Pode ocorrer por vontade própria, por omissão ou por equívocos de interpretação de fatos e comportamentos.
Em qualquer situação os resultados são sempre negativos.
Primeiro porque contraria padrões morais, éticos e religiosos (a mentira é considerada “pecado” pelas religiões cristãs tradicionais); segundo porque pode desencadear reações imprevisíveis, com exacerbação de animosidade e conflitos entre as pessoas, estabelecimento de focos de maledicência, entre outros.
Alguns filósofos, como Platão (428/427-348/347 a.C.), admitiam aceitar algumas mentiras, desde
que não produzissem maiores prejuízos, como a chamada “mentira piedosa”. Immanuel Kant (1724- -1804), Santo Agostinho (354-430) e Aristóteles (384-322 a.C.) não aceitavam qualquer tipo de mentira,
por acreditarem que o mentiroso é um Espírito moralmente fraco. Este último filósofo, inclusive, a distinguia e classificava em dois tipos: a jactância, que consiste em exagerar a verdade, e a ironia que, ao contrário, diminui a verdade.1*
Não há dúvidas de que a mentira, parcial ou total, velada ou declarada, revela desarmonia espiritual
de quem a pratica. A questão que se coloca, porém, é outra: o que fazer para evitar queda nas malhas
da maledicência, fazendo opção pela verdade? Pois nem sempre é fácil discernir entre o falso e o verdadeiro. Pondera o Espírito São Luís, a respeito, que todo cuidado é pouco ao comentar o mal
alheio, ainda que este se revele verdadeiro:
[...] Se as imperfeições de uma pessoa só prejudicam a ela mesma, não haverá nenhuma utilidade
em divulgá-la.No entanto, se podem acarretar prejuízos a terceiros, deve-se preferir o interesse
do maior número ao interesse de um só. [...] Em tal caso, deve-se pesar a soma das vantagens e dos inconvenientes.2*
No rastro histórico da mentira, vamos localizá-la como abominável técnica de persuasão, largamente
utilizada por Adolf Hitler e os construtores do nazismo, a qual foi denominada Teoria da Grande Mentira. Trata-se de uma ferramenta da propaganda ideológica frequentemente usada, no passado e no presente, para se referir à crença de que uma mentira, repetida com frequência, de forma convicente que ignora todas
e quaisquer declarações que poderiam desmascará-la, irá com o tempo ser aceita pelas pessoas,
adquirindo o status de verdade, desde que repetida enfaticamente e soprada nos ouvidos certos.3*
Estudos de psicologia comportamental indicam que a mentira pode surgir por várias razões: receio
de que a verdade produza consequências negativas, por insegurança ou baixa autoestima, por opressão de autoridades (pais, amigos, chefes), para obtenção de vantagens ou regalias, e por motivos patológicos. Analisa, contudo, o filósofo estadunidense David Livingstone Smith, Ph.D e professor da Universidade da Nova Inglaterra (USA), que a mentira está há muito tempo integrada no ser humano, iniciada, possivelmente, logo após o surgimento da linguagem. Informa que o homem aprendeu a mentir, inicialmente,
para si mesmo, como forma de aliviar tensões, mas, ao mentir para si, aprendeu a enganar o outro.4*
De qualquer forma, a mentira, pequena ou grande, revela imperfeição moral que pode e deve ser
combatida, pois é mecanismo contrário à melhoria moral do Espírito, como enfatiza Emmanuel:
– Mentira não é ato de guardar a verdade para o momento oportuno [...].
A mentira é a ação capciosa que visa ao proveito imediato de si mesmo, em detrimento dos interesses alheios em sua feição legítima e sagrada; e essa atitude mental da criatura é das que mais humilham a personalidade humana, retardando, por todos os modos, a evolução divina do Espírito.5*

O Espírito que já possui algum esclarecimento sabe, portanto, que o ato de mentir implica aquisição
de satisfações pessoais por meios escusos e que não considera o constrangimento e o sofrimento
do próximo. É um comportamento errôneo, um deslize moral, como ensina Joanna de Ângelis:
O erro é sempre um compromisso negativo, e toda lesão moral, particularmente aquela
produzida no organismo social, constitui grave comprometimento, de cujos efeitos não se
pode evadir o responsável. Desse modo, todo e qualquer deslize moral é sempre uma agressão à
ordem, à saúde, ao equilíbrio, que devem viger em toda parte.
É muito comum censurar-se o crime hediondo que estarrece, enquanto se praticam defecções ditas menores [...].Aqui, é a mentira branca, disfarçando o mau hábito de escamotear a verdade [...]. Mentir é sempre um hábito doentio que encarcera o indivíduo nas suas malhas traiçoeiras.
Adiante, é a censura com ironia, ocultando a perversidade que se expande a soldo da maledicência
e da leviandade. [...]6*

A mentira é relativamente comum na infância, daí ser importante que pais e educadores aprendam
a distinguir a realidade da fantasia. A situação se revela especialmente grave quando a criança
e o adolescente mentem para se isentarem da culpa, para chamarem a atenção dos genitores, familiares, colegas e professores.
Persistindo-se nessas bases, o processo pode evoluir para algo mais sério, doentio, sobretudo se os
adultos, que servem de referência para a criança e o jovem, também têm o hábito de mentir, ou de
usar de subterfúgios para justificar os seus atos incorretos.

Para o professor David L. Smith, anteriormente citado, a questão é
muito mais ampla quando se trata da educação de filhos.
[...] a maioria de nós diz que ensina os filhos a não mentir.Embora seja verdade que as crianças
ouvem que não devem mentir, aprendem mais frequentemente a mentir de uma maneira socialmente aceitável. [...] As crianças aprendem a praticar as formas de engano que são publicamente proibidas, mas, secretamente, sancionadas.
A mentira socialmente apropriada não é meramente tolerada; é compulsória. A criança
que não consegue dominar essa habilidade paga o alto preço da desaprovação, da punição
e do ostracismo social.7*

