Parte Segunda
Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos
CAPÍTULO IV
DA PLURALIDADE DAS EXISTÊNCIAS
Parentesco, filiação
205. A algumas pessoas a doutrina da reencarnação se afigura
destruidora dos laços de família, com o fazê-los anteriores à existência atual.
“Ela os distende; não os destrói. Fundando-se o
parentesco em afeições anteriores, menos precários são os laços existentes
entre os membros de uma mesma família. Essa doutrina amplia os deveres da
fraternidade, porquanto, no vosso vizinho, ou no vosso servo, pode achar-se um
Espírito a quem tenhais estado presos pelos laços da consangüinidade.”
a) - Ela, no entanto, diminui a importância que alguns
dão à genealogia, visto que qualquer pode ter tido por pai um Espírito que haja
pertencido a outra raça, ou que haja vivido em condição muito diversa.
“É exato; mas essa importância assenta no orgulho. Os
títulos, a categoria social, a riqueza, eis o que esses tais veneram nos seus
antepassados. Um, que coraria de contar, como ascendente, honrado sapateiro,
orgulhar-se-ia de descender de um gentil-homem devasso. Digam, porém, o que
disserem, ou façam o que fizerem, não obstarão a que as coisas sejam como são,
que não foi consultando-lhes a vaidade que Deus formulou as leis da Natureza.”
COMENTÁRIO
DO ESPÍRITO MIRAMEZ NA OBRA “FILOSOFIA ESPÍRITA”
FILOSOFIA ESPÍRITA - VOLUME V
Questão 205 comentada
CAPÍTULO 01
0205/LE
AMOR UNIVERSAL
A doutrina da reencarnação não se afigura como destruidora
dos laços de família. Pelo contrário, ela, como lei que vigora em todos os
mundos onde os Espíritos reencarnam, alicerça a verdadeira fraternidade, por
alimentar o amor universal entre todas as criaturas.
Cultivar o amor somente entre os ancestrais, oferecer
atenção somente àqueles com os quais convivemos, amar só os nossos familiares a
consciência em Cristo nos diz que reforça o egoísmo e o próprio orgulho, não só
dos que nos acompanham como, igualmente, de toda uma raça.
A lei da reencarnação é divina por eliminar os limites de
onde poderemos viver. Negá-la é desconhecer Jesus, que nos pede para amar a
Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos, e acrescentamos:
amar a todos e a tudo, pois, se a criação vem de Deus, somos todos irmãos, na
graça e misericórdia do Senhor.
O princípio das vidas sucessivas nunca destrói os lares; ele
os distende ao infinito e se forma na Terra uma única família para que tenhamos
oportunidade de exercitar o amor; sem a reencarnação, não há condições de se
estender o amor além das fronteiras do lar. Mas, com o tempo, as almas vão
crescendo e percebendo, que precisam umas das outras, mesmo que se encontrem
distantes. Basta ao homem olhar o que come, o que usa e o que não foi feito por
suas próprias mãos nem pelos seus familiares e que, por vezes, vieram de fora,
de outras nações. Façamos como o ar e as águas, que desconhecem barreiras de
estados e nações, levando o conforto e a alegria onde quer que seja. Imitemos o
sol: a sua luz se divide, manifestando saúde e doando vida onde pode alcançar
para servir.
O conhecimento das vidas múltiplas destrói a importância
exagerada que dispensamos aos nossos parentes, porque pode nos levar a nascer
em vários lugares, percebendo, por intuição na recordação silenciosa, que a
vida é amor, aquele amor que não se transforma em exigências, que não se vende
e nem se compra, força criadora de harmonia e de paz, trabalhando no
soerguimento de todos os caídos, por prazer de servir.
A falsa idéia de sangue real é que faz muitos negarem a
reencarnação. O apego às heranças é embaraço para se crer que nascemos tantas
vezes quantas forem necessárias; contudo, Deus não nos pediu opinião para fazer
as leis que correspondem às nossas necessidades de despertamento espiritual.
Quem ainda não deseja entender a lei da reencarnação esteja certo de que o
tempo se encarregará dele e a escola das vidas sucessivas ensinará que essa
lei, como dogma divino, é para o seu próprio bem, porque nos ajuda a entender e
vivenciar o amor universal.
