Caros amigos leitores , gostaríamos, na medida do possível ,contar com a interação de todos ,através de comentários , tornando se seguidores deste blog divulgando para seus conhecidos ,para que assim possamos estudar e aprendermos juntos , solidários e fraternos. Inscrevam-se no blog!

terça-feira, 11 de maio de 2021

A MULTIDÃO E A TRAGÉDIA DO GÓLGOTA -


 FRAGMENTOS DOS TEXTOS:
 [...]  Não parecia que os peregrinos de Jerusalém haviam acorrido à cidade para as comemorações alegres da Páscoa, mas, tão somente, para procederem à condenação do humilde Messias de Nazaret[...]Como homem, estou contra este povo inconsciente e infeliz e tudo faria por salvar o inocente; mas, como romano, acho que uma província, como esta, não passa de uma unidade econômica do Império[...]Os ódios, confraternizando com os ciúmes, espalharam injúrias que eram glosadas pela ingratidão de muitos que lhe foram comensais da ternura e receberam de Suas mãos o pábulo da vida estuante. Fervilhando as constrições obsidentes[...]As hordas desenfreadas da Espiritualidade inferior galvanizam no ódio os que se permitem as licenças das paixões dissolventes. Sempre se repetirão aquelas cenas nos linchamentos das ruas, nas prisões arbitrárias, nas injustiças tornadas legais[...]A obsessão coletiva como tóxico morbífico domina os participantes da inominável atuação infeliz. Ele não se defende, não reclama, nada pede. Submete-se e confia em Deus...




       No grande dia do Calvário



Da câmara isolada, onde se reunia o apressado e reduzido conselho de patrícios, podiam observar-se os ecos rumorosos da turba amotinada, em espantosa gritaria. Um ajudante de ordens do governador, de nome Políbius, homem sensato e honesto, penetrou no recinto, pálido e quase trêmulo, dirigindo-se a Pilatos:Senhor governador, a multidão enfurecida ameaça invadir a casa, se não confirmardes a sentença condenatória de Jesus Nazareno, dentro do menor prazo possível… — Mas, isso é um absurdo — retrucou Pilatos, emocionado. — E, afinal, que diz o profeta em tais circunstâncias? Sofre tudo sem uma palavra de recriminação e sem um apelo oficial aos tribunais de justiça? — Senhor — replicou Políbius, igualmente impressionado —, o prisioneiro é extraordinário na serenidade e na resignação. Deixa-se conduzir pelos algozes com a docilidade de um cordeiro e nada reclama, nem mesmo o supremo abandono em que o deixaram quase todos os diletos discípulos da sua doutrina!

  Comovido com os seus padecimentos, fui falar-lhe pessoalmente e, inquirindo-o sobre os seus martírios, afirmou que poderia invocar as legiões de seus anjos e pulverizar toda a Jerusalém dentro de um minuto, mas que isso não estava nos desígnios divinos e, sim, a sua humilhação infamante, para que cumprissem as determinações das  Escrituras. (Isaias) 

Fiz-lhe ver, então, que poderia recorrer à vossa magnanimidade, a fim de se ordenar um processo dentro de nossos dispositivos judiciários, de maneira a comprovar sua inocência e, todavia, recusou semelhante recurso, alegando que prescinde de toda proteção política dos homens, para confiar tão somente numa justiça que diz ser a de seu Pai que está nos Céus!

 [...]que poderíamos fazer para evitar-lhe a morte nefanda, nas mãos criminosas da massa inconsciente?[...]sugiro a pena dos açoites na praça pública, por ver se assim conseguimos amainar as iras populares, evitando ao prisioneiro a morte ignominiosa nas mãos de celerados sem consciência

[...]Vivendo na Judeia há quase sete anos, conheço este povo e sei de suas temíveis atitudes, quando as suas paixões se desencadeiam.  O suplício foi, então, ordenado, no pressuposto de evitar maiores males.[...] Nesse instante doloroso, Públio e alguns romanos se ausentaram por momentos da câmara privada onde se reuniam, a fim de observarem os movimentos instintivos da massa fanática e ignorante. Não parecia que os peregrinos de Jerusalém haviam acorrido à cidade para as comemorações alegres da Páscoa, mas, tão somente, para procederem à condenação do humilde Messias de Nazaret.[...] Políbius, cientificando o governador de que a pena do açoite não havia saciado, infelizmente, as iras da população enfurecida, que reclamava a crucificação do condenado.

[...] Penosamente surpreendido, exclamou o senador, dirigindo-se a Pilatos, com intimidade: — Não tendes, porventura, algum prisioneiro com processo consumado, que possa substituir o profeta em tão horrorosas penas? As massas possuem alma caprichosa e versátil e é bem possível que a de hoje se  satisfaça com a crucificação de algum criminoso, em lugar desse homem, que pode ser um mago ou visionário, mas é um coração caridoso e justo. O governador da Judeia concentrou-se por momentos, recorrendo à memória, com o fim de encontrar a desejada solução. Lembrou-se então de Barrabás, personalidade temível, que se encontrava no cárcere aguardando a última pena, conhecido e odiado de todos pelo seu comprovado espírito de perversidade, respondendo afinal: — Muito bem!… Temos aqui um celerado, no cárcere, para alívio de todos, e que poderia, com efeito, substituir o profeta na morte infamante!… E mandando fazer o possível silêncio, de uma das eminências do edifício, ordenou que o povo escolhesse entre o bandido e Jesus. 

 Mas, com grande surpresa de todos os presentes, a multidão bradava com sinistro alarido numa torrente de impropérios: — Jesus!… Jesus!… Absolvemos Barrabás!… Condenamos a Jesus!… Crucificai-o!… Crucificai-o!… Todos os romanos se aproximaram das janelas, observando a inconsciência da massa criminosa, no ímpeto de seus instintos desencadeados. 

 — Que fazer diante de tal quadro? — perguntou Pilatos, emocionado, ao senador que o ouvia atentamente. 
 — Meu amigo — respondeu Públio, com energia ,— se a decisão dependesse tão somente de mim, fundamentá-la-ia em nossos códigos judiciários, cuja evolução não comporta mais uma condenação tão sumária como esta, e mandava dispersar a multidão inconsciente à pata de cavalo; mas, considero que as minhas atribuições transitórias, junto ao vosso governo, não me outorgam direito a tais desmandos e, além disso, tendes aqui uma experiência de sete anos consecutivos. De minha parte, suponho que tudo foi feito para que as decisões não fossem precipitadas.

(...) Como homem, estou contra este povo inconsciente e infeliz e tudo faria por salvar o inocente; mas, como romano, acho que uma província, como esta, não passa de uma unidade econômica do Império, não nos competindo, a nós outros, o direito de interferência nos seus grandes problemas morais e presumindo desse modo, que a responsabilidade desta morte nefanda deve caber agora, exclusivamente, a essa turba ignorante e desesperada e aos sacerdotes ambiciosos e egoístas que a dirigem.

 Pilatos enterrou a fronte nas mãos, como a refletir maduramente naquelas ponderações; mas, antes que pudesse externar sua opinião, eis que Políbius aparece aflito, exclamando em atitude discreta: — Senhor governador, é preciso apressar vossa decisão. Espíritos maldizentes começam a duvidar da vossa fidelidade aos poderes do César, compelidos pela intriga dos sacerdotes do templo, colocando a vossa dignidade em terreno equívoco para todos… 

Além disso, a populaça tenta invadir a casa, tornando-se necessário assumirdes atitude decisiva, sem perda de um minuto.  Pilatos ficou rubro de cólera, diante de semelhantes injunções, exclamando irritado, como se estivesse sob o jugo do mais singular dos determinismos: — Está bem! Lavarei as mãos deste ignominioso delito! O povo de Jerusalém será satisfeito… 

 E, procedendo a esse ato que o celebrizaria para sempre, dirigiu algumas palavras ao condenado, mandando, em seguida, recolhe-lo a uma cela, onde pudesse permanecer alguns minutos, sem as grosseiras investidas da turba impetuosa, antes que a multidão o conduzisse ao Gólgota, que, na linguagem usual, deverá ser traduzido por Lugar da Caveira. 