A mentira sistemática produz, com o tempo, deformações no caráter
individual, sendo impossível, em determinados casos, discernir se a pessoa fala ou não a
verdade. A inteligência humana criou, então, instrumentos não verbais para detectar a mentira, os
quais, ainda que sejam considerados controvertidos, abusivos e antiéticos por várias comunidades
nacionais, são aceitos em investigações policiais de alguns países.
Entre eles estão os “polígrafos”, aparelhos de detecção de mentiras que medem o estresse fisiológico
do entrevistado quando ele fornece declarações ou responde a perguntas.
Acredita-se que os picos do estresse indicariam as mentiras.
A precisão desse método é amplamente contestada, pois o entrevistado tem condições de ludibriar
os registros do aparelho.
Outro detector de mentira é o soro da verdade, que também é considerado pouco confiável.
Recentemente, neurocientistas descobriram que a mentira ativa
estruturas específicas do cérebro, observadas durante exames de tomografia por ressonância magnética.
Trata-se de um método em fase de teste, pois é caro e pouco prático.
O certo, mesmo, é fugirmos da mentira, agindo com mais sinceridade no trato com as pessoas.
Para isto é necessário exercitar atos de boa conduta, apoiando-se nesta orientação do Codificador
do Espiritismo:
[...] Desde que a divisa do Espiritismo é Amor e caridade, reconhecereis a verdade pela prática
desta máxima, e tereis como certo que aquele que atira a pedra em outro não pode estar com a
verdade absoluta. [...].8
*
Referências:
1ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia.
Trad. Alfredo Bosi. 4. ed. São Paulo:
Martins Fontes, 2000. p. 660.
2KARDEC, Allan. O evangelho segundo o
espiritismo. Trad. Evandro Noleto Bezerra.
Rio de Janeiro: FEB, 2009. Cap. 10, item
21, p. 217.
3Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/
wiki/A_Grande_Mentira_(livro)>.
4SMITH, David Livingstone. Por que mentimos:
os fundamentos biológicos e psicológicos
da mentira. Trad. de Marcelo Lino.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2006. Prefácio,
p. 11.
5XAVIER, Francisco C. O consolador. Pelo
Espírito Emmanuel. 28. ed. 3. reimp. Rio
de Janeiro: FEB, 2010. Q. 192.
6FRANCO, Divaldo P. Iluminação interior.
Pelo Espírito Joanna de Ângelis. Salvador:
LEAL, 2006. Cap. 24, p. 149-150.
7SMITH, David Livingstone. Por que mentimos:
os fundamentos biológicos e psicológicos
da mentira. Trad. Marcelo Lino.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2006. Cap. 1, p. 9.
8KARDEC, Allan. Viagem espírita em 1862
e outras viagens de Allan Kardec. Trad.
Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. Rio de Janeiro:
FEB, 2007. Discurso de Allan Kardec
aos Espíritas de Bordeaux, p. 217.
Julho 2010 • Reformador 281

Artigo da Revista O Reformador tratando do assunto ligado aos trabalhadores das Casas Espíritas.

Proveitosa conquista

CLARA LILA GONZALEZ DE ARAÚJO
“Quando fordes convidados, ide colocar-vos no último lugar, a fim de que,
quando aquele que vos convidou chegar, vos diga: meu amigo, venha mais
para cima. Isso então será para vós um motivo de glória, diante de todos os
que estiverem convosco à mesa; – porquanto todo aquele que se eleva será
rebaixado e todo aquele que se abaixa será elevado.” 1*



O capítulo VII, de O Evangelho segundo o Espiritismo, itens 3 a 6, destaca o princípio de humildade como fator determinante para a ascensão espiritual de todas as criaturas e fundamenta- se, entre outras, na passagem evangélica em destaque. A análise oferecida por Allan Kardec, no texto em questão, enaltece a
ideia fundamental de que necessitamos nos despojar de certas vaidades, chamando atenção, sobretudo,
para o cuidado que devemos ter ao assumir situações de relevo social, profissional, ou religioso,
frente ao mundo material:
O Espiritismo aponta-nos outra aplicação do mesmo princípio nas encarnações sucessivas, mediante as quais os que, numa existência, ocuparam as mais elevadas posições, descem, em existência seguinte, às mais ínfimas condições, desde que os tenham dominado o orgulho e a ambição. Não procureis, pois, na Terra, os primeiros lugares, nem vos colocar acima dos outros, se não quiserdes ser obrigados a descer. [...]2*
A valiosa ressalva permite-nos avaliar, essencialmente, as práticas espíritas que desenvolvemos, ao
alimentar a superioridade ou a infalibilidade na execução dos trabalhos voluntários, considerando- os extremamente importantes ou prestigiosos. A questão suscita outras indagações indispensáveis
à nossa reflexão: Contribuímos sem impor exigências? Abraçamos os deveres humildes com devoção
e atendemo-los com amor? Acreditamos cooperar melhor quando nos tornarmos coordenadores de
equipes, em tarefas específicas e essenciais? Damos maior valor às próprias ideias do que às orientações
estabelecidas pela instituição, para o bom êxito dos labores?
Essas perguntas ajudarão na análise do problema. O Centro Espírita oferece-nos inúmeras oportunidades na realização de tarefas nobres e permite- -nos, pelo serviço no Bem, curar as mazelas morais adquiridas no
pretérito de nossas existências. As múltiplas ações que abarcamos – no estudo edificante, na mediunidade,
na evangelização, na assistência social, no atendimento fraterno, na imprensa espírita, na
propaganda libertadora – nos faz viver tempos de renovação e servir motivados pela Doutrina que
nos convoca às fileiras da caridade, sem olvidarmos os necessitados do caminho. Cada qual servindo a seu modo. Nem sempre, contudo, estamos preparados para dar a verdadeira importância às obras na esfera doutrinária e compreender o que elas representam para melhoria do nosso aperfeiçoamento
próprio. A maneira com que agimos, os motivos que determinam o nosso comportamento sincero, ao aceitarmos de boa vontade determinadas tarefas,é o que irá fixar o valor maior ou menor das nossas ações em benefício dos semelhantes. No entender de Vinícius (pseudônimo de Pedro de Camargo, 1878--1966), “o valor das obras não está nas suas grandes proporções, mas na pureza de intenção com que são executadas e no esforço empregado para sua consecução. [...]”.3* O autor, considerado um
dos maiores educadores e evangelizadores espíritas do nosso tempo, lembra-nos:
“[...] A viúva pobre fez mais deitando no gazofilácio do templo uma moedinha de cobre do que os ricos que ali despejavam punhados de ouro. O óbolo da viúva representa um valor maior, porque é a expressão do sumo esforço; era tudo que ela possuía. Dando tudo, não podia dar mais [...]”,3* como a querer dizer- nos: na seara do amor, onde operamos, não há serviço insignificante, não há tarefas menores; elas são apreciadas por Deus, segundo a sua soberana justiça, pela exteriorização dos nobres sentimentos que encobrimos no âmago do nosso coração.
Certos autores espíritas convocam- nos à labuta simples, sem que tenhamos pretensões de executar
grandes feitos, antes mesmo de amadurecermos como tarefeiros, por meio da aquisição de experiências
e estudos necessários ao cumprimento de ações que exijam especial dedicação, fidelidade e expressiva responsabilidade.
Yvonne A. Pereira (1906- -1984), a inesquecível médium, em uma de suas obras, lastima
profundamente a incompreensão de alguns iniciantes no Espiritismo, sobretudo os que aspiram
trabalhar na utilização de suas faculdades psíquicas, conforme suas possibilidades individuais, a serem bem cultivadas e praticadas, aconselhando-os:
[...] Todo médium deverá iniciar o seu desempenho no campo da Doutrina Espírita pelas vias da beneficência, porque assim fazendo desenvolverá os seus poderes psíquicos envolvido
nas faixas vibratórias superiores, junto aos Guias Espirituais, sempre incansáveis em recomendar a prática da beneficência e o estudo constante e metódico, desestimulando a ação arbitrária, de começar pelo fim[...].4*
A autora esclarece que o profitente, ao principiar na tarefa maior, deve compreender que o trabalho da caridade [...] é o serviço do silêncio, da modéstia; não vai para os jornais, nem para as tribunas ou rádios. Não serve para exaltar a vaidade, nem o orgulho, nem o prazer de se sentir admirado. É o trabalho da mão direita, que a esquerda não vê... Mas pelo Mestre e seus mensageiros é conhecido e saudado...5*

