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domingo, 24 de março de 2013

REABILITAÇÃO DE UM CULPADO."...Lembremos por fim, que Jesus veio chamar os pecadores e não os justos. Por isso jamais se defendeu das injúrias e ataques dirigidos à sua pessoa. Contra outra espécie de traidores, ele se insurgiu: os traficantes da fé, os impostores que exploravam o alheio sentimento. A este exprobrou em termos enérgicos. Seu gesto de revolta se verificou, quando expulsava do templo os vendilhões, dirigindo-lhes a seguinte apóstrofe: Fizestes da casa de meu Pai, que é casa de oração, covil de salteadores. Para os algozes que o cravaram na cruz, assim como para a plebe ignara que, aparvalhada, assistia ao seu sacrifício, teve esta frase lapidar: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem...."


Depois de termos falado sobre a Justiça, pratiquemos um ato que a objetive. Tenhamos a precisa coragem moral de, arrostando preconceitos, propugnar pela reabilitação de um culpado, cujo delito, de há muito, foi devidamente reparado, mediante a consumação da justiça imanente, que reponta dos mesmos erros e delitos, como processo expurgador, conducente à regeneração.

Queremos nos referir 'coram populo' a Judas Iscariotes, um dos doze apóstolos do Senhor. Bem sabemos que esse nome tem sido execrado, atravessando os séculos coberto de opróbrio e de ignomínia. Mas é precisamente por isso que, em nome da justiça e, particularmente, em nome do Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo, ousamos empreender esta tarefa, para o desempenho da qual imploramos o auxílio da luz que vem de cima.

Encaremos o crime de Judas com a devida calma, desapaixonadamente. Raciocinemos e argumentemos com o critério que a gravidade do caso requer. Comecemos levantando esta preliminar: Como foi Judas ter ao apostolado? Por solicitação própria? Não. Foi chamado, conforme peremptória declaração de Jesus, dirigida aos doze: Eu vos escolhi a vós; no entanto, um de vós é demônio. Daqui ressalta outro ponto importante. Jesus sabia que Judas ia cometer o ato delituoso ao qual se referiu por
ocasião da última páscoa, dizendo: Em verdade vos digo que um de vós me há de trair.
E eles, entristecendo-se muito, começaram cada um a perguntar-lhe: Serei eu, Senhor? E Jesus retrucando, acrescentou: o que mete a mão no prato comigo, esse me trairá. Judas, então, disse: Porventura sou eu, Rabi? O Senhor retorquiu: — Tu o disseste. Em verdade, o Filho do homem vai, como acerca dele está escrito, mas ai daquele por quem o Filho do homem é traído! Bom seria a esse indivíduo, se não houvera nascido. De posse destes dados, extraídos dos Evangelhos, portanto dignos de fé, passemos à ordem dos argumentos.

Jesus veio à terra no desempenho de missão redentora. Para consumá-la se fazia mister tornar-se conhecido dos homens, através de exemplos vivos que testemunhassem o seu acrisolado amor pelos míseros pecadores, mostrando-lhes a estrada da salvação e conduzindo por ela, como guia, toda a humanidade. Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim.

As velhas profecias vaticinaram os acontecimentos que haviam de se desenrolar no decurso da passagem do Filho de Deus por este orbe. Tudo estava previsto. Jesus se achava perfeitamente enfronhado do que o esperava. Marchou, todavia, resoluto e varonil ao encontro do sacrifício. Pai, afasta de mim este cálice; todavia faça-se a tua vontade, e não a minha.

