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terça-feira, 2 de abril de 2013

O Livro dos Espíritos - Farol a indicar caminhos

O Livro dos Espíritos - Farol a indicar caminhos

A. Merci Spada Borges
A história das civilizações se perpetua através dos livros, proporcionando o enriquecimento histórico e cultural dos povos. O livro, cada vez mais lido, torna-se instrumento atuante sobre a mente humana. Os livros tanto podem enriquecer, ampliar, libertar, quanto deturpar ou escravizar consciências. Portanto, é necessário valorizar aqueles que dignificam o homem.
Sob a luz abençoada do Consolador, O livro dos espíritos comemora 156 anos a iluminar consciências. Segundo publicação do próprio Codificador:
    Contém a doutrina completa, como a ditaram os próprios Espíritos, com toda a sua filosofia e todas as suas consequências morais. É a revelação do destino do homem, a iniciação no conhecimento da natureza dos Espíritos e nos mistérios da vida de além-túmulo. Quem o lê compreende que o Espiritismo objetiva um fim sério, que não constitui frívolo passatempo.

    Seu conteúdo se distribui em quatro partes; os temas, adredemente escolhidos, são desenvolvidos de forma muito original: perguntas e respostas. É uma disposição que facilita agradavelmente a leitura e o seu entendimento.

    A primeira edição dessa obra monumental foi revelada ao público a 18 de abril de 1857. Não foi por acaso que essa data ficou gravada nos anais do Espiritismo. Tão importante se tornou que, na atualidade, foi instituída como Dia Nacional do Espiritismo.

    O êxito do lançamento foi esplêndido. A primeira edição esgotou-se rapidamente. Em março de 1860, após revista, corrigida e ampliada, foi lançada a segunda edição, com seu conteúdo e formato definitivos. Completou-se, dessa forma, o primeiro livro da Codificação Espírita em toda sua amplitude filosófica e moral.

    O Espírito Baluze, em comunicação mediúnica e espontânea, faz referência a esse estandarte do Espiritismo:   
    E quando tantas esperanças não pedem senão para se espalhar,quando tantas outras regiões estão, como essa, numa prostração mortal, desejamos que, em todos os corações, em todos os recantos perdidos deste mundo, penetre O livro dos espíritos. Só a doutrina que ele encerra será capaz de mudar o espírito das populações [...].3 (Destaque nosso.)

    Em 1868, ao ser lançada A gênese,Allan Kardec ressalta em suas páginas:
O livro dos espíritos só teve consolidado o seu crédito, por ser a expressão de um pensamento coletivo, geral. Em abril de 1867,completou o seu primeiro período decenal. Nesse intervalo, os princípios fundamentais, cujas bases ele assentara, foram sucessivamente completados e desenvolvidos, por virtude da progressividade do ensino dos Espíritos.
Nenhum, porém, recebeu desmentido da experiência; todos,sem exceção, permaneceram de pé, mais vivazes do que nunca, enquanto que, de todas as ideias contraditórias que alguns tentaram opor-lhe, nenhuma prevaleceu[...].4 (Destaque nosso.)

    Tão importante se tornou O livro dos espíritos que os jornais da época se apressaram a publicar artigos favoráveis sobre essa obra monumental:
O livro dos espíritos, do Sr.Allan Kardec, é uma página nova do grande livro do infinito, e estamos persuadidos de que um marcador assinalará essa página. Ficaríamos desolados se pensassem que acabamos de fazer aqui um anúncio bibliográfico; se pudéssemos supor que assim fora, quebraríamos a nossa pena imediatamente. Não conhecemos absolutamente o autor, mas confessamos abertamente que ficaríamos felizes em conhecê-lo. Aquele que escreveu a introdução que inicia O livro dos espíritos deve ter a alma aberta a todos os sentimentos nobres.[...]
    A todos os deserdados da Terra,a todos os que caminham e caem, regando com suas lágrimas o pó da estrada, diremos:
Lede O livro dos espíritos; isso vos tornará mais fortes. Também aos felizes, aos que pelos caminhos só encontram os aplausos da multidão ou os sorrisos da fortuna, diremos: Estudai-o; ele vos tornará melhores.5 (Destaques nosso.)

