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quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Pão da Vida *


O mar da Galiléia é um lago de expressiva proporção, que a
generosidade do rio Jordão espalhou na imensa fenda abaixo do nível do
Mediterrâneo com pouco mais de duzentos metros.
Antigamente era muito piscoso. Nas suas margens floresciam aldeias e
cidades que se tornaram famosas, e se beneficiavam do seu clima agradável.
Em volta, as suas terras aráveis produziam legumes e frutas; ali pastavam
os animais e as vinhas eram exuberantes.
Ao tempo de Jesus, suas águas chegaram a receber milhares de pequenas
embarcações.
Também chamado de Tiberíades ou lago de Genesaré, foi cenário de
momentos culminantes na história do Cristianismo.
Em sua orla espraiavam-se as cidades de Cafarnaum, Betsaida,
Tiberíades, Magdala, Dalmanuta...
Em uma montanha próxima Ele entoou o Canto de libertação das criaturas,
em inolvidável sermão; pelas suas praias Ele caminhou curando, consolando,
apontando rumos.
Suas gentes simples – os galileus – normalmente, pescadores e
agricultores, conviveram com Ele, acompanharam-nO, foram por Ele amadas e O
amaram a seu modo, dentro dos seus limites.
A revolução que Ele pretendia não era percebida pela massa, que tinha
fome de justiça, de verdade, mas sempre mais de pães e de peixes...
Do outro lado, acima das escarpas rochosas, erguia-se a decápole – parte
das dez cidades gregas erigidas antes, e então decadentes, com exceção de
Gadara, que se celebrizaria em razão do obsesso que Ele curara.
Jesus amava aquela região, aquele povo, onde mais se demorou após
iniciar a Sua vida pública, quando os Seus O rejeitaram...
Incapazes de penetrar no conteúdo profundo da Sua mensagem, seguiam
o Mensageiro dominados por interesses imediatistas.
Ambicionavam o reino dos Céus, porém, viviam na Terra, sofriam-lhe as
injunções e carências, padeciam desconforto.
Ele representava-lhes o Libertador. Suas palavras os sensibilizavam, porém
as Suas ações os deslumbravam e os atraíam cada vez mais.
Já não eram alguns que O seguiam, e sim verdadeiras multidões com suas
chagas, agitações e problemas.
Com essa volumosa massa, Ele atravessou o mar e foi ensinar na outra
margem do alto de um monte.
Ali, percebendo a fome daqueles que O acompanhavam nutriu-os com
pães e peixes fartamente, deixando-os felizes, porque de estômagos satisfeitos.
Logo após volveu em silêncio a Cafarnaum com os doze.
Os acompanhantes, atendidos nas necessidades imediatas, não
perceberam a Sua ausência, porque, naqueles momentos, não mais
necessitavam dEle.
Só no dia seguinte perceberam que Ele se fora.
Outra vez, sentindo carência, volveram a Cafarnaum a busca-lO algo
contrafeitos, por não O terem em mãos para o socorro contínuo aos seus
caprichos.
Quando O encontraram, interrogaram-nO com uma quase exigência de
justificação por tê-los deixado:
- Rabi, quando chegaste aqui?
Não se tratava de zelo, de cuidado pelo Amigo, mas de reprimenda, de
cobrança indireta.
O Mestre fitou-os, compungido, e respondeu-lhes com severidade:
- ...Procurais-me, porque comestes dos pães e ficastes saciados.
Fez uma pausa e prosseguiu:
- Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela que dura até a vida
eterna, e que o filho do Homem vos dará...
De um para o outro dia haviam alterado o comportamento.
Viram os enfermos recuperarem-se ao influxo do Seu poder; alimentaramse
em excesso; beneficiaram-se da Sua presença. No entanto, à hora da decisão
de se transformarem para melhor, de se permitirem permear pela Sua palavra,
apelavam para os textos antigos convenientes, que permitiam fugir das novas
responsabilidades, indagando sobre novos sinais, recordando Moisés no deserto,
o maná que descera do Céu...
Não se davam conta de que tudo provinha de Deus, e que eles haviam
comido, às vesperas, um alimento da mesma procedência, que lhes dava vida,
porém que saciava só por breve prazo.
O mundo, as criaturas desejam refestelar-se na abundância de fora, no
desperdício, e não se recordam, nessas horas, da escassez e dos outros
esfaimados, esquecidos, em sofrimentos.
Desejam pão e prazer, conforto e ociosidade.
Cansam-se, quando os têm e fogem para a insatisfação, a revolta, a perda
de objetivos da vida.
Sucede que a duração do corpo é sempre muito breve, a dos seus
adereços menor, e a das suas imposições mais rápida... Por isso, a vida real,
aquela que permanece sobre as cinzas das ilusões vencidas, é a do ser imortal.
Jesus veio demonstrar a imortalidade, dar significado à existência física do
ser, não como fim, antes como meio para ser alcançada a plenificação.
Aferradas, todavia, aos sentidos grosseiros, as pessoas somente pensam
no momento em que se encontram – embora lhe percebam a fugacidade – longe
das aspirações transcendentes, as de longo, perene curso.
Aquela época difere desta pela face exterior, pelas conquistas da
inteligência, que trouxeram outros valores para serem cultivados, outras metas
para serem alcançadas. No entanto, o ser moral, o ser interior parece-se muito
com aqueles que o acompanhavam... Mesmo esses que dizem nEle crer e O
seguem.
- Eu sou o pão da vida – exclamou Jesus – o que vem a mim jamais terá
fome e o que acredita em mim jamais terá sede...
Os circunstantes, em face desta declaração robusta, sem eufemismos,
entreolharam-se, duvidaram, não sabendo o que fazer.
Enquanto se alimentavam e sorriam, a vida lhes parecia tranqüila, desde
que houvesse quem os abarrotasse, a fim de que, sem preocupação nem esforço,
pudessem banquetear-se sempre mais.
Tomar, porém, da charrua para conseguir a própria alimentação mudava
totalmente a paisagem do júbilo, que se tisnava ante as responsabilidades
surgidas.
O esforço pessoal constitui sinal de valor moral e o suor do sacrifício
umedece a massa que prepara o pão da vida, que mata a fome em definitivo.
O ser, inundado pelo ideal, tem a sua sede de luz e de paz saciada através
das conquistas valiosas das paisagens íntimas antes sob tormentas
desesperadoras.
O Mestre jamais negaceou, nunca se escusou.
Todas as suas asseverações foram claras, destituídas de disfarces ou
ocultas em símbolos complexos.
Falando a linguagem de todos os tempos, a verdade, nunca se Lhe notou
dubiedade, insegurança.
Não havia promessas vãs nos Seus discursos, nem alento para as atitudes
frívolas. Inteiriço, sempre igual na proposta, na discussão e na conclusão, a Sua
era uma linguagem lapidar, inimitável, jamais superada.
O texto do passado tem sabor de atualidade, hoje apresentado.
Compadeceu-se do caído, mas não se apiedou do erro.
Apoiou o doente, no entanto verberou pela libertação da doença.
Amparou o pecador, todavia exprobou o pecado.
Ajudou o vencido, porém conclamou-o ao soerguimento íntimo e à vitória
sobre si mesmo.
Não acusou, não condenou, nem anuiu com o crime, a devassidão, a
promiscuidade moral.
Pão da vida, Ele é saúde integral, alimento de sabor eterno.
Os galileus não poderiam, naquela época, entendê-lO.
O mesmo ocorre com os modernos fariseus que hoje O depreciam, que O
subestimam e que, presunçosos, se escondem nas catilinárias de palavras
rebuscadas em sofismas bem urdidos, em falsas ciências, para não se
transformarem moralmente, enquanto, jactanciosos, marcham para o túmulo
inexoravelmente, onde despertarão para a realidade...
Jesus é o pão da vida perene.
Aqueles que souberem alimentar-se dEle, nutrir-se-ão e viverão na paz de
consciência e na realização espiritual. .
AMÉLIA RODRIGUES
__________
(Página psicografada pelo médium Divaldo P. Franco, em 14 de julho de 1995, em
Paramirim – Bahia.)
Revista o Reformador Maio de 1999

