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No Evangelho segundo o Espiritismo, mantendo diálogo com um Espírito que se
identifica como São Luís (Luís IX, Rei de Fraça - 1214-1270); Allan Kardec faz três perguntas que
podem ser resumidas numa única questão:
(1)
"- É permitido repreender os outros, notar as imperfeições de outrem, divulgar o mal de outrem?"
O Espírito São Luís destaca algumas condições:
(1) podemos fazê-lo com moderação, tudo depende da intenção;
(2) com um fim útil, como uma caridade, mas com todo o cuidado, sem prazer de denegrir, o que
seria uma maldade. Ele sugere que a censura que alguém faça a outrem deve dirigi-la
a si próprio. Isso nos lembra a imagem da atitude do dedo indicador em riste, apontando,
acusando, mas enquanto um dedo acusa quatro apontam para o acusador.
Interpretando e trazendo para a actualidade esses ensinamentos, o Espírito Joanna de Ângelis
tece comentários em torno da nossa atitude quando alguém está sendo acusado. O que devemos fazer?
Qual deverá ser a nossa posição? E se formos nós os acusados?
Recomenda a Benfeitora mantermo-nos em silêncio, porquanto os acontecimentos podem ter
antecedentes que são ignorados pelos que acusam e observam e que nem sempre as coisas são como se
apresentam. Destaca, por fim, que quem está sendo acusado merece comiseração e
oportunidade de reeducação.
(2)
Ao refletirmos em torno dessas orientações fizemos uma conexão com três motivadores
psicológicos que podem influenciar nas atitudes de acusados e acusadores :
(1) a auto-estima, que pode apresentar-se em nível alto, médio ou baixo, e que pode ser o
reflexo de antecedentes desta ou de outras vidas;
(2) a afectividade, expressando, sentimento de compaixão ou de piedade; e
(3) a empatia, sugerindo colocar-se psicológica e emocionalmente no lugar do acusado, ensejando
a sua reeducação.
Abraham Maslow (1908-1970)
(3)
, um dos teóricos da terceira-força em Psicologia, que é a Psicologia Humanista,
após o Behaviorismo e a Psicanálise, viu no atendimento das necessidades do Ego - destacando a
auto-estima e a afectividade - motivadores psicológicos que fortaleceriam o ser humano
nos confrontos que mantêm, periodicamente, com os desafios existenciais, motivadores esses que,
juntamente com a empatia, são trabalhados pelos chamados terapeutas da auto-ajuda.
Esses motivadores, embora utilizados como técnicas modernas dentro de uma visão holística
do ser humano, ou numa visão transpessoal , que identifica o homem com uma alma
preexistente ao nascimento e sobrevivente à morte, têm suas raízes na época do Cristianismo
primitivo.
JESUS os praticou e estimulou numa comovedora aula em praça pública.
O relato é feito pelo evangelista João (8:3-11), que certamente presenciou o episódio, em
Jerusalém, quando Jesus retornava ao Templo, para ensinar, acompanhado de enorme multidão.
Aproxima-se, então, um grupo de escribas e fariseus, apresentando-lhe uma mulher apanhada em
adultério.
Pondo-a no meio do povo disseram-lhe:
- Mestre, esta mulher acaba de ser surpreendida em flagrante adultério. Moisés nos ordena
na Lei que as adúlteras sejam apedrejadas.
Qual, sobre isso, a Tua opinião? E Tu, que dizes?
Era uma Lei antiga, prevista em livros de Moisés, no Deuteronómio (22:22) e no Levítico (20:10),
tradição, porém, arcaica e em desuso naquele tempo, sobretudo porque o Decálogo já previa
"não matarás" e a condenação desse delito era simbólica, considerando que desde o domínio
romano a pena de morte fora retirada do Sinédrio e reservada ao Procurador de Roma.
(4)
"De nada adianta apedrejar o corpo e sim apedrejar a consciência"
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Imaginemos a cena em praça pública: a multidão enfurecida, provocada pelos fariseus,
assumindo o papel dos jurados, a expressar decisão antecipada; a mulher, acuada e
sendo acusada, na posição de ré, aguardando veredicto e sentença; e Jesus, feito ali,
pelos que a acusavam, advogado e juiz.