 Um sol abrasador tornara sufocante e insuportável a atmosfera. Saciada, afinal, a fúria da multidão nos seus desvairamentos infelizes, numerosos soldados seguiram o prisioneiro, que demandava o monte da crucificação, a passos vacilantes sob o madeiro da ignomínia, que a justiça da época destinava aos bandidos e aos ladrões. Até o momento de sua saída sob a cruz, ninguém se interessara por ele, junto à autoridade do governador da Judeia... Depreendia daí o senador que, quantos seguiam o Mestre de Nazaret nas margens do lago, em Cafarnaum, o haviam abandonado inteiramente. De uma das janelas do palácio, considerou, penalizado, o desprezo infligido àquele homem que um dia, o dominara com a força magnética da sua personalidade incompreensível, observando a ondulação da turba enfurecida, ao sair o inesquecível cortejo. Ao lado do Mestre não se via mais a carinhosa assistência dos discípulos e seus numerosos seguidores. Apenas algumas mulheres — entre as quais se destacava o vulto impressionante e agoniado de sua mãe — o amparavam afetuosamente, no doloroso e derradeiro transe. Aos poucos, a praça extensa aquietou-se ao calor sufocante da tarde que se avizinhava. À distância, ouvia-se ainda a vozearia da plebe, aliado ao relinchar dos cavalos e ao tinir das armaduras. 

 Impressionados com o espetáculo que, aliás, não era incomum na Palestina, reuniram-se os romanos em uma das salas amplas do palácio governamental, em animada palestra, comentando os instintos e paixões ferozes da plebe enfurecida. Daí a minutos, Cláudia mandava servir doces, vinhos e frutas, e, enquanto a conversação timbrava os problemas da província e as intrigas da corte de Tibério, mal imaginava aquele punhado de criaturas que, na cruz grosseira e humilde do Gólgota, ia acender-se uma gloriosa luz para todos os séculos terrestres.. 

Emmanuel 
Trecho do livro: Há dois mil anos , Cap.8-1ª parte.

                     ***

         O Calvário e a obsessão

[...]Os ódios, confraternizando com os ciúmes, espalharam injúrias que eram glosadas pela ingratidão de muitos que lhe foram comensais da ternura e receberam de Suas mãos o pábulo da vida estuante. Fervilhando as constrições obsidentes que se impunham, os adversários da liberdade espiritual da Terra, em desgoverno no Mundo Espiritual, dominaram os que se não armaram de vigilância e equilíbrio, tornando-se fáceis presas do anti-Cristo, a fim de que a tragédia do Gólgota se consumasse.

[...] As hordas desenfreadas da Espiritualidade inferior galvanizam no ódio os que se permitem as licenças das paixões dissolventes. Sempre se repetirão aquelas cenas nos linchamentos das ruas, nas prisões arbitrárias, nas injustiças tornadas legais, quando as massas afluem aos espetáculos hediondos e se asselvajam, tornando-se homicidas incomparáveis...
 
Como podiam aquelas gentes desconhecer a brandura do Pastor Divino, esquecer Suas concessões e "prodígios"? 

[...] A covardia moral, abrindo as faculdades psíquicas ao intercâmbio com os Espíritos imperfeitos e obsessores, todo o bem recebido negou, a fim de poupar-se. Transformou o inocente em algoz, em revolucionário desnaturado e elegeu o crime como elemento de justiça. 

O grande espetáculo da loucura coletiva se aproxima do Calvário. A obsessão coletiva como tóxico morbífico domina os participantes da inominável atuação infeliz. Ele não se defende, não reclama, nada pede. Submete-se e confia em Deus. Jesus é o exemplo, o ideal para a consunção do desar que vencerá os séculos a mais horrenda explosão coletiva que passará à História… 

 Amélia Rodrigues

                        * * *

Para Nossa Reflexão , trecho do Evangelho Segundo O Espiritismo, por Larcodaire:

[...]Deverá ele ainda expulsar os vendilhões do templo, que maculam tua casa, esse recinto de orações? E, quem sabe?, oh, homens, se Deus vos concedesse essa graça, se não o renegaríeis de novo, como outrora? Se não o acusaríeis de blasfemo, por vir abater o orgulho dos fariseus modernos? Talvez, mesmo, se não o faríeis seguir de novo o caminho do Gólgota?

Evangelho Segundo O Espiritismo Cap.7 item 11

segunda-feira, 10 de maio de 2021

A INTOLERÂNCIA "E João disse: Mestre, vimos um que em teu nome expulsava os demônios e lho proibimos, porque não te segue conosco". "E Jesus lhe disse: Não o proibais, porque quem não é contra nós é por nós. " (Lucas, 9:49-50)

A INTOLERÂNCIA

"E João disse: Mestre, vimos um que em teu nome expulsava os demônios e lho proibimos,porque não te segue conosco". "E Jesus lhe disse: Não o proibais, porque quem não é contra nós é por nós. " (Lucas, 9:49-50)

A intolerância sempre constituiu um dos grandes entraves na senda da evolução humana.
No campo da ciência ela foi a causa do retardamento de muitas descobertas, pois, no passado, tudo aquilo que ultrapassava o limite acanhado do conhecimento humano, era levado na conta de "engenho e arte do demônio".

No setor do aculturamento ela foi responsável pelo marasmo e pelas trevas que prevaleceram entre os homens durante muitos séculos, evitando que eles, através do conhecimento da verdade, se libertassem do preconceito e da superstição.

No seio das religiões, a intolerância se fez sentir em todo o seu aspecto negativo, sendo responsável por grande número de perseguições, de torturas e de morte. Sempre que surgia na Terra um Espírito mais saliente querendo impulsionar o esclarecimento espiritual do homem, ele era catalogado como herege e como tal perseguido e até morto.

O próprio Jesus Cristo foi vítima da intolerância dos seus contemporâneos, por isso, para nos legar a sua mensagem de paz e de amor, ele teve de enfrentar a fúria sanguinolenta de muitos fanáticos, perecendo finalmente pendurado numa cruz, no alto do Calvário.

A passagem evangélica que estamos enfocando, nos elucida sobre o pensamento de Jesus Cristo sobre a intolerância: ele repreendeu severamente um dos seus apóstolos pelo fato de ter proibido a uma pessoa que não os acompanhava, de também expulsar maus Espíritos.

Enquanto no cenário terreno as religiões se digladiam e fecham as portas a qualquer gênero de entendimento, tudo por causa de ingênuas divergências doutrinárias, o Mestre, cujos atos devem servir de paradigma para o nosso proceder, declara enfaticamente a João:
"Quem não é contra nós é por nós".

Os discípulos de Jesus, impregnados dos prejuízos do arcaico sistema religioso prevalecente entre os judeus, não haviam ainda se despojado do tradicional e aberrante hábito de considerar heresia tudo aquilo que não fosse referendado pela religião imperante. Vendo aquele homem que expelia os maus Espíritos, João enchesse de zelo e, após proibir o homem de praticar atos daquela natureza procurou apressadamente o Mestre, a fim de denunciar aquilo que considerava um trabalho paralelo e autêntica usurpação de poderes.

Agindo daquele modo, o apóstolo julgava estar prestando inestimável serviço à Boa Nova e, certamente, esperava o beneplácito do Mestre para o seu ato de intolerância.

A réplica, no entanto, foi adversa: "Não o proibais, por que, quem não é contra nós é por nós".

O Meigo Rabi da Galiléia deu assim inequívoca demonstração de tolerância e é pena que o seu exemplo não tenha servido decorrer dos séculos, de esteio para uma mais íntima aproximação entre os vários agrupamentos cristãos, os quais, apesar de viver sob o pálio de uma só doutrina, porfiam em se colocarem na mais acesa intolerância, refratários a quaisquer concessões ou gesto de aproximação.

No Velho Testamento encontramos uma passagem quase idêntica:
Devido ao abusivo costume reinante entre muitos médiuns, profetas judeus, de invocarem Espíritos para consultá-los sobre coisas fúteis, sem um objetivo mais sério, o médium-mor que era Moisés vetou terminantemente que se continuasse esse intercâmbio, proibindo que se invocassem os chamados mortos.
Muitos médiuns sensatos existiam, no entanto, entre os judeus, e entre eles dois rapazes sinceros, cujos nomes eram Eldad e Medad. Esses jovens estavam no campo entrando em contato com Espíritos quando, passando por ali um homem, apressou-se em denunciar o fato a Moisés, julgando assim estar prestando valioso serviço ao Grande Legislador.

Conforme narra o livro de Números, Cap. 11, V. 26 a 29, esse homem chegou todo agitado perto do libertador dos hebreus e delatou:
"Senhor! Eldad e Medad estão no campo profetizando!" Josué, o lugar-tenente de Moisés, que ali estava ao lado asseverou:
"Senhor Meu Moisés, proiba-lhos".

Mas Moisés não se importunou, pois conhecia o caráter da Mediunidade de Eldad e Medad e se limitou a responder a Josué:
"Tens tu ciúmes de mim? Oxalá que todo o povo do Senhor fosse profeta, que o Senhor lhe desse o seu Espírito."