Colaborar, anonimamente, em qualquer auxílio de assistência aos irmãos necessitados, fazendo o
bem sem ostentação, é uma recomendação indispensável!
Trabalhadores existem, aos milhares, colaborando, ativamente, nas instituições espíritas; todavia,
raríssimos buscam enriquecer os seus talentos no plantio da verdadeira caridade.
Mesmo os mais
experientes deixam-se dominar pelo cultivo excessivo do raciocínio, esquecendo-se dos generosos
sentimentos no coração, que deve nortear a autêntica prática do Espiritismo junto de Jesus. O livro
espírita Os Mensageiros, do Espírito André Luiz, psicografado por Francisco C. Xavier, relata o caso de Monteiro, servidor entusiasta da colônia “Nosso Lar”, preparado para ser colaborador na iluminação de companheiros encarnados e desencarnados. Ao reencarnar, no entanto, aprimorou-se na aplicação do vício intelectual, desorientando- se completamente.6* Em seu desabafo, comenta alguns aspectos sobre as causas de sua derrota como trabalhador espírita, dirigindo-se aos companheiros que o visitaram, após a desencarnação difícil que tivera:
[...] Chegava ao cúmulo de estudar, pacientemente, longos trechos das Escrituras, não para
meditá-los com o entendimento, mas por mastigá-los a meu bel-prazer, bolçando-os depois aos Espíritos perturbados, em plena sessão, com a ideia criminosa de falsa superioridade espiritual. [...]
Andava cego. [...] Talhava o Espiritismo a meu modo. Toda a proteção e garantia para mim, e valiosos conselhos ao próximo.
Ao demais disso, não conseguia retirar a mente dos espetáculos exteriores. [...]*7

Quando, pois, nos seja oferecido o ensejo de ajudar na seara espírita, saibamos agir com simplicidade
e humildade, sob os efeitos da legítima fraternidade cristã, sem esperar recompensas, de nenhuma
ordem, mas procurando enriquecer os dotes de eficiência imprescindível, apurados nos predicados
de bondade, modéstia, perseverança e espírito de sacrifício, para o engrandecimento das realizações que nos aguardam, sob o amparo dos mentores espirituais que nos assistem com conselhos e orientações legítimas. E, conforme adverte o Espírito Emmanuel, estejamos vigilantes para não deixar que “[...] se amorteça, entre os discípulos sinceros, a campanha contra o elogio pessoal, veneno das obras mais santas
a sufocar-lhes propósitos e esperanças”. 8* Assim procedendo, haveremos de obter proveitosa conquista,
multiplicando as partículas de amor que tivermos distribuído em bênçãos de luz para todos.
Revista O Reformador 2010-Julho
Referências:
1KARDEC, Allan. O evangelho segundo o
espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 25. ed.
de bolso. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB,
2009. Cap. 7, item 5.
2______. ______. Item 6, p. 145.
3VINÍCIUS (pseudônimo de Pedro de Camargo).
Em torno do mestre. 9. ed. 1.
reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2009. P. 2,
cap. O valor das obras.
4PEREIRA, Yvonne A. À luz do consolador.
3. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1998. Psicografia
e Caridade, p. 184-185.
5______. ______. p. 186.
6XAVIER, Francisco C. Os mensageiros.
Pelo Espírito André Luiz. 2. ed. esp. 2.
reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2009. Cap. 12,
p. 79-83.
7______. ______. p. 80-81.
8XAVIER, Francisco C. Pão nosso. Pelo Espírito
Emmanuel. 29. ed. 2. reimp. Rio de
Janeiro: FEB, 2009. Cap. 70.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Para amar o próximo

RICHARD SIMONETTI
Na célebre passagem evangélica, pergunta o doutor da Lei (Mateus, 22:36-40):
– Mestre, qual é o grande mandamento na Lei?
Responde Jesus:
– Amarás o senhor teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento.
Este é o primeiro e grande mandamento.
E há o segundo, semelhante ao primeiro: Amarás o teu próximo como a ti mesmo.
Nesses dois mandamentos estão a lei e os profetas.
Quando Jesus fala que o segundo é semelhante ao primeiro, demonstra, evidentemente, que não
podemos amar a Deus sem amar o próximo, porquanto não há melhor maneira de demonstrar afeto
por alguém do que querendo bem ao seu filho.
Impensável alguém dirigir-se a um pai, nestes termos:
– Gosto muito de você, mas detesto seu filho!
E Jesus estabelece a medida com a qual devemos amar o próximo
para que estejamos amando a Deus: que o façamos como a nós mesmos.
É fácil perceber a razão pela qual não amamos o próximo – é que não amamos a nós mesmos.
A característica básica da personalidade humana é o egoísmo, e onde ele impera pode haver paixão,
mas dificilmente haverá lugar para o amor.
A paixão situa-se nos domínios dos instintos, procura apenas a autoafirmação, o prazer a qualquer
preço, sem perspectivas além da hora presente, e sem aspirações mais nobres.
O amor situa-se nos domínios do sentimento e só se satisfaz com os valores da dedicação, do
sacrifício, da renúncia, das realizações mais nobres em favor do ser amado.
É a paixão por si mesmo que leva o indivíduo a buscar a satisfação dos sentidos no vício e no
desregramento...
É a paixão por si mesmo que lhe inspira a ânsia de poder e riqueza...
É a paixão por si mesmo que o faz comportar-se como uma criança, habituada a bater os pezinhos
e a reclamar em altas vozes porque não lhe deram o brinquedo desejado, porque a Vida não
atendeu às suas aspirações...
Em lugar dessa paixão desvairada que tanto nos compromete é preciso edificar o amor.
O caminho é a caridade, a ser exercitada em duas frentes: o corpo e o Espírito.
O corpo humano é, talvez, a maior maravilha da Criação, no plano da matéria.
Jamais os cientistas deixarão de surpreender-se com essa incrível máquina de peças vivas que permite
a manifestação da inteligência na Terra.
É uma máquina perfeita em suas finalidades, facultando ao Espírito uma bolsa de estudos na escola
da Reencarnação, em abençoado recomeço, sem a lembrança do passado a fim de que supere
desvios e fixações que precipitaram seus fracassos no pretérito.
Todavia, em relação ao corpo assemelhamo-nos a um motorista descuidado, que usa e abusa de
seu automóvel, sem a mínima noção de seu funcionamento, de suas necessidades, das regras de
trânsito, dos cuidados indispensáveis à sua conservação.
Quantas pessoas saberiam explicar o mecanismo da circulação sanguínea?
Quantas têm noção de como os nossos olhos fotografam o mundo exterior para que o cérebro veja?
Quantas compreendem o funcionamento do metabolismo orgânico, de assimilação e eliminação
de substâncias?
No entanto, o conhecimento elementar de Fisiologia é indispensável para que possamos compreender
as necessidades essenciais da máquina física, dentre as quais destacaríamos:
Regime alimentar.
Trabalho disciplinado.
Repouso adequado.
Exercícios físicos e respiratórios.
Cuidados de higiene.
Tudo isso é indispensável à preservação da economia orgânica, a fim de que nos movimentemos
bem na Terra, desfrutando dos dons da saúde, indispensáveis ao bom aproveitamento da jornada humana.
No entanto, raros se comportam assim.
Inspirados na eterna paixão por nós mesmos, cogitamos apenas dos prazeres da hora presente.
O fumo tranquiliza.
O alimento pesado satisfaz o paladar.
O álcool desinibe.
As drogas fazem o céu artificial.
Não importa que a saúde seja arruinada, que dificultemos a jornada, que abreviemos a existência.
E para que exercícios físicos e respiratórios, trabalho disciplinado, regime alimentar, repouso
adequado, cuidados de higiene?...
Deixa pra lá! Tudo isso é tão cansativo e maçante!
O resultado é que há muita gente com distúrbios digestivos, hipertensão arterial, úlcera gástrica,
excesso de peso, colesterol elevado, coração ameaçado, pulmões comprometidos…
– É o nosso carma! São as doenças escolhidas para o resgate do passado...
Ledo engano, leitor amigo.
É simplesmente falta de caridade para com o nosso corpo, essa máquina maravilhosa que Deus
nos oferece para as experiências na Terra, do qual teremos que prestar contas um dia.
E quanto ao Espírito imortal?
Fomos criados por Deus para sermos partícipes na obra da Criação, desfrutando a felicidade
suprema de uma plena integração nos ritmos do Universo, em comunhão com o Senhor.
Mas Deus não quer autômatos, cérebros programados. Somos seus filhos, dotados de suas
potencialidades criadoras, e Ele nos fez livres para desenvolvê- -las com nossos próprios esforços,
a fim de valorizarmos nossas aquisições.
Todavia, ante tão grandioso futuro, perdemo-nos nas vacilações do presente, empolgados pela paixão
de nós mesmos.
Procuramos a felicidade plena em valores falsos, no imediatismo terrestre, esquecidos de que a felicidade
é uma construção grandiosa demais para ser alicerçada sobre
ilusões.
A caridade para com o nosso Espírito é a ação em termos de vida eterna.
É considerar que somos imortais, que já vivíamos antes do berço e continuaremos a viver, depois do
túmulo. Consequentemente, nossos interesses maiores, nossas ações mais constantes devem girar em
torno de quem viverá para sempre, não do ser efêmero que voltará ao pó, conforme a expressão bíblica.
É buscar aqueles valores que, segundo Jesus, as traças e a ferrugem não consomem nem os ladrões
roubam, formados pela cultura, o conhecimento, a virtude, a sabedoria, o exercício do Bem...
Exercitando a caridade com o corpo, habilitamo-nos a aproveitar
integralmente o tempo que o Senhor nos concede para as experiências humanas...
Exercitando a caridade com o Espírito, cumprindo as metas que determinaram a jornada terrestre,
habilitamo-nos a estágios mais altos de espiritualidade.
Atendendo às necessidades do binômio corpo-espírito exercitaremos plenamente o amor a Deus
sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos.
Oportunas, caro leitor, para finalizar, as observações de Kardec
(Viagem Espírita em 1862, “Discursos Pronunciados nas Reuniões Gerais dos Espíritas de Lyon e Bordeaux”, Ed. FEB, p. 87):
[...] Ensinai, pois, a caridade e, sobretudo, pregai pelo exemplo; é a âncora de salvação da sociedade. Só
ela pode realizar o reino do bem na Terra, que é o reino de Deus; sem ela, o que quer que façais, só criareis
utopias, das quais só vos resultarão decepções.
Se o Espiritismo é uma verdade, se deve regenerar o mundo, é porque tem por base a caridade.
[...]
 Reformador • Junho 2010


