Caros amigos leitores , gostaríamos, na medida do possível ,contar com a interação de todos ,através de comentários , tornando se seguidores deste blog divulgando para seus conhecidos ,para que assim possamos estudar e aprendermos juntos , solidários e fraternos. Inscrevam-se no blog!

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

A escada de Jacó


Artigo extraído do livro "Educação para a Morte" - 5ª Edição - Setembro de 1996 - Editora Espírita Correio Fraterno do ABC.

Nascimento e morte determinam o trânsito especial entre o Céu e a Terra. Dia e noite, sem cessar, descem e sobem os anjos pela escada simbólica da visão bíblica de Jacó. Anjos são espíritos, e o Apóstolo Paulo esclareceu que são mensageiros. Trazem e levam mensagens de um plano para o outro. São mensagens de amor, de estímulo, de orientação e encorajamento. As mensagens são dadas, na maioria, através de intuições, na Terra, aos destinatários encarnados. Mas há também as que são dadas por via mediúnica, através de um médium, ou por sonhos. Essa comunhão espiritual permanente é conhecida desde as épocas mais remotas. Mas só em 1857, com a publicação de O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec, em Paris, o problema foi encarado como positivo e levado à consideração dos sábios e das instituições cientificas. As Igrejas Cristãs, tendo à frente a Católica Romana, levantaram-se contra essa colocação, que diziam simplória, de um grave problema teológico. Só os clérigos e os teólogos, segundo elas, tinham direito a tratar do assunto. Um século depois, a questão estava nas mãos das Ciências e a Ciência Espírita, fundada por Kardec era colocada à margem do mundo científico, por não possuir um objeto legitimamente científico, material, ao alcance dos sentidos humanos. Richet levantara, na Metapsíquica, à tese do sexto sentido, e Kardec sustentava que os fenômenos mediúnicos, pelo fato mesmo de serem fenômenos, constituíam o objeto sensível da Ciência Espírita.
Em 1830 os professores Joseph Banques Rhine e William McDougall lançavam na Universidade de Duke, na Carolina do Sul (Estados Unidos da América) a nova Ciência da Parapsicologia, para a investigação desses mesmos fenômenos. E em 1840 ambos proclamavam com seus colaboradores, a prova científica da Clarividência. Dali por diante cresceu rapidamente no mundo o interesse pelo assunto e surgiram pesquisas e cátedras em todas as grandes Universidades da América e da Europa. Hoje a questão é pacífica no plano científico, e mesmo no religioso, pois a Igreja aceitou a realidade dos fenômenos e interessou-se efetivamente pelas pesquisas. A Parapsicologia avançou rapidamente, seguindo a trilha da Ciência Espírita, sem nenhum desvio.
Vencida a barreira dos preconceitos e das sistemáticas a que se apegavam numerosos cientistas, a Parapsicologia definiu-se como a Ciência do Homem. Rhine, ao aposentar-se na Universidade de Duke, estabeleceu a Fundação para a Pesquisa da Natureza Humana. A Parapsicologia sustenta a natureza espiritual do homem e suas possibilidades de ação extensiva e intensiva no plano físico e mental ou espiritual. “A mente, que não é física, age sobre a matéria por vias não físicas”, declarou Rhine, apoiado por grandes nomes da Ciência em todo o mundo. Essa declaração mudou o panorama cultural do planeta. Hoje ninguém duvida, quando nasce uma criança, que se trata de um espírito humano reencarnado biologicamente na Terra. Embora ainda existam setores científicos infensos, à nova Ciência, firmou-se no mundo de maneira definitiva. Os cientistas que a negam ou rejeitam são considerados retrógrados ou se definem a si mesmos como pertencentes a religiões que não devem aceitar os novos princípios.
A morte perdeu o sentido de negação da vida. Os fenômenos Teta, um dos últimos tipos de fenômenos paranormais pesquisados pela Parapsicologia, nada mais são do que as comunicações mediúnicas. Além do trânsito entre a Terra e o Céu – o mais movimentado do mundo – existe agora a comunicação permanente entre os homens e os espíritos. As descobertas físicas no plano das pesquisas sobre a estrutura da matéria mostraram que não vivemos num mundo tridimensional, mas multidimensional. Os que morrem na Terra passam para os planos da esfera semimaterial, de matéria rarefeita, que a circunda, e, conforme o seu grau evolutivo, para as hipóstases espirituais entrevistas por Plotino, na fase helenista da Filosofia Grega. Nas sessões espíritas, em todo o mundo, milhares de pessoas conseguem conversar com amigos e parentes mortos, que dão provas evidentes de sua sobrevivência após a morte. As restrições dos sistemáticos e preconceituosos continuam, mas a realidade se impõe de tal maneira que essas restrições já diminuíram assustadoramente. A Terra se espiritualiza, apesar do materialismo das religiões e a morte já não amedronta milhares dos milhões de criaturas que morrem todos os dias.
Geralmente não se pensa no que isso representa para a Humanidade. Entregues às suas preocupações absorventes do seu dia a dia, homens e mulheres ainda vivem na Terra como há milhões de anos. Cuidam da vida sem se preocuparem com a morte. Essa posição anestésica é útil na Terra, mas desastrosa nos planos espirituais. Nas manifestações de espíritos (fenômenos teta) pode-se avaliar o prejuízo causado às criaturas por essa alienação à matéria. Embriagados pelos seus anseios de conquistas materiais, praticamente tragados pela vida prática, a maioria dos que morrem não têm a menor noção do que seja a morte. Entram em pânico após o trespasse, apegam-se depois a pessoas amigas de suas relações, perturbando-as sem querer ou procurando, através delas, sentirem um pouco da segurança perdida na Terra. Além desses prejuízos, a falta de educação para a morte causa o prejuízo maior dos desesperos, angústias existenciais e loucuras que hoje varrem a Terra em toda a sua extensão. Por outro lado é preciso considerar-se os prejuízos imensos produzidos pela ignorância das finalidades da vida. As próprias Ciências sofrem dessa ignorância, que lhe barra o caminho de descobertas necessárias para a melhoria das condições da vida terrena.
Por mais atilados e dedicados que sejam os cientistas, se não tiverem conhecimento das leis fundamentais que regem o planeta e condiciona, a Humanidade, não podem penetrar nas causas dos males e problemas que enfrentam. É questão pacífica que a falta de conhecimento preciso e amplo do meio em que estamos nos deixa entregues a perigos que não podemos prever. É o que agora mesmo acontece, no caso da poluição perigosíssima do planeta pelas exigências do desenvolvimento industrial. A falta de interesse pela Ecologia mergulhou o mundo numa situação desastrosa, que ainda não sabemos como poderemos superar. A Ciência ateve-se aos efeitos, deixando as causas por conta da Filosofia e da Religião. Esta última fechou-se em dogmas ilusórios, mandando às calendas a questão fundamental das causas. Entregues aos conhecimentos empíricos da realidade constatada nos efeitos, os homens conseguiram realizar a façanha trágica da poluição total do planeta, com os mais graves prejuízos para a vida humana, bem como os vegetais e aos animais. Descuidamos da morte e perdemos a vida. Se não mudarmos urgente de atitude, transformaremos a Terra numa Lua sem atmosfera.
A nossa insistência na consideração escatológica da morte, na sua função essencialmente destruidora – negando-lhe o papel fundamental de controladora da vida e a de renovadora das civilizações, parece ter provocado uma reação em nossa própria estrutura ôntica que nos transformou em nadificadores de nós mesmos e de toda a realidade. O estranho privilégio que pretendemos, de sermos os únicos seres condenados ao nada, um Universo em que tudo se renova e se eleva, constitui a mais espantosa contradição de toda a História Humana. Essa contradição monstruosa deforma a figura do homem no mundo que ao invés de imagem e semelhança de Deus, aparece como a fera mais temível do planeta, onde as feras selvagens são sistematicamente destruídas e devoradas pelo animal dotado de inteligência criadora, sentimento, moral, compreensão de sua espiritualidade e sensibilidade ética e estética. O humanismo apaixonado de Marx, que sonhava sem o saber com o Reino de Deus na Terra negou-se a si mesmo ao formular a teoria do poder totalitário e absoluto de uma classe social contra as outras. Larissa Reissner, que lutou pelos bolchevistas de armas na mão, mostra-se desolada, nas páginas brilhantes de seu livro Homens e Máquinas, ao referir-se aos campos de trabalhos forçados da URSS, em que antigos e bravos companheiros de luta pagavam sob o poder soviético o preço de suas ilusões para o fortalecimento do Estado-Leviatã de Hobbes. A terrível dialética das revoluções sociais materialistas, sem Deus e sem coração, levou o Marxismo ao pelourinho da lei de negação da negação, negando-se a si mesma no processo histórico. Sem o respeito do homem por si mesmo, pela sua condição humana, todas as tentativas de melhorar o mundo, acabam na asfixia da liberdade, nadificando o homem depois de transformá-lo em objeto. É essa também a contradição fundamental de Sartre em O Ser e o Nada e na Crítica da Razão Dialética. Mas é precisamente das contradições entre a tese e antítese que podemos obter a síntese que nos dá a verdade possível de cada problema.
Os anjos que descem pela escada de Jacó, na alegoria bíblica representam a tese da proposição existencial. A verdade possível do Céu, ou seja, dos planos divinos, entendendo-se por divino aquilo que supera a condição material. Mas são esses mesmos anjos que voltam para o Céu representando a antítese. O trânsito espacial resulta da síntese humana em que a proposta terrena e a resposta celeste se fundem no processo existencial da transcendência. Por isso Kardec rejeitou as revelações proféticas do passado, individuais e exclusivistas, que geraram as religiões da morte, estabelecendo o princípio das revelações conjugadas, de natureza cientifica, em que o mundo é a tese, o homem é a antítese e a verdade é a síntese. Essa síntese, como acentuou Léon Denis, a mundividência espírita, de difícil compreensão para os anjos que descem e ficam na rotina terrena, no círculo vicioso das reencarnações repetitivas. A verdade possível é interditada a eles, não por condenação divina, mas por opção própria. Quando eles romperem o círculo vicioso poderão compreender essa verdade, a verdade possível, ao alcance do homem que soube transcender-se. Na dialética espírita o homem propõe a tese, o espírito responde com a antítese e a Razão elabora a síntese do conhecimento possível. A religião, como ensinou Kardec, é a conseqüência da revelação espiritual fundida com a revelação cientifica. A verdade possível tem sua legitimidade e sua validade precisamente nessa fusão. Os limites da vida terrena condicionam a realidade humana às possibilidades cognoscitivas da mente humana atualizada na matéria. O espírito revela um princípio espiritual e o cientista revela a lei terrena a ela correspondente. Só nesse processo de perfeito equilíbrio o homem pode evitar os perigos do misticismo alienante, para viver na Terra em marcha para a transcendência, através da Existência. É esse o processo que permite a fusão dialética de Ciência e Religião, como fundamento de toda a verdade possível na Era Cósmica. Por isso, não insistimos no Espiritismo por sectarismo ou proselitismo, mas pelo fato inconteste de só ele nos oferecer os instrumentos conceptuais necessários à conquista da realidade. Sem a fusão da efetividade com a razão não poderíamos atingir a síntese do conhecimento geral, na fragmentação dos efeitos sem o esclarecimento das causas. O método indutivo da Ciência permite-nos reunir os efeitos para a compreensão possível da causa única e transcendente.