    Chegara o momento em que o eminente trabalhador deveria retornar ao lar espiritual. Completara galhardamente a missão a que viera: a Codificação estava estruturada no Pentateuco Consolador. Tendo o grande missionário desencarnado, foi publicada a sua biografia, de que extraímos o seguinte excerto:
    Data do aparecimento de O livro dos espíritos a fundação do Espiritismo que, até então, só contara com elementos esparsos, sem coordenação, e cujo alcance nem toda gente pudera apreender. A partir daquele momento, a doutrina prendeu a atenção dos homens sérios e tomou rápido desenvolvimento. Em poucos anos, aquelas ideias conquistaram numerosos aderentes em todas as camadas sociais e em todos os países. Esse êxito sem precedentes decorreu sem dúvida da simpatia que tais ideias despertaram, mas também é devido, em grande parte, à clareza com que foram expostas e que é um dos característicos dos escritos de Allan Kardec.6 (Destaque nosso.)

    O Sr. Camille Flammarion fez um discurso emocionante junto ao túmulo de Kardec:
[...] Quando, pelo ano de 1850,as manifestações, novas na aparência, das mesas girantes,das pancadas sem causa ostensiva,dos movimentos insólitos de objetos e móveis começaram a prender a atenção pública, determinando mesmo, nos de imaginação aventureira, uma espécie de febre, devida à novidade de tais experiências, Allan Kardec, estudando ao mesmo tempo o magnetismo e seus singulares efeitos, acompanhou com a maior paciência e clarividência judiciosa as experimentações e as tentativas numerosas que então se faziam em Paris. Recolheu e pôs em ordem os resultados conseguidos dessa longa observação e com eles compôs o corpo de doutrina que publicou em 1857, na primeira edição de O livro dos espíritos. Todos sabeis que êxito alcançou essa obra, na França e no estrangeiro. Havendo atingido a 16a edição, tem espalhado em todas as classes esse corpo de doutrina elementar [...].7 (Destaque nosso.)

    Doze anos depois de seu lançamento,precisamente em maio de 1869, após a desencarnação do amorável Codificador, O livro dos espíritos alcançou sua décima sexta edição francesa. E, nos dias atuais, após 156 anos de divulgação, a obra basilar da Codificação já foi traduzida para as mais diversas línguas do mundo, entre elas o japonês. O livro dos espíritos é o alicerce sólido, a pedra angular dessa consoladora Doutrina, revivescência do Evangelho de Jesus.8

Referências:

1KARDEC, Allan. O livro dos médiuns. Trad. Guillon Ribeiro. 80. ed. 4. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2012. pt. 1, cap. 3, Do
método, it. 35.
2______. Revista espírita: jornal de estudos psicológicos, ano 3, n. 3, p. 154 e 155, mar. 1860. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 3. ed.
2. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2009. À venda O livro dos espíritos – Segunda edição.
3______. ______. ano 9, n. 5, p. 199, mai.1866. Trad. Evandro Noleto Bezerra.2. ed. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2009. Lembrança retrospectiva de um Espírito.
4______. A gênese. Trad. Guillon Ribeiro,52. ed. 5. reimp. Rio de Janeiro: FEB,2012. Introdução, p. 16.
5______. Revista espírita: jornal de estudos psicológicos. ano 1, n. 1, p. 64 e 65,jan. 1858. Trad. Evandro Noleto Bezerra.
4. ed. 3. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011.
A Doutrina Espírita, p. 64 e 65.
6______. ______. ano 12, n. 5, p. 188 e 189, mai. 1869. Trad. Evandro Noleto Bezerra.3. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2009.
Biografia do sr. Allan Kardec.
7______. ______. p. 197. Discursos pronunciados junto ao túmulo. O espiritismo e a ciência.
8WANTUIL, Zêus; THIESEN, Francisco. Allan Kardec – Pesquisa biobibliográfica e ensaios de interpretação. 4. ed. Rio de Janeiro:FEB, 1998. v. 3, cap. 1, As obras espíritasde Allan Kardec.