Mundos Transitórios


PAULO DE TARSO SÃO THIAGO
“Sim, há mundos particularmente destinados aos seres errantes, mundos que lhes
podem servir de habitação temporária, espécies de bivaques, de campos onde
descansem de uma demasiado longa erraticidade (...)” (“O Livro dos Espíritos”, de Allan
Kardec. Parte 2ª. Cap. VI Q-234)

A Astronomia e a Astrofísica, a partir sobretudo da descoberta e do
aperfeiçoamento do telescópio ótico, do radiotelescópio e do telescópio orbital,
com o apoio das hipóteses e teorias da moderna Física, têm permitido ao homem
uma visão assaz abrangente do Cosmo.
Embora um sem-número de incógnitas e interrogações permaneçam sem
solução definitiva, já são do conhecimento da Ciência os processos de formação e
evolução das estrelas, a estrutura e composição em larga escala das galáxias e
do espaço intergalático, a existência, possivelmente como regra, de sistemas
planetários, os mecanismos de produção de energia em escala universal. Seres
humanos orbitaram a Terra em satélites artificiais ou caminharam na superfície da
Lua e sondas espaciais exploraram o sistema solar, além de Plutão, enviando aos
laboratórios informações a respeito da superfície e da atmosfera dos planetas.
Um dos objetivos mais intensamente perseguidos pelos cosmologistas é a
detecção de formas de vida orgânica fora da Terra. Esforços têm sido feitos nesse
sentido, sem sucesso até o momento. Para a Ciência, portanto, até prova em
contrário, o nosso planeta é o único que detém o fenômeno da vida e a
Humanidade está só no Universo.
A lógica filosófica, contudo, rejeita este posicionamento, por considerá-lo
absurdo, em face do que se conhece da constituição do Cosmo. Se assim fora, a
vida na Terra seria o resultado de uma ocorrência, cuja probabilidade é ínfima,
num processo aleatório cego. A crença num Criador rechaça a hipótese da
aleatoriedade e nos leva a admitir um propósito em toda a dinâmica da vida na
Terra e no Universo. A esse respeito, a Ciência é carente de dados e se omite e a
Filosofia a contradiz, através da especulação e da lógica corrente.
Para sanar a contradição, recorremos então à Revelação, que trouxe novas
luzes à questão. Referimo-nos à Terceira Revelação, à Doutrina Espírita,
codificada por Allan Kardec e divulgada ao mundo, a partir de 1857, através das
obras básicas, e ampliada posteriormente, nos últimos cento e quarenta anos, por
uma vasta literatura espírita.
As questões 55 a 58 de “O Livro dos Espíritos” abordam, ainda que sem
muitos detalhes, a problemática da vida fora do nosso planeta. Em resposta à
pergunta 55 (“São habitados todos os globos que se movem no espaço?”),
formulada pelo Codificador, os Espíritos Superiores dão a seguinte resposta:
“Sim e o homem terreno está longe de ser, como supõe, o primeiro em inteligência, em
bondade e em perfeição. Entretanto, há homens que se têm por espíritos muito fortes e
que imaginam pertencer a este pequenino globo o privilégio de conter seres racionais.
Orgulho e vaidade! Julgam que só para eles criou Deus o Universo”.
Resposta admirável e que inspira credibilidade, porque isenta de rodeios e
de expressões rebuscadas. É positiva e direta, não deixando espaço para
dúvidas. Afirma de forma peremptória que a vida e a inteligência não são
exclusividade da Terra, mas se espalham nos incontáveis mundos disseminados
pelo Universo infinito.
Em “A Gênese”, obra que compõe o pentateuco kardequiano, nas questões
53 a 61, do capítulo VI, que correspondem aos tópicos A Vida Universal e
Diversidade dos Mundos, tecem-se considerações mais detalhadas sobre o
assunto, reafirmando a pluralidade dos mundos habitados.
O “Evangelho segundo o Espiritismo” dedica um capítulo inteiro (cap. III) à
questão, sob o título: Há muitas moradas na casa de meu Pai, expressão retirada
do Novo Testamento, do seguinte trecho:
“Não se turbe o vosso coração. – Credes em Deus, crede também em mim. Há muitas
moradas na casa de meu Pai, se assim não fosse, já eu vo-lo teria dito, pois me vou para
vos preparar o lugar. – Depois que me tenha ido e que vos houver preparado o lugar,
voltarei e vos retirarei para mim, a fim de que onde eu estiver, também vós aí estejais”.
(João, 14;1-3).
As muitas moradas a que se referia Jesus são os mundos materiais que
rolam pelo espaço. Em sua diversidade, abrigam seres de variadas estruturas e
formas, todos eles em processo evolutivo incessante, e que buscam, consciente
ou inconscientemente, o aperfeiçoamento espiritual.
Na esfera dessa transcendental questão, há um tópico interessante,
curioso e pouco abordado na literatura espírita ou não-espírita. Trata-se de
Mundos transitórios, enfeixado nas questões 234 a 236 de “O Livro dos Espíritos”.
O trecho em epígrafe é parte da resposta à pergunta 234, formulada pelo
Codificador. Da análise do tópico em discussão, pode-se elaborar a seguinte
sinopse a respeito, acrescentando-se algumas conclusões racionais:
·  Os chamados mundos transitórios são orbes – planetas, satélites, algumas
categorias de estrelas – que, apesar de não albergarem seres orgânicos, por
suas condições físicas impróprias, constituem-se estações de repouso a
Espíritos errantes.
·  A Lua, por exemplo, é um forte candidato a mundo transitório, por sua completa
esterilidade, no que concerne à vida orgânica. A Terra já o teria sido, durante o
período de sua formação, conforma afirmam os Espíritos Reveladores nas
alíneas d e e, da questão 236. É possível que alguns planetas do sistema solar
também o sejam presentemente, a exemplo de Vênus e Mercúrio.
·  Os Espíritos errantes que se demoram em mundo transitórios aí permanecem
temporariamente. Embora estagiem em regime, digamos assim, de repouso
mental, porque afastados das lides reencarnatórias e dos sofrimentos e
embates impostos pela condição ordinária de erraticidade, eles podem evoluir,
principalmente na vertente intelectual, pois encontram subsídios e o campo
apropriado para o aprendizado.
·  Por serem destituídos de corpo orgânico-material, os Espíritos errantes que
“habitam” os mundos transitórios podem deixá-lo livremente, no momento que
lhes aprouver, temporária ou definitivamente. Segundo a sua condição
evolutiva, seus “vôos” podem ser maiores ou menores. Ficam restritos a
paragens próximas ou podem percorrer o espaço sideral, em visita a estrelas e
galáxias.
·  A condição de mundo transitório é temporária, sendo um estágio no processo
de transformação e evolução do orbe.
Segundo as teorias científicas mais aceitas atualmente, a Lua é um orbe
“morto”, porque já não apresenta qualquer condição de albergar vida orgânica.