Trocamos os muitos corpos na nossa caminhada, para que
possamos abolir o carma, corrigindo erros e ampliando nossos conhecimentos
sobre a vida que continua em todas as direções do existir. Quem deseja ser
livre haverá de conhecer a verdade, assim nos diz Nosso Senhor Jesus Cristo.
Deus não consulta a vaidade dos homens para formular leis no universo,
repetimos.
Quem não pôde ainda conceber a lei da reencarnação, como
bênção de Deus em nosso favor, que medite sobre ela, que ore pedindo
inspiração. O céu nunca foi pobre de conhecimentos, principalmente no que tange
à libertação dos Espíritos. Para derrubar o passado, não basta alguns segundos
de arrependimento. O arrependimento na reforma interna, pelo amor e pela
caridade, pelo trabalho e pela compreensão. Tudo que possamos ver e sentir,
troca de formas periodicamente, porque a vida é movimento, sendo que é a mesma
luz divina que move as formas que cada vez mais ascendem para a luz da verdade.
Quem nasce, renasce; esta é a lei.
http://www.olivrodosespiritoscomentado.com/fev5q205c.html
Revista Espírita 1862 » Março » Os Espíritos e o brasão
Entre os argumentos apresentados por certas pessoas em
oposição à doutrina da reencarnação, um há que devemos examinar porque, à
primeira vista, parece especioso.
Dizem que ela tenderia a romper os laços da família,
multiplicando-os, pois aquele que concentrasse sua afeição sobre o pai deveria
reparti-la por tantos pais quantas as reencarnações. Como, então, uma vez no
mundo dos Espíritos, se reconhecer no meio dessa progenitura? Por outro lado,
em que se torna a filiação dos antepassados, se aquele que se julga descendente
em linha reta de Hugo Capeto ou de Godofredo de Bulhões viveu várias vezes? Se,
depois de ter sido um grão senhor, pode tornar-se um plebeu? Eis, assim, toda
uma linhagem derrubada!
Para começar responderemos que de duas uma: ou isso é ou não
é. Se for, todas as recriminações pessoais não impedirão que seja, porque, para
regular a ordem das coisas, Deus não pede conselho a este ou àquele, do
contrário cada um quereria que o mundo fosse regido à sua vontade. Quanto à
multiplicidade dos laços de família, diremos que certos pais não têm senão um
filho, enquanto outros têm dez, doze e mais. Já se pensou em acusar Deus de
obrigá-los a dividir a afeição em tantas partes? E esses filhos, que por sua
vez têm filhos, tudo isso não forma uma família numerosa da qual avô ou bisavô
se vangloria, em vez de lamentar-se? Vós, que fazeis vossa genealogia remontar
a cinco ou seis séculos, uma vez no mundo dos Espíritos, não devereis partilhar
a vossa afeição entre todos os vossos ascendentes? Se vos atribuís uma dúzia de
avós, então tereis o duplo ou o triplo, eis tudo! Mas tendes uma ideia muito
mesquinha dos vossos sentimentos afetuosos, pois temeis que não bastem para
querer a várias pessoas. Tranquilizai-vos, porém. Vou provar que com a
reencarnação vossa afeição será menos dividida do que se não existisse. Com
efeito, suponhamos que na vossa genealogia contásseis cinquenta avós, tanto
ascendentes diretos quanto colaterais, o que é pouco, se remontardes às
cruzadas. Pela reencarnação pode ser que alguns dentre eles voltem várias
vezes, e que assim, em lugar de cinquenta Espíritos que contais na Terra, só
encontreis a metade no outro mundo.
Passemos à questão de filiação. Com o vosso sistema chegais
a um resultado diferente daquele que esperais. Se não houver preexistência,
anterioridade da alma, a alma ainda não viveu. Nesse estado de coisas, não tem nenhuma
relação com nenhum dos vossos antepassados. Suponhamos que
descendais em linha reta de Carlos Magno. O que é que há de comum entre vós e
ele? O que foi que vos transmitiu intelectual e moralmente? Nada, absolutamente
nada. Por que vos apegais a ele? Por uma série de corpos que apodreceram todos,
destruídos e dispersados? Não há nisso por que vos sentirdes orgulhosos. Com a
preexistência da alma, ao contrário, podeis ter tido com os vossos antepassados
relações reais, sérias e mais lisonjeiras para o amor-próprio. Portanto, sem a
reencarnação existe apenas um parentesco corporal, pela transmissão de
moléculas orgânicas da mesma natureza que a dos cavalos puro-sangue. Com a
reencarnação há um parentesco espiritual. Qual dos dois é melhor?