Assim como Jesus reconheceu que o homem que expelia os maus Espíritos em seu nome, estava trabalhando pela mesma causa, embora em caminho diverso, Moisés também suspirava pelo mediunismo sadio entre o seu povo, alegrando-se com o fato de dois de seus patrícios estarem entrando em sintonia com os Espíritos do Senhor, para fins edificantes.

Ambos deram vibrante demonstração de tolerância e compenetração dos reais objetivos que animam aqueles que desejam cooperar na tarefa comum de entrelaçamento entre os homens, com vistas a uma mais estreita aproximação com o Alto.

Afirmou João em seu Evangelho que "a luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam" (João, 1:5).

Essa passagem deixa entrever claramente que Jesus Cristo veio como autêntica luz a iluminar o caminho dos homens, mas a intolerância destes fez com que a sua mensagem fosse incompreendida, e as forças das trevas conseguiram fazer com que largos anos de obscurantismo suplantassem a voz da verdade, retardando a implantação dos ideais cristãos, da forma como foram ensinados pelo Cristo, fundamentados sobre a pureza e a singeleza.

Nos Evangelhos encontramos uma narrativa bastante elucidativa: Jesus Cristo não foi recebido numa aldeia de Samaritanos. Os seus apóstolos, revoltados, perguntaram-lhe:
"Queres que façamos descer fogo do céu e os consuma, assim como o fez Elias?". E a resposta do Mestre foi a seguinte: "Não sabeis que espírito sois, porque o Filho do homem não veio para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las". E dirigiram-se para outra aldeia.

Preferindo dirigir-se para outra aldeia, em vez de concordar com a sugestão dos apóstolos Tiago e João, de procurarem consumir o povo que não os recebera, Jesus Cristo, mais uma vez, demonstrou que a tolerância deve sempre nortear os rumos daqueles que se arrogam ao título de cristãos verdadeiros.

Paulo A. Godoy

domingo, 9 de maio de 2021

PERTO DE DEUS " SERÁS MÃE"

 

Perto de Deus

Entre a alma, prestes a reencarnar na Terra, e o Mensageiro Divino travou-se expressivo diálogo:
 
— Anjo bom — disse ela —, já fiz numerosas romagens no mundo. Cansei-me de prazeres envenenados e posses inúteis… Se posso pedir algo, desejaria agora colocar-me em serviço, perto de Deus, embora deva achar-me entre os homens…
 
— Sabes efetiamente a que aspiras? que responsabilidade procuras? — replicou o interpelado. — Quando falham aqueles que servem à vida, perto de Deus, a obra da vida, em torno deles, é perturbada nos mais íntimos mecanismos.
 
— Por misericórdia, anjo amigo! Dar-me-ás instruções…
 
— Conseguirás aceitá-las?
 
— Assim espero, com o amparo do Senhor.
 
— O Céu, então, conceder-te-á o que solicitas.
 
— Posso informar-me quanto ao trabalho que me aguarda?
 
— Porque estarás mais perto de Deus, conquanto entre os homens, recolherás dos homens o tratamento que eles habitualmente dão a Deus…
 
— Como assim?
 
Amarás com todas as fibras de teu espírito, mas ninguém conhecerá, nem te avaliará as reservas de ternura!… Viverás abençoando e servindo, qual se carregasses no próprio peito a suprema felicidade e o desespero supremo. Nunca te fartarás de dar e os que te cercarem jamais se fartarão de exigir…
 
— Que mais?
 
Dar-te-ão no mundo um nome bendito, como se faz com o Pai Celestial; contudo, qual se faz igualmente até hoje na Terra com o Todo-Misericordioso, reclamar-se-á tudo de ti, sem que se te dê coisa alguma. Embora detendo o direito de fulgir à luz do primeiro lugar nas assembleias humanas, estarás na sombra do último… Nutrirás as criaturas queridas com a essência do próprio sangue; no entanto, serás apartada geralmente de todas elas, como se o mundo esmerasse em te apunhalar o coração. Muitas vezes, serás obrigada a sorrir, engolindo as próprias lágrimas, e conhecerás a verdade com a obrigação de respeitar a mentira… Conquanto venhas a residir no regozijo oculto da vizinhança de Deus, respirarás no fogo invisível do sofrimento!…
 
— Que mais?
 
Adornarás as outras criaturas para que brilhem nos salões da beleza ou nos torneios da inteligência; entretanto, raras te guardarão na memória, quando erguidas ao fausto do poder ou ao delírio da fama. Produzirás o encanto da paz; todavia, quando os homens se inclinem à guerra, serás impotente para afastar-lhes o impulso homicida… Por isso mesmo, debalde chorarás quando se decidirem ao extermínio uns dos outros, de vez que te acharás perto do Todo-Sábio e, por enquanto, o Todo-Sábio é o Grande Anônimo, entre os povos da Terra…
 
— Que mais?
 
Todas as profissões no planeta são honorificadas com salários correspondentes às tarefas executadas, mas o teu ofício, porque estejas em mais íntima associação com o Eterno e para que não comprometas a Obra da Divina Providência, não terá compensações amoedadas. 
 
 Outros seareiros da Vinha Terrestre serão beneficiados com a determinação de horários especiais; contudo, já que o Supremo Pai serve dia e noite, não disporás de ocasiões para descanso certo, porquanto o amor te colocará em permanente vigília!

Não medirás sacrifícios para auxiliar, com absoluto esquecimento de ti; no entanto, verás teu carinho e abnegação apelidados, quase sempre, por fanatismo e loucura…
 
Zelarás pelos outros, mas os outros muito dificilmente se lembrarão de zelar por ti… Farás o pão dos entes amados… Na maioria das circunstâncias, porém, serás a última pessoa a servir-se dos restos da mesa, e, quando o repouso felicite aqueles que te consumirem as horas, velarás, noite a dentro, sozinha e esquecida, entre a prece e a aflição… Espiritualmente, viverás mais perto de Deus, e, em razão disso, terás por dever agir com o ilimitado amor com que Deus ama…
 

Anjo bom — disse a Alma, em pranto de emoção e esperança —, que missão será essa?
O Emissário Divino endereçou-lhe profundo olhar e respondeu num gesto de bênção: — Serás mãe!…
 

Irmão X

LIVRO: ESTANTE DA VIDA 


quinta-feira, 6 de maio de 2021

ESCÂNDALOS "As alegorias do Mestre demonstram a Sua profunda sabedoria de esconder na letra que mata, o espírito que vivifica, porque os Seus eram ensinamentos para todos os períodos e tempos da Humanidade, não somente para uma fase do processo evolutivo do ser humano e do planeta terrestre.



"Aí do mundo por causa dos escândalos." - Mateus, (cap.XVIII, v. 7)

Tudo aquilo quanto violente o equilíbrio, o estabelecido, constitui um escândalo, uma irreverência atentatória contra a ordem. Como consequência, os efeitos do ato danoso produzem ressonância, desarmonizandoo indivíduo e, com ele, o grupo social, no qual se encontra situado.

Por constituir um desequilíbrio daquele que o pratica, o escândalo, sob o ponto de vista da psicologia profunda, é manifestação da sombra que permanece em vertiginosa expansão no ser humano, gerando vícios e hábitos mórbidos que levam a desaires profundamente perturbadores, já que terminam por afetar aqueles que lhe compartem a convivência, a afetividade.
Invariavelmente, nesse caso, é de natureza íntima e ninguém toma conhecimento, porque permanece agindo no lado escuro da personalidade, fomentando distúrbios emocionais e comportamentais de variado porte, que se transformam em conflitos de consciência quando defrontados com o ético, o social e o espiritual.

Quase sempre o indivíduo mergulhado na sombra, de que tem dificuldade de se libertar, disfarça as imperfeições projetando a imagem irreal de um comportamento que está longe de possuir, mas que se torna, não raro, severo para com os demais e muito tolerante para com os próprios erros.

Estabelecida essa transferência psicológica de conduta, passa a viver em torvelinho de paixões e tormento aflições que procura disfarçar com habilidade.

O lamento do Homem-Jesus sobre o escândalo é portador de uma invulgar energia nos Seus discursos, convidando a atitudes que seriam absurdas se consideradas na letra neotestamentária, que conclama à eliminação do órgão por intermédio do qual se processa o escândalo, antes que despertar na Vida além do corpo com o seu modelo perispiritual degenerado. Isto porque, todas as construções mentais do Espírito, antes de atingirem o corpo e o induzirem à ação de qualquer procedência, são decodificadas pelo agente intermediário, que se encarrega de impulsionar a forma física na execução do propósito psíquico.