Não há água, pelo menos sob forma líquida e gasosa, e nem atmosfera. No
passado, ela teria sido um astro “vivo”, e a sua morte, a resultante do processo
evolutivo natural e inexorável.
As estrelas com massa aproximadamente igual à do Sol, um pouco maior
ou menor, seguem um caminho evolutivo que as conduz, em seu estágio final, ao
que os astrônomos chamam de anãs brancas. São astros densos, quentes e de
baixa luminosidade. Por terem consumido todo o combustível nuclear,
responsável pela produção de energia, sofreram colapso gravitacional, reduzindose
a 1% do seu raio original. A aceleração da gravidade à sua superfície é muito
elevada e a pressão atmosférica, imensa.
As estrelas de nêutrons são o estágio final de estrelas de massa três a
quatro vezes superior à do Sol. Ao se esgotar o combustível nuclear, elas sofrem
colapso gravitacional, reduzindo seu diâmetro a poucos quilômetros e atingindo
densidades em torno a 10 elevada a 14a. potência de g/cm3, ou seja, cem trilhões
de vezes maior do que a da água destilada. Seu núcleo é composto
principalmente de nêutrons, partículas que normalmente fazem parte do núcleo
atômico. A força de gravidade na superfície de uma estrela de nêutrons é tão
intensa que um ser humano seria literalmente esmagado. Nenhum ser vivo
poderia portanto sobreviver a semelhante condição.
Estrelas suficientemente maciças, de massa várias vezes maior que a do
Sol, podem ter um destino ainda mais extraordinário que as estrelas de nêutrons.
Ao sofrerem colapso gravitacional, devido ao esgotamento do combustível
nuclear, a pressão atinge patamares inimagináveis, determinando reversão no
sentido do movimento da matéria. Há então brusca expansão, à semelhança de
uma enorme explosão. Grande quantidade de energia é produzida. Elas se
tornam extraordinariamente luminosas e são conhecidas pela curiosa
denominação de supernovas. Por ocasião da explosão, uma parte da matéria que
as constitui é lançada no espaço e a porção remanescente, que ainda é
considerável, passa a se contrair incessantemente, atingindo uma densidade
superior à das estrelas de nêutrons. A gravidade em sua superfície é de tal ordem
que dela nem mesmo a luz é capaz de escapar. Esses objetos são conhecidos
como buracos negros, por que são invisíveis à observação ótica. Os astrônomos
suspeitam que a maioria das galáxias contém em seu centro um tal objeto. A
Física moderna define um buraco negro como “uma região do espaço-tempo
intensamente curva que consiste numa singularidade cercada por um horizonte de
eventos”.
Anãs brancas, estrelas de nêutrons e buracos negros são fortes candidatos
a mundos transitórios.
Os Espíritos desencarnados são destituídos de corpo material e por isso
não sofrem ação da gravidade e nem são susceptíveis à pressão atmosférica ou a
quaisquer outros fatores de ordem física.
A título de esclarecimento e para que não restem dúvidas na mente do
leitor, a condição de erraticidade é o estado em que se encontram os Espíritos
desencarnados, nos intervalos entre as existências corporais. Significa isto que os
Espíritos errantes ainda não atingiram uma posição evolutiva que lhes permita
dispensar o processo encarnatório.
Deus, em Sua infinita sabedoria, planejou o Universo e instituiu leis, de
forma que nada seja ou se torne inútil. As coisas e os seres transformam-se
continuamente, seguindo o seu destino. Porém, não há nenhum momento ou
estágio nesse processo de transformação que não tenha o seu nicho ou sua
função. Tudo contribui de alguma maneira para o concerto universal.
Revista O Reformador fevereiro de 1999

