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quinta-feira, 23 de agosto de 2012

O meu único encontro com Herculano Pires




Cirso Santiago
Fui e sou admirador do professor José Herculano Pires, Acompanhei grande parte de seu trabalho através do rádio, da televisão, do livro e do jornal. Ainda hoje, quando já não o temos carnalmente entre nós, ampliando seu discurso, busco com renovado interesse suas obras para aprender, reciclar ou sedimentar conceitos. E a cada pesquisa descubro mais e mais sua grandeza. E dos escaninhos de minha memória saltam logo as palavras judiciosas do escritor Mário Graciotti:
"De que distância, de que regiões, de que época virá esse espírito que se instalou na engrenagem somática de um dos mais curiosos fenômenos intelectuais do Brasil nascente, o poeta, o jornalista, o escritor, o filósofo Herculano Pires?"
"A constante e invariável temática que flui de sua bela inteligência e de seu grande coração revela uma diretiva uniforme e impressionante, da qual podemos discordar, aqui ou ali, mas difícil se nos torna relegá-la a plano secundário." (1)
Foi no dia 9 de março de 1979, às 21hl5, que tombou esse Altaneiro Jequitibá do Espiritismo em terras brasileiras. Caiu seu corpo físico vitimado por um enfarto, mas sua essência, o Espírito Herculano Pires, continuou em pé, vibrante e dinâmico como dantes. Prova isto, sua manifestação mediúnica logo após seu desencarne, conforme registro na edição n.° 100 deste jornal. O Grupo Espírita Caírbar Schutel, que há anos funciona na casa da família Pires, estava reunido naquela noite e o professor ali compareceu testemunhando a continuidade da vida, a exemplo do que já fizeram outros espíritos de grande envergadura moral. Diz o articulista: "Alguns familiares, que não participavam da sessão, levaram o professor para o hospital, mas em silêncio, a fim de que o trabalho mediúnico prosseguisse. Terminada a sessão foram lidas duas mensagens psicografadas; uma, sem assinatura e que atribuímos a Caírbar Schutel (patrono do grupo) referia-se, claramente, ao desencarne e a outra do próprio Herculano Pires e dirigida à sua esposa, dona Virgínia." (grifei)
Faz 10 anos, portanto, que o professor Herculano Pires, a quem carinhosamente se atribui o cognome LÉON DENIS BRASILEIRO, partiu para outra dimensão: a dimensão cósmica do Espírito. E sua ausência no movimento espírita é e sempre será relevante.
Por falta de oportunidade, não gozei do seu convívio. Teria me enriquecido muito se isto tivesse sido possível, não há dúvida! Tivemos apenas um encontro. Mas este, por minha exclusiva culpa, foi prejudicado. Aconteceu há coisa de 20 anos, quando desabrochava em mim a mediunidade psicográfica. Com a natural insegurança do médium em desenvolvimento nascente, vivia à procura de quem pudesse ler e opinar sobre as páginas mediúnicas que recebia. Os que estavam à minha volta e que me poderiam prestar esse serviço, ou exageravam nas avaliações elogiosas ou negavam qualquer palavra com medo de melindrar-me ou, quem sabe, para não se comprometer com a minha "obsessão"...
Preocupado com o fenômeno que em mim se realizava e com a lisura doutrinária das páginas que me eram ditadas, continuava a buscar orientações. Fui à Federação Espírita do Estado de São Paulo. Ali, um conhecido confrade, depois de uma passada de olhos no escrito que levei, disse: "Procure o professor Herculano Pires!"
Soube mais tarde que o professor Herculano estaria, certo dia, palestrando e autografando livros num centro daqui do ABC paulista. Não perdi a oportunidade. Após a palestra, procurei falar-lhe. Mas os "vigilantes" não me permitiam aproximar. Comprei então um livro e entrei na fila para colher seu autógrafo e passar-lhe uma mensagem com um bilhete em anexo, em que lhe expunha o meu desejo. No último momento, um "vigilante" ainda tentou frustrar o meu intento. Insisti, intransigente... O professor não entendeu, e nem poderia entender, minha ansiedade. Levantou os olhos do trabalho que realizava e olhou-me com um ar mesclado de espanto e piedade que jamais se apagará de minha memória. Terá pensado numa obsessão? Talvez! O que tenho certeza é que não gostou, e com justa razão, da minha momentânea indisciplina. Percebendo, no entanto, o envelope que eu segurava na mão estendida, recolheu-o a um dos seus bolsos e meneou sua grande cabeça, como a me dizer: "Verificarei depois!"
Sai contente... Mas nunca recebi resposta do professor àquela minha solicitação. Talvez tenha sido por falta de tempo. Foi sempre um homem muito ocupado e, quem sabe, minha preocupação não seria das mais urgentes. Seja como for, perdi a oportunidade de sua abalizada opinião.
Mas hoje, depois de militar vários anos na Redação deste jornal, compreendo melhor a fuga daqueles a quem se pede uma crítica desapaixonada ao nosso trabalho. É que embora a sinceridade com que muitas vezes se formula esse desejo, são poucos ainda os que entre nós estão prontos para aceitar qualquer crítica à sua realização, mormente quando esta é mediúnica. É o professor Herculano sabia disso com muito mais lucidez do que a que suponho ter hoje. E por isso, certamente, considerou que sua opinião não seria bem absorvida por mim naquela altura (e hoje seria? Ah!... dúvida cruel). Silenciou, porque, embasado em sua larga experiência, sentiu que eu, como tantos, não estava apto para compreender que a crítica, independente do seu teor ser-nos favorável ou não, quando bem aproveitada pelo uso da razão, funciona sempre à maneira de um buril que, guiado por compenetrada inteligência, acaba por libertar, pouco a pouco, a preciosa gema da crosta desvaliosa.
Obrigado professor Herculano. Valeu o nosso único encontro. Valeu seu silêncio-crítico que me tem levado a raciocinar muito sobre as minhas tarefas com o desejo de acertar. Registrar esse fato foi à maneira que encontrei para prestar-lhe minha singela homenagem nesse marco de sua passagem para o "outro mundo".
Nota: (1) Texto constante do prefácio do livro Barrabás e o Relato de Judas, de J. Herculano Pires.

Correio Fraterno no 219  março de 1989
http://www.correiofraterno.com.br/acervo/decada-de-80/46-no219-mar-1989-no219-mar-1989-/158-o-meu-o-encontro-com-herculano-pires

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