Assim sendo, compreensivelmente a matéria não é responsável pelas ações a que vai induzida. Razão porque fortaleza e fraqueza de caráter, de vontade, de ação, pertencem ao Espírito e não ao corpo, que sempre reflete a origem de onde procedem. É inevitável a ocorrência de fenômenos perturbadores e infelizes, considerando-se o estágio em que se demoram as criaturas humanas, a sua anterioridade de conduta, os hábitos a que se encontram vinculadas. Todavia, quando alguém se ergue para censurar e condenar sem autoridade moral para o fato, também produz escândalo, por esconder a deficiência e desforçar-se naquele em quem projeta a inferioridade que gostaria de eliminar.

Nessa proposta encontra-se embutido também o dever que a todos cumpre, que é respeitar as decisões e ações do seu próximo, porquanto, quem se levanta para impedir o processo de desenvolvimento de outrem, seja por qual motivo for, realiza um escândalo de agressão ao seu livre arbítrio, envolvendo-o na sua sombra, de que não se consegue libertar. Esse é o sentido revolucionário da palavra de Jesus, em torno da necessidade de auto-iluminação para se arrancar o órgão escandaloso: língua, braço, mão, pé...

Erradicar na sua origem a onda vibratória que vai acionar o órgão, eis o esforço que deve ser empreendido, de forma que seja eliminada a causa geradora da futura ação malévola, de modo que o indivíduo se harmonize, mudando a linha direcional das aspirações e dos compromissos aos quais se vincula. Inevitavelmente se tornam necessários os escândalos no mundo, porque constituem advertências para a observância dos bons princípios, porquanto se assim não fora, dificilmente se poderia aquilatar os males que produzem os instintos agressivos, os comportamentos destrutivos, invitando às mais audaciosas conquistas morais.

Para que os escândalos se tornem conhecidos, as criaturas se lhes tornam intermediárias, e é a essas que Jesus lamenta com severidade, porquanto estão escrevendo o capítulo obscuro do seu porvir, no qual defrontarão os frutos apodrecidos das atitudes anteriores que ora lhes exigem recuperação. Como é sempre mais difícil reeducar, reparar e refazer, o discurso de advertência tem cabida, ajudando o indivíduo a poupar-se, mesmo que com austeridade, de muitos prazeres que são de natureza primária e perversa, do que os fruir e passar a viver sob o açodar da consciência intranqüila e do coração angustiado.

Quando o indivíduo escandaliza, prescreve para si mesmo consequências lamentáveis, sendo conduzido a percorrer o caminho de volta com aqueles a quem feriu, ou enfrentando os acidentes morais que foram deixados no transcurso dos seus atos. E' necessário, por enquanto, a ocorrência do escândalo e das suas sequelas morais e espirituais, porque, dessa maneira, as criaturas passam a considerar a profundidade do significado existencial, que é todo elaborado em compromissos de dignificação e de engrandecimento moral.

Um campo não lavrado se torna pasto de miasmas ou de morte, área desértica, selvagem ou pantanosa, aguardando o arado e o dreno, conforme for o espaço de que se disponha para semear e cultivar. As afeições agressivas e conflituosas no lar ou fora dele resultam das ações escandalosas do passado, ora de retorno, a fim de que se reabilitem aqueles que geraram as dificuldades, provando o pão amargo do seu vício e da sua insensatez.

A única maneira de construir-se o futuro ditoso é extirpar dos sentimentos o egoísmo, esse grande responsável pelos males que se multiplicam em toda parte, substituindo-o pelo seu antagonista, que é o altruísmo, gerador de bênçãos e estimulante para o crescimento moral daquele que o cultiva.

Na conduta de sombra espessa do passado, muitos místicos, atormentados pelo masoquismo, levaram a severa proposta de Jesus ao pé da letra, procurando amputar os órgãos que provocaram anteriormente danos ao próximo, esquecidos de que esses prejuízos são sempre de natureza moral, permanecendo insculpidos naqueles que os operam.

Essa necessidade de sofrimento, de castração, de amputação, está superada pela razão, pelo discernimento, que demonstram as excelentes oportunidades que se podem fruir utilizando-os de forma positiva e edificante, face às necessidades de toda natureza que são encontradas amiúde aguardando socorro e orientação.

Qual a utilidade de amputar-se a mão que esbofeteou, quando ela não pode recuperar moralmente aquele que foi ultrajado? E como amputar o pensamento vil, senão através da disciplina que cultiva aspirações enobrecedoras e induz a condutas de liberdade? Os vícios, que são heranças do primarismo ancestral do ser, necessitam de correção mediante o esforço empreendido para a aquisição de novos costumes, aqueles que são saudáveis e contribuem para o bem-estar.

Seria um absurdo, num homem de excelente lucidez, arrancar-se um olho porque é instrumento da inveja daquilo que observa, sendo que é no Espírito que se encontra a mazela, a inferioridade moral, a ambição desmedida de possuir o que noutrem percebe. Extirpar o órgão, de forma alguma altera o sentido mental do comportamento, enquanto que necessário é corrigir a óptica emocional para tudo visualizar com alegria e gratidão a Deus, eis a forma mais exequível para a superação das dificuldades enraizadas no ego discriminador.

As alegorias do Mestre demonstram a Sua profunda sabedoria de esconder na letra que mata, o espírito que vivifica, porque os Seus eram ensinamentos para todos os períodos e tempos da Humanidade, não somente para uma fase do processo evolutivo do ser humano e do planeta terrestre. Penetrando nos arcanos do futuro, Ele podia perscrutar a sua essencialidade e cultura, deixando desde então exarados os códigos de respeito pela vida e de integração na Consciência Cósmica.

A visão da unicidade das existências, em uma psicologia superficial, torna absurda a lição do Mestre a respeito dos escândalos, bem como outras de notável atualidade, se confrontadas com a doutrina dos renascimentos corporais, que contém a sementeira dos atos e a sua colheita, a realização em uma etapa e o seu reencontro em outra, constituindo o método educativo e salutar para o desenvolvimento de todos os valores éticos que jazem adormecidos no ser profundo, aguardando os fatores propiciatórios ao seu desenvolvimento.

Enquanto o ser humano não se liberta dos prejuízos morais a que se entrega, cabe o lamento do Mestre: -Ai do mundo por causa dos escândalos, face aos infelizes efeitos que deles decorrem.

Joanna de Ângelis/Divaldo Franco
Do Livro: Jesus e o Evangelho

quarta-feira, 5 de maio de 2021

O IRMÃO DO FILHO PRÓDIGO"(...)O irmão do Filho Pródigo, por outro lado, representa a outra parcela de seres humanos: aqueles que se encastelam nas muralhas dos dogmas, julgando-se os únicos herdeiros das coisas celestes e os monopolizadores da verdade, arrogando-se o qualificativo de eleitos ou escolhidos, não tolerando jamais que os seus irmãos, que eles qualificam de hereges venham a ser um dia recebidos na Casa do Pai, com o mesmo amor e carinho a eles dispensados. "(...)






O IRMÃO DO FILHO PRÓDIGO

"E o seu filho mais velho estava no campo; e quando veio, e chegou perto da casa, ouviu músicas e danças." (Lucas 15:25)


A Parábola do Filho Pródigo, narrada no capítulo 15, versículos 11 a 32, do Evangelho segundo Lucas, é indubitavelmente uma das mais belas páginas do Livro da Vida. Ela objetiva pulverizar a teoria das penas eternas e colocar em situação de suma relevância a infinita misericórdia de Deus.

No desenvolvimento da parábola, deparamos com a afirmativa de ter o Filho Pródigo saído de sua casa acumulado de bens, entretanto, malbaratando aquilo que recebera, dentro em pouco nada possuía e, após muita luta, corroído pelo remorso e pela fome, viu-se na dura contingência de regressar ao lar paterno, onde foi recebido com intenso júbilo e com as mais vivas demonstrações de amor.

A parábola encerra, no entanto, uma última parte. Descreve o irmão do Filho Pródigo, o qual, voltando do campo e vendo a festa que o pai mandara fazer, em regozijo pela volta do seu filho que estava perdido e foi achado, que estava morto e reviveu, encheu-se de ciúmes e assediado por um sentimento egoístico, verberou acerbamente o procedimento do pai, ao qual qualificou de injusto.

O seu argumento, dirigindo-se ao pai, foi o seguinte: - Eis que te sirvo há tantos anos, sem nunca transgredir o teu mandamento, e nunca me deste um cabrito para alegrar-me com os meus amigos. Vindo porém, este teu filho, que desperdiçou a tua fazenda com as meretrizes, mataste-lhe o bezerro cevado.