Iniciando a ingente tarefa, Jesus começa reunindo os que deviam colaborar com Ele na obra da libertação humana. Chega-se a uns pescadores e, sem mais preâmbulos, vai dizendo assim: Acompanhem-me, pois, doravante, sereis pescadores de almas. E tais indivíduos, como que premidos por mola invisível, deixam seus barcos, redes e demais petrechos do ofício e seguem o Senhor. Da mesma forma, com relação a Mateus, portageiro da alfândega, que, abandonando o emprego, se põe ao lado dos demais escolhidos. Deste fato concluímos que aquelas pessoas tinham vindo a este mundo já comissionadas, já designadas a desempenhar certas incumbências junto ao Redentor da Humanidade. Do contrário é inexplicával a facilidade com que todos anuíram ao chamado que lhes foi dirigido por um homem desconhecido, com quem jamais haviam tido qualquer entendimento, e que viram pela primeira vez.
O compromisso, portanto, fora tomado antes, noutro plano da vida. Ora, Judas foi, a seu turno, solicitado a acompanhar Jesus. Anuiu, como os demais, ao chamamento. Veio, pois, a este mundo para fazer parte do ministério apostólico. Nesse caso, acode-nos à mente a seguinte consideração: se Judas ia fracassar desastrosamente, como fracassou, na qualidade de apóstolo; se as profecias previram o acontecimento; se, finalmente, Jesus estava ciente do desastre que esperava aquele discípulo, achando até que melhor fora ele não ter nascido, isto é, não ter vindo ao mundo, então por que o incluiu no apostolado? Não seria preferível afastá-lo, na hipótese de haver partido dele o desejo de participar da obra messiânica? Como, pois, se compreende ter sido ele chamado?
Não será lícito estranharmos semelhante procedimento por parte daquele que veio dar a vida pela redenção dos pecadores? Como, então, contribuir para a perdição precisamente de um dos seus escolhidos? Eis a questão que parece inextricável. Mas o Evangelho diz que não há nada encoberto que não seja descoberto, e nada oculto que não venha a ser revelado. Portanto, meditemos.

Jesus não podia consentir na perdição de Judas, ao incorporá-lo no colégio apostólico, prevendo a sua ruína. Atribuir-se ao Senhor semelhante cometimento seria rematada heresia. Há, portanto, uma razão que o levou a agir como agiu. Para descobri-la temos que, preliminarmente, estudar o caráter de Judas. Qualifiquemo-lo, tal como se faz aos réus. Judas, além de ambicioso, amigo do dinheiro, sumamente egoísta, era cínico. Este mal, quando empolga os Espíritos, os torna por assim dizer impermeáveis à luz, à verdade e a todas as sugestões e inspirações boas e salutares. Ficam impassíveis às emoções e às influências de ordem moral. Sua sensibilidade se embota, sua consciência se cauteriza, sua razão se obnubila.
Mergulhados na voragem da materialidade, só aspiram à satisfação dos apetites, debaixo dos seus múltiplos aspectos. Acovardados fogem das lutas, acocoram-se no comodismo, evitando tudo quanto possa perturbar-lhes o antegozo dos seus desejos e dos seus pendores inconfessáveis. Ficam, por assim dizer, cristalizados na esfera bastarda do sensualismo. E aí permaneceriam eternamente se o 'surge et ambula' não constituísse a lei soberana que rege o destino das criaturas de Deus. Sim, tal categoria de indivíduos ficaria estacionária se pudesse furtar-se à influência incoercível da evolução.
De repente, surge um imprevisto que os atira para a correnteza das provas. Então, como que arrastados pelas torrentes caudalosas de profundo rio, vão, sacudidos pelas ondas, batendo-se contra os rochedos ásperos e arestosos até que, precipitados no pélago das águas, ao rumor das quais despertam para a realidade, abrem os olhos para a luz, acordam-se-lhe a razão e a consciência, raiando a aurora de uma vida de reparação, era das reabilitações.

Eis aí o que sucedeu a Judas. Era necessário que essa alma fosse profundamente abalada, fosse sacudida até os seus fundamentos, suportasse um tremendo choque, passasse por um verdadeiro cataclismo, para que despertasse. Jesus não viu somente a queda de Iscariotes; viu também a sua redenção, após a prática do ato ignominoso. Por isso consentiu em incluí-lo no número dos apóstolos. Foi dura, foi tremenda a sua expiação, porém era esse o meio de chamá-lo à razão. Seu estado reclamava um drástico enérgico. Esse medicamento lhe foi propinado.

Cumpriu-se a Justiça, de cuja consumação emerge a misericórdia como seu complemento. Pela dor e pelo amor! Uma vez a lei satisfeita, soa a hora da graça. Lei e graça, justiça e misericórdia se entrelaçam na sábia urdidura da obra redentora do Espírito. Prossigamos, no entanto, no esclarecimento e justificação da nossa campanha em prol da reabilitação do grande delinquente. Judas foi tentado. Jesus o afirma, dizendo que Satanás o havia possuído. Se é certo que a influência da tentação não dirime o delito, contudo é inegável que constitui atenuante em favor do criminoso.
As circunstâncias atenuantes estão previstas até nos códigos terrenos, apesar das inúmeras lacunas de que eles se ressentem. A culpabilidade de Iscariotes deve ser julgada através dessa circunstância. O Tentador o dominou, agindo através dos dois principais defeitos do malsinado apóstolo: cinismo e grande apego ao dinheiro. Essas duas falhas acentuadas do seu caráter têm as suas raízes mergulhadas no egoísmo. Com dinheiro se compram prazeres e deleites que gratificam os sentidos. Com cinismo o indivíduo faz ouvidos de mercador aos protestos da consciência.
Que Judas se fascinava pelo dinheiro, di-lo claramente João Evangelista, reportando-se às suas ladroíces como tesoureiro da comunidade. Que era um cínico e simulador atesta-o eloquente o seu gesto, na última ceia, interrogando o Mestre sobre aquele que ia traí-lo metendo a mão no prato com Jesus, após este haver declarado que tal importaria o sinal denunciador daquele que o havia de trair. Os maus pendores facilitaram a tarefa do traidor ou talvez, dos Espíritos das trevas.