Certamente objetareis que com a reencarnação um Espírito
estranho pode infiltrar-se na vossa linhagem e que, em vez de nela contar
apenas gentis-homens, pode-se aí encontrar um sapateiro. É perfeitamente certo,
mas isso não quer dizer nada. São Pedro era um pobre pescador. Ele não seria de
uma casa suficientemente digna que nos fizesse corar por tê-lo em nossa
família?
Depois, entre seus antepassados de nomes brilhantes, tiveram
todos uma conduta edificante, a nosso ver a única coisa de que, até certo
ponto, nos poderíamos honrar, posto o seu mérito nada tenha com o nosso? Que se
perscrute a vida particular desses paladinos, desses grandes barões que
roubavam sem escrúpulos os transeuntes e que, em nossos dias, seriam
simplesmente arrastados à barra do tribunal por seus grandes feitos; de certos
grão senhores para quem a vida de um vilão não valia uma peça de caça, pois
faziam enforcar um homem por causa de um coelho. Tudo isso eram pecadilhos que
não manchavam brasões. Mas fazer um casamento desigual; introduzir na família
um sangue plebeu era um crime imperdoável. Ora, por mais que se faça, quando
soar a hora da partida ─ e soa para os grandes como para os pequenos ─ terão
que deixar na Terra as roupas bordadas e os pergaminhos de nada servirão diante
do juiz supremo, que pronuncia esta sentença terrível: Aquele que se exaltar
será humilhado!
Se bastasse descender de qualquer grande homem para ter seu
lugar marcado previamente no Céu, a gente o compraria barato, pois custaria
apenas o mérito alheio. A reencarnação dá uma nobreza mais meritória ─ a única
aceita por Deus ─ a de haver pessoalmente animado uma série de homens de
bem. Feliz aquele que puder depor aos pés do Eterno o tributo dos serviços
feitos à Humanidade em cada uma de suas existências, porque a soma de seus
méritos será proporcional ao número de suas existências. Mas àquele que apenas
puder prevalecer-se da ilustração de seus antepassados, perguntará Deus: “Por
que vós mesmo não vos ilustrastes?”.
Um outro sistema poderia, aparentemente, conciliar as
exigências do amor-próprio com o princípio da não reencarnação. É aquele pelo
qual o pai não transmitiria ao filho apenas o corpo, mas também uma porção da
alma, de modo que, se descendêsseis de Carlos Magno, vossa alma poderia ter seu
tronco na dele. Muito bem. Vejamos, porém, a que consequência chegamos. Em
virtude de tal sistema, a alma de Carlos Magno teria o seu tronco na de seu pai
e, assim, elo por elo, chegaríamos a Adão. Se a alma de Adão é o tronco de
todas as almas do gênero humano, as quais transmitem aos sucessores uma porção
de si própria, as almas atuais seriam um produto de fracionamento tal que
ultrapassaria todas as subdivisões homeopáticas. Disso resultaria que a alma do
pai comum deveria ser mais completa e mais inteira que a dos descendentes.
Resultaria, ainda, que Deus teria criado apenas uma alma, que se subdividiria
ao infinito e assim cada um de nós não seria uma criação direta de Deus.
Aliás, tal sistema deixaria imenso problema a ser resolvido:
o das aptidões especiais. Se o pai transmitisse a seu filho os atributos de sua
alma, necessariamente transmitiria suas virtudes e seus vícios, seus talentos e
sua inépcia, como lhe transmite certas enfermidades congênitas. Como, então,
explicar por que homens virtuosos ou de gênio têm filhos maus ou cretinos e
vice-versa? Por que uma linhagem seria misturada de bons e de maus? Dizei, ao
contrário, que cada alma é individual; que tem existência própria e
independente; que progride em virtude de seu livre-arbítrio, por uma série de
existências corporais, em cada uma das quais adquire algo de bom e deixa algo
de mau, até que tenha atingido a perfeição, e tudo se explica, tudo se acomoda
à razão, à justiça de Deus, mesmo em proveito do amor-próprio.