domingo, 31 de março de 2013

MEDIUNIDADE SEM PRECONCEITO

25/03/2013




De maneira mais ampla, em mediunidade, certos aspectos não podem deixar de ser considerados por aqueles que, sem preconceito, se dispõem a estudar o fenômeno, que não se prende apenas e tão somente aos padrões estabelecidos e aceitos pela vulgaridade.
Abaixo, enumeramos alguns deles:
- o espírito comunicante não carece, necessariamente, de estar fisicamente presente no recinto em que o médium esteja se entregando ao transe.
- na maioria das comunicações, escritas ou verbalizadas, o médium não reproduz senão a essência do pensamento do espírito que por ele se expressa.
- no ato mediúnico de natureza inteligente, a interpretação sempre cabe ao medianeiro, junto ao qual a independência do espírito comunicante é sempre relativa, e jamais absoluta.
- em determinados comunicados mediúnicos, ao suprir essa ou aquela deficiência do espírito, a interferência do médium chega a ser enriquecedora, e, portanto, desejável.
- não raro, o próprio espírito do médium pode-se comunicar com maior proveito que o faria um espírito que, por ele, se manifestasse.
- no estado de transe, o espírito do médium pode, inclusive, se manifestar como outra personalidade que haja animado em vida anterior.
- quase sempre, na gleba psíquica do médium, o espírito lança apenas a semente da ideia que deseja transmitir, deixando ao médium o trabalho de fazê-la florescer.
- na maioria dos médiuns, o que se rotula de fenômeno psicofônico ou psicográfico não passa de fenômeno de ordem intuitiva.
- em muitas ocasiões, o espírito que se manifesta pelo médium é o seu espírito protetor, que, então, assume, junto a ele, o papel de médium de outros espíritos.
- determinados espíritos emprestam as suas identidades (leia-se “nomes”) às comunicações que, em essência, não lhes pertencem de todo.
- o que o médium pensa e sente, ou seja, a sua formação intelectual e doutrinária, estabelece canais seletivos aos espíritos que o procuram, que, praticamente, não encontram ensejo de contradizê-lo.
- o fenômeno mediúnico de natureza intelectual se passa, integralmente, na esfera do pensamento, com a imaginação do médium criando o cenário para a história que o espírito pretende contar.
 Os aspectos aqui relacionados, e outros mais que, no momento, nos escapam, autorizam-nos definir a mediunidade idônea como sendo percepção a serviço da Vida Imortal, dando ensejo a que o espírito, encarnado ou desencarnado, demonstre a sua independência da matéria.
O resto, a meu ver, é mero detalhe, no qual, com certeza, muitos se perdem, e continuarão a se perder, em polêmicas infindáveis, dando repasto à própria vaidade e personalismo.

INÁCIO FERREIRA

Uberaba – MG, 25 de março de 2013.

Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita -Livro I-Roteiro 6-Módulo 2- O Cristianismo." A Escritura dos Evangelhos. Os Evangelistas"