Fraternidade


JUVANIR BORGES DE SOUZA
A Mensagem do Cristo de Deus dirigida às Humanidades, que se
sucedem e se renovam, é um apelo permanente à fraternidade entre todos os
homens – irmãos, amigos, ou inimigos.
“Amai-vos uns aos outros”; “Ama ao próximo como a ti mesmo”; “Ama ao
teu inimigo”; “Faça aos outros o que gostarias que te fizessem” – são fórmulas
com fulcro no amor, no entendimento, na compreensão, na fraternidade,
ensinadas e repetidas sucessivamente nos Evangelhos.
O Consolador, prometido e enviado pelo Mestre Incomparável, que já se
encontra entre os homens, reproduz e enfatiza os mesmos ensinamentos,
procurando despertar as almas para as fontes do Bem que todas possuem em
desenvolvimento ou em gérmen.
As vidas que se sucedem, para a ascensão contínua de cada ser espiritual,
são repetidas oportunidades que a Providência Divina oferece para o aprendizado
do amor fraterno entre as criaturas.
Aqueles que já despertaram e reconheceram a necessidade da vivência do
“maior dos mandamentos”- o amor a Deus e ao próximo – tornam-se não somente
os praticantes, mas também os auxiliares da obra divina da implantação da
fraternidade legítima entre os homens.
A tarefa que compete a cada ser realizar em si mesmo resume-se em
expandir seus conhecimentos e aprender a amar, exercitando esse sentimento,
que se desdobra em múltiplas formas no relacionamento com o Criador, com os
semelhantes e com a Natureza.
Todo o esforço, todo o trabalho do Espírito, ligado à matéria ou em estado
livre, constitui o carreiro da evolução, no qual o ser desenvolve a sabedoria e o
senso do Amor e da justiça, que resumem toda a Lei.
A fraternidade é decorrência natural da prática dessa Lei universal.
Dentre os homens, aqueles que, impelidos por idéias, religiões e filosofias
reconhecem o Ser Supremo e suas leis, constróem uma consciência esclarecida
pelo sentimento de amor e justiça. Suas vidas tornam-se exemplos de
fraternidade, de solidariedade e de serviço ao próximo.
O Consolador, a Doutrina dos Espíritos, é um manancial permanente onde
os aprendizes das verdades eternas aperfeiçoam seus conhecimentos e sua
consciência, reeducam-se, renovam-se intimamente, compreendem o porquê da
vida, das desigualdades, do sofrimento, da morte e das transformações.
Na medida em que o adepto espírita aplica sua vontade e determinação em
vivência dos princípios morais e espirituais que abraçou, ele se eleva, domina as
paixões e vicissitudes, que identifica em sua personalidade, renova-se, evolui,
identifica-se com sua verdadeira natureza que, mesmo em conjunção com a
matéria, é essencialmente espiritual.
Na trilha do Cristo e de seus ensinamentos, os trabalhadores da Nova
Revelação, especialmente os que constituíram a falange do Espírito da Verdade e
os que, nos dias atuais, apoiam e incentivam a propagação do Espiritismo no
mundo, dão ênfase especial à necessidade da fraternidade no relacionamento
entre seus seguidores.
Todos os que chegam às fileiras do Consolador despertam de um estado
de consciência anterior influenciado por religiões dogmáticas, ou por filosofias
limitativas, ou pelo materialismo incongruente, ou por uma indiferença
comprometedora quanto ao próprio destino.
Na realidade, são influências de determinado estado de ignorância em que
se encontra o Espírito, cerceando seu desenvolvimento e melhor compreensão de
sua própria natureza e destino.
Esse estágio de ignorância não é um mal em si mesmo, mas uma condição
transitória, superável pelo advento de novos conhecimentos e pela aceitação de
realidades que se tornam patentes.
A evolução é feita pela substituição contínua de conhecimentos e
sentimentos por outros superiores, concordantes coma lei divina.
Uma Doutrina Superior, como a dos Espíritos, em consonância com as
verdades e realidades, isenta dos prejuízos das paixões e interesses humanos,
porque tem origem divina, auxilia de forma decisiva o progresso daqueles que a
aceitam e a praticam com sinceridade.
Ela vem em socorro de todos os que estão à procura de um novo estágio
evolutivo, saturados e inconformados com dogmas impróprios, superados pelas
luzes dos novos conhecimentos.
É o Consolador prometido por Jesus, para repor as coisas nos seus
devidos lugares, retificando entendimentos e interpretações e trazendo novas
idéias, informações e experiências para os homens.
Aceitando a Nova Revelação o homem sente-se como que liberto de liames
de um longo passado de ignorância e de insatisfação. Reconhece ter chegado a
um novo estágio evolutivo, em um terreno favorável ao desenvolvimento de ideais
que o encaminham para o Alto, com a segurança que as leis divinas proporcionam
aos que as praticam.
Nesse despertar para a luz, as reações de cada ser variam de
conformidade com os próprios valores individuais.
Há os que se sentem felizes e libertos, transformando suas vidas e
dominando as vicissitudes e os óbices com vontade e determinação. Tornam-se
servidores conscientes, espíritas sinceros, trabalhadores dedicados da Grande
Causa, nas mais variadas atividades a que se dedicam: oradores, escritores,
dirigentes, médiuns, evangelizadores, obreiros da assistência espiritual e material.
Outros esforçam-se por se modificarem, conscientes de que precisam
dominar ora o egoísmo, ora a vaidade, ora o personalismo que identificam em
suas individualidades. Travam luta interior consigo mesmos, das quais nem
sempre saem vencedores imediatamente. Em todo caso, a lei natural e a Doutrina
Consoladora oferecem tempo indeterminado para a reforma interior, aguardando
que os esforços de cada um produzam seus efeitos, nesta ou noutra vida.
Há, também, os que se entusiasmam com os princípios edificantes, que
lhes descortinam uma nova realidade, nesta e na vida futura, mas que temem
romper com suas antigas concepções religiosas ou filosóficas, dominados que
são por preconceitos arraigados.
Perdem a oportunidade preciosa que lhe oferece o conhecimento espírita
de uma renovação consciente e proveitosa, preferindo o comodismo a que se
afeiçoaram por séculos.
As ilusões, as miragens e as quimeras próprias de um mundo material de
expiações e provas, como o nosso, exercem poderosa influência sobre as almas,
mesmo sobre as que já vislumbram novos horizontes. Daí a dificuldade da
divulgação das idéias novas superiores e da sua vivência pelos que as aceitam.

Muitos não têm ainda a capacidade de entender e absorver as verdades da
Nova Revelação. Suas inteligências se comprazem no que aprenderam antes, em
conceitos e preconceitos seculares cristalizados de tal forma em seus
entendimentos que se torna inviável removê-los pela razão e pela evidência de
um valor novo. Nesses casos há que se confiar na Providência Divina, que tem
muitos meios para fazer chegar a essas almas as verdades superiores: a dor,
novas reencarnações, novos meios de reeducação, reencontro com novas
oportunidades.
*
Compete a nós, espíritas, que nos sentimos beneficiados pelo
conhecimento da Nova Luz, antes de tudo vivenciar os seus ensinos. Mas
cumpre-nos também levar essa luz aos nossos semelhantes, companheiros de
jornada de diferentes condições individuais.
Divulgar a Doutrina Espírita é, pois, nosso dever, como forma de praticar a
caridade moral do esclarecimento.
Mas é preciso não confundir o dever moral do esclarecimento e da
exemplificação com as imposições, o fanatismo, o desrespeito à pessoa humana,
grandes erros em que incorrem, ainda hoje, fanáticos de diferentes denominações
religiosas.
O Espiritismo é doutrina de amor e de compreensão. Não podemos forçar o
entendimento de quem não tem condições de aceitar seus princípios, como, por
exemplo, a lei das reencarnações, a lei de causa e efeito, a distinção entre Deus,
o Criador de todas as coisas, e Jesus, o Cristo, seu enviado, questões que,
entendidas espontaneamente, conduzem ao sólido terreno de todo o acervo
doutrinário.
Não podemos esquecer que, ao lado do amor ao próximo, como regra de
comportamento, estão também o dever de respeito à liberdade da pessoa
humana, que não devemos violar, sob pena de repetir erros do passado.
O sentimento de fraternidade para com os nossos semelhantes quaisquer
sejam suas condições individuais, conduz-nos com segurança à prática do que
preconiza a Doutrina Espírita, aos seus princípios morais.
É a vivência dos ensinos de Jesus resumidos no grande mandamento do
amor ao próximo como a si mesmo, que não exclui ninguém, nem mesmo os
inimigos.
A fraternidade liga entre si todos os seres, e nesse aspecto, confunde-se
com a solidariedade, já que todos os Espíritos são criaturas do mesmo Criador,
têm o mesmo destino e são regidos pelas mesmas leis.
Não é por outro motivo que os Espíritos Superiores, a serviço do Cristo,
exortam continuamente ao Movimento Espírita, vale dizer a todos os que se unem
sob a égide do Consolador, a cultivarem a fraternidade, a se entenderem como
irmãos.
Como assinala Emmanuel (“O Consolador”, item 349 – FEB), a fraternidade
é a lei da assistência mútua e da solidariedade comum, sem a qual todo
progresso, no planeta, seria praticamente impossível.
Bezerra de Menezes, o incansável trabalhador das hostes espiritistas,
inconfundível batalhador da união fraternal de todos os espíritas, por ocasião da
inauguração da primeira construção da sede da Federação em Brasília,
conclamava a todos à fraternidade, nestes termos:

“Estamos enchendo a nossa Casa com o espírito de amor e com a luz do Espírito
Redivivo, para albergar no seio generoso da fraternidade os que virão depois de nós,
sedentos de luz, necessitados de paz”. (Médium Divaldo P. Franco – REFORMADOR de
junho de 1967 – grifos nossos).
E o Espírito da Verdade, em “O Evangelho segundo o Espiritismo” - Os
Obreiros do Senhor -, assim convoca os trabalhadores dedicados à obra
grandiosa de transformação da Humanidade:
“Trabalhemos juntos e unamos os nossos esforços, a fim de que o Senhor, ao chegar,
encontre acabada a obra”, porquanto o Senhor lhes dirá: ”Vinde a mim, vós que sois bons
servidores, vós que soubestes impor silêncio aos vossos ciúmes e às vossas discórdias,
a fim de que daí não viesse dano para a obra!” Mas, ai daqueles que, por efeito das suas
dissensões, houverem retardado a hora da colheita (...)”. (Grifos nossos)
O desafio que os espíritas, “os trabalhadores da última hora”, que têm os
esclarecimentos e os conhecimentos mais belos e generosos que vieram à Terra,
têm diante de si mesmos é o de assimilá-los e pô-los em prática em seu
Movimento.Revista O Reformador Fevereiro de 1999

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Conhecendo o Livro Céu e o Inferno " Criminosos Arrependidos" parte 2


Leamire
Condenado à pena última pelo júri de Aisne e executado a 31 de dezembro de 1857. Evocado em 29 de janeiro de 1858.
1 . Evocação
— R. Aqui estou.
2. Vendo-nos, que sensação experimentais?
R. A sensação da vergonha.
3. Conservastes a vossa consciência até o último momento?
R. Sim.
4. Após a execução tivestes imediata noção dessa nova existência?
R. Eu estava imerso em grande perturbação, da qual, aliás, ainda não me libertei. Senti uma dor imensa e me parecia ser o coração que a sofria. Vi rolar não sei o que aos pés do cadafalso; vi o sangue que escorria e mais pungente se me tornou a minha dor.
P. Era uma dor puramente física, análoga àquela que proviria de um grande ferimento, pela amputação de um membro, por exemplo?
R. Não; figurai-vos antes um remorso, uma grande dor moral.

5. Mas a dor física do suplício, quem a experimentava: o corpo ou o Espírito?
R. A dor moral estava em meu Espírito, sentindo o corpo a dor física; mas o Espírito desligado também dela se ressentia.
6. Vistes o corpo mutilado?
R. Vi qualquer coisa informe, à qual me parecia integrado; entretanto, reconhecia-me intacto, isto é, que eu era eu mesmo...
P. Que impressões vos advieram desse fato?
R. Eu sentia muito a minha dor, estava completamente ligado a ela.
7. Será verdade que o corpo vive ainda alguns instantes depois da decapitação, tendo o supliciado a consciência das suas idéias?
R. O Espírito retira-se pouco a pouco; quanto mais o retêm os laços materiais, menos pronta é a separação.
8. Dizem que se tem notado a expressão da cólera e movimentos na fisionomia de alguns supliciados como se estes quisessem falar; será isso efeito de contrações nervosas ou um ato da vontade?
R. Da vontade, uma vez que o Espírito não está desligado.
9. Qual o primeiro sentimento que experimentastes ao entrar na vossa nova existência?
R. Um sofrimento intolerável, uma espécie de remorso pungente cuja causa ignorava.
10. Acaso vos achastes reunido aos vossos cúmplices supliciados ao mesmo tempo?
R. Infelizmente, sim, por desgraça nossa, pois essa visão recíproca é um suplício contínuo, exprobrando-se uns aos outros os seus crimes.
11. Tendes encontrado as vossas vítimas?
R. Vejo-as... são felizes; seus olhares perseguem-me... sinto que me varam o ser e embalde tento fugir-lhes.
P. Que impressão vos causam esses olhares?
R. Vergonha e remorso. Ocasionei-os voluntariamente e ainda os abomino.
P. Qual a impressão que lhes causais vós?
R. Piedade, é sentimento que lhes percebo a meu respeito.
12. Terão por sua vez o ódio e o desejo de vingança?
R. Não; os olhares que me lançam me lembram a minha expiação. Vós não podeis avaliar o suplício horrível de tudo devermos àqueles a quem odiamos.
13. Lamentais a perda da vida corporal?
R. Apenas lamento os meus crimes. Se o fato ainda dependesse de mim, não mais sucumbiria.
14. O pendor para o mal estava na vossa natureza, ou fostes ainda influenciado pelo meio em que vivestes?
R. Sendo eu um Espírito inferior, a tendência para o mal estava na minha própria natureza. Quis elevar-me rapidamente, mas pedi mais do que comportavam as minhas forças. Supondo-me forte, acabei por ceder às tentações do mal.
15. Se tivésseis recebido sãos princípios de educação, ter-vos-íeis desviado da senda criminosa?
R. Sim, mas eu havia escolhido a condição do nascimento.
P. Acaso não vos poderíeis ter tornado homem de bem?
R. Um homem fraco é incapaz tanto para a prática do bem como para o do mal. Poderia, talvez, corrigir na vida o mal inerente à minha natureza, mas nunca me elevar à prática do bem.
16. Quando encarnado acreditáveis em Deus?
R. Não.
P. Mas falam que à última hora vos arrependestes...
R. Porque acreditei num Deus vingativo, era natural que o temesse...
17. Parece-vos justo o castigo que vos aplicaram na Terra?
R. Sim.
18. Esperais obter o perdão dos vossos crimes?
R. Não sei.
P. Como pretendeis repará-los?
R. Por novas provações, conquanto me pareça que uma eternidade existe entre mim e elas.