É óbvio, na narrativa evangélica, que o Fiho Pródigo representa aquele que Deus coloca nos caminhos da vida, para o aprendizado comum e que, por uma razão ou outra, vem a falhar no desempenho das tarefas peculiares ao seu processos evolutivo.

Em outras palavras, o Filho Pródigo da Parábola simboliza a parcela de criaturas humanas que é cumulada de bens para o desempenho satisfatório de determinada tarefa e que, por invigilância, prevaricação ou qualquer outro fator, vem a fracassar, retornando ao mundo espiritual sem ter praticado atos meritórios, mas como um morto que reviveu, dotado de experiência suficiente para poder prosseguir em sua tarefa ascensional rumo ao Criador, em vidas futuras, na Terra ou em outras moradas da Casa do Pai. Tudo isso confirmando o dizer evangélico de que há mais alegria nos Céus por um pecador que se regenera, do que por noventa e nove justos que não precisam de arrependimento.

O irmão do Filho Pródigo, por outro lado, representa a outra parcela de seres humanos: aqueles que se encastelam nas muralhas dos dogmas, julgando-se os únicos herdeiros das coisas celestes e os monopolizadores da verdade, arrogando-se o qualificativo de eleitos ou escolhidos, não tolerando jamais que os seus irmãos, que eles qualificam de hereges venham a ser um dia recebidos na Casa do Pai, com o mesmo amor e carinho a eles dispensados.
Esses homens avocam a si o título de herdeiros do reino de Deus, fazendo-o simplesmente pelo fato de se assentarem nos bancos das igrejas e templos da Terra, cumprindo exteriormente as ordenações que suas religiões prescrevem, revoltando-se intimamente pelo fato de cobrir Deus com o seu infinito amor todos aqueles que estiveram sobrecarregados nos caminhos da vida, mas que uma experiência tardia levou de volta ao caminho do bem.

Foi a atitude egoísta de homens que pensam desse modo que levou o Cristo a proclamar: "Muitos virão do oriente e do ocidente e assentar-se-ão ao lado de Abraão, lsaac e Jacó, no Reino dos Céus."

Foi a demonstração de completa ausência de amor expressada por esses homens que levou o Cristo a exclamar: - Os publicanos e as meretrizes entrarão no Reino dos Céus adiante de vós !

Quando do advento de Jesus Cristo, muitos dos seus contemporâneos se arroganm o qualificativo de fllhos de Abraão, julgando que isso era o bastante para lhes garantir pronto acesso aos planos espirituais superiores que eles acreditavam ser a morada dos antigos profetas e patriarcas, entre eles Abraão, lsaac e Jacó. No entanto, João Batista, como precursor do advento de Jesus, disse-lhes, peremptoriamente: Não presumais de vós mesmos, dizendo: Temos por pai a Abraão, porque eu vos digo que mesmo destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão.
Mesmo a uma pessoa com o coração empedernido, no decorrrer de muitas reencarnações Deus faz com que se transmude em Espírito apto a habitar as moradas reservadas àqueles que souberam realmente seguir as pegadas dos profetas e dos grandes missionários que já vieram à Terra.

O fato de uma pessoa pertencer a esta ou àquela escola religiosa, ser deste ou daquele pensamento filosófico, desta ou daquela corrente científica, não é o bastante para que ela se enquadre nas recomendações de Jesus Cristo atinentes à observância e vivência dos seus ensinos. É imperioso, acima de tudo, o desprendimento das coisas da Terra, o abandono dos vícios e, mais do que tudo, a conquista da reforma íntima, sinônimo de conquista do Reino dos Céus, o que se faz unicamente pela prática do amor sem limitações.

Paulo A. Godoy

Livro: O Evangelho Pede Licença

terça-feira, 4 de maio de 2021

DORMIA O CRISTO OU DORMIMOS NÓS?(...)" Queremos que as coisas mudem para melhor, mas não queremos mudar , esquecidos de que as coisas não mudam, são os homens que mudam; não os outros homens, mas nós mesmos...."

A tarde chegara de mansinho. O dia fora longo e cansativo, pois eram muitas as  solicitações . Mateus diz que lhe haviam trazido muitos possessos e enfermos. Ele os curou dos males físicos e espirituais, mas a multidão continuava a envolve- lo. Marcos não menciona os endemoniados e doentes neste ponto, mas informa que ele pregara longamente em parábolas , como era de seu hábito: a parábola do semeador, a da lâmpada , a da medida - a medida com que medis , com essa mesma sereis medidos - , a da semente que cresce sozinha , a do grão de mostarda. Lucas também reporta as parábolas, mas não coloca o episódio da tempestade na mesma sequência que os seus dois companheiros evangelistas. Todos, porém,se referem com grande precisão a cena dramática no mar.

E certo , a vista dos relatos , que Jesus pediu que o transportassem a outra margem do lago. Marcos , mais minucioso, acrescenta que os apóstolos despediram o povo e o levaram enquanto outras embarcações o seguiram.

São unânimes os narradores em assegurar que o Mestre logo adormeceu, e , enquanto ele dormia, levantou se uma tempestade. Mateus diz que era tão grande o temporal que as ondas chegavam  a  encobrir a barca. Marcos diz apenas que era uma" forte borrasca" , enquanto Lucas confirmava a inundação do barco pelas aguas revoltas.

        Muita gente deve questionar a possibilidade de armar-se uma tempestade desse porte num reduzido mar interior.

        O chamado mar da Galiléia é , na verdade, um lago , através do qual fui o rio Jordão. Fica entre o atual Estado de Israel , de um lado , a Síria de outro , uma ponta da Jordânia , ao sul. Depois de atravessar o lago, o Jordão segue para o sul na direção do  mar Morto, onde termina o curso.

       O mar da Galiléia era conhecido nos tempos do Antigo Testamento por mar de Chinnereth ou Chineneroth. Tanto nos livros dos Macabeus como nas obras de Flavius Josephus é chamado de Gennesar. Nos Evangelhos o nome preferido é o mar da Galiléia, mas Lucas chama-o de Lago de Genesaré (5:1) , e João duas vezes menciona-o com o nome de Tiberíades, que , aliás, ficou consagrado na designação moderna, Bahr Tabariyeh (6:1 e  21:1).

      Toda região é um roteiro sentimental da peregrinação do Cristo, que ali viveu uma boa parte dos seus anos de pregação. Um pouco ao norte, Cafarnaum, mais abaixo , Magdala e , depois, Tiberíades. Do outro lado, Betsaida e Gadara com a Decápolis, ao sul.

     A Enciclopédia Britânica informa que as " elevações em torno do mar são cinzentas e desnudas no verão, mas se cobrem de vegetação na primavera" . " O lago - informa pouco adiante -  está profundamente embutido no meio das elevações e , consequentemente , sujeito a súbitas ventanias e violentas tempestades, que se armam rapidamente; a navegação não está livre de riscos." Os grifos são meus e servem apenas para destacar a observação moderna que confirma integralmente a informação dos evangelistas segundo a qual as tempestades são ali súbitas e violentas.

    É certo, pois, que  ao iniciar a viagem para a outra margem, o tempo estava bom e as águas calmas. O Mestre logo adormeceu e dormia ainda no fragor da tormenta.

A narrativa evangélica é extremamente sóbria e feita com enorme economia de palavras, especialmente de adjetivos.
Quando os autores dizem que a borrasca era forte e que as águas invadiam o barco, podemos acreditar neles. Aqueles homens viviam em torno do lago, onde pescavam na subsistência.
Conheciam os perigos e estavam afeitos a eles. Não há dúvida, pois, de que a tormenta foi de assustar e , por isso, decidiram despertar o Mestre, com a leve sugestão de uma censura na pergunta que lhe formularam, segundo Marcos: será que ele não se importava de que eles morressem?

   Mateus diz que Jesus primeiro os censurou pela falta de fé que haviam demonstrado com o pavor.A lição que fica, no entanto, é unânime e todos reproduzem a estupefação dos que estavam com ele na barca, ao comentarem entre si:
  - Quem é este homem a quem até os ventos e o mar obedecem?
  A pergunta ressoa até hoje, nos descampados imensos da História.

Um grupo de homens simples e puros de coração, ignorantes dos grandes mistérios da vida, seguia fielmente o seu Mestre. Dia e noite estavam à sua volta, ouviam no pregar, faziam lhe perguntas , assistiam ao seu trabalho junto aos pobres, aos doentes, aos possessos; viam no conviver com os publicanos e renegados e, no entanto, não têm noção exata de quem é ele realmente . Nunca viram alguém calar os elementos enfurecidos. Jamais alguém demonstrou tanta calma, tanta segurança e fé. E, no entanto, bastou que ele se reclinasse por alguns momentos na barca para que pensassem que os havia abandonado à sua sorte, no esquecimento do sono.