As dimensões da educação

As dimensões da educação

Artigo extraído do livro "Pedagogia Espírita" - 1ª Edição - Maio de 1985 - Editora Cultural Espírita Ltda - EDICEL.

A educação só se tornou problemática nos momentos em que se desligou da religião. Isso é visível nos momentos históricos de desligamento parcial, como no mundo clássico, particularmente no apogeu da civilização grega, e na fase de emancipação total que começa no Renascimento e vai encontrar seu ponto culminante em Rousseau. Enquanto as religiões incorporaram, em suas estruturas gerais, o conceito de educação como salvação e a prática educativa como catequese, não havia problema. Quando, porém, o pensamento crítico se desenvolveu, a ponto de atingir a própria substância da fé, retirando ao homem a base ingênua de certezas tradicionais em que ele se sentia seguro dentro do mundo, tornou-se evidente a necessidade de criação de sistemas educacionais autônomos e surgiu a problemática da educação.

O episódio dos sofistas, seguido dos esforços de Sócrates, Platão e Aristóteles, é bastante elucidativo desse fato. A transformação da estrutura estática do antigo estado grego na estrutura dinâmica do imperialismo de Péricles, como esclarece Jaeger, exige a “racionalização da educação política”, como “um caso particular da racionalização de toda a vida grega, que mais do que nunca se funda na ação e no êxito”. A educação supera os seus estágios familial e épico, ambos dominados pela concepção mítico-religiosa, para adquirir uma nova dimensão: a cívica ou política. Esse problema da “ação e do êxito” é também examinado por Marrou, que nos oferece um estudo do mecanismo de transição da educação épica para a técnica, na “passagem progressiva de uma cultura de nobres guerreiros para uma cultura de escribas”.

A reincorporação da educação à estrutura religiosa, que se verifica na Idade Média, não representa um retrocesso, porque se realiza num plano de enriquecimento conceptual. Quer dizer: a educação medieval, conquanto dominada pela concepção religiosa e submetida ao controle eclesiástico, já se processa numa perspectiva racional. As contribuições do racionalismo grego, do pensamento jurídico romano e do providencialismo cristão misturam-se nessa perspectiva, em que se elabora, desde o declínio do Império, essa fusão conceptual que, segundo Dilthey, “aflui como metafísica para os povos modernos”. A homogeneidade do pensamento medieval não era mais do que o resultado de um lento processo de caldeamento em que a educação também se caldeava em novas possibilidades formais. O processo histórico não se interrompe, mas prossegue, não mais em extensão, mas em profundidade, como assimilação. E na medida em que vão surgindo, nas linhas sucessivas desse processo, as dimensões espirituais do homem, a educação naturalmente se desenvolve em perspectivas dimensionais.

Esta possibilidade de encararmos a educação num plano de desenvolvimento progressivo, não apenas histórico, mas, sobretudo historicista, parece-nos bastante fecunda para melhor compreensão do problema educacional. A partir da educação primitiva, como simples forma de integração, passamos às formas religiosa e cívica, como processos de domesticação, para atingirmos os conceitos clássico e moderno de formação cultural em que as condições de imanência social são finalmente rompidas pelo impulso da transcendência espiritual. Encontramos assim uma dialética da educação que nos permite o processo educativo de maneira dinâmica, acima dos traçados rígidos da História como conseqüência de fases e das condições deterministas bio-psico-sociais.

Essa dialética talvez nos forneça os meios de que necessitamos, com tanta urgência, para superarmos o impasse em que se encontra o problema da educação em nossos dias, no entrechoque de tantas teorias contraditórias. Se pudermos encarar a educação como um processo de desenvolvimento dimensional da cultura, não como substituição de fases históricas condicionadas pelo tempo, mas de um processo que se serve do tempo, estaremos mais próximos de uma visão global do problema. Parece-nos, pelo menos, que dessa maneira poderemos superar a representação esquemática, fragmentária que hoje possuímos do processo, gerando posições diversas e contraditórias na sua enfocação teórica, para encontrarmos as linhas gerais de uma verdadeira Filosofia da Educação.


As dimensões do homem


É evidente que as dimensões da educação decorrem das dimensões do homem. Se o homem pode ser encarado, tanto espiritual como socialmente, numa perspectiva de sucessões dimensionais, então o processo educativo também será susceptível dessa visualização. E é precisamente numa teoria dimensional do homem que vamos buscar as possibilidades de uma formulação teórica da educação nesse sentido. Formulação, aliás, que pode levar-nos a maiores possibilidades metodológicas na colocação filosófica do processo educacional.

Apesar de termos nos referido a História e a historicistas, não é num historicista que vamos encontrar a teoria, mas no existencialista Jean Sartre com seu famoso ensaio de ontologia fenomenológica. Tanto melhor, pois esse simples fato reforça a nossa referência às possibilidades de transcendência do processo educacional. Embora Sartre tenha encontrado a transcendência em termos fenomenológicos no plano social, a sua teoria nos leva, por um impulso dialético, a superar a polaridade ontológico-social da educação. E essa superação vai nos fazer sentir as suas possibilidades num ensaio de Denis de Rougemont sobre o desenvolvimento das dimensões humanas na civilização ocidental. É nesse ensaio que podemos avaliar a fecundidade da aplicação da teoria dimensional aos processos sociais

O homem é apresentado por Sartre, em L’être et lê Néant, na sua conhecida formulação dialética: uma forma rígida ou fechada, len-soi, primeira dimensão do ser, que se nega a si mesma na especificidade humana, atingindo em le pour soi a segunda dimensão, da qual resulta necessariamente a terceira dimensão de l’être pour autrui, na relação social. Essa formulação se repete no capítulo sobre a terceira dimensão ontológica do corpo da seguinte maneira: antes de tudo, o corpo existe, e este existir é a sua primeira dimensão; depois, o corpo entra em relação com os outros, e nesta relação surge a sua segunda dimensão; por fim, no conhecimento do corpo pelos outros tem ele a sua terceira dimensão. (“J’existe pour moi comme connusion ontologique de mon corps”.)

Em Denis de Rougemont essa dialética das dimensões adquire maior densidade ontológica, passando do plano da fenomenologia para o da metafísica. Apresenta-se, porém, numa perspectiva fideísta. A transcendência do ser, que é a sua terceira dimensão, equivale a um duplo processo de relações: no plano social como amor do próximo, e no metafísico como amor de Deus. Essas dimensões se tornam mais claras numa enfocação histórico-cultural: a primeira dimensão é a do horizonte tribal, que o autor define servindo-se da teoria do corpo mágico ou corpo-sagrado do ensaísta austríaco Rudolf Kessner, e em que o homem primitivo aparece como simples parcela de um todo fechado sobre si mesmo; a segunda dimensão é a do horizonte civilizado em que surge o indivíduo urbano que se torna cidadão. A terceira dimensão é a do transcendente em que o homem se torna cristão, integrando-se nos princípios espirituais da civilização. Esse particularismo de Rougemont equivale, entretanto, ao conceito universal da transcendência pela cultura, que encontramos no horizonte profético de John Murphy em seus estudos sobre as Origens e a História das Religiões.

Vemos, assim, que as limitações daquilo que chamamos perspectiva fideísta, no ensaio de Rougemont, não diminuem a importância de sua tentativa de aplicação da teoria das dimensões humanas num plano mais fecundo que o da ontologia fenomenológica de Sartre. Vejamos de que maneira Rougemont esquematiza a sua teoria das dimensões do espírito ocidental, que se eleva à terceira dimensão pelo impacto de uma religião oriental. É curiosa essa aplicação sectária da teoria das dimensões, que servindo-se de elementos orientais, faz surgir no ocidente, no fenômeno da pessoa, o homem tridimensional, ao mesmo tempo que nega aos orientais essa possibilidade.

É o seguinte o esquema apresentado pelo próprio Denis de Rougemont: “Se o homem do clã, da tribo ou da casta, só tinha uma dimensão real: sua relação com o corpo sagrado; se a segunda dimensão, inventada pelos gregos, é a que reúne o indivíduo e seu modo de relações, a cidade; São Paulo definiu a terceira dimensão: a relação dialética com o transcendente, religando o indivíduo como vocação divina à comunidade, como amor do próximo. Esse homem, melhor liberado que o indivíduo grego, melhor entrosado que o cidadão romano, mais livre pela fé mesma que o entrosa, é o arquétipo do Ocidente que nasce, é a pessoa”.

Murphy, porém, ao tratar do horizonte-profético como uma conseqüência universal do desenvolvimento do horizonte civilizado, acentua o aparecimento “das condições novas que tornaram possível o advento de grandes individualidades, profetas, filósofos, instrutores éticos e religiosos, desde cerca de dois mil anos antes da nossa era”. Situando o período desse desenvolvimento entre o XI e o III séculos antes de Cristo, e limitando-o geograficamente à região compreendida entre a Grécia e o Egito, passando pela Palestina e a Mesopotâmia, até a índia e a China, demonstra historicamente o aparecimento da pessoa, equivalente à terceira dimensão de Rougemont, muito antes do advento do Cristianismo. Anulamos, assim, o exagero fideísta de Rougemont, como esse mesmo exagero anulou o negativismo existencial de Sartre, que limitava a terceira dimensão ao plano das relações sociais. E assim, por um processo dialético, temos a pureza conceptual da teoria das dimensões humanas, capazes de nos servir, sem qualquer limitação sectarista, para uma possível tentativa de elaboração metodológica, visando à mais ampla e mais profunda enfocação filosófica do problema da educação.

A validade da teoria dimensional do espírito parece-nos pelo menos bem sustentada nas formulações de Dilthey, Sartre e Rougemont. Claro que ela se funda, para o primeiro e o último, nos pressupostos da evolução histórica, e para o segundo, na problemática do ser. Temos assim, na sua base, a polaridade ontológica-social, com todas as implicações que vão de um pólo a outro. Convém lembrar, como demonstra Jean Vahl, que as raízes da teoria dimensional, por assim dizer, se aprofundam no passado filosófico. De qualquer maneira, o que nos interessa é a possibilidade de sua aplicação metodológica. Essa possibilidade parece fecunda principalmente por oferecer à Filosofia da Educação perspectivas filosóficas para a solução dos seus problemas até agora frustrados, em grande parte, pela falta dessas perspectivas.