19. Onde vos achais agora?
R. Estou no meu sofrimento.
P. Perguntamos qual o lugar onde vos encontrais...
R. Perto do médium.
20. Uma vez que assim é, sobre que forma vos veríamos, se isso nos fosse possível?
R. Ver-me-íeis sob a minha forma corpórea: a cabeça separada do tronco.
P. Podereis aparecer-nos?
R. Não; deixai-me.
21. Podereis dizer-nos como vos evadistes da prisão de Montlidier?
R. Nada mais sei... é tão grande o meu sofrimento, que apenas guardo a lembrança do crime... Deixai-me.
22. Poderíamos concorrer para vos aliviar desse sofrimento?
R. Fazei votos para que sobrevenha a expiação.




Aprendendo com o Livro dos Espíritos questão 30

 
“De um só elemento primitivo. Os corpos que considerais simples não são verdadeiros elementos, são transformações da matéria primitiva.”
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Comentários de Miramez por João Nunes Maia.
 

Aprendenco com o Livro do Espírito questão 29

 
 
A humanidade, no momento, não está precisando de mais ciência para viver melhor e, sim, de educação dos próprios sentimentos. É necessário que vigore, de agora para frente, o conhecimento sobre o amor e a aplicação prática desta virtude incomparável, que se divide ao infinito para ajudar com eficiência. Se Deus deixasse o homem, na escala de evolução em que se encontra, descobrir o que ele deseja sobre as propriedades mais profundas das formas, deixaria em perigo a sua própria moradia, pois apenas com o que já teve oportunidade de descobrir, poderá fazê-lo passar por vexames em futuro próximo. A força maior que a humanidade alimenta é o ódio, a ganância, a inveja, o orgulho e, acima de tudo, o egoísmo. As transações comerciais estão na frente de todos os sentimentos altruísticos e o Cristo foi esquecido na Sua mais profunda esquemática de nivelar os homens, como sendo irmãos, filhos de um mesmo Pai, de empenhar com Seus discípulos para pregar o Evangelho a todas as nações, a todas as criaturas.
 

Aprendendo com o Livro dos Espíritos questão 28

 
Elas se nos mostram como sendo distintas; daí o considerarmo-las formando os dois princípios constitutivos do Universo. Vemos acima de tudo isso uma inteligência que domina todas as outras, que as governa, que se distingue delas por atributos essenciais. A essa inteligência suprema é que chamamos Deus.
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Comentários de Miramez por João Nunes Maia.
 