Perdoa
Recebe a provação de alma serena.
Desculpa todo golpe que te doa.
Guarda contigo a paz singela e boa,
Inda mesmo ante a voz que te condena.
Tudo no mundo é caridade plena.
A fonte beija a pedra que a magoa.
A estrela mostra o brilho na lagoa.
A rosa enfeita o acúleo que envenena.
A árvore esquece o vento que a desnuda.
A Terra inteira serve, humilde e muda.
A chuva desce ao bojo da cisterna...
Perdoa e quebrarás grilhões e algemas,
Buscando, enfim, as vastidões supremas
Para a glória do amor na vida eterna.

Fonte: XAVIER, Francisco C.; VIEIRA, Waldo. Antologia dos imortais. Poetas diversos.
4. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002. p. 96-97.

Mundo em transição


Conforme se observa na questão 55 de O Livro dos Espíritos, cuja primeira
edição ocorreu em 18 de abril de 1857, Allan Kardec pergunta: São habitados
todos os globos que se movem no espaço? E os Espíritos superiores respondem:
“Sim e o homem terreno está longe de ser, como supõe, o primeiro em inteligência,
em bondade e em perfeição”.
Aprofundando a análise deste assunto, Kardec observa:
Nos mundos intermédios, misturam-se o bem e o mal, predominando um ou outro,
segundo o grau de adiantamento da maioria dos que os habitam. Embora se não possa
fazer, dos diversos mundos, uma classificação absoluta, pode-se contudo, em virtude
do estado em que se acham e da destinação que trazem, tomando por base os matizes
mais salientes, dividi-los, de modo geral, como segue: mundos primitivos, destinados
às primeiras encarnações da alma humana;mundos de expiação e provas, onde domina
o mal;mundos de regeneração, nos quais as almas que ainda têm o que expiar haurem
novas forças, repousando das fadigas da luta; mundos ditosos, onde o bem sobrepuja
o mal; mundos celestes ou divinos, habitações de Espíritos depurados, onde
exclusivamente reina o bem. (O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. III, item 4.)
Em mensagem transmitida através de Divaldo Pereira Franco no encerramento
do 3o Congresso Espírita Brasileiro, em 18 de abril de 2010, publicada nesta edição
de Reformador (p. 8), Bezerra de Menezes assevera:
...Estamos agora em um novo período.
Estes dias assinalam uma data muito especial, a data da mudança do mundo de provas
e expiações para o mundo de regeneração.
A grande noite que se abatia sobre a Terra lentamente deu lugar ao amanhecer de
bênçãos.
E continua sinalizando para a necessidade de todos nós aumentarmos a nossa
capacidade de nos amarmos uns aos outros a fim de podermos ser realmente úteis
na construção desse novo mundo e assegurar o direito de nele permanecer.
Devemos lembrar, ainda, a mensagem de Santo Agostinho, de 1862, que, falando
sobre os mundos de regeneração, destaca:
[...] Em todas as frontes, vê-se escrita a palavra amor; perfeita equidade preside às relações
sociais, todos reconhecem Deus e tentam caminhar para Ele, cumprindo-lhe as leis.
Mas [...] nesses mundos, ainda falível é o homem e o Espírito do mal não há perdido
completamente o seu império. Não avançar é recuar, e, se o homem não se houver firmado
bastante na senda do bem, pode recair nos mundos de expiação, onde, então,
novas e mais terríveis provas o aguardam. (Op. cit., itens 17 e 18.)
Com todos estes esclarecimentos, só nos resta, em nosso próprio benefício,
empenharmo-nos no nosso aprimoramento moral.