Educação e Filosofia


A inquietação atual do pensamento pedagógico, à procura de uma Filosofia da Educação que realmente corresponda às exigências do mundo em transformação, resulta não só do fato mesmo dessa transformação, como também da falta de unidade, ou pelo menos de uma confluência de vistas a respeito dos problemas a serem postos em equação. Quando, em 1941, a National Society for the Study of Education, dos Estados Unidos, resolveu dedicar um dos seus anuários ao problema da Filosofia da Educação, essa falta de unidade fundamental se tornou bem patente. Na introdução que escreveu para o anuário, publicado em 1942, o Prof. John Brubacher, da Universidade de Yale, esclarece que o intuito da Natinal Society era conseguir que “as diversas filosofias se dirigissem de maneira clara e inequívoca, aos pontos importantes de seus desacordos”. Entretanto, os colaboradores convidados, representantes das várias escolas atuais de Filosofia, e particularmente de Filosofia da Educação, não puderam atender a esse apelo.

No decorrer destes últimos anos muitos esforços foram desenvolvidos no sentido da superação desse estado de coisas. Mas a superação não era fácil, pois os desacordos eram ainda mais profundos, como podemos ver neste trecho do prefácio de Brubacher: “Afortunada ou desgraçadamente, esse plano não foi adotado porque no Comitê da obra, não somente se pode chegar a um acordo com referência aos problemas que seriam selecionados, como nem mesmo foi possível uma coincidência a respeito do que constitui um problema na Filosofia da Educação. Em conseqüência decidiu-se permitir a cada colaborador a exposição do seu sistema de Filosofia da Educação na forma que lhe parecesse mais adequada”.

Mortimer Adler, que colaborou no anuário escrevendo uma defesa da Filosofia da Educação, pôs em relevo a necessidade de uma definição do seu objeto como solução dos desacordos existentes. Lamentou a posição individual e irredutível de vários filósofos que só tinham a expor “a sua opinião, o seu ponto de vista sobre educação, ou o seu sistema de filosofia”, e acentuou a urgência de se afastarem de cogitação os elementos que, não sendo filosóficos, sobrecarregam as escolas atuais de Filosofia da Educação. Dez anos depois, ao publicar o seu Traité de Pedagogie Generale, na França, René Hubert denunciava essa mesma situação e procurava lançar as bases realmente filosóficas de uma Filosofia da Educação.

O problema se torna claro nestas palavras de Paul Desjardins, que Hubert reproduz no prefácio da sua obra: “Os reformadores da educação, que temos observado, descobriram a verdade em quase todas as questões de detalhe: este, sobre a educação dos sentidos e sobre o processo do juízo na primeira infância; aquele, sobre a aplicação do trabalho manual; um, sobre a ginástica racional; outro, sobre a maneira de ensinar idiomas, ou a Física, ou o Desenho, ou a Música vocal, etc; descobrimentos contemporâneos e diversos, cujo centro, se refletimos a respeito, aparece como único; entretanto, este centro, de que tudo parte, não está assinalado com suficiente ênfase em nenhum lugar, e isso é o que falta determinar numa escola pensada à francesa”. Hubert comenta: “Porque este centro é o homem, e o mestre cuja memória acabamos de evocar teria sem dúvida acrescentado conosco que escola pensada à francesa é a que se dedica a ensinar e fazer nascer o Homem”.

É curioso que tenhamos encontrado, no próprio pensamento francês contemporâneo, as sugestões para uma resposta ao reclamo de Desjardins. A escola pensada à francesa, que põe a sua ênfase no objeto e centro da educação, o homem, só poderá aparecer, no campo vasto e contraditório da Filosofia da Educação, com base num esforço metodológico essencialmente humanista. A sugestão do esquema sartreano das dimensões do espírito parece-nos abrir amplas possibilidades nesse sentido. Da mesma maneira porque no estudo das religiões a aplicação do método dos horizontes culturais alargou a compreensão do problema, podemos esperar que um método dimensional permita o reajuste necessário do problema filosófico da educação.


Um método integral


Poderíamos aspirar a um método integral que, aplicado à história da Educação e a toda à problemática educacional, nos possibilitasse a investigação de todos os seus aspectos, ou que pelo menos nos desse, no plano da interpretação, uma visão geral e dinâmica do processo educativo? Os métodos históricos, comparativos e culturais não chegam a tanto. O método dos horizontes culturais oferece perspectiva mesológica em extensão, mas falta-lhe a profundidade ontológica que é procurada na complementação de pesquisas psicológicas. Entretanto a Psicologia é um particularismo, uma especialização, como a Sociologia. Suas pesquisas se referem a problemas particulares de estrutura e função, como as sociológicas aos problemas de relação. A Filosofia da Educação, porém, abrange todo o contexto de ações e reações objetivas e subjetivas que vai do ser como ser ao social e como cultura. A Filosofia da Educação extravasa, assim, da extensão de sua própria polaridade no momento em que transcende o social para penetrar no cultural, no pleno domínio do espírito. É o que estuda Hubert, com admirável clareza e segurança, no seu tratado.

É possível que estejamos exagerando as possibilidades do método dimensional e só os especialistas em metodologia poderão responder até onde as nossas esperanças são viáveis. O Prof. Cannabrava, que se destaca no estudo dos problemas metodológicos entre nós, procurou solucionar a diversidade dos conceitos de verdade empírica e verdade formal através do objetivismo-crítico, propondo o método único da síntese-reflexiva. “A Filosofia elaborou um método – declara – que permite conjugar a análise da estrutura lógica do conhecimento com a interpretação sintético-funcional dos processos empíricos que se relacionam diretamente com a atividade cognitiva”. A mesma unidade no tocante aos problemas gerais da Filosofia da Educação, em sua relação específica com o objeto do problema educacional, não poderá ser tentada?

Investigar as possibilidades metodológicas da teoria das dimensões humanas parece-nos, pois, tarefa das mais promissoras. Partindo da análise do corpo-mágico, da feliz formulação de Kessner, onde o homem se apresenta na sua primeira dimensão, um método dimensional nos levaria ao exame de todas as implicações da passagem para a segunda dimensão e desta para a terceira. Esse método global ou integral penetraria, assim, em todas as estruturas e conexões da polaridade pedagógica, abrangendo a simultaneidade do ser como ser – existindo em si, agindo no para-si e se transcendendo no cultural – do bio-pisiquismo em sua dinâmica funcional e do social em sua dinâmica de relações. Para essa penetração simultânea o método deveria dispor das técnicas específicas necessárias, subordinadas sempre ao contexto dimensional. Essa solução, se possível, livraria a Filosofia da Educação das contradições atuais, eliminando o atomismo das teorizações pessoais que tanto se apóiam em métodos filosóficos quanto em métodos científicos ou simples técnicas de pesquisa.

Esta busca da unidade pode parecer um desejo de volta, em termos psicanalíticos, à homogeneidade religiosa a que nos referimos no início. A educação, à maneira do Positivismo comteano, encontraria assim um meio de negar a sua natureza problemática para adormecer de novo no seio das certezas tradicionais. Mas o exemplo medieval a que já aludimos bastaria para mostrar-nos a irreversibilidade do processo evolutivo. Assim como na Idade Média o império religioso desenvolveu-se em plano racional e crítico, elaborando a autonomia mais completa do pensamento que eclodiria na Renascença, assim também a volta à unidade, no presente, não seria um simples retrocesso, mas um reajuste dialético. Poderíamos apelar para o princípio marxista da negação para explicar este aspecto do problema.

Não resta dúvida que a unidade metodológica é uma tentativa de superação de problemas, mas não de anulação da natureza problemática do processo educativo, o que seria impossível. Essa busca, como já vimos, existe na Filosofia Geral, como existia nas Ciências. Busca-se não apenas a unidade metodológica nesses dois campos, mas também a unidade conceptual, como vemos na obra de Einstein. E se o objetivo do conhecimento é a reconstrução do Universo pela síntese após a análise, essa busca não é a conseqüência de um complexo inconsciente, mas um imperativo do próprio desenvolvimento cultural.

No caso da educação, superar a situação conflitiva do presente para encontrar um plano de unidade equivalerá realmente a reconstruir a homogeneidade religiosa, porque o destino do homem, segundo Hubert, “consiste em ser espírito”, e o fim da educação, segundo Kerchensteiner, é “a criação de um ser espiritual”. Entretanto, não se trata da colocação do problema nos termos da antiga metafísica religiosa e sim nos da moderna ontologia. O espírito, nessa nova homogeneidade religiosa, é uma entidade cultural acessível às indagações do pensamento científico e filosófico. Murphy já o disse na introdução do seu estudo sobre as origens da religião, que citamos acima: “O homem é o produto da evolução, tanto no seu corpo quanto no seu espírito”. Assim, para usarmos uma expressão de Tagore, “a religião do homem” seria a nova homogeneidade em que a educação poderia reconstruir-se, não mais na base ingênua de certezas tradicionais, mas na base dinâmica da expansão do conhecimento em busca de novas dimensões do espírito.


Educação e religião


O problema do aparecimento e desenvolvimento da escola leiga, do laicismo pedagógico, tem sua fonte em três grandes equívocos que felizmente estão agora em fase de extinção. Vejamo-los:

1.º - O equívoco do Materialismo, que na verdade só apareceu de maneira clara, perfeitamente definida, na época moderna. Tudo quanto se considera como materialismo na Antiguidade só entra nessa classificação de maneira forçada. Foi o desenvolvimento das Ciências que permitiu uma fundamentação positiva para o Materialismo e conseqüentemente a sua formulação filosófica. Desde então surgiu o conflito Ciência versus Religião. Os homens cultos e os espíritos fortes opuseram-se ao ensino da Religião nas escolas por considerá-lo determinante de retrocessos culturais.

Nesse caso, o equívoco do Materialismo estava certo, porque o ensino religioso e o seu predomínio na Educação eram também um perigoso e lamentável equívoco, de vez que as religiões se equivocavam no tocante a pontos fundamentais do Conhecimento. O laicismo tinha por finalidade garantir uma educação liberta de superstições e preconceitos que as religiões semeavam e estimulavam no espírito dos educandos.

2.º - O equívoco do Espiritualismo, que partindo de premissas certas, na base das Revelações antigas, desenvolveu-se em várias formas de falsos silogismos, chegando a conclusões erradas na elaboração de suas teologias, teogonias e dogmáticas. Esse equívoco, traduzido violentamente no sectarismo das Igrejas foi à razão fundamental da luta entre Ciência e Religião. O sectarismo violento queria apossar-se de tudo, a começar pela criança, que desde os primeiros rudimentos de compreensão devia ser absorvida por ele. Daí o domínio da escola, de que até hoje não desistiu, porque através dela o sectarismo pretende moldar a mentalidade das gerações.