O Sr. Salgues, de Antuérpia, de quem falamos no número
passado, não é partidário da reencarnação. Depois do aparecimento de O Livro
dos Espíritos ele escreveu-nos uma longa carta, na qual combatia essa
doutrina com argumentos baseados na sua incompatibilidade com os laços de
família. Nessa carta, datada de 18 de setembro de 1857, dá-nos a sua
genealogia, que remonta aos carolíngios e pergunta em que se torna essa
gloriosa filiação, com a mistura de Espíritos pela reencarnação. Dela extraímos
a seguinte passagem:
“Mas para que serviriam os quadros genealógicos? Tenho o meu
completo, regular: de um lado, desde os antepassados de Carlos
Magno, e do outro, desde a filha do emir Muza, um dos descendentes abassidas de
Maomé, décima geração por seu casamento com Garcia, príncipe de Navarra, pai,
com ela, de Garcia Ximenes, rei de Navarra; e, enfim, essa genealogia
continuou, por meio de alianças, por soberanos de quase todas as cortes da
Europa, até a época de Afonso VI, rei de Castela, depois nas casas de Comminges,
de Lascaris Vintimille, de Montmorency, de Turenne e finalmente dos condes e
senhores Pelhasse de Salgues, no Languedoc.
“Tudo isto se pode verificar na Arte de verificar as
datas, nos Beneditinos de Saint-Maur, no Dicionário da nobreza da
França, no Armorial, no Padre Anselmo, Noreri, etc. Mas se não nos
ligamos aos nossos pais senão pela matéria carnal que recebeu o nosso Espírito,
não há em toda parte lacunas e soluções de continuidade? É um caminho traçado
na areia, que se perde em milhares de direções.
Então, que nos seja permitido crer que se o Espírito não se
transmite, a alma é para o homem o que o aroma é para a flor. Ora, Swedenborg
não diz nos Arcanos que nada se perde na Natureza, e que o aroma das flores
reproduz novas flores em outras regiões, que não aquela de onde saiu? É, pois,
pela alma, que não é Espírito, que talvez existisse uma cadeia semiespiritual
das gerações. Se tivesse contentado ao meu Espírito saltar oito ou dez
gerações de vez em quando, onde poderia reconhecer meus antepassados?”
Como se vê, o Sr. Salgues não se apega senão à procedência
do corpo. Como, porém, conciliar as relações de Espírito a Espírito com a não
preexistência da alma? Se houvesse entre eles, na filiação, relações
necessárias, como o descendente de tantos soberanos seria hoje um simples
proprietário anjuvino? Aos olhos do mundo não é uma
regressão? Não pomos em dúvida a autenticidade de sua genealogia, e o
felicitamos por ela, desde que isso lhe dá prazer, mas diremos que o prezamos
mais por suas virtudes pessoais do que pelas dos antepassados.
A autoridade de Swedenborg é muito contestável, quando
atribui ao aroma a reprodução das flores. Esse óleo essencial, volátil, que lhe
dá o aroma, jamais teve a faculdade reprodutora, que reside unicamente no
pólen. Falta, portanto, justeza à comparação, pois se a alma apenas influencia,
com seu perfume, a alma que a sucede, não a cria. Contudo, deveria
transmitir-lhe suas próprias qualidades e, em tal hipótese, não vemos por que o
descendente de Carlos Magno não teria enchido o mundo com o brilho de suas
ações, enquanto que Napoleão se apoiaria sobre uma alma vulgar. Diga-se, no
entanto, que Napoleão descende de Carlos Magno, ou melhor, que ele foi Carlos
Magno, que veio no século dezenove continuar a obra começada no oitavo, e a
gente compreenderá. Mas, com o princípio da unicidade da existência, nada liga
Carlos Magno aos seus descendentes, a não ser esse aroma, transmitido pouco a
pouco sobre almas não criadas. Então, como explicar por que, entre seus descendentes,
houve tantos homens nulos e indignos, e por que Napoleão é um gênio muito maior
do que seus obscuros antepassados?
Faça-se o que se fizer, sem a reencarnação, a gente se bate,
a cada passo, contra dificuldades insolúveis, que só a preexistência da alma
resolve de maneira ao mesmo tempo simples, lógica e completa, porque dá a razão
de tudo.