  Hoje, quando tantos séculos rolaram sobre aquela cena dramática e profunda no seu conteúdo , não temos mais o direito de especular acerca da sua grandeza. Sabemos que ele é grande, sabemos que ele não dorme, sabemos que ele mesmo ausente dos nossos olhos imperfeitos em algum ponto deste mundo e em toda parte , ele vela,dirige,aconselha,cura,prega,ensina,ama e espera.Sabemos que a sua mensagem original ficou enovelada pelo pensamento daqueles que em vez de se tornarem prisioneiros do Cristo, como dizia Paulo, preferiram a tentativa inglória e improfícua de aprisionarem o Cristo, a fim de colocá- lo a serviço de suas paixões.

E agora que novas borrascas se armam sobre o mundo - e não mais sobre o manso mar da Galiléia - , muitos temem pelos seus destinos e bradam ao Cristo , desesperados e aflitos , achando que ele dormiu e os esqueceu.

Outros muitos desejam aproveitar a confusão da tormenta para implantar de uma vez, na Terra , o reinado da treva e da prepotência. Alguns destes , num doloroso processo de auto ilusão , se dizem trabalhadores do Cristo e que , depois de restabelecido o processo do poder incontestado , reabrirão os Evangelhos para pregar novamente a palavra do Senhor

Como? Que lhe diria o Mestre se isso acontecesse?
- Jamais vos conheci, afastai vos de mim, agentes da iniquidade! (Mat. 7:23)
Não são aqueles que dizem Senhor! Senhor! que entrarão no reino dos céus, advertiu Jesus, mas aqueles que fazem a vontade do Pai, isto é, cumprem a Sua lei, trabalham incessantemente pela harmonização interior, entregam-se às tarefas do amor, não as da discórdia, da vingança, da opressão.

Estamos novamente em pleno mar da Galiléia. A tormenta agita o barco que as ondas invadem e ameaçam tragar. O céu está negro e fechado, pesado e opressivo. O terror se instalou no coração de muitos, a indiferença em outros, a loucura em tantos, a ignorância em multidões inteiras. E o Cristo mais uma vez parece dormir... Mais uma vez parece esquecido da angústias daqueles que se voltam para ele como último alento de esperança. Parece... Ou será que nós é que dormimos? Ou será que nós é que o esquecemos?

Estejamos em paz, ainda que a tormenta se avolume, e ela vai fatalmente avolumar-se . Encontramo-nos à soleira de uma nova era. chegaram os tempos anunciados das dores, porque infelizmente , na imperfeita humana condição, as mudanças trazem dores no seu bojo. Não que sejam dolorosas em si; nós é que temos preferido anestesiar o conformismo. Queremos que as coisas mudem para melhor, mas não queremos mudar , esquecidos de que as coisas não mudam, são os homens que mudam; não os outros homens, mas nós mesmos.

Estejamos certos, pois, de que o Cristo não dorme, nem nos abandonou à nossa sorte. Sua mensagem renovada pelo Espiritismo está conosco, integral, restabelecida, explicada além do que ele nos confiou naquela época,porque se ainda agora muito vacilamos no entendimento da sua palavra, que poderemos dizer daqueles tempos recuados em que até mesmo os que com ele conviviam pensavam que ele dormia...?

Livro: Candeias na noite escura
João Marcus
Pseudônimo de Hermínio C. Miranda

segunda-feira, 3 de maio de 2021

COMER PÃO, BEBER VINHO "... pão representa o corpo doutrinário de sua doutrina e o vinho significa que ela se fundamenta sobre o Espírito"...Por isso, os seguidores de Moisés comeram o maná e morreram porque o pão que pretendiam era meramente para o sustento do corpo. Jesus, no entanto, trouxe o pão espiritual, do qual quem comer terá a vida eterna, isto é, passará a assimilar as coisas que dizem respeito ao Espírito. ..."







COMER PÃO , BEBER VINHO 

"E, tomando o pão, e havendo dado graças, partiu-o, e deu-lho, dizendo: Isto é meu corpo que vos é dado.
Semelhantemente, tomou o cálice, depois da ceia, dizendo: Este cálice é o Novo testamento do meu sangue, que é derramado por vós". (Lucas, 22:19-20)

O ato comemorativo da Páscoa, da forma como é realizado na atualidade, representa flagrante contraste com tudo aquilo que Jesus Cristo objetivou ensinar através do singelo ato da última ceia, quando congregou os apóstolos para o último encontro que antecedeu a sua crucificação.

A realização da chamada última ceia tem um sentido bem mais profundo, pois o anseio do Mestre era de propiciar aos seus apóstolos um ensinamento sobre a necessidade de troca de idéias sobre a nova doutrina, confraternização, entrelaçamento, fraternidade, unificação, e obviamente constituiu um grandioso ensino endereçado à posteridade.

Entretanto, o ato realizado pelo Mestre, quando cada um dos presentes comeu um pedaço de pão e tomou um pouco de vinho, após sofrer o impacto de constante deturpações, tem servido, no decurso dos tempos, para justificar a realização de verdadeiros festins materiais, quando o vinho é utilizado em excesso, muitas vezes com danosas conseqüências, e o uso de carnes das mais variadas espécies suplantou o singelo uso do pão.

O ato tem servido mesmo para que alguns homens procurem nele uma justificativa para os excessos no uso do vinho, afirmando que Jesus Cristo era apologista do seu uso, tendo mesmo, nas Bodas de Caná, convertido água em vinho, esquecendo-se de que ainda nesse caso o Senhor teve por objetivo ensinar que as doutrinas religiosas que se fundamentam sobre as coisas do mundo, sobre as coisas materiais, terão que se espiritualizar, para atender o reclamo dos seus seguidores, pois só assim poderão tomar parte no grande festim que o Cristo definiu como "conquista do reino dos céus".
Teria Jesus Cristo se reunido com os apóstolos meramente para que juntos comessem pão e bebessem vinho, ou objetivou ele propiciar aos seus pósteros um ensinamento de grande profundidade?

Nenhum dos atos comuns da vida do Mestre deixa de encerrar uma mensagem e é óbvio que nesse caso não poderia haver exceção. O pão representa o corpo doutrinário de sua doutrina e o vinho significa que ela se fundamenta sobre o Espírito.

São numerosos os ensinos de Jesus sobre o pão espiritual e para se verificar isso basta recorrer aos Evangelhos:
"Eu sou o pão da vida. Vossos pais comeram o maná no deserto e morreram. Este é o pão que desce do céu, para que o que dele comer não morra. Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer deste pão viverá para sempre; e o pão que eu der é a minha carne, que eu darei pela vida do mundo. Assim como o Pai, que vive, me enviou, e eu vivo pelo Pai, assim, quem de mim se alimenta, também viverá por mim. Este é o pão que desceu do céu; não é o caso de vossos pais, que comeram o maná e morreram; quem comer este pão viverá para sempre" (João, 6:48-51;57-58).

Moisés prometia as coisas da Terra. Os judeus daquela época ambicionavam possuir a Terra da Promissão.
Jesus veio trazer a mensagem para ensinar aos homens a conquista das coisas do Espírito.
Por isso, os seguidores de Moisés comeram o maná e morreram porque o pão que pretendiam era meramente para o sustento do corpo. Jesus, no entanto, trouxe o pão espiritual, do qual quem comer terá a vida eterna, isto é, passará a assimilar as coisas que dizem respeito ao Espírito.

Além dos doze apóstolos, Jesus Cristo também teve outros setenta discípulos mais ou menos dedicados. Certa vez, conforme relata o evangelista João (6: 60-65), após ter proferido um discurso sobre o sentido de sua doutrina, dizendo "minha carne verdadeiramente é comida, e o meu sangue verdadeiramente é bebida", foi sumariamente abandonado por esses setenta discípulos, os quais disseram: "Duro é este discurso; quem o pode ouvir?".

O Mestre asseverou que não se pode pôr vinho novo em odres velhos, do contrário ele não suportará a fermentação e se romperá. A sua doutrina, embora tenha como um dos seus fundamentos nas leis morais recebidas por Moisés no Monte Sinai, é sempre nova e não poderá ser suportada pelos "odres velhos" de antigas concepções religiosas, pelo sistema arcaico que se fundamenta sobre leis transitórias destinadas a servirem determinada época, ou em dogmas estabelecidos por grupos ou pessoas, que sempre se insurgiram contra as idéias reformistas.