3.º - O equívoco da Filosofia, que através da Gnosiologia, da Teoria do Conhecimento, acabou referendando os dois equívocos acima, particularmente a partir do criticismo kantiano, que delimitou o campo do Conhecimento possível, relegando para o impossível – e portanto fora do alcance científico – os problemas espirituais. A separação entre Ciência e Religião foi então oficializada no plano cultural. Se o homem só podia conhecer através da Ciência pelo uso da Razão, não havia motivo algum que justificasse nas escolas a disciplina religiosa. A escola se tornava instrumento da Ciência. A Religião devia restringir-se ao âmbito familial e ser ministrada nas igrejas.

Temos nesse quadro, segundo me parece, o esquema geral do nascimento da Escola Leiga. Os homens de cultura tinham dois motivos bastante fortes para rejeitar a Religião na escola. De um lado, ela não podia oferecer dados positivos e, portanto verdadeiros sobre o que pretendia ensinar. De outro lado o seu ensino contrariava a Ciência, prejudicando a formação cultural dos alunos, e, além disso, criava e estimulava desentendimentos entre os homens, pelas pretensões exclusivistas do sectarismo. Longe de religar, ela na verdade desligava e gerava conflitos insensatos, sempre extremamente violentos porque baseados no fanatismo.


Situação atual


As campanhas pela escola laica abalaram o mundo e conseguiram vitórias parciais muito importantes. Apesar disso, o sectarismo religioso não desistiu e não desistirá jamais das suas pretensões, pois não há nada mais insistente do que o fanatismo, mormente quando aliado a interesses materiais. Não obstante, a situação atual no campo do conhecimento já traz em si mesma a solução para esse velho problema. Basta que os homens responsáveis encarem o assunto a sério e procurem resolvê-lo no interesse superior das coletividades, sem prejuízo para os sectarismos religiosos nem para os defensores da independência cultural.

Procuremos encarar a situação atual nos três campos acima especificados, vendo como seriam solucionados os impasses seculares a respeito:

1.º - O materialismo perdeu, com a rápida evolução dos conhecimentos científicos nestes últimos anos, os seus elementos de sustentação no campo da Razão. O próprio conceito de matéria, tanto no Materialismo mecanicista do passado quanto no Materialismo dialético de hoje, perdeu a sua substância. Além da descoberta de que a matéria é simples condensação de energia, temos agora o grande passo da física na descoberta da antimatéria. Numa verdadeira ação de pinça, as Ciências Físicas de um lado e as Ciências Psicológicas de outro, através das pesquisas nucleares e parapsicológicas, demonstraram positivamente a existência de outras dimensões do Universo e, portanto das coisas e dos seres. Já se pode falar cientificamente no Outro Mundo, sem qualquer implicação religiosa, em bases puramente científicas, pois se admite em face de provas de laboratório a existência do mundo da antimatéria. Na Parapsicologia a tese vitoriosa é a da existência do extrafísico no próprio homem, demonstrando a possibilidade científica da sobrevivência após a morte. E para coroar essa conquista do invisível os cientistas soviéticos acabaram de descobrir o corpo bioplástico do homem, um corpo de forma humana e de natureza energética, visível através da Câmara Kirlian de fotografia com adaptação de lentes óticas. Está rompida a barreira kantiana entre o conhecimento positivo e o chamado conhecimento sobrenatural. Não há sobrenatural: a Natureza continua em outras dimensões, que já estão sendo incorporadas ao conhecimento racional e sujeitas à pesquisa científica.

2.º - O Espiritualismo, até mesmo no seio das igrejas mais sólidas e tradicionais, modificou-se e continua a modificar-se profundamente, ameaçado nas suas fortalezas antiquadas pelo avanço dos conhecimentos. Há um acelerado processo de transformação nas Igrejas, que já atingiu a própria essência de várias delas obrigando-as a modificar não só a sistemática tradicional dos cultos, mas também a sua Teologia. O caso Theilhard de Chardin na Igreja Católica e o caso das Novas Teologias nas Igrejas da Reforma e suas constelações de satélites são suficientes para mostrar a profundidade da revolução havida e cujo processo continua a se desenrolar. É verdade que o sectarismo fanático e retrógrado procura reagir, mas é evidente que os seus estertores são tipicamente agônicos. O fanatismo obscurantista não tem mais nenhuma possibilidade de manter o seu domínio nos povos.

3.º - A Filosofia está francamente de volta às suas raízes espiritualistas, à sua verdadeira tradição, pois ela sempre foi um campo de cogitação sobre os problemas do espírito. Passado o surto de sarampo intelectual do Existencialismo ateu de Sartre, que punha a sua ênfase na existência e aniquilava o Ser, vemo-la de volta, ainda convalescentes, aos braços do misticismo alemão renascido em Heidegger, com a afirmação enfática do Ser como único objeto real da cogitação filosófica. Por outro lado, a Filosofia se impôs de novo como o elemento fundamental e aglutinador do Conhecimento, com sua plana capacidade de restabelecer a unidade do Saber, até agora dividido em regiões indevidamente antípodas.

Assim a situação atual se revela inteiramente favorável à solução do impasse educacional criado pelo fanatismo religioso. Científica e filosoficamente já se reconhece que a Religião é uma das províncias principais do conhecimento. As pesquisas antropológicas, sociológicas e etnológicas, apoiadas nos dados arqueológicos e na investigação psicológica e parapsicológica, demonstraram de sobejo que o homem não é apenas o animal político de Aristóteles, mas também e, sobretudo o ser religioso de Arnold Toynbee, cujas construções mais grandiosas têm sempre como esteio o seu substrato fideísta.

O ecumenismo católico, embora não tenha o poder que só o desprendimento, o desapego dos bens terrenos lhe poderia dar, nem por isso deixa de ser um sinal dos tempos, uma prova de que a conciliação das crenças se impõe ao mundo religioso como uma exigência da nova situação. Como acentuou Garaudy, passamos da era do anátema à era do diálogo. A Religião tenta superar o fanatismo e o pragmatismo sectário que a haviam desfigurado. Ventos novos estão soprando na atmosfera poluída do planeta e devemos esperar que a renovem, afastando e extinguindo os elementos de poluição.


Religião nas escolas


Ao lado de todos esses eventos auspiciosos devemos assinalar o desenvolvimento das pesquisas e dos estudos universitários sobre a Religião abrangendo todos os aspectos do problema. Há um conceito novo de fé, uma nova interpretação dos fatos religiosos. A contribuição espírita – que impregnou, consciente ou inconscientemente a obra de Chardin e dos renovadores da Teologia em geral, já faz sentir a sua ação benéfica por toda parte. O próprio Espiritismo começa a ser compreendido – e pelos próprios adeptos – não mais como uma nova seita destinada a substituir as anteriores, mas como aquela forma de síntese do Conhecimento de que nos falaram Kardec, Léon Denis e Sir Oliver Lodge, entre outros.

Tudo isso facilita a compreensão de que não podemos ter Educação sem Religião, de que o sonho da Educação Laica não passou de resposta aos grandes equívocos do passado a que acima me referi. O laicismo foi apenas um elemento histórico, inegavelmente necessário, mas que agora tem de ser substituído por um novo elemento. E qual seria essa novidade? Não, certamente, o restabelecimento das formas arcaicas e anacrônicas do ensino religioso sectário nas escolas. Isso seria um retrocesso e, portanto uma negação de todas as grandes conquistas que vimos na apreciação da situação atual.

Reconhecendo que a Religião corresponde a uma exigência natural da condição humana e a uma exigência da consciência humana, e que pertence de maneira irrevogável ao campo do Conhecimento, devemos reconduzi-la à escola, mas desprovida da roupagem imprópria do sectarismo. Temos de introduzir nos currículos escolares, em todos os graus de ensino, a disciplina Religião ao lado da Ciência e da Filosofia. Sua necessidade é inegável, pois sem atender aos reclamos do transcendente no homem não atingiremos aos objetivos da Paidéia grega: a educação completa do ser para o desenvolvimento integral e harmoniosa de todas as suas possibilidades.

Façamos agora justiça a Kant, que acima ficou um tanto prejudicado por sua posição agnóstica. Lembremos que, fiel aos rigores metodológicos da sua investigação, ele teve de separar o falso do real dentro das condições do saber do seu tempo. Nem por isso, entretanto, deixou de reconhecer a legitimidade dos impulsos afetivos do homem, e na Crítica do Juízo abriu perspectivas para a compreensão que hoje atingimos. Nele encontramos a idéia de Deus reconhecida como o supremo conceito que é dado à criatura humana formular, pois que essa idéia suprema representa uma síntese do Todo. E nele encontramos também a definição de Educação como desenvolvimento no homem de toda a sua perfectibilidade possível.

O próprio Kant, portanto, que respondeu pelo divisionismo do campo do Conhecimento, pode agora responder pela sua reunificação. E é realmente o que acontece, no momento, graças à corrente neokantiana da Filosofia contemporânea, onde deparamos com a Pedagogia renovadora de Kerchensteiner e Rena Hubert aquele na Alemanha e este na França, pregando uma Educação que tem por fundamento a Filosofia do Espírito. Nessa forma nova de Educação a Religião comparece, não como um ensino dogmático e sectário, mas como uma resposta às exigências conscienciais do homem, esclarecendo-lhe os problemas da existência de Deus, da natureza espiritual das criaturas e da sua destinação transcendente. Não é o padre, nem o pastor, nem o rabi, nem a catequista que vão dirigir a cadeira, mas o professor especializado no assunto, tratando dos problemas religiosos como se trata dos filosóficos e dos científicos.

De posse dos dados fornecidos pela disciplina escolar o educando decidirá por si mesmo, de acordo com a sua vocação, as suas tendências e preferências, o setor religioso em que se localizará, se for o caso. Mas poderá também se apoiar nesses dados para o desenvolvimento da sua própria religião, da sua posição pessoal – pois como demonstrou Bergson, comprovando Pestalozzi, existe a religião dinâmica individual que não se cristaliza em estruturas sociais.

Alegarão certamente os sectários que essa forma de ensino religioso livre e optativo (compreenda-se bem: optativo no sentido de facultar ao educando escolher ou não uma religião, mas obrigatório nos currículos escolares) equivale ao laicismo vigente. Porque o sectário só entende por religião válida a que ele professa. Aconteceria o mesmo no campo da Filosofia se um professor fanático entendesse que só a escola filosófica de sua preferência devesse ser ensinada. Mas os espíritos arejados, abertos compreenderão a importância do ensino religioso como disciplina universitária nos cursos superiores e como matéria didática de informação geral no primário e no secundário.