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Deus e os Deuses




Herculano Pires/ Livro: Concepção Existencial de Deus

O Deus judeu, exclusivista e autoritário, definiu-se na Bíblia com esta afirmação: Eu sou aquele que é. Os homens já percebiam, então, que a multiplicidade dos deuses era contraditória em si mesma, militava contra a idéia de Deus. Se Iavé ou Jeová se apresentava como o Único, sua posição era lógica e respondia às exigências de coerência do novo pensamento que se desenvolvia em Israel e no mundo. Mas o exclusivismo de Iavé parecia demasiado arrogante. O poder esmagador de Júpiter, que através das legiões romanas ameaçava dominar o mundo inteiro, não deixava lugar para esse deusinho petulante de uma pequena província do Império. Caberia, talvez, a Zeus, senhor do Olimpo, que levara os gregos a um desenvolvimento cultural sem precedentes, impor-se como Deus único. Mas quando o Messias judeu, Jesus de Nazaré, adoçou a arrogância judia chamando Iavé de Pai, abriu-se a possibilidade de uma aceitação universal do monoteísmo hebraico. O desenvolvimento posterior do Cristianismo, facilmente infiltrado nas populações subjugadas do Império Romano, provou a eficácia da intervenção messiânica. Todos os deuses foram perdendo os seus adeptos para aquele Deus desconhecido com o qual o Apóstolo Paulo identificara Iavé em Atenas.
Kerchensteiner, em notável estudo, analisou em nossos dias a fisiologia do mito, mostrando as leis que regem o processo mitológico. Os deuses não foram inventados pelos homens, como querem as teorias simplórias de Taylor e Spencer, ainda hoje sustentadas até mesmo pelo chamado materialismo científico. Os mitos nascem do seio da Mãe-Terra, evocados pelo coração dos homens, e sobem aos céus escalando montanhas ou nos vapores d’água que se acumulam na atmosfera. Daí a facilidade com que se tomava a nuvem por Juno ou o relâmpago por Júpiter. Da Terra-Mãe surgem as pedras e os rios, as matas e os animais e, por fim, os homens. Mas os homens trazem a idéia de Deus no coração e possuem a capacidade mental de projetar-se nas coisas e nos seres. A dinâmica do animismo primitivo gera a floração dos deuses que protegem os povos. Mas os deuses particulares, das tribos e depois das nações, nada mais são do que a fragmentação ilusória da unidade primitiva e irredutível. Assim como, partindo das coisas isoladas – a terra, a água, os vegetais, os animais, etc. – os homens vão depois descobrindo a unidade da realidade indivisível, pois a realidade é uma só, formada de inumeráveis conjuntos, assim também a multiplicidade dos deuses tribais vai aos poucos se fundindo nas pequenas unidades do sistema solar e à unificação atual do Cosmo, maiores das mitologias nacionais. O homem finito não pode conceber o infinito como uno e absoluto senão através das experiências do real. A unificação da idéia de Deus precedeu à unificação copérnica da unidade do sistema solar e a unificação atual do Cosmo, como exigência primária do desenvolvimento da razão. Por isso os gregos anteciparam o monoteísmo no plano filosófico, pelo qual Sócrates teve de pagar o preço da taça de cicuta. Mas a unidade religiosa só foi possível na reforma do Judaísmo por Jesus de Nazaré, que os gregos apoiaram chamando-o de Cristo (um nome grego) e que teve de pagar um preço mais alto com a crucificação romana. Os homens partem das coisas mínimas para chegarem pouco a pouco às máximas. O mito é, ao mesmo tempo, a projeção da alma humana nas coisas e a absorção das coisas pelo poder anímico do homem. A mitologia não foi também a invenção gratuita dos deuses pela imaginação dos homens, nem a busca de proteção ante a insegurança da vida precária, mas a tentativa necessária de racionalização do mundo. Superando o sensível da teoria platônica, os homens converteram o mundo num organismo vivo e inteligível, através dos mitos. O Olimpo se assemelhava às cortes dos Soberanos terrenos, com a hierarquia humana de funções e poderes, não por imitação, mas porque somente assim os homens poderiam compreender o mistério do mundo. Não foi o medo, mas a curiosidade que gerou os deuses. A prova histórica disso está na teoria diltheiana do caldeirão medieval, onde, só naquela fase específica da teocracia medieval a Razão se fundia numa peça única, destinada à preparação do Renascimento como Idade da Razão.
A embriaguez racional, como acontece aos indivíduos na passagem da mitologia infantil para o alvorecer racional da puberdade e da adolescência, levou os homens à rebeldia dos primeiros tempos de liberdade, geradora do ateísmo e do materialismo. O desenvolvimento das Ciências segue os rumos da crise da adolescência, no esquema do famoso estudo de Maurice Debesse. Os homens do Renascimento, do Mundo Moderno e até mesmo do Mundo Contemporâneo portaram-se como adolescentes no chamado conflito de gerações. Já agora, porém, nas vésperas da Era Cósmica, os achados do Renascimento precisam ser revisados, para que a problemática humana seja respondida em termos de razão; mesmo porque é na razão que temos a imagem de Deus no homem, não em sua forma corpórea, que o assemelha aos símios. A concepção antropomórfica de Deus foi uma traquinagem da Humanidade adolescente. Essa traquinagem se justifica em seu tempo, como simples ensaio religioso para uma tentativa posterior de colocação da idéia de Deus em termos racionais. Kardec, em seu livro O Céu e o Inferno, comparando a mitologia greco-romana com a mitologia cristã, mostrou as incongruências tipicamente adolescentes da reformulação teológica da idéia de prêmio e castigo após a morte. O Céu cristão aparece ingênuo e fantasioso como um sonho de meninotes e o Inferno cristão impiedoso e injusto como uma descrição de terrores infantis. Tão mais impiedoso e desarrazoado é esse inferno do que o pagão, que chegamos a rir das graves proposições teológicas formuladas por teólogos e clérigos eminentes.
O poder temporal da Igreja, que submeteu ao seu arbítrio as cortes européias, estendendo-se depois a todas as áreas mundiais da conversão, impediu a análise dessas criações monstruosas e incentivou o desenvolvimento do ateísmo e do materialismo. O panteísmo de Espinosa foi a única reação madura aos absurdos teológicos, colocando a concepção monoteísta em termos realmente racionais. Mas a posição panteísta incide no erro de confundir a Criação com o Criador, o que diminuiu a eficácia da proposição espinosiana. O campo continuou livre para o materialismo.
Espinosa teve o mérito de desfazer o engano da concepção antropomórfica da Bíblia e substituir o símbolo da criação alegórica do homem numa proposição filosófica de integração cósmica da criatura humana. A orgulhosa pretensão de separatividade e privilégio, que ainda hoje é pregada nos seminários de várias igrejas cristãs, foi esmagada pela sua inteligência. O homem, simples modo ou afecção da substância terrena, nas muitas manifestações do poder divino, brota da natureza como todas as coisas e a ela volta com a morte. Mas nem por isso o seu panteísmo caiu no materialismo. A Natureza naturata representa a Criação, é natureza sensível. Mas por baixo do sensível existe o inteligível, que é a Natureza naturans, o próprio Deus, fonte geradora de toda a realidade. Deus é imanente no mundo e todas as coisas e todos os seres nascem dele, como as fontes e os vegetais. A exposição matemática de Espinosa em A Ética faz desse pequeno judeu excomungado o restaurador da grandeza moral e espiritual do judaísmo. Os rabinos esbravejaram nas sinagogas, mas ele arrancou da sua fé judaica independente uma contribuição heróica para a concepção existencial de Deus que apareceria mais tarde na obra de Kardec.
Na Antigüidade encontramos algumas posições que podem ser consideradas precursoras da posição espinosiana. Encontramos na China o conceito do Tao, que gerou o Taoísmo, em que o Céu é o próprio Deus e ao mesmo tempo o caminho da redenção; na Pérsia arcaica a proposição dinâmica de Zoroastro, que toma o fogo como a única imagem possível de Deus; em Pitágoras, na Grécia arcaica, a visão cósmica de um Universo integrado em que os reinos da Natureza permutam incessantemente as suas energias, inclusive o humano; e, ainda, entre os gregos a concepção isoloísta da Terra como um ser vivo e gerador de vida. A Música das Esferas, girando no Infinito, podia ser captada pelos ouvidos sensíveis e dava a essa concepção o valor estético de uma criação musical. Nenhuma dessas concepções elevadas, entretanto, conseguiu socializar-se e conquistar o povo. Foram clarões da inteligência humana que não comoveram o homem, o que Jesus de Nazaré conseguiu, transformando o mundo, não obstante as igrejas nascidas do seu pensamento o houvessem deturpado com incríveis enxertos do mais primário paganismo. O próprio Jesus foi transformado num mito em que há pinceladas fortes de Apolo e Osíris. Ritos simplórios das religiões pagãs, como as bênçãos de aspersão (de origem fálica) perderam a sua naturalidade ingênua e pura e se transformaram em ritos sofisticados e desprovidos de seu sentido genético. Igrejas pagãs foram transformadas pela força e embuste em templos cristãos, como a igreja rústica da deusa Lutécia, em Paris, sobre a qual foi erguida mais tarde a Catedral de Notre Dame, que guarda em seu porão os restos da igreja pagã.
Os herdeiros do Cristianismo primitivo sufocaram as práticas mediúnicas de que o Apóstolo Paulo dá notícias em sua I Epístola aos Coríntios, asfixiaram as manifestações do espírito (o pneuma grego), introduziram altares e imagens no culto cristão e negaram o princípio da reencarnação constante de vários trechos dos Evangelhos. Ao invés de desenvolverem a concepção cristã de Deus, restabeleceram a concepção mitológica de Iavé como Deus dos Exércitos e voltaram à violência bíblica que Jesus havia substituído pelo amor e a caridade, implantando as guerras de conquista em nome do Deus judaico antigo, chegando mesmo a adotar a imagem de um Deus iracundo e cruel, vingativo e ordenador de matanças e devastações do tipo bíblico da conquista de Canaã.
O Deus mitológico dos judeus absorveu em sua concepção, como Deus do Cristianismo deformado, os deuses da Antigüidade mais violentos, num processo de sincretismo religioso até então sem precedentes. Todas essas deturpações vingaram entre as populações incultas da Europa, a partir do século IV da Era Cristã, asfixiando a essência dos ensinos renovadores do Cristo e criando condições propícias para a revolta do ateísmo e do materialismo que explodiria na Era da Razão, após a Idade Média. A unicidade de Deus, que devia ampliar e elevar o conceito de Deus no mundo, transformou-se na multiplicidade dos deuses, no politeísmo dos altares carregados de imagens destinadas à adoração dos crentes interessados em milagres e no comércio de indulgências. A Reforma do século XVI, iniciada por Lutero, com objetivo de retorno ao Cristianismo puro, foi também desfigurada pela influência de inovadores violentos, como Calvino, apegado à violência bíblica.
Apesar de todas essas deformações, o Cristianismo, particularmente após a Reforma de Lutero e a publicação dos Evangelhos em línguas populares de várias nações, contribuiu poderosamente para modificar a selvageria dos homens; porque os princípios cristãos, vividos por clérigos humildes e humanos como Francisco de Assis e outros, conseguiram tocar os corações sensíveis em todo o mundo.Victor Hugo, em seu Prefácio de Cromwell, considerado como manifesto do romantismo, traçou em pinceladas ardentes a modificação profunda que o Cristianismo conseguiu, apesar de todos os percalços, promover no pensamento europeu, com reflexos mundiais. O conceito de Deus como o Pai era tão poderoso, correspondia de tal maneira aos anseios de populações cansadas de guerras e violências, que conseguiu superar os malefícios, embora em parte, das adulterações ocorridas em dois mil anos e ainda hoje em desenvolvimento. Essa constitui uma prova altamente significativa, na dura experiência religiosa da Terra, da importância do conceito de Deus para a evolução planetária. Por isso, apesar de tudo, podemos ainda esperar que o restabelecimento progressivo, lento e difícil, da pureza dos ensinos de Jesus, juntamente com o avanço cultural e científico do nosso tempo, que leva a Ciência à necessária conversão, prepare nos próximos séculos condições mais favoráveis à espiritualização racional da Terra. A razão conturbada por tantos absurdos deverá restabelecer-se em seus fundamentos espirituais, pois quem diz razão não se refere à matéria, mas ao espírito. Apesar das confusões materialistas a respeito de cérebro e mente, já se começa a compreender essa coisa tão simples e clara: que a razão é função do espírito e, como assinalou Rhine, que o pensamento é uma energia extrafísica. Enquadrando-se nessa nova perspectiva e conceito existencial de Deus, é possível que a guerra nuclear desapareça com o advento das novas gerações, libertas dos prejuízos do passado e do presente. É sempre melhor pensar no melhor.