Revista O Reformador 2010-Junho

domingo, 9 de setembro de 2012

Os efeitos do álcool na sociedade e no Espírito imortal

 Reformador • Abr i l 2009
ROBERTO CARLOS FONSECA
1. Introdução
O álcool, do árabe al-kuhl (essência) é uma das drogas mais antigas da Humanidade. Inicialmente
se acreditava que teria surgido em 6000 a.C., no Egito, onde foram encontradas ruínas de uma
fábrica de cerveja. Porém, recentemente, pesquisadores descobriram vestígios de uva apodrecida
em locais habitados por homens pré-históricos, a qual tinha em torno de 5% de teor alcoólico, demonstrando que o seu consumo é ancestral. No início, a utilização de bebidas alcoólicas pelas sociedades
estava muito ligada à prática religiosa, pois acreditava-se que elas facilitavam o contato com os deuses. Ainda hoje, de forma diferenciada, o álcool serve de símbolo para muitas religiões. Outro sentido para o uso de alcoólicos era a sua utilização tanto como dissipador de preocupações e dor quanto como elemento abortivo.
Com a Revolução Industrial, foram desenvolvidas bebidas destiladas como o uísque (usquebaugh –
água da vida), as quais possuem um teor extremamente alto, gerando inúmeros malefícios ao corpo humano.
Acompanhando a Revolução Industrial, as bebidas fermentadas também passaram a conter um
grau etílico maior, aumentando o número de dependentes em álcool.
O alcoolismo decorre do uso prolongado, geralmente entre 20 e 25 anos, de substâncias alcoólicas.Nesta
fase, o hábito de consumir a bebida já está relacionado ao ritmo de vida do indivíduo, sendo muito difícil
convencê-lo a parar de ingeri-la. .
2-Efeitos no cérebro
Acreditar que o álcool é somente um estimulante é um grande engano. Ele, num primeiro momento,
ao agir diretamente no lobo frontal do cérebro, desinibe o indivíduo, modificando sobremaneira
seu comportamento social, mas sua principal característica é provocar a depressão. Seus efeitos
podem ser observados em três fases:
Na primeira, o indivíduo, via de regra, perde seu senso moral, seus medos e inibições, passando
a se comportar conforme pendores
íntimos que estavam reprimidos por medo das Leis do Estado e pelos costumes vigentes no grupo
social em que se relaciona. Se tinha comportamento tímido, passa a se soltar, principalmente em
relação ao sexo oposto. Se era quieto, torna-se loquaz.
Na segunda, podem ocorrer falta de coordenação motora, descontrole dos reflexos, descontrole
emocional e agressividade. Isto explica a mudança brusca de comportamento, visualizada geralmente
quando ocorrem atos de violência após o consumo de bebidas alcoólicas. Muitos pais de
família, que fazem uso de alcoólicos, ao retornarem ao lar acabam por extravasar seus pendores de
violência na esposa e nos filhos.
A terceira é caracterizada pela depressão, condição em que o indivíduo reclama de tudo e de todos,
da vida, do salário, e normalmente extravasa suas angústias por meio de lágrimas. Ocorrem
também problemas digestivos como: vômitos, diarreias, dores de cabeça, sono, mal-estar geral, coma
etc. Esta fase é mais perigosa, pois a depressão alcoólica pode levar ao suicídio, principalmente
em alcoolistas que, ao retornarem à realidade, percebem que não conseguiram ficar sem a bebida.
Este sentimento de fracasso é agente impulsionador do comportamento suicida.
3-A dependência
Denomina-se alcoolismo a dependência à bebida alcoólica, caracterizada pelo consumo compulsivo
de álcool, com progressiva tolerância à intoxicação produzida pela droga e desenvolvimento de
sintomas de abstinência, quando o consumo é interrompido. Os sintomas mais comuns no caso de
uma crise de abstinência são sudorese, aceleração cardíaca, insônia, náuseas e vômitos. Num estado
mais avançado, ela se caracteriza como delirium tremens, causando confusão mental, alucinações
e convulsões.
Inicialmente, o alcoolista era discriminado, sendo tratado como um ser de personalidade fraca.
Mas, com o avanço da Ciência e dos tratamentos, chegou-se à conclusão de que o alcoolismo
é uma doença, potencialmente forte e destruidora do caráter do indivíduo, que faz de tudo para ter
satisfeita a sua vontade de beber: mente, rouba, trai, seduz.
O alcoolismo gera deterioração psicológica e física. O indivíduo, aos poucos, pela perda dos neurônios,
tem sua capacidade mental reduzida, descuida-se da sua apresentação, torna-se impontual e
tem a concentração nas atividades corriqueiras limitada.
Para esta doença não há cura, o que existe é um tratamento ininterrupto, a fim de que jamais ocorra
novamente o consumo, sob risco de retornar todo o prazer em sorver os alcoólicos, colocando
a perder todo o tratamento já realizado.
4-O álcool e a sociedade
Impulsionado pelos costumes sociais, pela tradição das festas
e comemorações múltiplas, o homem não se dá conta de que o álcool é um dos maiores males que
existem na face da Terra. É agente impulsionador da violência, possui inúmeras doenças atreladas ao
seu uso abusivo, e está entranhado em quase todas as ocasiões em que um grupo humano se reúne, como
se fosse impossível conversar, trocar ideias, tomar decisões na vida particular ou em sociedade, sem
estar com um copo na mão.
Aliado ao baixo custo de produção, tornando-o uma droga acessível a qualquer grupo social, e às políticas de governo pouco eficazes no combate ao seu consumo indiscriminado, ele se torna um verdadeiro destruidor de vidas, de carreiras e da sociedade.
5. Considerações
Se o indivíduo bebe uma vez por semana, é um bebedor social; se de três a quatro vezes, é um
bebedor excessivo; mas se bebe todos os dias, é considerado bebedor dependente.Nem todo bebedor
social vai ser um bebedor dependente, porém todo dependente, um dia, já foi bebedor social. Na
fase da dependência, ele dificilmente sairá sem ajuda; é preciso solicitar auxílio a parentes, amigos
e especialistas.
A maior dificuldade de se combater o uso abusivo de alcoólicos está em ser o álcool uma droga
socialmente aceita. A maioria das pessoas tem o seu primeiro contat com o álcool dentro do próprio
lar.
6. O álcool e o Espírito imortal
Joanna de Ângelis nos alerta que o uso de alcoólicos reflete o declínio dos valores espirituais da
sociedade, sendo aceito como hábito social. Enfatiza que a viciação alcoólica inicia-se pelo aperitivo
inocente, repete-se através do hábito social, impõe-se aos poucos como necessidade e converte-se em
dominação absoluta pela dependência.
Alerta também que a desencarnação se dá através do suicídio indireto, graças à sobrecarga destrutiva que o dependente de álcool depõe sobre o corpo físico.1
Os efeitos do consumo desta substância transcendem os umbrais da morte, vão além dos danos causados
ao corpo físico, instrumento de trabalho da alma reencarnada, que o devolve à terra após o desenlace, a
morte. Esta substância deixa inúmeras marcas no perispírito e na mente do dependente alcoólico, que
se refletirão na próxima encarnação.
Da análise do texto de Manoel P. de Miranda no livro Nas Fronteiras da Loucura, psicografia de
Divaldo P. Franco, podemos concluir que a intoxicação alcoólica traz os seguintes prejuízos a quem
dela se torna dependente:
1. Libera toxinas que impregnam o perispírito;
2. Introduz impurezas amortecendo as vibrações;
3. Entorpecimento psíquico;
4. Insensibilidade ao tratamento espiritual;
5. A dependência prossegue depois da morte;
6. As lesões do corpo físico refletem-se no corpo espiritual;
7. O perispírito imprime as lesões nas futuras organizações fisiológicas;

1FRANCO, Divaldo P. Após a tempestade.
Pelo Espírito Joanna de Ângelis. 8. ed. Salvador
(BA): LEAL, 1985. Cap. 9, Viciação
alcoólica, p. 49.