Outra questão. Um fato conhecido é que as famílias se
abastardam e degeneram quando as alianças não saem da linha direta. Dá-se nas
raças humanas o mesmo que nas raças animais. Por que, então, a necessidade de
cruzamentos? Em que se torna, então, a unidade do tronco? Não há aí uma mistura
de Espíritos, uma intrusão de Espíritos estranhos à família?
Um dia abordaremos este grave
problema, com todos os desenvolvimentos que o assunto comporta.
O Evangelho segundo o Espiritismo » Capítulo IV - Ninguém
poderá ver o reino de Deus se não nascer de novo » A reencarnação fortalece os
laços de famíla, » 18
AO PASSO QUE A UNICIDADE DA EXISTÊNCIA OS ROMPE
18. Os laços de família não sofrem destruição alguma com a
reencarnação, como o pensam certas pessoas. Ao contrário, tornam-se mais
fortalecidos e apertados. O princípio oposto, sim, os destrói.
No espaço, os Espíritos formam grupos ou famílias
entrelaçados pela afeição, pela simpatia e pela semelhança das inclinações.
Ditosos por se encontrarem juntos, esses Espíritos se buscam uns aos outros. A
encarnação apenas momentaneamente os separa, porquanto, ao regressarem à
erraticidade, novamente se reúnem como amigos que voltam de uma viagem. Muitas
vezes, até, uns seguem a outros na encarnação, vindo aqui reunir-se numa mesma
família, ou num mesmo círculo, a fim de trabalharem juntos pelo seu mútuo
adiantamento. Se uns encarnam e outros não, nem por isso deixam de estar unidos
pelo pensamento. Os que se conservam livres velam pelos que se acham em
cativeiro. Os mais adiantados se esforçam por fazer que os retardatários
progridam. Após cada existência, todos têm avançado um passo na senda do
aperfeiçoamento. Cada vez menos presos à matéria, mais viva se lhes torna a
afeição recíproca, pela razão mesma de que, mais depurada, não tem a
perturbá-la o egoísmo, nem as sombras das paixões. Podem, portanto, percorrer,
assim, ilimitado número de existências corpóreas, sem que nenhum golpe receba a
mútua estima que os liga.
Está bem visto que aqui se trata
de afeição real, de alma a alma, única que sobrevive à destruição do corpo,
porquanto os seres que neste mundo se unem apenas pelos sentidos nenhum motivo
têm para se procurarem no mundo dos Espíritos. Duráveis somente o são as
afeições espirituais; as de natureza carnal se extinguem com a causa que lhes
deu origem. Ora, semelhante causa não subsiste no mundo dos Espíritos, enquanto
a alma existe sempre. No que concerne às pessoas que se unem exclusivamente por
motivo de interesse, essas nada realmente são umas para as outras: a morte as
separa na Terra e no céu.
O
Evangelho segundo o Espiritismo » Capítulo XI - Amar o próximo como a si mesmo
» Instrução dos Espíritos » A lei de amor » A lei de amor
8.
O amor resume a doutrina de Jesus toda inteira, visto que esse é o sentimento
por excelência, e os sentimentos são os instintos elevados à altura do
progresso feito. Em sua origem, o homem só tem instintos; quando mais avançado
e corrompido, só tem sensações; quando instruído e depurado, tem sentimentos. E
o ponto delicado do sentimento é o amor, não o amor no sentido vulgar do termo,
mas esse sol interior que condensa e reúne em seu ardente foco todas as
aspirações e todas as revelações sobre-humanas. A lei de amor substitui a
personalidade pela fusão dos seres; extingue as misérias sociais. Ditoso aquele
que, ultrapassando a sua humanidade, ama com amplo amor os seus irmãos em
sofrimento! ditoso aquele que ama, pois não conhece a aflição da alma, nem a do
corpo. Seus pés são leves e vive como que transportado, fora de si mesmo.
Quando Jesus pronunciou a divina palavra – amor, os povos sobressaltaram-se e
os mártires, ébrios de esperança, desceram ao circo.
O
Espiritismo a seu turno vem pronunciar uma segunda palavra do alfabeto divino.