Os programas incluirão, nesse caso, os dados objetivos da Origem e História das Religiões, da Filosofia da Religião, da Sociologia e da Psicologia da Religião, dentro do objetivo de formação cultural do aluno. Claro que no curso primário o programa seria adequado, tratando da existência de Deus, de seu poder criador e mantenedor do Universo, do sentimento religioso que a sua existência desperta nas criaturas, das relações entre Deus e o homem, da função das religiões na vida humana, da importância dos valores religiosos para a formação da personalidade e assim por diante. No secundário já se poderia, além do necessário desenvolvimento maior desses temas, incluir elementos de História das Religiões, das provas da sobrevivência do homem após a morte, das relações entre o mundo visível e o mundo invisível, da função pragmática das religiões e assim por diante.

Dessa maneira a Educação não seria parcial, voltada apenas para os problemas imediatos da vida, mas forneceria elementos racionais para a formação espiritual do educando. E por isso mesmo não seria também religiosa no sentido estreito e superado do sectarismo ainda hoje dominante. Essa providencia me parece urgente, pois estamos, como já vimos, às portas de uma civilização espiritualista e não podemos continuar educando as crianças e os jovens nos moldes obsoletos do passado. Educação sem religião é atualmente absurda, como absurda é também a educação materialista que continuamos a aplicar.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

O Mistério do Ser-( Educação)

A educação depende do conhecimento menor ou maior que o educador possua de si mesmo. Porque conhecer-se a si mesmo é o primeiro passo do conhecimento do ser humano. A Humanidade é uma só. O ser humano, em todas as épocas e em toda parte, foi sempre o mesmo. Sua constituição física, sua estrutura psicológica, sua consciência são iguais em todos os seres humanos. Essa igualdade fundamental e essencial é o que caracteriza o homem. As diferenças temperamentais, culturais, de tipologia psicológica, de raça ou nacionalidade, de cor ou tamanho são apenas acidentais. Por isso mesmo a Educação é universal e seus objetivos são os mesmos em todas as épocas e em todas as latitudes da Terra.
Essa padronização, que devia simplificar a educação, na verdade a complica, porque por baixo do aspecto padronizador surgem as diferenciações individuais e grupais. Cada indivíduo é único, diferente de todos os demais, mesmo nos grupos afins. O tipo psicológico de cada ser humano é único e irredutível à massa. O mistério do ser, que aturde os educadores, chama-se personalidade. Cada ser humano é uma pessoa. E o é desde o nascimento, pois já nasce formado com sua complicada estrutura que vai apenas desenvolver-se no crescimento e na relação social. É difícil para o educador dominar todas essas variações e orientá-las.
Educar, como se vê, é decifrar o enigma do ser em geral e de cada ser em particular, de cada educando. René Hubert, pedagogo francês contemporâneo, define a Educação como um ato de amor, pelo qual uma consciência formada procura elevar ao seu nível uma consciência em formação. A Educação se apresenta, assim, como Ciência, Filosofia, Arte e Religião. É Ciência quando investiga as leis da complexa estrutura humana. É Filosofia quando, de posse dessas leis, procura interpretar o homem. É Arte quando o educador se debruça sobre o educando para tentar orientá-lo no desenvolvimento de seus poderes internos vitais e espirituais. É Religião porque busca a salvação do ser humano no torvelinho de todas as ameaças, tentações e perigos do mundo. O verdadeiro educador é o que pratica a Religião verdadeira do amor ao próximo, naquilo que podemos chamar o Culto do Ser no templo do seu próprio ser.
Não se trata de uma imagem mística da Educação, mas de uma tentativa de vê-la, compreendê-la e aplicá-la em todas as suas dimensões. O ato de educar é essencialmente religioso. Não é apenas um ato de amor individual, do mestre para o discípulo, mas também um ato de integração e salvação. A Educação não procura integrar o ser em desenvolvimento numa dada situação social ou cultural, mas na condição humana, salvando-o dos condicionamentos animais da espécie, elevando-o ao plano superior do espírito.
É fácil compreendermos como está longe de tudo isso o profissionalismo educacional do nosso tempo. Tinham razão os filósofos gregos quando condenaram o profissionalismo dos sofistas. Não se tratava apenas de uma diferenciação de classes sociais, mas da luta contra o abastardamento da Educação pelos que negavam a existência da verdade a troco de interesses imediatistas.
Como ajustar os fins superiores da Educação às exigências de uma civilização baseada no lucro? A falta de uma solução para esse ajustamento é a origem da crise universal da Educação em nosso tempo. Não obstante, a solução poderia ser encontrada na aplicação de processos vocacionais. Nenhum tipo de educação coletiva pode ser eficiente se não estiver em condições de observar e orientar as tendências vocacionais.
O desenvolvimento da Era Cósmica, apenas iniciada com as conquistas atuais da Astronáutica, traz novos e graves problemas ao campo educacional. Toda a Terra está sendo afetada pela nova concepção do homem e da sua posição no Cosmos. O aceleramento do processo tecnológico está levando o homem a conhecer melhor a sua própria condição humana. O ceticismo dos últimos tempos vai cedendo lugar a um despertar de novas e grandiosas esperanças. A Educação da Era Cósmica começa a nascer e os educadores começam a perceber que precisam renovar os processos educacionais.
Pedagogia Espírita: Herculano Pires

Educação no lar


A educação espírita começa no lar. Nas famílias espíritas é dever dos pais iniciar os filhos nos princípios doutrinários desde cedo. A falta de compreensão da doutrina faz que certas pessoas pensem que as crianças não devem preocupar-se com o assunto. Essas pessoas se esquecem de que os seus filhos necessitam de orientação espiritual e que essa orientação será tanto mais eficiente quanto mais cedo lhes for dada. Kardec, num trecho da Revista Espírita, conta como na França, já no seu tempo, a educação espírita no lar começava a produzir maravilhosos efeitos.
É preciso não esquecer que as crianças são espíritos reencarnados, espíritos adultos que se vestem, como ensina Kardec: “com a roupagem da inocência” para voltarem à Terra e iniciarem uma vida nova. Os espíritos que se reencarnam em famílias espíritas já vêm para esse meio para receberem desde cedo o auxílio de que necessitam. Os pais que, a pretexto de respeitar a liberdade de escolha de quem ainda não pode escolher, ou de não forçar os filhos a tomarem um rumo certo na vida, deixam de iniciar os filhos no Espiritismo, estão faltando com os seus deveres mais graves.
Ensinar às crianças o princípio da reencarnação, da lei de causas e efeitos, da presença do anjo-guardião em suas vidas, da comunicabilidade dos espíritos e assim por diante, é um dever inalienável dos pais. Pensar que isso pode assustar as crianças e criar temores desnecessários é ignorar que as crianças já trazem consigo o germe desses conhecimentos e também que estão mais próximos do mundo espiritual do que os adultos.
Descuidar da educação espírita dos filhos é negar-lhes a verdade. O maior patrimônio que os pais podem legar aos filhos é o conhecimento de uma doutrina que vai garantir-lhes a tranqüilidade e a orientação certa no futuro. Os pais que temem dar educação espírita às crianças não têm uma noção exata do Espiritismo e por isso mesmo não confiam no valor da doutrina que esposam.
Porque razão os católicos e os protestantes podem ensinar aos filhos que existe o inferno e o diabo, que a condenação eterna os ameaça e que o anjo da guarda pode protegê-los, e o espírita não pode ensinar princípios muito mais confortadores e racionais? Se o medo do diabo e do inferno não traumatiza as crianças das religiões formalistas, por que razão o ensino de que não existe o inferno nem existe o diabo vai apavorá-las? Não há lógica nenhuma nessa atitude que decorre apenas de preconceitos ainda não superados pelos pais, na educação errônea que receberam quando crianças.
As crianças de hoje estão preparadas para enfrentar a realidade do novo mundo que está nascendo. Esse novo mundo tem por alicerce os fundamentos do Espiritismo, porque os princípios da doutrina estão sendo confirmados dia a dia pelas Ciências. A mente humana se abre neste século para o conhecimento racional dos problemas espirituais. Chegou o momento do Consolador prometido pelo Cristo. Os pais espíritas precisam compreender isso e iniciar sem temor os seus filhos na doutrina que lhes garantirá tranqüilidade e confiança na vida nova que iniciam.
A melhor maneira de desenvolver a educação espírita no lar é organizar festinhas domingueiras com prece, recitativos infantis de tema evangélico, explicação de parábolas, canções espíritas e brincadeiras criativas, que ajudem a despertar a criatividade das crianças. Espiritismo é alegria, espontaneidade, sociabilidade. Essas festinhas preparam o espírito da criança para o aprendizado nas aulas dos Centros e para as aulas de Espiritismo na escola.
Esconder às crianças de hoje a verdade espírita é cometer um verdadeiro crime contra o seu progresso espiritual e a sua integração na cultura espírita do novo mundo que está nascendo. Que os pais espíritas não se furtem a esse dever. A educação no lar é a base de todo o processo posterior de educação escolar e de educação social, que os adolescentes e os jovens irão enfrentar na vida.
Não importa que alguns espíritas metidos a sabichões combatam a educação espírita. Deus os perdoará, porque eles não sabem o que fazem. O que importa é os pais se inteirarem de suas responsabilidades pessoais, que não podem transferir a ninguém, e tratem de cumpri-las. Se forem realmente espíritas, os pais saberão quanto o Espiritismo lhes tem valido na vida. Que direito terão de negar aos filhos o conhecimento dessa doutrina que tanto bem lhes faz? Quererão que os filhos se extraviem no materialismo e na irresponsabilidade que desgraça tantos jovens de hoje?

