Inaldo Lacerda Lima
“Entrai pela porta estreita, pois que larga é a porta e espaçoso o caminho
que levam à perdição. “ Jesus. (MATEUS, 7:13.)
Abrimos as sagradas Escrituras, desde o Gênesis ao Apocalipse, e
encontramos efetivamente um vasto repositório de profundos ensinamentos,
ameaças e advertências. Mas encontramos, também, relatos e poemas que,
sinceramente, nunca saberemos por que ali foram colocados, o que deixamos
por conta dos estudiosos e pesquisadores.
Para o professor, ex-padre e filósofo brasileiro Humberto Rohden, que
estudou profundamente a Bíblia e nos brindou com uma magnífica tradução do
texto original grego, com as variantes da Vulgata, do Novo Testamento.
Costumava ele dizer, entre amigos: o Antigo Testamento é letra morta,
ultrapassada, e guarda apenas um valor histórico indispensável ao
conhecimento e à cultura.
Assim nos falou ele, certa feita, na cidade de João Pessoa, no hotel de
Da. Rosália, em que se hospedara e onde o fomos encontrar numa roda de
religiosos e intelectuais da época. No dia anterior, 19 de julho de 1955, proferira
ele magnífica conferência na sede da Federação Espírita Paraibana. E foram as
palavras e conceitos do Prof. Rohden que nos encorajaram, então, a uma leitura
completa do Velho e do Novo Testamentos, como, ainda, a leitura de todos os
livros do já famoso filósofo.
Na continuidade de nossos estudos espíritas, fizemos a leitura meditativa
de “O Evangelho segundo o Espiritismo”, das obras publicadas até agora pelo
sapiente Espírito Emmanuel, o estudo criterioso dos clássicos e a leitura sempre
repetida de “Os Quatros Evangelhos”. (Edição FEB).
Diante, portanto, de todo esse manancial maravilhoso de estudo,
pesquisas e reflexões formamos a convicção plena e inamovível de que o
Evangelho trazido a este planeta por Jesus, seu Governador e Guia, é
realmente a porta para a vida. Suas palavras são inconfundíveis e de uma
seriedade que toca o Infinito: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém
vem ao Pai senão por mim” (João, 14, v.6).
É insofismável a maneira de falar do Cristo, seja nas narrações dos
evangelistas que estiveram ao seu lado no apostolado, seja nas que nos foram
oferecidas por Lucas e Marcos. É o que nos leva a considerar perdoável a
confusão de clérigos, pastores e teólogos em considerá-lo o próprio Deus.
Já tentamos fazer comparações entre a linguagem do Cristo e tudo o
mais que se contém nas letras do Antigo Testamento. Não há comparação
possível de sua maneira de expressar-se com a de qualquer profeta da Bíblia,
nem mesmo com João Batista, “que era o maior dentre os que de mulher
fossem nascidos!...”
E o que destaca o Cristo, o que o torna diferente? A sua autoridade! que
levou Nicodemos a admirar-se tanto: “Rabi, bem sabemos que és Mestre, vindo
da parte de Deus; porque ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se
Deus não for com ele (João, 3, v.2).
Era a autoridade de Jesus que o tornava diferente, especial e, sobretudo,
respeitado e temido. Respeitado pelos simples e sofredores, temido pelos falsos
sacerdotes, fariseus e escribas.
O Cristo nos veio a mando do Pai trazer a porta para a vida àqueles que,
para isso, se colocaram em condições, procurando seguir os seus ensinos,
adaptando-se a um novo modo de ser. Sua missão não era impor, mas lançar a
semente na alma da Humanidade, e teria que aguardar que ela fecundasse e
produzisse frutos. É o que nos revela a parábola do semeador (Marcos, 4: 1-20):
somente uma pequena parte cairia em terra boa.
A sementeira é o mundo e envolve diversas épocas. No caso do
Cristianismo, já lá se vão vinte séculos, o que nos confirma que a evolução é
processo lento que se manifesta na ordem física e espiritual, requerendo no
homem aprendizagem por amadurecimento e reforma moral por experiência e
conscientização, até atingir um estado satisfatório de depuração e
aperfeiçoamento.
Consoante ilações que nos permite tirar o Espiritismo, o período de
expiações e provas parece provir de eras remotas até os nossos dias. E quando
a seara já se encontrava próxima da hora da colheita, eis que nos envia o
Espírito de Verdade ou Consolador que ele prometera.
Sabendo o plenipotenciário divino que o Espiritismo não seria aceito por
todos, mormente por aqueles que amadurecidos já se encontravam para
compreendê-lo, mas que relutariam porque presos a dogmas e princípios
inconsistentes, fez com que uma parte ¾ a semente caída em terreno bom! ¾
não por privilégio, mas por maturação psíquica, assumisse com humildade (e só
vale com humildade) a função ou papel de trabalhadores da última hora, e
franqueou-lhes a porta para a vida à luz do Evangelho. São indubitavelmente os
espíritas que alcançaram certa condição de associar à prática da Doutrina-luz a
humildade.
A porta para a vida são os ensinamentos que nos trouxe da parte do Pai
e em função dos quais foi sacrificado pelos homens que detinham o poder. O
poder dos homens, pelo qual eles se perdem, é sempre recheado de vaidade e
orgulho, atributos da alma imperfeita, que fecundam enquanto existe o egoísmo
que os desfigura e escraviza.
O período de mundo primitivo foi o mais longo da História, pois deve ter
envolvido a integração do homem na Natureza, sua preparação para a vida
social em agrupamentos instáveis, infância e adolescência.