O PROGRAMA DO SENHOR

01 - O PROGRAMA DO SENHOR
A frente da turba faminta, Jesus multiplicou os pães e os peixes, atendendo à necessidade
dos circunstantes.
O fenômeno maravilhara.
O povo jazia entre o êxtase e o júbilo intraduzíveis.
Fora quinhoado por um sinal do Céu, maior que os de Moisés e Josué.
Frêmito de admiração e assombro dominava a massa compacta.
Relacionavam-se, ali, pessoas procedentes das regiões mais diversas.
Além dos peregrinos, em grande número, que se adensavam habitualmente em torno do
Senhor, buscando consolação e cura, mercadores da Iduméia, negociantes da Síria,
soldados romanos e cameleiros do deserto ali se congregavam em multidão, na qual se
destacavam as exclamações das mulheres e o choro das criancinhas.
O povo, convenientemente sentado na relva, recebia, com interjeições gratulatórias, o
saboroso pão que resultara do milagre sublime.
Água pura em grandes bilhas era servida, após o substancioso repasto, pelas mãos robustas
e felizes dos apóstolos.
E Jesus, após renovar as promessas do Reino de Deus, de semblante melancólico e sereno
contemplava os seguidores, da eminência do monte.
Semelhava-se, realmente, a um príncipe, materializado, de súbito, na Terra, pela suavidade
que lhe transparecia da fronte excelsa, tocada pelo vento que soprava, de leve...
Expressões de júbilo eram ouvidas, aqui e ali.
Não fornecera Ele provas de inexcedível poder? não era o maior de todos os profetas? não
seria o libertador da raça escolhida?
Recolhiam os discípulos a sobra abundante do inesperado banquete, quando Malebel,
espadaúdo assessor da Justiça em Jerusalém, acercou-se do Mestre e clamou para a
multidão haver encontrado o restaurador de Israel. Esclareceu que conviria receber-lhe as
determinações, desde aquela hora inesquecível, e os ouvintes reergueram-se, à pressa,
engrossando fileiras, ao redor do Messias Nazareno.
Jesus, em silêncio, esperou que alguém lhe endereçasse a palavra e, efetivamente, Malebel
não se fez rogado.
– Senhor – indagou, exultante –, és, em verdade, o arauto do novo Reino?
– Sim – respondeu o Cristo, sem, titubear.
– Em que alicerces será estabelecida a nova ordem? – prosseguiu o oficial do Sinédrio,
dilatando o diálogo.

– Em obrigações de trabalho para todos.
O interlocutor esfregou o sobrecenho com a mão direita, evidentemente inquieto, e
continuou:
– Instituir-se-á, porém, uma organização hierárquica?
– Como não? – acentuou o Mestre, sorrindo.
– Qual a função dos melhores?
– Melhorar os piores.
– E a ocupação dos mais inteligentes?
– Instruir os ignorantes.
– Senhor, e os bons? Que farão os homens bons, dentro do novo sistema?
Ajudarão aos maus, á fim de que estes se façam igualmente bons.
– E o encargo dos ricos?
– Amparar os mais pobres para que também se enriqueçam de recursos e conhecimentos.
– Mestre – tornou Malebel, desapontado –, quem ditará semelhantes normas?
– O amor pelo sacrifício, que florescerá em obras de paz no caminho de todos.
– E quem fiscalizará o funcionamento do novo regime?
– A compreensão da responsabilidade em cada um de nós.
– Senhor, como tudo isto é estranho! – considerou o noviço, alarmado – desejarás dizer que
o Reino diferente prescindirá de palácios, exércitos, prisões, impostos e castigos?

– Sim – aclarou Jesus, abertamente –, dispensará tudo isso e reclamará o espírito de
renúncia, de serviço, de humildade, de paciência, de fraternidade, de sinceridade e,
sobretudo, do amor de que somos credores, uns para com os outros, e a nossa vitória
permanecerá muito mais na ação incessante do bem com o desprendimento da posse, na
esfera de cada um, que nos próprios fundamentos da Justiça, até agora conhecidos no
mundo.

Nesse instante, justamente quando os doentes e os aleijados, os pobres e os aflitos desciam
da colina tomados de intenso júbilo, Malebel, o destacado funcionário de Jerusalém, exibindo
terrível máscara de sarcasmo na fisionomia dantes respeitosa, voltou as costas ao Senhor, e,
acompanhado por algumas centenas de pessoas bem situadas na vida, deu-se pressa em
retirar-se, proferindo frases de insulto e zombaria...
O milagre dos pães fora rapidamente esquecido, dando a entender que a memória funciona
dificilmente nos estômagos cheios
, e, se Jesus não quis perder o contacto com a multidão,
naquela hora célebre, foi obrigado a descer também
.

Livro: Pontos e Contos /Irmão X por Francisco Candido Xavier