Consideremos, agora, outras particularidades dignas de meditação. A missão de Jesus não foi compreendida pelos homens do seu tempo, inclusive pelos próprios discípulos e apóstolos. Estes, só depois do dia de Pentecostes, é que a perceberam e assimilaram. Todos viam no Enviado celeste o libertador do povo de Deus das garras de César. Supunham que Jesus empregaria processos e meios miraculosos para vencer o despotismo romano, expulsando os invasores da Palestina. Aguardavam ansiosamente esse momento. A mente humana, acanhada e regionalista, não abarcava a grandiosidade da obra messiânica. Ninguém pensava na libertação do Espírito da servidão dos vícios e das paixões com sede na carne. Esta questão era demasiadamente transcendental para os homens daquele século.

Judas via em Jesus um místico, com poderes supranormais extraordinários, aguardando o momento oportuno para utilizá-los em favor do seu povo oprimido. Naturalmente, ao negociar com os sacerdotes judaicos a entrega de seu Mestre, Judas supunha que Ele jamais pereceria às mãos dos seus inimigos. Estaria, talvez, convencido de que, na ocasião azada, Jesus os destroçaria, manejando faculdades que tanto o distiguiam, e que Judas tanto invejava. Vários episódios teriam contribuído para alicerçar na mente do grande culpado aquela hipótese.
Ele presenciou o Senhor, quando os judeus tentaram aprisioná-lo. Estava habituado a vê-lo aparecer inesperadamente entre os discípulos e ausentar-se, sem que se soubesse para onde teria ido. No Jardim das Oliveiras, Jesus, apresentando-se aos beleguins romanos guiados pelo mesmo Judas, se transfigura diante deles, deixando irradiar a luz refulgente do seu Espírito. Diante deste fenômeno insólito, a soldadesca, aturdida e confusa, cai por terra. Estas ocorrências todas corroboraram o conceito de Iscariotes, animando-o a executar o plano que arquitetara.
Quando, porém, acompanhando com interesse a sucessão dos acontecimentos, viu que Jesus caminha para o suplício, sem opor embargos aos seus verdugos, e que, finalmente, sucumbiu no madeiro infamante. Judas estremeceu! Experimentou dentro de si o rugir duma tormenta, o desabar de um medonho e inconcebível furacão. O que se teria passado com ele, em tão trágico lance, a linguagem humana não possui expressões bastante para relatar. São desses transes que se imaginam, porém não se descrevem. Perpassou-lhe pela mente o quadro da sua vida ao lado do Mestre. Lembrou-se das palavras que ouvira dele; da sua bondade e doçura; da sua dedicação pelos sofredores; dos benefícios que espalhou por toda parte onde esteve; do caso da viúva de Naim cujo filho redivivo, restituído a mãe, transformou o seu pranto em alegria; e daquele filha voltar à vida, quando todos a consideravam morta; e, mais outro ainda, o de Lázaro, cujas irmãs e amigos pranteavam a morte, ressuscitado pelo Senhor e entregue ao afeto dos que o amavam. Essas maravilhas todas, de alta benemerência, e tudo o mais que observara 'de visu', acompanhando o Mestre em sua peregrinação terrena, se desenharam ao vivo no delírio febril da sua imaginação.

Sabe-se pela experiência dos que se encontram em perigo iminente de morte que nesses indivíduo se escoa em sua mente, que nestes instante, todo o passado do indivíduo se escoa em sua mente de um modo vertiginoso, porém perfeitamente compreensível. Todo o bem e todo o mal praticado, as conjunturas alegres ou tristes, os atos dignos ou inconfessáveis, tudo, enfim, num esforço rápido e vivo, é percebido e sentido naqueles fugazes momentos. Foi o que se teria verificado com o grande pecador. Sua alma então desperta; as cordas do seu sentimento habituadas à inação vibram agora desusada e descompassadamente. Lavram em seu interior as labaredas rubras do remorso. Sua razão, ora acordada, lhe mostra a vileza e a monstruosidade do seu crime. Judas se contorce no paroxismo da dor, no estertor horrendo da exprobração da consciência revivida, no tormento dantesco do criminoso vergado ao peso da condenação!