Pedagogia Espírita- Herculano Pires

A educação segundo Herculano Pires


O exercício da educação moral é o que pode fazer a diferença na conturbada sociedade de hoje. Herculano Pires, escritor e expositor de grande importância para a Doutrina Espírita, dedicou-se muito ao tema. Seu livro “Pedagogia espírita” é uma importante coletânea de uma revista sobre educação que Herculano mantinha. Trazemos ao leitor algumas idéias contidas no livro sobre o tema, em forma de entrevista.
PALAVRA ESPÍRITA Herculano, o que é educar?
HERCULANO PIRES Educar é decifrar o enigma do ser em geral e de cada ser em particular, de cada educando. O ser humano, em todas as épocas e em toda parte, foi sempre o mesmo. Sua constituição física, sua estrutura psicológica, sua consciência são iguais em todos os seres humanos. Essa igualdade fundamental e essencial é o que caracteriza o homem. As diferenças temperamentais, culturais, de tipologia psicológica, de raça ou nacionalidade, de cor ou tamanho são apenas acidentais. Porém, essa padronização não ajuda a simplificar a educação porque por baixo do aspecto padronizador surgem as diferenciações individuais e grupais. (...) Cada ser humano tem uma personalidade. E é desde o nascimento, pois já nasce formada com sua complicada estrutura que vai apenas desenvolver-se no crescimento e na relação social. É difícil para o educador dominar todas essas variações e orientá-las.
PALAVRA ESPÍRITA Se educar é descobrir o enigma do ser, como deve agir o educador nesse processo de descoberta?
HERCULANO PIRES A Educação se apresenta como Ciência, Filosofia, Arte e Religião. É Ciência quando investiga as leis da complexa estrutura humana. É Filosofia quando, de posse dessas leis, procura interpretar o homem. É Arte quando o educador se debruça sobre o educando para tentar orientá-lo no desenvolvimento de seus poderes internos vitais e espirituais. É Religião porque busca a salvação do ser humano no torvelinho de todas as ameaças, tentações e perigos do mundo. Segundo René Hubert, pedagogo francês contemporâneo, a Educação é um ato de amor, pelo qual uma consciência formada procura elevar ao seu nível uma consciência em formação. Esse é o caminho para a descoberta do enigma do ser.
PALAVRA ESPÍRITA O que é Educação Espírita?
HERCULANO PIRES É o processo de orientação das novas gerações de acordo com a visão nova que o Espiritismo nos oferece da realidade. A realidade compreende o mundo e o homem. Para o homem viver com proveito no mundo, deve saber, antes de mais nada, o que ele próprio é e qual o seu destino. (...) Nada disso pode ser conhecido sem o conhecimento dos princípios espíritas.
PALAVRA ESPÍRITA Porque a Educação Espírita é importante no processo de educação do ser?
HERCULANO PIRES Porque ela objetiva a Educação Integral e Contínua do Ser, abrangendo ao mesmo tempo todo o complexo da personalidade do educando e todas as faixas etárias em que ela se projeta. Sendo o Espiritismo uma doutrina que abrange, em seus três aspectos fundamentais – a Ciência, a Filosofia e a Religião – todas as facetas do Homem, visando necessariamente à unificação do Conhecimento, é evidente que a Educação Espírita só pode ser integral e contínua, indo de extremo a outro da existência humana. Ligada historicamente à linha rousseauniana da Educação Moderna, através de Pestalozzi, de quem Kardec foi discípulo e continuador, a Educação Espírita se entrosa naturalmente nas aspirações e nos objetivos da Pedagogia contemporânea.
PALAVRA ESPÍRITA Herculano, onde a Educação Espírita deve começar?
HERCULANO PIRES A Educação Espírita começa no lar. Nas famílias espíritas é dever dos pais iniciar os filhos nos princípios doutrinários desde cedo. A falta de compreensão da doutrina faz que certas pessoas pensem que as crianças não devem preocupar-se com o assunto. Essas pessoas se esquecem de que os seus filhos necessitam de orientação espiritual e que essa orientação será tanto mais eficiente quanto mais cedo lhes for dada. Os espíritos que se reencarnam em famílias espíritas já vêm para esse meio para receberem desde cedo o auxílio de que necessitam. Os pais que, a pretexto de respeitar a liberdade de escolha de quem ainda não pode escolher, ou de não forçar os filhos a tomarem um rumo certo na vida, deixam de iniciar os filhos no Espiritismo, estão faltando com os seu deveres mais graves. Descuidar da educação espírita dos filhos é negar-lhes a verdade.
PALAVRA ESPÍRITA Qual é a melhor maneira de desenvolver a educação espírita no lar?
HERCULANO PIRES É organizar festinhas domingueiras com prece, recitativos infantis de tema evangélico, explicação de parábolas, canções espíritas e brincadeiras criativas, que ajudem a despertar a criatividade das crianças. Espiritismo é alegria, espontaneidade, sociabilidade. Essas festinhas preparam o espírito da criança para o aprendizado nas aulas dos Centros e para as aulas de Espiritismo na escola.