Estai atentos, pois essa palavra ergue a pedra dos túmulos vazios, e a reencarnação, triunfando da morte,
revela ao homem deslumbrado o seu patrimônio intelectual. Já não é ao suplício
que ela o conduz, mas à conquista do seu ser, elevado e transfigurado. O sangue
resgatou o Espírito e o Espírito deve hoje resgatar o homem da matéria.
Disse
eu que em seu começo o homem só tem instintos; aquele, pois, em quem os
instintos dominam está mais perto do ponto de partida do que do fim. Para
avançar na direção do objetivo precisa vencer os instintos em proveito dos
sentimentos, isto é, aperfeiçoar estes últimos, sufocando os germes latentes da
matéria. Os instintos são a germinação e os embriões do sentimento; trazem
consigo o progresso, como a glande encerra em si o carvalho, e os seres menos
adiantados são os que, despojando-se pouco a pouco de suas crisálidas, se
conservam escravizados aos seus instintos. O Espírito deve ser cultivado como
um campo. Toda a riqueza futura depende do labor presente, que vos granjeará
muito mais do que bens terrenos: a elevação gloriosa. É então que,
compreendendo a lei de amor que liga todos os seres, buscareis nela os gozos
suaves da alma, prelúdios das alegrias celestes. – Lázaro.
(Paris, 1862.)
9.
O amor é de essência divina e todos vós, do primeiro ao último, tendes, no
fundo do coração, a centelha desse fogo sagrado. Este é um fato que já haveis
podido constatar muitas vezes: o homem, por mais abjeto, vil e criminoso que
seja, vota a um ente ou a um objeto qualquer viva e ardente afeição à prova de
tudo quanto tendesse a diminuí-la e que alcança, não raro, sublimes proporções.
A
um ente ou um objeto qualquer, disse eu, porque há entre vós indivíduos que,
com o coração a transbordar de amor, despendem tesouros desse sentimento com
animais, plantas e, até, com coisas materiais: espécies de misantropos que, a
se queixarem da Humanidade em geral e a resistirem ao pendor natural de suas
almas, que buscam em torno de si a afeição e a simpatia, rebaixam a lei de amor
à condição de instinto. Entretanto, por mais que façam, não logram sufocar o
gérmen vivaz que Deus lhes depositou nos corações ao criá-los. Esse gérmen se
desenvolve e cresce com a moralidade e a inteligência e, embora comprimido
amiúde pelo egoísmo, torna-se a fonte das santas e doces virtudes que geram as
afeições sinceras e duráveis e ajudam a criatura a transpor o caminho escarpado
e árido da existência humana.
Há
pessoas a quem repugna a reencarnação, com a idéia de que outros venham a
partilhar das afetuosas simpatias de que são ciosas. Pobres irmãos! o vosso
afeto vos torna egoístas; o vosso amor se restringe a um círculo íntimo de
parentes e de amigos, sendo-vos indiferentes os demais. Pois bem! para
praticardes a lei de amor, tal como Deus o entende, preciso se faz chegueis
passo a passo a amar a todos os vossos irmãos indistintamente. A tarefa é longa
e difícil, mas cumprir-se-á: Deus o quer e a lei de amor constitui o primeiro e
o mais importante preceito da vossa nova doutrina, porque é ela que um dia matará
o egoísmo, qualquer que seja a forma sob que se apresente, dado que, além do
egoísmo pessoal, há também o egoísmo de família, de casta, de nacionalidade.
Disse Jesus: “Amai o vosso próximo como a vós mesmos.” Ora, qual o limite com
relação ao próximo? Será a família, a seita, a nação? Não; é a Humanidade
inteira. Nos mundos superiores, o amor recíproco é que harmoniza e dirige os
Espíritos adiantados que os habitam, e o vosso planeta, destinado a um
progresso em breve, pela sua transformação social, verá praticada por seus
habitantes esta sublime lei, reflexo da Divindade.
Os
efeitos da lei de amor são o melhoramento moral da raça humana e a felicidade
durante a vida terrestre. Os mais rebeldes e os mais viciosos se reformarão,
quando observarem os benefícios resultantes da prática deste preceito: Não
façais aos outros o que não quiserdes que vos façam; fazei-lhes, ao contrário,
todo o bem que vos esteja ao alcance fazer-lhes.