EADE - LIVRO I
ROTEIRO
6
Objetivos
• Explicar como foram redigidos os textos evangélicos.
• Analisar o papel desempenhado pelos evangelistas na divulgação
do Cristianismo.
IDÉIAS PRINCIPAIS
CRISTIANISMO E ESPIRITISMO
MÓDULO II - O CRISTIANISMO
• Os [...] mensageiros do Cristo presidem à redação dos textos definitivos [do Evangelho], com vistas ao futuro, não somente junto aos Apóstolos e seus discípulos, mas igualmente junto aos núcleos das tradições. Os cristãos mais destacados trocam, entre si, cartas de alto valor doutrinário para as diversas igrejas. São mensagens de fraternidade e de amor, que a posteridade muita vez não pôde ou não quis compreender. Emmanuel: A caminho da luz. Cap. 14.
• Entre os anos 60 e os 80 da Era Cristã aparecem os primeiros escritos evangélicos de Marcos, considerados os mais antigos. No final do século I, entre os anos 80 e 98, surge o Evangelho de Lucas, assim como o de Mateus.
Este foi possivelmente escrito em hebraico, atualmente perdido. Finalmente, entre os anos de 98 e 110, aparece, em Éfeso, o evangelho de João. Ao lado desses evangelhos, únicos reconhecidos pela Igreja Católica, grande número de outros vinha à luz [são os evangelhos apócrifos]. Por que razão foram esses numerosos documentos declarados apócrifos e rejeitados? Muito provavelmente porque haviam constituído num embaraço aos que nos séculos I e II imprimiram ao Cristianismo uma direção que o devia afastar, cada vez mais, de suas formas primitivas [...]. Léon Denis: Cristianismo e espiritismo. Cap. 1.
• A grandeza da doutrina [cristã] não reside na circunstância de o Evangelho ser de Marcos ou de Mateus, de Lucas ou de João; está na beleza imortal que se irradia de suas lições divinas, atravessando as idades e atraindo os corações. Emmanuel: A caminho da luz. Cap. 14.
A ESCRITURA DOS EVANGELHOS. OS EVANGELISTAS
O ambiente histórico em que o Evangelho surgiu é o do judaísmo, formado e alimentado pelos livros sacros do Antigo Testamento, condicionado pelos acontecimentos históricos, pelas instituições nas quais se encontrou inserido, e pelas correntes religiosas que o especificaram.
A palavra evangelho, do grego euangélion, quer dizer boa-notícia ou boa nova, por extensão. O sentido mais antigo da palavra está relacionado a uma gorjeta que era dada aos que traziam “boas-notícias”. Nas cidades gregas empregava-se o vocábulo evangelho quando ecoava a notícia de uma vitória militar, ou nascimento do filho de um rei ou imperador. Uniam-se à notícia cânticos e cerimônias festivas, dando-se uma conotação de alegria. 9
O Novo Testamento abrange quatro conjuntos de livros, assim discriminados:
a) Evangelhos; b) Atos dos Apóstolos; c) Epístolas; d) Apocalipse. Neste roteiro estão inseridas informações sobre o Evangelho de Jesus, segundo os registros de Mateus, Marcos, Lucas e João.
O Evangelho [Boa Nova], cerne doutrinário do Cristianismo, contém aspectos da biografia terrena de Jesus Cristo e seus principais ensinamentos de caráter moral, coligidos segundo informações de Mateus, Marcos, Lucas e João. Mateus e João, discípulos diretos (apóstolos), de contato pessoal com o Mestre, escreveram respectivamente em hebraico e em grego; Marcos e Lucas, redigiram seus textos em grego, o primeiro transmitindo reminiscências de Pedro, o segundo investigando e recolhendo informações por via indireta.
Harmonizam-se os quatro textos num todo orgânico, composto sem acomodações, sob inspiração mediúnica, cujo influxo não derrogou a liberdade volitiva e os pensadores psíquicos: Mateus, menosprezado funcionário, atende ao aceno do novo chefe e nele passa a vislumbrar o diretor supremo, o rei em nomenclatura humana, embora em nível do reino dos céus; Marcos, atemorizado
quando jovem com a intensidade da tarefa, sublima depois, vendo em Jesus o servo incansável, paradigma da fraternidade a serviço divino; Lucas, mais intelectualizado, apresenta Jesus como entidade imaculada, presa pela genealogia ao pai Adão, porém subtraída ao pecado pela redenção no Pai Criador. João, mais espiritualizado, portanto mais próximo da essência dos ensinamentos de