sábado, 8 de setembro de 2012

Perdão e Reparação


Editorial

A necessidade do perdão – como atitude essencial para a conquista da plenitude espiritual – foi
ensinada por Jesus em diversas ocasiões: “Se perdoardes aos homens as suas ofensas, também
vosso Pai Celeste vos perdoará”1, “Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos
nossos devedores”(2) e “Reconcilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás com ele no caminho”
(3). Destacou, ainda, a importância de perdoar de forma ilimitada: “Não vos digo que perdoeis
até sete vezes, mas até setenta vezes sete vezes.”(4)
Mas o Cristo não se limitou a teorizar sobre o perdão: Do alto da cruz humilhante, submetido a
dores extremas, orou por seus algozes, compreendendo-lhes a ignorância: “Pai, perdoa-lhes porque
não sabem o que fazem.”(5)
Antídoto do ódio, o perdão é gesto de generosidade que beneficia muito mais a quem perdoa do
que àquele que é perdoado. Sentimentos como ódio, rancor e desejo de vingança escravizam as criaturas,
algemando-as a idéias fixas, estados mentais mórbidos, infelicidade e desequilíbrio. Quem perdoa
se liberta do grilhão que o mantém prisioneiro. Mas quem é perdoado não está livre da necessidade
de reparar o mal cometido. Este, registrado na consciência do Ser, exigirá corrigenda, a fim de
que a criatura se reabilite perante a Lei Divina. Mesmo depois de perdoado, sofre o aguilhão do remorso,
que lhe cobra reparação dos prejuízos materiais ou morais que causou a outrem.
Jesus assinalou o imperativo de a criatura buscar o reajuste perante Deus e a própria consciência
mediante o exercício do amor incondicional. Ao reerguer a mulher que era acusada por seus vícios,
o Cristo observa: “Seus muitos pecados lhe são perdoados, porque muito amou.”(6)
Assim, a reparação que favorece a paz interior virá pela vivência do amor, ao eleger o Bem como
prática. Mas poderá ser, também, profundamente dolorosa, quando aquele que foi perdoado permanece
em clima de enfermidade moral, recusando-se à grandeza da fraternidade.
A lição que o Evangelho nos oferece e que a Doutrina Espírita explicita não deixa dúvidas: Não
se chega à felicidade, que todos buscam, sem a vivência da lei moral que emana de Deus e que consiste
na prática da Caridade. E só praticamos a Caridade, plenamente, perdoando os outros e reparando
nossos erros, sempre!
1Mateus, 6:14 4Mateus, 18:22
2Mateus, 6:12 5Lucas, 23:34
3Mateus, 5:25 6Lucas, 7:47
Editorial
O Reformador -Julho de 2005

O amor cobre a multidão de pecados


Antônio Carmo Rubatino-Reformador/Outubro 2005
Uma torrente infindável de mágoas e sentimentos contraditórios leva contingentes de seres humanos exaustos a formar um séqüito de sofredores à procura de socorro psiquiátrico ou psicológico, multiplicando o volume das análises e divãs em consultórios e clínicas.
Quantitativo crescente de casosaporta aos templos religiosos, num desesperado apelo para a fé como
última saída para uma coletânea de ressentimentos, num intricado labirinto de angústias e depressões.
Em grande parte, é a dificuldade nossa de cada dia de desculpar, de desculpar-se, de começar de novo.
Dificuldade que emerge dos relacionamentos diários, tornando a vida uma administração de conflitos
– na família, na escola, no trabalho, no trânsito, no lazer. Até na Casa Espírita.
A Ciência vem fazendo importantes constatações na área do comportamento humano, levando pesquisadores a formular conceitos de extrema relevância, capazes de alterar substanciosamente a qualidade
de vida de indivíduos, famílias e grupos sociais. Revolucionando diagnósticos e substituindo terapias
convencionais, conduzindo pacientes a trocar prolongados tratamentos alopáticos por terapias inovadoras,
os níveis do conhecimento indicam a mudança de hábitos comopré-requisito terapêutico à erradicação
de males de etiologia complexa. Sem externar crenças, a maioria dos pesquisadores evita revelar
convicções religiosas de modo a dar às conclusões caráter de cunho estritamente científico, mas
acabam por fornecer subsídios valiosos ao argumento da religiosidade corrente.
Estudiosos de Stanford relataram valiosas observações, levando o cientista Fred Luskin a tratar do assunto
com admirável propriedade quando torna pública parte desse importante acervo(1):
“Estudos científicos mostram com clareza que o aprendizado do perdão é bom para a saúde e bem-
-estar – bom para a saúde mental e, de acordo com dados recentes, bom para a saúde física.
“(...) Definitivamente, o passado é passado.
“(...) A doença cardíaca é a causa mortis principal tanto para homens quanto para mulheres.
“(...) a raiva provoca a liberação de substâncias químicas associadas ao estresse, que alteram o funcionamento do coração e causam o estreitamento das artérias coronárias e periféricas.
“(...) O perdão é uma experiência complexa, que modifica o nível da autoconfiança, de ações,
pensamentos, emoções e sentimentos espirituais de pessoa vítima de afronta. Acredito que aprender a
perdoar os sofrimentos e ressentimentos da vida seja um passo importante para nos sentirmos mais
esperançosos e conectados espiritualmente, e menos deprimidos.”
Pasma o relato circunstanciado do Dr. Fred Luskin sobre algo que não é estranho ao meio espírita(2):
“Imagine que o que você vê em sua mente está sendo visto numa tela de tevê.
(...) Pelo seu controle remoto você determina o que se apresenta na sua televisão. Imagine agora que
cada um tenha um controle remoto para mudar o canal que está vendo na mente.
(...) desse ponto de vista, a mágoa pode ser vista como um controle remoto travado no canal da
mágoa.”
O raciocínio do cientista faz-nos rememorar a rica literatura advinda através de Chico Xavier, da
valiosa colaboração de André Luiz(3):