Não
acrediteis na esterilidade e no endurecimento do coração humano; ao amor verdadeiro,
ele, a seu mau grado, cede. É um ímã a que não lhe é possível resistir. O
contacto desse amor vivifica e fecunda os germens dessa virtude que está em
vossos corações em estado latente. A Terra, orbe de provação e de exílio, será
então purificada por esse fogo sagrado e verá praticada a caridade, a
humildade, a paciência, o devotamento, a abnegação, a resignação e o
sacrifício, virtudes todas filhas do amor. Não vos canseis, pois, de escutar as
palavras de João, o Evangelista. Como sabeis, quando a enfermidade e a velhice
o obrigaram a suspender o curso de suas prédicas, limitava-se a repetir estas
doces palavras: “Meus filhinhos, amai-vos uns aos outros.”
Caros
irmãos, aproveitai essas lições; é difícil o praticá-las, porém, a alma colhe
delas imenso bem. Crede-me, fazei o sublime esforço que vos peço: “Amai-vos” e
vereis a Terra em breve transformada num Paraíso onde as almas dos justos virão
repousar. – Fénelon. (Bordeaux, 1861.)
10.
Meus caros condiscípulos, os Espíritos aqui presentes vos dizem, por meu
intermédio: “Amai muito, a fim de serdes amados.” É tão justo esse pensamento,
que nele encontrareis tudo o que consola e abranda as penas de cada dia; ou
melhor: pondo em prática esse sábio conselho, elevar-vos-eis de tal modo acima
da matéria que vos espiritualizareis antes de deixardes o invólucro terrestre.
Havendo os estudos espíritas desenvolvido em vós a compreensão do futuro, uma
certeza tendes: a de caminhardes para Deus, vendo realizadas todas as promessas
que correspondem às aspirações de vossa alma. Por isso, deveis elevar-vos bem
alto para julgardes sem as constrições da matéria, e não condenardes o vosso
próximo sem terdes dirigido a Deus o pensamento.
Amar,
no sentido profundo do termo, é o homem ser leal, probo, consciencioso, para
fazer aos outros o que queira que estes lhe façam; é procurar em torno de si o
sentido íntimo de todas as dores que acabrunham seus irmãos, para suavizá-las;
é considerar como sua a grande família humana, porque essa família todos a
encontrareis, dentro de certo período, em mundos mais adiantados; e os
Espíritos que a compõem são, como vós, filhos de Deus, marcados na fronte para
se elevarem ao infinito. É por isso que não podeis recusar aos vossos irmãos o
que Deus liberalmente vos outorgou, porquanto, de vossa parte, muito vos
alegraria que vossos irmãos vos dessem aquilo de que necessitais. Para todos os
sofrimentos, tende, pois, sempre uma palavra de esperança e de apoio, a fim de
que sejais inteiramente amor e justiça.
Crede
que esta sábia exortação: “Amai bastante, para serdes amados”, fará seu
caminho; ela é revolucionária e segue a rota que é fixa, invariável. Mas, já
ganhastes muito, vós que me ouvis, pois que já sois infinitamente melhores do
que éreis há cem anos. Mudastes tanto, em proveito vosso, que aceitais de boa
mente, sobre a liberdade e a fraternidade, uma imensidade de idéias novas, que
outrora rejeitaríeis. Ora, daqui a cem anos, sem dúvida aceitareis com a mesma
facilidade as que ainda vos não puderam entrar no cérebro.
Hoje,
quando o movimento espírita há dado tão grande passo, vede com que rapidez as
idéias de justiça e de renovação, constantes nos ditados espíritas, são aceitas
pela parte mediana do mundo inteligente. É que essas idéias correspondem a tudo
o que há de divino em vós. É que estais preparados por uma sementeira fecunda:
a do século passado, que implantou no seio da sociedade terrena as grandes
idéias de progresso. E, como tudo se encadeia sob a direção do Altíssimo, todas
as lições recebidas e aceitas virão a encerrar-se na permuta universal do amor
ao próximo. Por aí, os Espíritos encarnados, melhor apreciando e sentindo, se
estenderão as mãos, de todos os confins do vosso planeta. Uns e outros
reunir-se-ão, para se entenderem e amarem, para destruírem todas as injustiças,
todas as causas de desinteligências entre os povos.