Jesus, tem olhos de ver no Cristo a entidade celestial, o verbo mesmo de Deus, não apenas o rei, o servo, o homem, sinopse da biografia terrena. 1, 15
O Cristo nada escreveu. Suas palavras, disseminadas ao longo dos caminhos, foram transmitidas de boca em boca e, posteriormente, transcritas em diferentes épocas, muito tempo depois da sua morte. Uma tradição religiosa popular formou-se pouco a pouco, tradição
que sofreu constante evolução até o século IV [...]. Durante [...] meio século depois da morte de Jesus, a tradição cristã, oral e viva, é qual água corrente em que qualquer se pode saciar. Sua propaganda se fez por meio da prédica [sermão, discurso religioso], pelo ensino dos apóstolos, homens simples, iletrados, mas iluminados pelo pensamento do Mestre.
Não é senão do ano 60 ao 80 que aparecem as primeiras narrações escritas, a de Marcos a princípio, que é a mais antiga, depois as primeiras narrativas atribuídas a Mateus e Lucas,
todas, escritos fragmentários e que se vão acrescentar de sucessivas adições, como todas as obras populares. 3 Foi somente no fim do século I, de 80 a 98, que surgiu o evangelho de Lucas, assim como o de Mateus, o primitivo, atualmente perdido; finalmente, de 98 a
110, apareceu, em Éfeso, o evangelho de João. Ao lado desses evangelhos, únicos depois reconhecidos pela Igreja, grande número de outros vinha à luz. Desses, são conhecidos atualmente uns vinte; mas, no século III, Orígenes os citava em maior número. Lucas
faz alusão a isso no primeiro versículo da obra que traz o seu nome. 10
Os textos evangélicos utilizados pelos povos não anglo-saxônicos originam- se da Vulgata (divulgada) Latina, fixada a partir do século IV, quando o erudito Jerônimo, secretário do papa Dâmaso I, verte do grego para o latim textos autenticáveis, e separa os considerados de autoria obscura ou apócrifa.
Sabemos, no entanto, que existiu a chamada Bíblia dos Setenta, corpo doutrinário traduzido, ao que se diz, por setenta sábios de Alexandria, do qual se teria tirado setenta cópias.
O grego, em que os evangelhos foram escritos, foi o popular dialeto
alexandrino chamado kini, que era a língua mais falada ou, pelo menos, compreendida pelos homens cultos de todas as localidades do Oriente e do Ocidente do Império Romano. Por essa razão os evangelistas usaram o grego e não o hebraico para escrever os evangelhos, tornando-os, assim, acessíveis a um maior número de pessoas.
Naquele tempo, não havia pontuação nem separação de palavras na escrita.
Os textos utilizavam apenas as letras maiúsculas do alfabeto grego. As palavras eram redigidas com letras minúsculas e sem espaçamentos. A colocação de espaços entre as palavras e as frases foi adotada a partir do século IX d.C. A pontuação surgiu com o aparecimento da imprensa no século XV. A organização dos textos bíblicos em capítulos foi introduzida no Ocidente pelo
cardeal inglês Hugo, no século XIII. A subdivisão dos capítulos em versículos foi criação do tipógrafo parisiense Roberto Stefen, no século XVI.
Não obstante a existência de várias traduções inglesas da Bíblia, empreendidas durante a Idade Média, somente no século XVI a História registra a tradução definitiva da Bíblia inglesa, na forma que conhecemos atualmente. Na conferência de Hampton Court, em 1604, foi proposta uma nova tradução da Bíblia. Cinqüenta e quatro tradutores foram convidados para o empreendimento
dessa tarefa em Oxford, Cambridge e Westminster. Essa tradução, dedicada ao Rei James I, foi publicada em 1611, em volumes grandes. Trata-se de uma tradução, também conhecida como a Versão Autorizada, que se enraizou de tal forma na história religiosa e literária dos povos de língua inglesa que as edições posteriores cuidavam apenas de simples revisões, e não de substituições.
Algumas dessas revisões foram: a Revisão Inglesa de 1885 e a Versão- Padrão Americana (American Standard Version) de 1901. Esta última foi vigorosamente revisada pela Revised Standard Version de 1946-1952. Os textos bíblicos publicados em língua inglesa — que têm como base a tradução de
William Tyndale, de 1525-1526 —, sobretudo o Novo Testamento, apresentam diferenças das edições publicadas pelos demais povos. É que a tradução inglesa foi realizada diretamente do original grego e não do latim (Vulgata). 17