A Educação Espírita


Dora Incontri
Definições Possíveis
Existem três perspectivas sob as quais se pode falar em Educação Espírita. E certo que elas acabam se unificando num só conceito. Um aspecto deriva do outro e formam uma visão única.
· Espiritismo como Educação. A essência do Espiritismo é a Educação. Ao contrário de outras correntes religiosas, que têm um caráter salvacionista, a Doutrina Espírita, com seu tríplice aspecto—cientifico, filosófico e religioso —pretende promover a evolução do homem e esta evolução é um processo pedagógico. A Educação do Espírito é o cerne da proposta espírita. Se o Espiritismo é uma síntese cultural, abrangendo todas as áreas do conhecimento, seu ponto de unificação é justamente a Pedagogia. Não foi à toa que Kardec tenha sido educador e tenha recebido influência de Pestalozzi, um dos maiores educadores de todos os tempos. Melhor compreende o Espiritismo quem o compreende pedagogicamente.
Lendo Kardec com olhos pedagógicos, pode-se observar a sua insistência e a dos Espíritos em comparações com imagens emprestadas do universo educacional. O desenvolvimento do Espírito através das vidas sucessivas é visto como um curso escolar, com seus anos letivos. A Terra é tratada como uma escola, em que as almas se matriculam para o seu aperfeiçoamento. As imagens são recorrentes e não são meros recursos literários. Há de fato uma identificação. Corroborando essa leitura do Espiritismo, Herculano Pires, em Pedagogia Espírita, comenta que: "O Livro dos Espíritos é um manual de Educação Integral oferecido à Humanidade para a sua formação moral e espiritual na Escola da Terra".
Ser espírita, pois, na acepção plena da palavra é engajar-se num processo de auto-educação, cujo fim mal podemos entrever. E estar em processo de auto-aperfeiçoamento, como já vimos, é o requisito básico do educador. Como o Espiritismo não é uma doutrina individualista, no sentido de descomprometer o ser humano de deveres para com o próximo—ao contrário, elege na caridade seu princípio máximo—quem está em processo de melhorar a si mesmo tem o dever moral de exercer uma tarefa pedagógica com todas as criaturas que o cercam. A caridade máxima, portanto, que o espírita deve procurar realizar como ideal de vida, não é o assistencialismo social, respeitável e necessário, mas limitado e superficial, é sim a caridade da Educação. Elevar, transformar, despertar consciências, contribuindo para a mudança interna dos homens—que redundará também numa evolução externa—esta deve ser a meta de todo espírita.
· A Educação Segundo o Espiritismo. Se o Espiritismo é pedagógico, olhando a questão do lado avesso, a área específica da Pedagogia humana pode se iluminar com a perspectiva espírita. Neste sentido, a Educação espírita é a prática de uma Pedagogia à luz do Espiritismo. É exatamente o que estamos teorizando nesta obra. Muitas das idéias aqui expostas poderão ser partilhadas por adeptos de outras correntes filosóficas ou religiosas. Mas para aplicá-las inteiras, para aderir a uma formulação pedagógica completamente espírita, é preciso estar convencido dos postulados básicos da doutrina de Kardec. O educador espírita, porém, poderá e deverá exercer sua tarefa com quaisquer crianças e adultos. Se a verdadeira Educação se dá quando se desperta um processo evolutivo no educando, este processo poderá ser desencadeado em qualquer ser humano, tenha ele a cultura que tiver, seja ele partidário da religião que for. A influência benéfica de um educador, consciente de seu mandato, poderá se imprimir em qualquer educando.
Assim, educar espiritamente não é necessariamente educar para o Espiritismo. Kardec sempre enfatizou que os espíritas não deveriam fazer proselitismo e muito menos violentar consciências. No relacionamento com pessoas não espíritas, o educador espírita saberá exercer sua tarefa, sem impor suas convicções.
· O Ensino Espírita. O terceiro aspecto da Educação espírita é mais específico, é o ensino propriamente da Doutrina Espírita. Mas se não houver, por parte daqueles que estão promovendo este ensino, uma compreensão clara e uma prática engajada da Pedagogia espírita, então o processo não passará de catequese, um ensino formal, destituído de compromissos mais profundos. Na linha conceitual que temos seguido aqui, é evidente que o ensino espírita não poderá ser mera transmissão de conteúdos, mas o despertar de uma consciência espiritual.
Cenários da Educação Espírita
· A Existência. Entender o Espiritismo como Educação é ser espírita verdadeiramente. Por isso, quem é espírita de fato e pratica a caridade da Educação em todas as dimensões possíveis, faz isso existencialmente, no seu meio familiar, profissional, social, espiritual... É alguém engajado na própria evolução e na evolução coletiva. O destino espiritual do próximo não lhe será jamais indiferente. Não tomará, é claro, uma postura salvacionista, nem pretenderá mudar o mundo sozinho. Mas levará até o sacrifício o compromisso de exemplificar o bem, arrastando com isso outros seres ao contágio da virtude Amará com intensidade seu próximo mais próximo, procurando estender sempre mais seu amor ao próximo longínquo, significando esse amor justamente o empenho em ajudar o outro a encontrar seu próprio caminho evolutivo.
Consolar, amparar, servir—todos esses verbos tão conjugados em mensagens e orientações espirituais—são as atitudes fundamentais de quem ensina com a sinceridade dos sentimentos e a força do exemplo. São a ponte de acesso ao coração do próximo, não como fator de proselitismo, mas como centelha para desencadear um processo de Educação. Quem presta um serviço, quem se dispõe a se doar—se o faz com o influxo de vibrações autenticamente fraternas —pode restaurar no outro a confiança existencial e a vontade de crescer. Nesta doação fraternal, pode estar incluído um prato de comida, um passe, um agasalho... Mas a caridade deve transcender tudo isto, porque deve tocar a alma do outro.
Há pessoas que entendem a prática da Doutrina apenas no exíguo espaço do Centro Espírita. Quando estão no mundo, na profissão, na família, numa festa, nas relações sociais, agem como se não fossem espíritas. Mas o compromisso educativo existencial do adepto do Espiritismo é justamente ser em qualquer lugar e a qualquer hora um elemento de influências positivas, um pólo de transformação do ambiente. Sem prepotência, sem austeridade excessiva, sem pretensão à verdade absoluta, sem autoritarismo, como quem passa e serve, o espírita deve fazer brilhar seu empenho em ser melhor, sua fidelidade aos princípios éticos fundamentais, sua sede intelectual. . . procurando partilhar sua chama interior.
Irradiar otimismo, disposição, energia e serenidade—todas aquelas virtudes que vimos como constitutivas do verdadeiro educador—deve ser uma conseqüência natural da sua compreensão de mundo. Quem sabe que a vida é eterna, que toda tragédia é passageira, que tudo caminha para a perfeição, que todos estão sob a proteção de uma Providência misericordiosa e justa, será necessariamente uma pessoa alegre e tranqüila, no controle de si mesma, podendo com isso servir de edificação e apoio aos irmãos do caminho.
A missão pedagógica do espírita, porém, não se dá apenas no plano moral. Em todos os setores de atividade, os espíritas devem também se esforçar pelo avanço intelectual de si mesmos e da comunidade a que pertencem. Promover a cultura elevada e proporcionar meios à instrução—isso faz parte integrante de seu programa de ação. É nesse sentido que se deve abrir aqui uma crítica ao movimento espírita brasileiro, que tem se preocupado muito mais com a caridade material do que com a caridade pedagógica. Dar pão e agasalho é bem mais fácil do que educar, mas educar é uma terapêutica global e uma solução social muito mais eficaz.
Entenda-se que esse empenho pela Educação intelectual não pode significar impregnar-se de materialismo, de sofismas niilistas e de especulações vazias, que são hoje o tônus da maioria das correntes dominantes. A convicção espírita firme e sincera não é, entretanto, empecilho para o diálogo, para a abertura mental e para a tolerância ideológica.
· A Família Espírita. O mais forte impacto que o Espiritismo causa na relação entre os membros de uma mesma família é a desierarquização de funções. É verdade que os pais recebem a tarefa de educar os filhos e trata-se de tarefa de grande responsabilidade moral. Mas pais e filhos, marido e mulher, avós e netos são acima de tudo Espíritos irmãos, peregrinos da evolução humana, cada qual carregando sua herança passada e sua missão presente, essencialmente iguais, e dignos todos, moços e velhos, homens e mulheres, crianças e adultos, de respeito e amor. Nesta perspectiva, o autoritarismo patriarcal do passado perde qualquer fundamento. Espiritualmente, filhos podem até ser mais adiantados que pais. Mesmo nesse caso, não ficam os pais eximidos de sua função de educar.
Outra explicação inédita que o Espiritismo nos aponta para o entendimento das relações familiares é a lei da reencarnação. Como pai e filho, irmão e irmã, avô e neto, podem nascer adversários ferrenhos do passado. E nesse caso, a convivência cotidiana deve ser justamente a oportunidade de reconciliação e ajuste. Quando o pai ou a mãe percebe num filho uma aversão inata, uma antipatia inexplicável, podem estar certos de que a relação atual é preciosa ocasião para reajuste de ódios anteriores. Cabe então ao adulto, na posse do conhecimento espírita, procurar com mais afinco, dedicação e renúncia, conquistar o amor daquele ser a quem talvez prejudicou em eras passadas. Se aquele que tem a missão de educar permanecer com o coração endurecido e não fizer a sua parte para a reconciliação espiritual, terá fracassado duplamente, como pai ou mãe e como cristão, com o dever moral de perdoar e reconciliar-se com os adversários.
Assim, num clima não-hierárquico—onde todos se sintam acima de tudo irmãos uns dos outros—de cultivo permanente de amor e respeito mútuo, a família espírita é o cenário mais propicio e mais imediato para a Educação espírita. Evidentemente, não se trata aqui de sermões esporádicos a respeito de postulados doutrinários. Mas quando o Espiritismo está enraizado na alma, entranhado no comportamento cotidiano, como explicação para os porquês da existência, como parâmetro ético, como proposta vital—então a convicção espírita se impregna naturalmente nas crianças, marcando-as para o resto da vida.
Então, nem sequer faz sentido a questão muito polemizada por certos adeptos: se os pais devem ou não ensinar Espiritismo às crianças. Se os pais s de fato espíritas, ensinarão nos mínimos gestos, nas relações familiares, na vi profissional, e na própria prática pedagógica que adotarem com os filhos, o que é ser espírita. Mas se o Espiritismo representar apenas uma freqüência rotineira um Centro, sem que haja um engajamento existencial, então obrigar a criança ir a cursos de evangelização, como se vai a um catecismo para fazer primeira comunhão (quando os pais não são católicos praticantes) é transformar a Doutrina num formalismo religioso, sem um sentido mais profundo. É evidente que tal atitude não criará convicções; ao invés, despertará resistências.
Além da função pedagógica, específica dos pais, não se pode deixar de mencionar que a família serve como cenário educativo para todos os seus membros, desde que haja engajamento no processo de melhoria Intima. É na família que podemos e devemos em primeiro lugar conquistar e exercitar virtudes fundamentais, como altruísmo, paciência, amor ao próximo e ao mesmo tempo o empenho de contribuirmos para o progresso do outro. Trata-se, pois, de um cenário permanente e fecundo para a Educação do Espírito.
A Escola e a Universidade Espírita. É numa instituição de ensino primário, secundário ou superior, que devemos também colocar em prática a Educação segundo o Espiritismo. É preciso criar espaços institucionais, onde as crianças, os adolescentes e os jovens possam receber uma Educação integral; serem amados e observados como Espíritos imortais e reencarnados; serem estimulados a se auto-educarem... Nem todos os alunos de uma escola ou de uma universidade espírita deverão ser necessariamente adeptos do Espiritismo. Aprender o conteúdo doutrinário pode ser uma opção de pais e alunos. Mas todos deverão se beneficiar de uma visão espírita da Educação. Muitas das idéias que constituem o universo da Pedagogia Espírita vêm de uma tradição que começa em Sócrates, passa por Comenius, Rousseau, Pestalozzi e têm seu modelo máximo em Jesus. Desta forma, crianças e jovens pertencentes a diferentes credos poderão usufruir de uma Educação espiritualista, sem que suas consciências sejam violentadas por imposições.
Salvo raras exceções, as escolas espíritas que fizeram história no Brasil e outras que ainda estão atuantes, adotaram o sistema educacional vigente e apenas acrescentaram uma aula de Espiritismo, opcional ou obrigatória. Quando muito, apóiam-se numa filosofia vagamente humanista. Este não é o modelo de uma escola verdadeiramente espírita. A Doutrina não pode se reduzir a um catecismo periódico, divorciado da prática existencial. Trata-se sim de oferecer escolas com uma proposta de Educação tão revolucionária, tão superior, tão mais democrática e eficaz que as ofertas vigentes, que mesmo não-espíritas disputarão suas vagas.
Manifesta-se aí o compromisso espírita de agir pedagogicamente, tanto no sentido moral quanto intelectual e mesmo estético. E preciso abolir o conceito ultrapassado de que a boa vontade supre todas as deficiências. Escolas espíritas—sem necessidade de ostentação—devem ser modernas, com arquitetura diferençada, em meio à natureza, bem equipadas e, sobretudo, com recursos humanos qualificados. E para formar recursos humanos compatíveis, precisamos de universidades espíritas. O círculo se fecha. É imprescindível criarmos um ciclo educativo completo, pelo qual possamos educar pessoas pelo menos humanistas, que se ponham na vanguarda espiritual da sociedade e espíritas mais conscientes, com uma cosmovisão doutrinária mais integrada e fundamentada. Ao mesmo tempo em que o Espiritismo pode contribuir para a melhoria da Educação, a Educação espírita deve contribuir para o progresso do próprio Espiritismo.
Certamente, não deixarão de perguntar pelos recursos financeiros necessários a tais empreendimentos. Os recursos existem. O movimento espírita não constrói centros, asilos, hospitais, orfanatos, federações? Por que não aplicar parte destes recursos para a construção de escolas e faculdades? O que falta é uma mudança de mentalidade: é preferível, embora mais trabalhoso, aplicar dinheiro em Educação do que em assistencialismo; aliás, o próprio assistencialismo deveria ser pedagógico.
Os Centros e Instituições Espíritas. A primeira instituição espírita do mundo foi a Sociedade de Estudos Psíquicos de Paris. Lá se pesquisavam os aspectos cientifico, filosófico e moral do Espiritismo. Os participantes debatiam questões existenciais, mensagens e fenômenos mediúnicos, temas do cotidiano e notícias de jornais, teorias cientificas ou filosóficas à luz da Doutrina. Intercambio entre os próprios encarnados—entre os membros da sociedade e outras sociedades semelhantes na França e no estrangeiro—e entre encarnados e desencarnados, alimentava o progresso do Espiritismo, sob a luminosa liderança de Kardec que, apesar de sua incontestável autoridade espiritual, jamais se arvorou em chefe do movimento. O aspecto acadêmico da Sociedade—no que a academia tem de positivo em pesquisa e diálogo entre os pares e não no seu r espírito sistemático e arrogante—estava presente na Sociedade de Paris, que tinha um caráter de "estudos", portanto, um caráter pedagógico.
No Brasil, houve um processo, talvez historicamente necessário, de massificação do Espiritismo. Centros, Federações, instituições diversas atendem diariamente a milhares de pessoas em todo o país. Com isso, a Doutrina penetrou em todas as camadas da sociedade e multiplicou adeptos e simpatizantes. O Brasil se tornou o país mais espírita do mundo. Mas essa disseminação em massa teve seu preço. As casas espíritas praticam um assistencialismo social e espiritual em que o indivíduo atendido geralmente assume uma atitude muito passiva de assistir cursos, palestras, tomar passes. Às vezes, após anos e anos numa casa espírita, o freqüentador tradicional não passou de fato por um processo pedagógico de crescimento global, mas pratica o Espiritismo à moda tradicional de outras religiões: de forma rotineira, mística e destituída de significação existencial mais profunda.
Já que o movimento espírita brasileiro avançou tanto em termos numéricos, chegou a hora de darmos um salto qualitativo em suas práticas: e esse salto deve ser justamente o de caracterizar toda a atividade espírita como atividade pedagógica, segundo a própria essência da Doutrina. Pode-se objetar que as atividades desenvolvidas pelos Centros e Federações são predominantemente educacionais. Cursos, palestras, estudos doutrinários, o grande movimento da evangelização infantil, as Mocidades Espíritas, a própria assistência social— sempre acompanhada do ensino do Espiritismo—e a assistência espiritual— com a doutrinação dos Espíritos—tudo isto é Educação espírita. É verdade que o movimento espírita tem esse caráter instrutivo, mas não necessariamente pedagógico. Geralmente, é um ensino exercido de forma autoritária e conservadora, arraigado nos modelos tradicionais do sistema educacional vigente e nas heranças trazidas das igrejas. Crianças, adolescentes, jovens, adultos, que chegam à casa espírita, não se tornam educandos para assumir sua própria auto-educação, num processo participativo, dinâmico e enriquecedor.
São tratados como ouvintes passivos.
A metodologia adotada para o ensino do Espiritismo, em qualquer nível costuma ser maçante e autoritária, sem recursos didáticos, sem consciência de expositores e líderes do sentido real de um processo pedagógico.
Pode-se argumentar que um dos problemas com que se depara a casa espírita é a freqüência de pessoas traumatizadas por perdas dolorosas ou portadoras de complexos problemas obsessivos. Isso faz com que tais recém-chegados sejam muitas vezes tratados de forma paternalista. Costuma-se mesmo dizer que, para estes, o Espiritismo teria um caráter apenas consolador. E quem precisa ser consolado não está interessado em renovação. E quem está obsedado não pode ter a liberdade da palavra, nem mesmo para indagar—é o que se pensa.
É evidente que o controle de qualquer atividade espírita deve ser ass do por pessoas equilibradas, moralmente idôneas, conhecedoras e praticando Espiritismo em todos os seus aspectos. Isto não é motivo para que os outros participantes do processo sejam tratados com uma falsa superioridade. O educador verdadeiro é aquele que sabe converter traumas em motivos de edificação e crescimento e fazer da participação ativa dos educandos uma terapia para seu reequilíbrio. O primeiro passo para que se dê de fato um desencadear das potencialidades dos que freqüentam a casa espírita é que sejam acolhidos como seres pensantes e dignos de serem ouvidos. Que se tornem indivíduos conhecidos, respeitados e participantes, e não meros assistidores de palestras.
Seminários, debates, reuniões de estudos em que todos possam colocar seus questionamentos e dúvidas, a própria disposição das cadeiras em círculos e não em platéias com um púlpito longínquo—tudo isso deve fazer parte do panorama pedagógico do Centro Espírita, quebrando o monólogo autoritário dos oradores. E evidente que, para isso, o Centro não precisa nem deve se converter numa arena de disputas de opinião e de brigas pessoais. É preciso criar o hábito de debater idéias com argumentos e não com ofensas e enfrentar a divergência de opinião com naturalidade, preservando sempre os postulados básicos do Espiritismo. Com líderes conscientes, equilibrados e com sólidas convicções doutrinárias, é possível se ventilar o clima com a liberdade de expressão, mantendo-se o padrão vibratório elevado e a compreensão fraterna entre todos. Aliás, isto também deve fazer parte do aprendizado. É muito fácil se obter uma harmonia aparente, sob o tacão da disciplina autoritária. O desafio é obter a união, pela adesão voluntária de todos os participantes a uma proposta de progresso e fraternidade.
Educação mediúnica
A Educação mediúnica é um dos aspectos característicos da Educação espírita, ligada ao desabrochar das capacidades extra-sensoriais que todo ser humano deverá desenvolver em sua jornada evolutiva. Como já foi analisado (ver Cap. II), há o mediunato—compromisso específico de atuação mediúnica numa dada existência—mas além desta tarefa, todos os seres humanos têm uma mediunidade geral, mais ou menos cultivada.
No caso de o indivíduo possuir algum dom mediúnico específico, a Educação mediúnica tem por meta possibilitar seu desenvolvimento e uso equilibrado, sadio e positivo. No caso de mediunidade difusa, não-específica, a meta é a de aguçar a sensibilidade extra-sensorial, a intuição, a percepção psíquica—coisas presentes em todos os seres humanos.
Tanto num como noutro caso, são facetas da proposta espírita: o controle racional das faculdades mediúnicas, fruto do estudo acurado dos fenômenos e da auto-análise que todo espírita comprometido com sua auto-educação deve permanentemente promover; o uso da mediunidade para fins úteis, nobres e cristãos; o cuidado para não converter nenhum dom mediúnico em fonte de riqueza material, de projeção pessoal ou de manipulação psíquica, ou seja, mediunidade com absoluto desinteresse e devotamento.
A Educação mediúnica não é meramente um apossar-se de técnicas, mas deve ser um fator de evolução global para o Espírito; uma possibilidade real de aperfeiçoamento moral e de prática do Bem. Os parâmetros éticos da mediunidade se sobrepõem aos aspectos técnicos, inclusive como garantia de controle do fenômeno e de atração de bons Espíritos—ao contrário de certas correntes espiritualistas que acentuam a frieza da técnica em detrimento do amor que deve orientar a utilização dos dons psíquicos.
Se, conforme Herculano Pires, O Livro dos Espíritos é um manual de Educação Integral, O Livro dos Médiuns é um manual de Educação mediúnica, que pela primeira vez na história humana colocou balizas éticas e racionais para a prática da mediunidade.
A EDUCAÇÃO SEGUNDO O ESPIRITISMO – Dora Incontri