Ainda desta vez o Senhor teve por objetivo proclamar que o sentido profundo de sua doutrina estava contido na expressão "carne e sangue". Carne porque ela é um corpo individual, inalterável, sangue porque ela é dinâmica e não estática. A sua doutrina é um corpo ativo, atuante, que não pode ser compreendida nos moldes como o era até há pouco tempo: uma doutrina estanque, sem vibração, divorciada da ciência, ciosa de ser a exclusiva, monopolizadora de toda a verdade, zelosa dos seus dogmas e portadora de outros prejuízos.

O corpo doutrinário é animado pela força e pela vibração. Se qualquer uma das veias desse corpo deixar de receber o influxo do sangue, ela se esclerosa, se petrifica.

fonte:
Autor: Paulo A. Godoy
Livro: Padrões Evangélicos.

domingo, 2 de maio de 2021

LUTERO E KARDEC : UMA VISITA ÀS REGIÕES INFERIORES “Para agradar a Deus e assegurar a sua posição futura, bastará que o homem não pratique o mal?

fragmentos:

Conta-se que Allan Kardec, quando reunia os textos de que nasceria “O Livro dos Espíritos”, recolheu-se ao leito, certa noite, impressionado com um sonho de Lutero[...]o codificador da Doutrina Espírita, durante o repouso, viu-se também fora do corpo, em singular desdobramento…identificou um enviado de Planos Sublimes que o transportou, de chofre, a nevoenta região[...]rogou Kardec, emocionado —, que sofredores são estes, cujos gemidos e imprecações me cortam a alma? [...]Temos junto de nós os que estavam no mundo plenamente educados quanto aos imperativos do Bem e da Verdade, e que fugiram deliberadamente da Verdade e do Bem, especialmente os cristãos infiéis de todas as épocas, perfeitos conhecedores da lição e do exemplo do Cristo e que se entregaram ao mal, por livre vontade…



Consciência Espírita

Diz você que não compreende o motivo de tanta autocensura nas comunicações dos espíritas desencarnados. Fulano, que deixou a melhor ficha de serviço, volta a escrever, declarando que não agiu entre os homens como deveria; sicrano, conhecido por elevado padrão de virtudes, regressa, por vários médiuns, a lastimar o tempo perdido… E você acentua, depois de interessantes apontamentos: “Tem-se a impressão de que os nossos confrades tornam, do Além, atormentados por terríveis complexos de culpa. Como explicar o fenômeno?”

 

Creia, meu caro, que nutro pessoalmente pelos espíritas a mais enternecida admiração. Infatigáveis construtores do progresso, obreiros do Cristianismo Redivivo. Tanta liberdade, porém, receberam para a interpretação dos ensinamentos de Jesus que, sinceramente, não conheço neste mundo pessoas de fé mais favorecidas de raciocínio, ante os problemas da vida e do Universo. Carregando largos cabedais de conhecimento, é justo guardem eles a preocupação de realizar muito e sempre mais, a favor de tantos irmãos da Terra, detidos por ilusões e inibições no capítulo da crença.

 

Conta-se que Allan Kardec, quando reunia os textos de que nasceria “O Livro dos Espíritos”, recolheu-se ao leito, certa noite, impressionado com um sonho de Lutero, de que tomara notícias. O grande reformador, em seu tempo, acalentava a convicção de haver estado no paraíso, colhendo informes em torno da felicidade celestial.

 

Comovido, o codificador da Doutrina Espírita, durante o repouso, viu-se também fora do corpo, em singular desdobramento… Junto dele, identificou um enviado de Planos Sublimes que o transportou, de chofre, a nevoenta região, onde gemiam milhares de entidades em sofrimento estarrecedor. Soluços de aflição casavam-se a gritos de cólera, blasfêmias seguiam-se a gargalhadas de loucura.

 

Atônito, Kardec lembrou os tiranos da História e inquiriu, espantado:
Jazem aqui os crucificadores de Jesus?
— Nenhum deles — informou o guia solícito. Conquanto responsáveis, desconheciam, na essência, o mal que praticavam. O próprio Mestre auxiliou-os a se desembaraçarem do remorso, conseguindo-lhes abençoadas reencarnações, em que se resgataram perante a Lei.

 

— E os imperadores romanos? Decerto, padecerão nestes sítios aqueles mesmos suplícios que impuseram à Humanidade…
— Nada disso. Homens da categoria de Tibério ou Calígula não possuíam a mínima noção de espiritualidade. Alguns deles, depois de estágios regenerativos na Terra, já se elevaram a Esferas superiores, enquanto que outros se demoram, até hoje, internados no campo físico, à beira da remissão.

 

Acaso, andarão presos nestes vales sombrios tornou o visitante — os algozes dos cristãos, nos séculos primitivos do Evangelho?

 

— De nenhum modo — replicou o lúcido acompanhante —, os carrascos dos seguidores de Jesus, nos dias apostólicos, eram homens e mulheres quase selvagens, apesar das tintas de civilização que ostentavam…Todos foram encaminhados à reencarnação, para adquirirem instrução e entendimento.

 

O codificador do Espiritismo pensou nos conquistadores da Antiguidade, Átila, Aníbal, Alarico I,  Gengiscão… 

 

Antes, todavia, que enunciasse nova pergunta, o mensageiro acrescentou, respondendo-lhe à consulta mental:
— Não vagueiam, por aqui, os guerreiros que recordas… Eles nada sabiam das realidades do espírito e, por isso, recolheram piedoso amparo, dirigidos para o renascimento carnal, entrando em lides expiatórias, conforme os débitos contraídos…

 

— Então, dize-me — rogou Kardec, emocionado —, que sofredores são estes, cujos gemidos e imprecações me cortam a alma?

 

E o orientador esclareceu, imperturbável:
— Temos junto de nós os que estavam no mundo plenamente educados quanto aos imperativos do Bem e da Verdade, e que fugiram deliberadamente da Verdade e do Bem, especialmente os cristãos infiéis de todas as épocas, perfeitos conhecedores da lição e do exemplo do Cristo e que se entregaram ao mal, por livre vontade… Para eles, um novo berço na Terra é sempre mais difícil…

 

Chocado com a inesperada observação, Kardec regressou ao corpo e, de imediato, levantou-se e escreveu a pergunta que apresentaria, na noite próxima, ao exame dos mentores da obra em andamento e que figura como sendo a questão número 642, de “O Livro dos Espíritos”: ( “Para agradar a Deus e assegurar a sua posição futura, bastará que o homem não pratique o mal?”, indagação esta a que os instrutores retorquiram: “Não; cumpre-lhe fazer o bem, no limite de suas forças, porquanto responderá por todo o mal que haja resultado de não haver praticado o bem.”

 

Segundo é fácil de perceber, meu amigo, com princípios tão claros e tão lógicos, é natural que a consciência espírita, situada em confronto com as ideias dominantes nas religiões da maioria, seja muito diferente.

.Irmão X
fonte:

LIVRO : CARTAS E CRÔNICAS - CAP. 7 : CONSCIÊNCIA ESPÍRITA
PSICOGRAFADO POR FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER 
PELO ESPÍRITO: IRMÃO X 


quinta-feira, 29 de abril de 2021

O ÓBULO DA VIÚVA POBRE " Seu ato foi, portanto, um ato de santidade, porque de suprema renúncia."

O ÓBULO DA VIÚVA POBRE
 
"Sentando-se Jesus em frente ao gazofilácio, observava como o povo punha ali as suas dádivas. Muitos ricos deitavam grandes quantias; chegando, porém, uma pobre viúva, lançou duas pequenas moedas, que valem um quadrante. Chamando, então, Jesus os seus discípulos, disse-lhes: Em verdade vos digo que esta pobre viúva deu mais que todos os ofertantes; pois estes deram do que lhes sobrava; ela, porém, da sua pobreza deu tudo o que possuía, tudo de que dispunha para o seu sustento".

Vendo em Jesus o Mestre, o Educador que ensina através das páginas do livro da vida fazendo do mundo uma escola, vamos considerar o fruto de sua observação, com respeito à dádiva dos ricos e à da viúva pobre. 

 Narra o texto que Jesus acompanhava o gesto daqueles que depositavam no tesouro do templo as suas ofertas. O excelso intérprete da justiça divina verificou que os homens ricos lançavam vultosas somas no gazofilácio, julgando, talvez, assegurar com seu ouro uma bela posição no reino dos céus. O que, porém, chamou a atenção dele, de modo particular, foi a insignificante oferta da viúva pobre, que deitou no cofre sacro duas moedinhas de cobre, no valor dum quadrante, ou seja, 4 centavos.