Judas enlouquece, Judas suicida-se! Detenhamo-nos aqui. Não tentemos avançar mais para dentro da sua dor, porque há dores cujo abismo causa vertigem aos que delas se aproximam. Descubramo-nos diante da sua grande, imensa e incomensurável tortura; deixemos que esta opere a sua obra de purificação. Executou-se a lei. A lei que pontifica no interior de cada homem, onde ele é juiz de si mesmo. Quanto tempo ficaria o espírito do grande delinquente no estado de desespero em que partiu deste mundo? Não sabemos. O importante é que ele se arrependeu. Deu, portanto, o primeiro passo no caminho da reparação. Após a Justiça consumada, soa, como já o dissemos, a hora da misericórdia.
À lei sucede a graça, Judas é um regenerado. Para afirmá-lo, nos baseamos na doutrina que nos foi revelada pela sua vítima. Jesus estendeu, de há muito, a sua destra benfazeja, amparando e acolhendo o apóstolo transviado. Perdoou-lhe, como perdoou a Pedro e a Paulo, que também pecaram. Todos, depois de suportarem a consequência dos erros praticados, se reabilitaram. Por que Judas não se teria reabilitado também? — Reabilitou-se, sim, no-lo diz o mesmo Jesus, através destes preceitos seus: Amai aos vosso inimigos. Fazei bem aos que vos fizerem mal. Orai pelos que vos perseguem e caluniam. Perdoai e sereis perdoados. Não julgueis, não condeneis. Com a medida com que medirdes, com essa sereis medidos. Quem predicou assim não podia abandonar um pecador que deu visíveis provas de contrição. Jesus é aquele cuja escola é Ele mesmo, cujas teorias são os seus exemplos, cujas doutrinas são a sua vida.
Portanto, é Ele quem nos dá autoridade para propugnarmos no sentido de apagar o estigma aviltante que envolve a memória de Judas. A gravidade da culpa depende da previsibilidade do evento criminoso. Ora, Judas não teve a previsão das consequências do delito que praticou. Só depois de consumado é que ele mediu o seus efeitos. Não cabe na mente do egoísta que alguém, dispondo de força excepcionais e singulares, deixe de utilizá-las em defesa própria. Renúncia e sacrifício são expressões que carecem de sentido para as mentalidades imbuídas do egoísmo.

Demais, cumpre acentuar ainda uma particularidade muito curiosa no ato pecaminoso de Iscariotes. O seu crime não foi propriamente de traição. Falta circunstância para que se capitule naquela rubrica: a circunstância da surpresa da vítima. Não pode haver traição, sem que se verifique o sobressalto, o inopinado, o imprevisto. Ora, Jesus, a vítima, estava a par de tudo, vinha acompanhando os passos de seu discípulo, ciente de toda a trama que ele urdira. Onde, pois, a traição?

É verdade que este pormenor não altera, do ponto de vista moral, a natureza do delito ora em apreço. Seja, porém, como for, o fato é que Judas resgatou a sua grande culpa no cadinho de uma imensa dor. As 30 moedas, preço de sua perfídia, ali fundidas, caíram, gota a gota, em seu atribulado coração.

Lembremos por fim, que Jesus veio chamar os pecadores e não os justos. Por isso jamais se defendeu das injúrias e ataques dirigidos à sua pessoa. Contra outra espécie de traidores, ele se insurgiu: os traficantes da fé, os impostores que exploravam o alheio sentimento. A este exprobrou em termos enérgicos. Seu gesto de revolta se verificou, quando expulsava do templo os vendilhões, dirigindo-lhes a seguinte apóstrofe: Fizestes da casa de meu Pai, que é casa de oração, covil de salteadores. Para os algozes que o cravaram na cruz, assim como para a plebe ignara que, aparvalhada, assistia ao seu sacrifício, teve esta frase lapidar: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem.
Os pecadores confessos e contritos encontraram nele refúgio, consolo e salvação. Duas almas tiveram a primazia na obra de redenção consumada no Calvário: a primeira foi Dimas, o bom ladrão crucificado à direita do Cristo de Deus; a segunda foi Judas, o suicida, na demência do remorso.
Vinícius

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