“(...) Estupefato, comecei a divisar formas movimentadas no âmbito da pequena tela sombria. Surgiu
uma casa modesta de cidade humilde. Tive a impressão de transpor- lhe a porta. Lá dentro, um quadro
horrível e angustioso. Uma senhora de idade madura, demonstrando crueldade impassível no rosto,
lutava com um homem embriagado.
– ‘Ana! Ana! pelo amor de
Deus! não me mates! – dizia ele, súplice,
incapaz de defender-se. –
‘Nunca! Nunca te perdoarei! (...)’.”
Com toda a sua dinâmica de desvendar o conhecimento a partir de observação repetida e sistemática,
a ciência experimental vem galgando passos importantes na disseminação do saber, dando saltos
quantitativos gigantescos, ora muito objetiva e rapidamente, ora muito lenta e gradualmente. E a variante
dos novos passos que são dados tem a vontade como mola propulsora.
Quando deseja, o homem caminha rápido, muito rápido; quando não, demora-se nas enseadas da
vida, às vezes evitando tratar abordagens incômodas ou de futuro incerto, postergando o transcendente
para outra instância, receoso de chegar a conclusões embaraçosas, que possam implicar em mudanças
importantes nos valores cultuados.
A ciência e a religião tocam-se nas linhas infinitas do tempo.
O Meigo Nazareno já havia recomendado o perdão na sua mensagem consoladora ao colégio apostólico,
aos discípulos, e, em todos os conflitos, externava generosidade e compreensão, procurando substituir a ofensa pela desculpa, a intransigência pela tolerância, a mágoa pelo amor. Recomendara a um
dileto amigo que desculpasse ilimitadas vezes, como que procurando dizer a ele que o perdão age como
medicamento profilático, vacinal, capaz de substituir vincos na fronte cerrada e ameaçadora pela amena
descontração de um riso relaxante e confortador (4). Acostumado a observar a infantilidade de conflituosos
contemporâneos, desaconselhava o litígio, endereçando as querelas a soluções que esvaziam as disputas (5).
Como quem quisesse nos dizer que a maioria dos aborrecimentos do dia-a-dia passariam despercebidos,
se pudéssemos as mais das vezes dizer ao semelhante que nos desafia:
– Estou errado, enganei-me.
Não faria de novo.
Habituados a não reconhecer o próprio erro, sempre empenhamos recursos verbalísticos persuasivos,
no afã de evitar o mea culpa que deixaria o assunto exaurir-se de per si. Opta-se por tentar identificar
o erro no semelhante ou descobrir nele a contribuição para a contenda, crendo na sua dissimulação,
capaz de aviltar a verdade para esquivar-se de qualquer transgressão.
De Pedro vem observação interessante, que não cogita da contenda, dotada de senso de oportunidade,
atualíssima na sociedade em que estamos inseridos, onde o conflito ainda é a via primeira para solucionar
questões do dia-a-dia (6):
(...) tende amor intenso uns para com os outros, porque o amor cobre a multidão de pecados.
Sede, mutuamente, hospitaleiros, sem reclamar. Servi uns aos outros, cada um conforme o dom que
recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus. Se alguém fala, fale de acordo com os
oráculos de Deus; se alguém serve, faça-o na força que Deus supre...
Desculpar não é aceitar o erro que alguém pratica. Mas reconhecer o erro, nosso ou do nosso semelhante,
sem se ofender. Sem se magoar.
Sem ter que sentir de novo, no dia seguinte, a contrariedade da véspera: portanto, sem se ressentir.
É aceitar as pessoas, e a nós mesmos, sem ficarmos presos aos acontecimentos indesejados da vida em
sociedade. É admitir que “o passado é passado”, como afirma FredLuskin. Ou o próprio Emmanuel
quando escreveu: “Agora, eis o momento
da melhora que procuras. (...)
Ontem não mais existe (...).” (7)
AGORA
Agora, eis o momento
Da melhora que buscas.
De nada te lastimes.
Ontem não mais existe.
De tudo o que se foi,
Só a lição perdura.
Renova-te e caminha
Sobre o eterno presente.
Olha o tronco podado
Lançando ramos novos.
Não pares, segue e serve.
Deus cuidará de ti.
Emmanuel

1O Poder do Perdão, Fred Luskin. Editora Novo
Paradigma, cap. 7.
2Idem, ibidem, cap. 9
3Os Mensageiros – Francisco C. Xavier, pelo
Espírito André Luiz, cap. 23, p. 147, Ed. FEB.
4Mateus, 18:21-22.
5Mateus, 5:23-24.
6I Pedro, 4:8-11.
7Espera Servindo, pelo Espírito Emmanuel,
GEEM.