Em todos os tempos o Mestre sempre é chamado para defender os fracos e em diversas ocasiões
coloca-se ao lado das mulheres, socorrendo-as, defendendo-as e, sobretudo, através delas
exemplifica a necessidade do exercício da misericórdia, como observamos nos relatos que envolveram
a mulher hemorroíssa, a mulher encurvada, a viúva de Naim, a mulher cananéia, a samaritana, Salomé
mãe dos filhos de Zebedeu, Maria Madalena, Marta e Maria, a pecadora citada por Lucas e a
mulher de Betânia, aquela que envolveu a cabeça de Jesus com perfume caro e puríssimo, tendo sido
o seu acto questionado pelos discípulos, levando o Mestre a declarar que "onde quer que venha a
ser proclamado o Evangelho o que ela fez jamais será esquecido." (Mateus, 26: 6-13).
- Tu, pois, que dizes? Insistia a multidão dos acusadores.
Era aquele um momento histórico do Cristo. Era, em verdade, uma cilada. Desafiando-O, promovendo-O
a advogado de defesa e de acusação e simultaneamente a juiz, queriam a Sua perdição. Para a
multidão pouco importava a mulher. A expectativa de todos era em torno da decisão que
Ele tomaria. Como reagiria ao desafio? Se desculpar a mulher estará transgredindo
a Lei de Moisés; se confirmar a sentença, Sua misericórdia, que intensamente prega, será
colocada em dúvida.
Nesse instante , o silêncio do Cristo, que escrevia no chão com o dedo, segundo o
Evangelista que testemunhou o facto, é por Ele quebrado, quando ao erguer-se, pronuncia a
sentença:
" - Aquele que dentre vós estiver sem pecado atire a primeira pedra."
A multidão fica em choque. Não esperava por isso. Era um conjunto de seres-instinto ,
comandados pelas sensações. Egocêntricos e violentos, haviam desafiado o homem-razão,
que no dizer do Espírito Manoel Philomeno de Miranda são homens que
"pensam com calma nas circunstâncias mais graves, desenvolvendo o sentimento do altruísmo".
(5)
Ao pronunciar a sentença inesquecível o objectivo do Mestre é terapeutico e pedagógico: busca
desenvolver nos acusadores a postura da empatia , de se colocarem no lugar daquela
mulher, compreendendo as suas lutas e estimulando-os a serem empáticos , embora tenham
preferido ser egocêntricos. Assim, os fariseus e seus liderados, desafiados agora pelo Cristo,
que lhes submete a Lei de todos os tempos, de todos os mundos, a Lei das Causas e dos Efeitos,
retiram-se vencidos.
Dirige-se, então, à mulher:
" - Onde estão os que te acusavam? Ninguém te condenou? Nem Eu tão pouco te condenarei.
Vai, e não peques mais."
É toda a expressão da afectividade . O Mestre não a condena. Orienta, conversa, interage,
respeita a situação difícil daquela mulher, preocupando-se com ela. Sabe que está sujeita aos
mecanismos da Lei Divina e que "de nada adianta apedrejar o corpo e sim apedrejar a
consciência, lapidando-a através de acções renovadoras".
O Espírito Amélia Rodrigues, através do médium Divaldo Franco
(6)
, narra que naquele mesmo dia, à noite, Jesus teria o Encontro da Reparação com
aquela mulher, quando se estabelece um diálogo motivador, e o Mestre busca elevar a sua
auto-estima, afectada pelo acontecimento que poderia destruir a sua vida, comprometendo
a oportunidade reencarnatória. A misericórdia do Cristo, através da aplicação da empatia, da
afectividade e da auto-estima, motivaria aquela alma sofrida a vivenciar uma existência
renovada, agora nas directrizes do amor e da caridade.
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(1) - KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo.
117 ed.FEB, cap.X, item 19, p.180.
(2) - FRANCO, Divaldo. Vida Feliz
pelo Espírito Joanna de Ângelis. 12.ed. LEAL, p.53.
(3) - MASLOW, Abraham H. Uma Teoria da Motivação Humana
O Comportamento Humano na Empresa.
BALCÃO, Yolanda Ferreira.
CORDEIRO, Laerte Leite.
2.ed. FGV, p.337.
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(4) - PASTORINO, C. Torres. Sabedoria do Evangelho.
Ed. Sabedoria, 1977, volume 5, p.71.
(5) - FRANCO, Divaldo P. Loucura e Obsessão
pelo Espírito Manoel Philomeno de Miranda. 7.ed. LEAL,
p.241.
(5) - Franco, Divaldo C. Pelos Caminhos de Jesus
pelo Espírito Amélia Rodrigues. 1.ed. LEAL, p.131.
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