VIBRAÇÕES

Emmanuel

Entendendo-se o conceito de vibrações, no terreno do espírito, por oscilações ou ondas mentais, importa observar que exteriorizamos constantemente semelhantes energias. Disso decorre a importância das idéias que alimentamos.
Em muitas faces da experiência terrestre nos desgastamos com as nossas próprias reações intempestivas, ante a conduta alheia, agravando obstáculos ou ensomando problemas.
Se nos situássemos, porém, no lugar de quantos criem dificuldades, estaríamos em novo câmbio de emoções e pensamentos, frustrando descargas de ódio ou violência, angústia ou crueldade que viessem a ocorrer em nossos distritos de ação.
Experimenta a química do amor no laboratório do raciocínio.
Se alguém te fere coloca-te, de imediato, na condição do agressor e reconhecerá para logo que a compaixão deve envolver aquele que se entregou inadvertidamente ao ataque para sofrer em si mesmo a dor do desequilíbrio.
Se alguém te injuria, situa-te na posição daquele que te apedreja o caminho e perceberá sem detença que se faz digno de piedade todo aquele que assim procede, ignorando que corta apropria alma, induzindo-se à dor do arrependimento.
Se te encontras sob o cerco de vibrações conturbadoras, emite de ti mesmo aquelas outras que se mostrem capazes de gerar vida e elevação, otimismo e alegria.
Ninguém susta golpes da ofensa com pancadas de revide, tanto quanto ninguém apaga fogo a jorros de querosene.
Responde a perturbações com a paz.
Ante o assalto das trevas faze luz.
Se alguém te desfecha vibrações contrárias à tua felicidade, endereça a esse alguém a tua silenciosa mensagem de harmonia e de amor com que lhe desejes felicidade maior.
Disse-nos o Senhor: "Batei e abrir-se-vos-á. Pedi e obtereis".
Este mesmo princípio governa o campo das vibrações.
Insiste no bem e o bem te garantirá.

Do livro Paz e renovação. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.

Dez Maneiras de Amar a Nós Mesmos


1 - Disciplinar os próprios impulsos.

2 - Trabalhar, cada dia, produzindo o melhor que pudermos.

3 - Atender aos bons conselhos que traçamos para os outros.

4 - Aceitar sem revolta a crítica e a reprovação.

5 - Esquecer as faltas alheias sem desculpar as nossas.

6 - Evitar as conversações inúteis.

7 - Receber o sofrimento o processo de nossa educação.

8 - Calar diante da ofensa, retribuindo o mal com o bem.

9 - Ajudar a todos, sem exigir qualquer pagamento de gratidão.

10 - Repetir as lições edificantes, tantas vezes quantas se fizerem necessárias, perseverando no aperfeiçoamento de nós mesmos sem desanimar e colocando-nos a serviço do Divino Mestre, hoje e sempre.


Autor: André Luiz
Psicografia de Chico Xavier. Do livro: Paz e Renovação

PENSAMENTO E DESOBSESSÃO

André Luiz

Falamos de pensamento livre.
Analise o corpo de que você se serve no plano material: do ponto de vista do autocontrole, é uma cabine perfeita com dispositivos especiais destinados a sua própria defesa.
O cérebro com os centros diretivos da mente funciona encerrado na caixa craniana, à maneira de usina quase lacrada num cofre forte.
Os olhos registram impressões, mas podem conservá-las em estudo discreto.
Os ouvidos são forçados a escutar o que lhes afete a estrutura, entretanto, não precisam dizer o que assinalam.
A voz é produzida na laringe sem necessidade de arrojar de si palavras em desgoverno.
Mãos e pés por implementos de serviço não se movimentam sem determinações da vontade.
Os recursos do sexo não atuam sem comando mental.
Fácil, assim, verificar que não existe trabalho desobsessivo sem reajuste da emoção e da idéia, porquanto todos os processos educativos e reeducativos da alma se articulam, de início, no pensamento.
Eis porque Jesus enunciou, há quase vinte séculos:- "Não é o que entra pela boca que contamina o homem, mas sim aquilo que, impropriamente, lhe sai do coração".


Do livro Paz e renovação. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.

TESTE DO PROCESSO DESOBSESSIVO


André Luiz
Verifique você:
Se já consegue dispensar aos outros o tratamento que desejaria receber:
Se adia a execução das próprias tarefas;
Se reconhece que toda criatura humana é imperfeita quanto nós mesmos e que, por isso, não nos será lícito exigir do próximo testemunhos de santidade e grandeza na passarela do mundo;
Se guarda fidelidade aos compromissos assumidos;
Se cultiva a pontualidade;
Se evita contrair débitos;
Se orienta a conversação sem perguntas desnecessárias;
Se acolhe construtivamente as críticas de que se faz objeto;
Se fala auxiliando ou agredindo a quem ouve;
Se conserva ressentimentos;
Se sabe atrair amigos e alimentar afeições;
Se mantém o autocontrole, na vida emotiva, como base da sua dieta mental.
Todos nós, os Espíritos em evolução na Terra, temos a nossa quota de obsessão, em maior ou menor grau. E todos estamos trabalhando pela própria libertação. À vista disso, de quando em quando, é sumamente importante façamos um teste de nosso processo desobsessivo, a fim de que cada um de nós observe, em particular, como vai indo o seu.

Livro: Paz e Renovação. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.

SEM DESÂNIMO

André Luiz

Se você deixou de trabalhar, entrando em desânimo, examine o tráfego numa rua simples.
Ônibus, automóveis, caminhões, ambulâncias e viaturas diversas passam em graus de velocidade diferente, cumprindo as tarefas que lhes foram assinaladas.
Nenhum veículo segue sem objetivo e sem direção.
Observe, porém, o carro parado, fora da pista.
Além de constituir uma tentação para malfeitores e um perigo no trânsito, é também um peso morto na economia geral, porquanto foge do bem que lhe cabe fazer.
Entretanto, se o dono resolve recuperá-lo, aparecem, de pronto,  motoristas abnegados, que se empenham a socorrê-lo.
Considera a lição e não gaste o seu tempo, acalentando enguiços na própria alma, que farão de você um trambolho para os corações queridos que lhe partilham a marcha.
Qual acontece ao veículo mais singelo, você pode perfeitamente auxiliar nos caminhos da vida, arrancar um companheiro dessa ou daquela dificuldade, carregar um doente, transportar uma carta confortadora, entregar um remédio ou distribuir alimento.
Se você quiser, realmente, largar o cantinho da inércia, rogue amparo aos Espíritos Benevolentes e Sábios que funcionam, caridosamente, na condição de mecânicos da Providência Divina, e eles colaborarão com você, mas para que isso aconteça, é preciso, antes de tudo, que você pense em servir, dispondo-se a começar.
Do livro "Paz e Renovação" Psicografia de Francisco Cândido Xavier.