Entrevistando São Francisco de Assis

Revista o Reformador 2001-Outubro
O dia fora especialmente abrasador. A Úmbria ardia sob o Sol da primavera
que explodia em flores por toda parte.
Os imensos campos que se aproximavam dos montes sobranceiros, divididos
em variadas plantações, estuavam no variegado tom de verde, confraternizando
com as terras arroteadas para novas sementeiras, enquanto o feno em fardos
arredondados dava um colorido especial de amarelo-marrom à relva, ora queimada
pelo Sol, ora reverdecente, entremeada pelo vermelho rubro das papoulas exuberantes.
No alto da cidade, a imponente catedral dedicada ao Santo da pobreza com
a sua torre-campanário de elevado porte que, no passado, servia para observar os
inimigos que se aproximassem da encantadora Assis, construída em pedras sobre
outras pedras que a exaltavam dando-lhe um ar de grandeza, galantaria e de glória.
Quando a noite desceu, um pouco tarde, porque a claridade no poente permanecia
em colorido deslumbrante, e o zimbório se adornou de estrelas, a movimentação
prosseguiu em ritmo também febril.
Favônios sopravam do vale fértil, refrescando as ruelas e praças iluminadas.
Um espetáculo na Praça de S. Francisco atraíra a multidão ávida de ruídos e
movimentação, encerrando-se sem grande finale, reduzindo a cidade formosa ao
silêncio quebrado apenas pelas onomatopéias da Natureza e um que outro transeunte
notívago. Perambulando pelas proximidades da Igreja inferior, em tentativa
de recordar aqueles já remotos tempos do século XIII, quando o jovem trovador fora
arrebatado por Jesus e saíra a cantar a melodia imortal do Evangelho, vi acercar-se
um grupo de Espíritos nobres e, dentre eles, o Pai Francisco.
Mantinha as mesmas características com que Giotto o imortalizara nos seus
afrescos. De regular estatura, compleição frágil, traços sem grande beleza física,
porém portador de difícil abordagem de irradiação psíquica, estava acompanhado
por alguns dos seus primeiros irmãos da revolução do amor, da pobreza e da humildade.
Não poderia desperdiçar a feliz oportunidade. Porque estivessem conversando
discretamente, utilizei-me de um momento que se me fez factível e, aproximando-
me, expliquei que eu havia sido na Terra um jornalista brasileiro que, no
Além-Túmulo, reencontrara Jesus e O amava com ternura e respeito.
Interroguei o benfeitor do irmão lobo, se ele me poderia conceder alguns
breves minutos para uma entrevista que encaminharia aos poucos leitores que tomariam
conhecimento do nosso encontro.
Jovial e algo tímido, o santo anuiu de bom grado.
Interroguei-o, sem delongas, bastante emocionado:
– Como vê o desfile de multidões chegadas de diferentes partes do mundo,
para conhecerem Assis, e visitarem os lugares por onde o Paizinho esteve, especialmente
a tumba que lhe guarda os despojos carnais?
Expressando no olhar luminoso a grandeza espiritual de que era possuidor,
o pobrezinho respondeu:
– Esse interesse das criaturas muito me sensibiliza, especialmente porque
reconheço a pequenez da atividade por mim desenvolvida na Terra. No entanto, se
eu pudesse optar, preferiria que o sentimento de todos fosse o de manter contato
O
com o Espírito do Senhor a Quem procurei seguir nos já longínquos dias da existência
física. Em todos os meus passos, a minha pessoa sempre procurou ceder o seu
insignificante lugar ao Pastor que nos orienta o caminho e nos guarda a paz.
“Quando o anjo da morte se acercou do meu corpo cansado, antes de me
retirar destes sítios queridos abençoando-os, senti que viriam muitos homens e
mulheres no futuro, e que encontrariam paz, roteiro e reconforto moral, elegendo,
após acuradas meditações, o reino de Deus. Ainda mantenho essa esperança, e
por isso, periodicamente com os meus irmãos que foram dos mais pobres, procuro
auscultar as almas e auxiliá-las no despertamento, ajudando-as conforme as suas
necessidades e de acordo com os seus apelos e preces...”
– E esse bulício que toma as massas, enquanto o mercado de recordações
cresce cada vez mais, alterando o significado das visitações, que lhe parece?
– Não me cabe censurar o comportamento dos meus irmãos do agitado
mundo atual. A criatura humana deve viver, negociar, trocar objetos e procurar a
conquista de lucros. Toda atividade honrosa merece respeito, porque arranca o ser
da ociosidade, que é um grande adversário do equilíbrio e da dignidade. Vale porém
reconhecer que existem outros recursos que podem ser mobilizados para a
permuta de valores, evitando-se a exaltação das crendices e superstições que contribuem
para auxiliar na transferência das responsabilidades da transformação interior
para o Bem, pela magnetização de objetos e adoração de símbolos...
“As pessoas vivem hoje aturdidas pela pressa, pela volúpia da falta de tempo
para meditar, para assimilar as bênçãos do Pai Criador. Assis sempre inspirou paz
e reflexão. A vida cristã é a antítese do comportamento agitado e angustiado do ser
moderno. Compreendo toda essa inquietação e mesmo a falta de silêncio, por
momentos sequer, no Templo, quando se poderia pensar no significado daqueles
dias que ficaram no passado e sua aplicação na atualidade movimentada.”
– O Paizinho acredita que seria possível repetir aquelas vivências nestes tumultuados
anos terrestres?
– Acredito que sim, porquanto aqueles eram também dias de muito sofrimento
e inquietação, considerando-se a população e as circunstâncias existentes.
Havia guerra entre Assis e Perúgia, entre os estados italianos e papais, abuso do
poder senhorial e religioso, alucinação e desespero das Cruzadas, miséria das
camadas pobres e dos camponeses, indiferença social e perseguições de toda
ordem... A mensagem de Jesus não é para um tempo, para uma Nação, nem mesmo
é uma proposta figurativa que deve ser interpretada conforme a comodidade
dos cristãos. Naquela época também se afirmava que era impossível viver conforme
o Evangelho: com despojamento, com humildade, com renúncia, com amor total
pelo próximo deserdado...
“Mais de uma vez, respondendo a esse argumento egoísta, esclareci que, ou
o Evangelho deveria ser seguido conforme fora pregado, e o luxo, a ostentação, o
orgulho banidos da Igreja e dos corações, ou se deveria viver conforme as vaidades
terrenas, as ambições de classes e de poder, estando a Palavra totalmente errada...
Na conjuntura, era inevitável que o Evangelho triunfasse, embora nem todos
tivessem a coragem de abandonar o século para seguir Jesus. Compreendo a atitude
daqueles que prosseguem pensando ser impossível entregar a vida ao Mestre
e desfrutar simultaneamente dos prazeres do mundo, embriagando-se de gozo e de
perturbações. Entretanto, considero ser irrealizável a paz, enquanto a criatura se
mantiver encarcerada na cela dourada dos presídios da posse e das paixões mais
degradantes. Quando se rompem os elos dos vícios – e o poder terrestre, o uso
indevido do sexo, os interesses servis, as dependências químicas, alcoólicas e outras
são vícios que se arrastam através das gerações, fixando-se na história do
pensamento humano como necessidades urgentes – uma liberdade diferente toma
conta da existência que adquire beleza e tranqüilidade. Não se trata isto de uma
utopia, mas de uma realidade. A única posse que liberta é não ter nada além do
essencial, que favorece a construção da vida feliz.”
– Que pensa a respeito da alteração de objetivos e de comportamentos que
a Ordem franciscana vivencia atualmente, em total afronta aos postulados básicos e
iniciais que foram traçados pelo Irmão Alegria?
Sem demonstrar enfado ou mal-estar ante a interrogação, o Entrevistado
respondeu serenamente:
– É normal que as idéias puras e dignificantes no seu início dêem lugar no
futuro a realizações totalmente diversas dos programas elaborados. Com o tempo e
a adesão de muitos indivíduos, vão surgindo alterações compatíveis com o nível
evolutivo dos mesmos, que procuram adaptar às suas necessidades aquilo que
pensam estar esposando com nobreza e mesmo abnegação. Transcorrido um largo
período, pouco sobrevive aos ditames das imposições e caprichos impostos pelos
séculos inexoráveis... Com a nossa tradição, os primeiros fenômenos surgiram
quando ainda me encontrava no corpo, constatando-o dolorosamente ao retornar da
Cruzada, em face do largo tempo que permaneci no Oriente visitando as terras
onde Jesus vivera... O choque que experimentei foi muito grande, levando-me ao
quase recolhimento total na Porciúncula e à necessidade de maior doação, a fim de
manter fiéis os demais companheiros que haviam renunciado a tudo: orgulho, cultura
vã, discussões teológicas vazias de significado espiritual e ricas de palavras pobres
e confusas, de comodidade, até o momento em que a Irmã Morte me arrebatou
o Espírito...
– Como seria possível viver segundo os rígidos critérios do Evangelho, sem
perturbar o progresso tecnológico nem o desenvolvimento da ciência?
– A ciência e o progresso tecnológico são inspirações de Nosso Pai, favorecendo
o ser humano com recursos que lhe tornam a vida mais feliz e menos penosa,
diminuindo-lhe a carga bruta dos afazeres, as conjunturas amargas das enfermidades,
especialmente as mutiladoras e degenerativas, proporcionando meios
hábeis para a fraternidade e o entendimento entre os homens e as Nações. Será
isso o que ocorre? O monstro da guerra não continua ceifando vidas e semeando o
horror em nome da ordem e da paz? Gerações sucessivas não têm sido vitimadas
pelo preconceito de raça, de orgulho, de classe e de religião?
“Despojar-se de tudo não é atirar fora as conquistas já realizadas, mas aplicá-
las em favor de todos e não apenas de alguns poucos. É o impositivo de repartir
o excesso com aqueles que não têm nada ou que padecem carência, respeitar os
direitos à vida, preservar a irmã Natureza e todos os seres viventes igualmente filhos
de Deus. Quem se despoja fica livre para amar e para servir, bases da vida em
toda parte.”
Profundamente comovido, interroguei, por fim:
– O Paizinho Francisco poderia encerrar esta entrevista enviando, por meu
intermédio, uma mensagem aos homens da Terra na atualidade?
– A mensagem que me envolve o Espírito e que faz parte de todo o meu processo
de evolução é seguir Jesus e viver os Seus feitos. Mas, se me fosse facultado
sintetizar tudo quanto eu gostaria de repetir aos meus irmãos terrestres neste
momento de glórias e de sofrimentos, de grandezas e de misérias, eu diria: fazer
aos outros somente aquilo que deseje que os outros lhe façam, e em qualquer circunstância,
amar e amar até sentir as dores que o amor muitas vezes experimenta
quando direcionado ao próximo.
O Emissário de Jesus sorriu suavemente, envolvendo-me em peregrina luminosidade
que me levou às lágrimas.
Profundamente tocado pela sua magnanimidade, prossegui o giro por Assis,
evocando sua bênção, no fim do mês de setembro de 1226, quando ele pediu para
ser transportado para a sua Porciúncula, onde morreria, e vazada nas seguintes
palavras:
– Abençoada sejas tu por Deus, Cidade Santa, porque por ti muitas almas
se salvarão e em ti muitos servos de Deus habitarão e por ti muitos serão eleitos
no reino da vida eterna. Paz a ti!
Irmão X
(Página psicografada pelo médium Divaldo P. Franco, na madrugada de 27 de maio
de 2001, em Assis, Itália.)