O Mestre observa a atitude daquela mulher, penetra o seu íntimo, devassa os recessos mais secretos do seu coração e predica assim aos discípulos: Em verdade vos digo que esta pobre viúva deitou mais na arca do templo que todos os ofertantes. Porque estes deram do que lhes sobrava; ela, porém, da sua pobreza deu tudo o que possuía, tudo o que tinha reservado para o seu sustento. É significativa a expressão — em verdade vos digo — com que Jesus costumava preceder as sentenças graves que proferia. Em verdade quer dizer na realidade, de fato, isto é assim, e não como os homens querem que seja, ou supõem que há de ser.

A linguagem humana é capciosa: traduz o convencionalismo de cada época; reflete a opinião sempre errônea e falsa da conceituação vigente adotada pela maioria, ou, ainda, a expressão da ignorância oficializada pelos usos e costumes sociais. Apartando-se deste círculo vicioso, o Sábio Instrutor da humanidade acentua que o seu dizer é — em verdade — isto é, fora de todo o conceito terreno eivado de dolo; fora de todo o juízo humano pronunciado levianamente, sem conhecimento de causa, na ignorância dos fatores ocultos que determinam os acontecimentos e os fenômenos que caem sob o domínio dos sentidos.

Ele estava em condições de apreciar os fatos da vida com justeza, pois que não os julgava pelas aparências, porém mediante plena compreensão dos elementos que entram em jogo para produzi-lo. Daí a sua autoridade acerca dos julgamentos que emitia e das lições que ministrava, fazendo-as preceder desta advertência: em verdade vos digo. Vejamos, agora, o que Ele, em verdade, nos ensina neste caso do óbolo da viúva pobre.

A maneira como Jesus aprecia o mérito ou demérito das nossas obras difere, sobremaneira, do critério, usado pelos homens. No episódio, que ora nos serve de tema, vemos que Ele reputou a oferenda da viúva como a maior de todas depositadas no gazofilácio. Nada obstante, foi a menor, a mais pequenina numericamente falando. Isto porque o Mestre se louvou, não nas aparências, isto é, no que se podia perceber com os sentidos, mas nos motivos íntimos que impeliram os ofertantes a lançar suas dádivas na arca do templo. Por que o fizeram eles? Quais os fatores que preponderaram no ânimo dos ricos para que dessem grandes somas?
A vaidade, talvez, porque as ofertas eram feitas publicamente; o interesse — quem sabe? — de comprar com o seu ouro a simpatia dos deuses, esperando, por esse processo, alcançar a desejada felicidade futura; ou, ainda, para serem agradáveis aos influentes sacerdotes e aos poderosos pontífices, usufrutários e desfrutadores das rendas do templo. Tais motivos, por si só, invalidam, moralmente, as mais vultosas dádivas. Os que agiram visando àqueles alvos já receberam a sua recompensa, de acordo com os planos concebidos.

Quanto à viúva, cabe-lhe o mérito da máxima sinceridade com que agiu. Essa virtude é que dá valimento ao seu gesto. Ela considerava a espórtula ao templo como um dever sagrado, portanto imprescindível. A prova do que dizemos está no esforço que fez; mais do que esforço, no sacrifício, visto como se privou do único recurso pecuniário de que dispunha, o qual se destinava ao seu próprio sustento! Seu ato foi, portanto, um ato de santidade, porque de suprema renúncia.

A soma total de todo o ouro, deitado, no decurso dos séculos, no gazofilácio do famoso templo de Jerusalém, não valia, por certo, a excelsitude do sentimento que, do fundo do coração daquela pobre mulher desprotegida, a compeliu a privar-se das suas duas únicas moedinhas, reservadas para atender à mais premente e cruel das necessidades humanas — que é o pão de cada dia.

O Soberano Intérprete da divina justiça costumava computar, no seu julgamento, os valores morais, e não somente os de ordem material, como fazem os homens. Por isso teve em maior estimação a mesquinha oferta da viúva, comparada com a opulenta doação dos ricos: estes, sem nenhum esforço deram uma insignificante parcela do muito que possuíam. O juízo humano se funda no testemunho dos sentidos. O juízo divino se baseia no critério da razão e no senso do coração. A verdade, como disse muito bem Flammarion, não está no que vemos, mas naquilo que escapa à apreciação dos nossos órgãos visuais.

A balança da excelsa justiça não pesou o ouro que os ricos deitaram no gazofilácio, mas sim, o ouro que eles retiveram em seu poder. Estabelecido o confronto, constatou que a dádiva foi exígua. No que respeita, porém, à viúva pobre, a oferta foi maravilhosa, pois que ela havia dado tudo quanto tinha. Quem dá tudo que possui dá o máximo. Não é possível haver dádiva maior. Tal o critério que Jesus empregou ao proferir a sentença: Em verdade vos digo que esta pobre viúva deu mais que todos os ricos.

Pela ordem destas considerações, ou seja, por associação natural de idéias em torno deste episódio evangélico, ocorre-nos à mente um fato que nos vem provar quanto a nossa sociedade vive divorciada dos precípuos elementos de justiça. Queremos nos referir à maneira de aquilatar-se o valor do trabalho, de onde decorre, conseqüentemente, a distribuição da riqueza. Costuma-se dividir o trabalho humano em duas categorias: o intelectual e o manual, isto é, o da inteligência e o dos músculos.
Os primeiros fazem jus a remunerações desproporcionalmente maiores que os últimos. O trabalho intelectual chega, por vezes, à culminância de um valor meramente estimativo, fora de qualquer princípio de equidade, enquanto que o labor dos músculos, quanto mais rude e mais penoso, tanto menos valia representa. Será justa semelhante maneira de julgar o produto da atividade humana? Por que motivo vale muito o esforço intelectual e vale pouco, quase nada, o esforço muscular? Será, talvez por que se empresta uma certa nobreza ao trabalho intelectual? Mas será, acaso, menos elevado ou menos nobre o trabalho manual?

Parece-nos que aqueles que arroteiam o solo, abrindo leiras para receber a semente no milagre cotidiano da multiplicação dos pães, exercem o mais humano e santo dos labores. Demais, o que cumpre considerarmos é a utilidade do trabalho executado. A significação do vocábulo trabalho, segundo os economistas, é a atividade humana empregada na produção de utilidades. Ora, o trabalho dos músculos é tão necessário à sociedade como o da inteligência. Um não é, em rigor, superior a outro, porque ambos os ramos de atividade preenchem as necessidades da vida humana.

Onde, pois, a razão de tamanha disparidade no cômputo que se faz dos produtos manuais em comparação com os intelectuais? A única explicação está em que são os intelectuais que fazem as leis e regulam a sua aplicação na sociedade. Vivemos sob o despotismo da inteligência. Daí procede a iniquidade. Sim, a iniquidade porquanto o lixeiro ou o cavoucador que despende o seu maior esforço e que, como a viúva pobre, dá tudo quanto tem, merece perceber um salário que lhe proporcione, e à sua família, relativo conforto e bem-estar. Eles têm direito à vida e aos legítimos prazeres que refrigeram e amenizam as asperezas da luta cotidiana.

O que Jesus apreciou na dádiva da viúva foi o supremo esforço que ela empregou, despojando-se de tudo que possuía, para atender às solicitações da sua crença. Por isso, e só por isso, as suas duas moedinhas de cobre valiam mais que os punhados de ouro que os nababos daquela época lançaram na arca do templo. Apliquemos este critério no valor que damos ao trabalho, e cheguemos à conclusão de que muito merece aquele que muito se esforça, aquele que faz o melhor que pode no exercício do mister que exerce, seja este de que natureza for.

Em realidade, todo o trabalho é intelectual. Os músculos são dirigidos pela inteligência. Não há labor puramente manual, pois que o homem não é máquina de função mecânica e monótona. Os que exercem os rudes misteres musculares são aqueles cuja inteligência ainda não foi educada suficientemente para lhes proporcionar um trabalho menos árduo e mais compensador.

Neste mundo, dadas as suas condições de planeta atrasado, de mundo expiatório, os que sabem mais se locupletam dos que sabem menos, sendo esta a razão das formidáveis desproporções no aquilatar-se o valor das várias modalidades de trabalho, e, como consequência, da distribuição da riqueza.

E, assim se explica a advertência do Mestre dirigida aos seus discípulos: Se a vossa justiça não for superior à dos escribas e fariseus, não entrareis no reino de Deus. A justiça que vigora neste mundo é justiça de escribas e fariseus, cujos frutos são a miséria, as rivalidades e as guerras.

Vinícius

Do Livro : Na Escola do Mestre