Grande pensamento de renovação pelo Espiritismo, tão
bem exposto em O Livro dos Espíritos; tu
produzirás o grande milagre do século vindouro, o da reunião de todos os
interesses materiais e espirituais dos homens, pela aplicação desta máxima bem
compreendida: “Amai bastante, para serdes amados.” Sanson,
ex-membro da Sociedade Espírita de Paris. (1863.)
O Evangelho segundo o Espiritismo » Capítulo XIV - Honrai a
vosso pai e vossa mãe » A parentela corporal e a parentela espiritual
8. Os laços do sangue não criam forçosamente os liames entre
os Espíritos. O corpo procede do corpo, mas o Espírito não procede do Espírito,
porquanto o Espírito já existia antes da formação do corpo. Não é o pai quem
cria o Espírito de seu filho; ele mais não faz do que lhe fornecer o invólucro
corpóreo, cumprindo-lhe, no entanto, auxiliar o desenvolvimento intelectual e
moral do filho, para fazê-lo progredir.
Os que encarnam numa família, sobretudo como parentes
próximos, são, as mais das vezes, Espíritos simpáticos, ligados por anteriores
relações, que se expressam por uma afeição recíproca na vida terrena. Mas,
também pode acontecer sejam completamente estranhos uns aos outros esses
Espíritos, afastados entre si por antipatias igualmente anteriores, que se
traduzem na Terra por um mútuo antagonismo, que aí lhes serve de provação. Não
são os da consangüinidade os verdadeiros laços de família e sim os da simpatia
e da comunhão de idéias, os quais prendem os Espíritos antes, durante e
depois de suas encarnações. Segue-se que dois seres nascidos de pais
diferentes podem ser mais irmãos pelo Espírito, do que se o fossem pelo sangue.
Podem então atrair-se, buscar-se, sentir prazer quando juntos, ao passo que
dois irmãos consangüíneos podem repelir-se, conforme se observa todos os dias:
problema moral que só o Espiritismo podia resolver pela pluralidade das
existências. (Cap. IV, nº 13)
Há, pois, duas espécies de famílias: as famílias
pelos laços espirituais e as famílias pelos laços corporais. Duráveis,
as primeiras se fortalecem pela purificação e se perpetuam no mundo dos
Espíritos, através das várias migrações da alma; as segundas, frágeis como a
matéria, se extinguem com o tempo e muitas vezes se dissolvem moralmente, já na
existência atual. Foi o que Jesus quis tornar compreensível, dizendo de seus
discípulos: Aqui estão minha mãe e meus irmãos, isto é, minha família pelos
laços do Espírito, pois todo aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos
céus é meu irmão, minha irmã e minha mãe.
A hostilidade que lhe moviam
seus irmãos se acha claramente expressa em a narração de São Marcos, que diz
terem eles o propósito de se apoderarem do Mestre, sob o pretexto de que
este perdera o espírito. Informado da chegada deles,
conhecendo os sentimentos que nutriam a seu respeito, era natural que Jesus
dissesse, referindo-se a seus discípulos, do ponto de vista espiritual: “Eis
aqui meus verdadeiros irmãos”. Embora na companhia daqueles estivesse sua mãe,
ele generaliza o ensino que de maneira alguma implica haja pretendido declarar
que sua mãe segundo o corpo nada lhe era como Espírito, que só indiferença lhe
merecia. Provou suficientemente o contrário em várias outras
circunstâncias.
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Caráter da revelação espírita » 35
35. Com a doutrina da criação da alma no instante do
nascimento, vem-se a cair no sistema das criações privilegiadas; os homens são
estranhos uns aos outros, nada os liga, os laços de família são puramente
carnais; não são de nenhum modo solidários com um passado em que não existiam;
com a doutrina do nada após a morte, todas as relações cessam com a vida; os
seres humanos não são solidários no futuro. Pela reencarnação, são solidários
no passado e no futuro e, como as suas relações se perpetuam, tanto no mundo
espiritual como no corporal, a fraternidade tem por base as próprias leis da
Natureza; o bem tem um objetivo e o mal conseqüências inevitáveis.
Fonte:http://www.ipeak.net/site/estudo_janela_conteudo.php?origem=888&idioma=1