O novo período que se seguirá a partir do final deste milênio poderá ser o
da regeneração da Humanidade nas pessoas daqueles que, aqui, num orbe em
renovação, mereçam permanecer.
O dragão, representado pela treva das paixões, da ignorância e do ódio,
deverá ser lançado no abismo por mil anos, conforme nos previne o Apocalipse
em seu capítulo XX, versículo 2. Reiniciar-se-á, então, o reinado do Evangelho,
com a herança da Terra aos bem-aventurados do Sermão da Montanha.
Eis aí, companheiros e irmãos, exercitandos do Evangelho, a porta que
está sendo adentrada pelos que aceitamos permanecer fiéis a serviço do
Senhor, na conformidade do capítulo XX de “O Evangelho segundo o
Espiritismo” a que nos temos referido bastante em outras partes deste estudo.
Atentemos nos conceitos aqui transcritos desse profético e sublimado
capítulo XX da terceira obra da Codificação. Não os comentaremos. Deixemos
isso aos cuidados de nossos leitores.
Assegura-nos o Espírito Constantino (Bordéus, 1863):
“Bons espíritas, meus bem-amados, sois todos obreiros da última hora.”
Revela-nos o Espírito Henri Heine (Paris, 1863):
“(...) e, finalmente, pelos espíritas. Estes, que por último vieram, foram
anunciados e preditos desde a aurora do advento do Messias e receberão a
mesma recompensa. Que digo? recompensa maior.”
Adverte-nos, carinhosamente, o Espírito Erasto (Paris, 1863):
“(...) novos apóstolos da crença revelada pelas proféticas vozes
superiores, ides pregar o novo dogma da reencarnação e da elevação dos
Espíritos. (...)
Ó verdadeiros adeptos do Espiritismo!... sois os escolhidos de Deus! Ide
e pregai a palavra divina. (...)”
“Marcha, pois, avante, falange imponente pela tua fé! Diante de ti os
grandes batalhões dos incrédulos se dissiparão (...).”
Finalmente, eis como nos fala o Espírito de Verdade (Paris, 1862):
“Aproxima-se o tempo em que se cumprirão as coisas anunciadas para a
transformação da Humanidade. Ditosos serão os que houverem trabalhado no
campo do Senhor, com desinteresse e sem outro móvel, senão a caridade! (...)
Mas, ai daqueles que, por efeito das suas dissensões, houverem retardado a
hora da colheita, pois a tempestade virá e eles serão levados no turbilhão! “
Antes de concluirmos esta penúltima parte destas reflexões pedagógicas
em torno de uma porta para a vida superior, meditemos ainda sobre algumas
sentenças do Espírito de Verdade dirigidas aos espíritas, destacando esta que
todo trabalhador da seara conhece e sabe de cor (capítulo VI da referida obra):
“Espíritas! amai-vos, este o primeiro ensinamento; instruí-vos, este o
segundo.”
Mais adiante, na mensagem seguinte (Paris, 1861):
“(...) Vossas almas, porém, não estão esquecidas; e eu, o jardineiro
divino, as cultivo no silêncio dos vossos pensamentos.”
E, na última mensagem (Havre, 1863):
“Tomai, pois, por divisa estas duas palavras: devotamento e abnegação,
e sereis fortes, porque elas resumem todos os deveres que a caridade e a
humildade vos impõem.”
Dissemos que nos isentaríamos de qualquer comentário a esses
pensamentos de tão elevados emissários de Deus. Mas não podemos sopitar o
desejo de uma indagação, uma apenas:
Que é que torna tão difícil para os espíritas, em sua generalidade, a
unificação que há tanto tempo, desde Allan Kardec, o mundo maior nos
pede?
Escreve o Codificador Allan Kardec, já no final do item 4 do capítulo XVII
de “O Evangelho segundo o Espiritismo”, essas palavras grifadas por ele
mesmo:
“Reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral e
pelos esforços que emprega para domar suas inclinações más.”
Pedagogicamente, empregar esforços para domar nossas inclinações
más é não dar reforço àqueles hábitos que nos têm conduzido a fracassos
senão a quedas desastrosas no caminho de nosso progresso ou
aperfeiçoamento moral.
Para isso e nisso o Evangelho constitui realmente a porta segura de
nossa redenção. Estudá-lo em profundidade e aplicá-lo em todas as ocasiões
em que pesarem contra nós as forças impulsivas do hábito malsão, é recurso
verdadeiramente superior e infalível.
Para que o espírita seja realmente obreiro de que o Cristo de Deus deva
utilizar-se em favor de sua obra, é indispensável que se mantenha integrado no
Bem numa interação fecunda de devotamento e abnegação com os Espíritos
Superiores, conforme nos conclama o Espírito de Verdade.
Para isso, preciso é abster-se o espírita consciente de todo e qualquer
estado de mágoa ou ressentimento contra quem quer que seja, ou estará pela
própria consciência impedido de penetrar a porta que conduz à vida espiritual
superior. Não há meio termo. Se meio termo houvesse, as vozes do Céu no-lo
demonstrariam. Por sua vez, o tempo urge, ele que esteve à nossa disposição
por séculos e séculos.
Cumpre-nos agradecer a atenção que os bondosos e pacientes leitores
nos dispensaram durante a leitura desses trabalhos que, num esforço de
pesquisas e reflexões, à luz do Evangelho, inspirado nos sentimos em oferecerlhes...