1. Os evangelhos canônicos e os apócrifos
Os evangelhos são narrativas cuidadosamente escritas sobre o nascimento, a vida, o ministério, a morte e a ressurreição de Jesus de Nazaré. Não podemos jamais esquecer que os textos existentes em o Novo Testamento retratam, além dos ensinamentos do Cristo, a pregação e a vida dos apóstolos e discípulos diretos.
Estudos críticos (e sérios) demonstram que nos textos evangélicos há diferenças que evidenciam a influência pessoal do escritor, sem deixar de lado a inspiração divina. Assim, os três primeiros evangelhos (Mateus, Marcos e Lucas) – chamados de evangelhos sinóticos – têm muitos aspectos comuns e também muitas diferenças. As semelhanças vão de algumas palavras a textos
inteiros. As diferenças são encontradas nas narrativas de fatos e de acontecimentos relacionados à vida e à missão do Cristo, percebendo-se discrepâncias, aqui e ali. Em termos numéricos, podemos representar a questão sinótica assim:
• dos 661 versículos do evangelho de Marcos, 600 estão no de Mateus e 350 no de Lucas;
• os evangelhos de Mateus e Lucas têm 240 versículos em comum, os quais não constam do evangelho de Marcos;
• Mateus e Lucas inseriram outros versículos, segundo interpretação
própria.
Os evangelistas Mateus e João foram apóstolos de Jesus. Lucas e Marcos não conviveram com ele. Os escritos evangélicos, também chamados de Escrituras Gregas, foram divididos em “canônicos” – textos que fazem parte do Novo Testamento – e “apócrifos” (palavra que significa coisa escondida, oculta). Os apócrifos (ou deuterocanônicos), definidos no Concílio de Nicéia, são manuscritos redigidos pelos discípulos de Jesus e que não foram (nem são) reconhecidos pela Igreja Católica, sob a alegação de que a veracidade dos mesmos não poderia ser comprovada. 9, 16
Existem cerca de 112 textos, apócrifos, 52 no Antigo Testamento e 60 no Novo Testamento. A tradição contabiliza um número maior.
Exemplos de livros apócrifos. 19, 20
1. Evangelhos: de Maria de Madalena; de Tomé; de Filipe; o árabe quetrata da infância de Jesus; do pseudo-Tomé; de Tiago; da morte e assunção de Maria.
2. Atos: de Pedro; de Tecla; de Paulo; dos 12 apóstolos; de Pilatos.
3. Epístolas: de Pilatos a Herodes; de Pilatos a Tibério; de Pedro a Filipe; de Paulo aos laodicenses; epístola aos coríntios, de Aristeu.
4. Apocalipses: de Tiago; de João; de Estêvão; de Pedro; de Elias; de Esdras; de Baruc; de Sofonias.
5. Testamentos: de Abraão; de Isaac; de Jacó; dos 12 Patriarcas; de Moisés; de Salomão; de Jó.
6. Outros livros: A filha de Pedro; a descida do Cristo aos infernos; declaração de José de Arimatéia; vida de Adão e Eva; jubileus, 1, 2 e 3; Henoque;Salmos de Salomão; Oráculos Sibilinos.
Os evangelhos de Marcos, Mateus e Lucas são chamados de sinóticos,porque apresentam, entre si, muitas semelhanças, podendo ser dispostos emcolunas paralelas e “abarcados com um só olhar”. Quanto ao quarto evangelho, o de João, este permanece único, pois se distingue significativamente dos demais em conteúdo, estilo e forma. 1 A hipótese mais aceita para justificar as similaridades existentes nos evangelhos sinóticos é denominada “teoria das
duas fontes”. Nessa teoria, Marcos teria utilizado uma fonte (possivelmente originária de Pedro), a qual serviria de subsídios para os relatos de Mateus eLucas. A outra fonte, utilizada por estes dois evangelistas, é totalmente desconhecida e se chama Fonte Q (inicial da palavra alemã quelle = fonte). 2 Os textos evangélicos sofreram, ao longo dos tempos três grandes modificações:
no texto original, escrito pelos evangelistas, durante a elaboração da Vulgata e na redação final, que é a que temos atualmente.
Por entre essas fases, ocorreram influências em variados sentidos, levando a relações literárias, de semelhança ou de diferenças, que são observadas entre os evangelhos no seu estado atual. Assim, pode-se perceber, que a redação de Marcos deve ter sofrido influência do documento – fonte de Mateus – daí verifica-se as semelhanças onde é dependente – onde, por sua vez, deve ter influenciado a última redação do primeiro evangelho.
3 Os evangelhos segundo Mateus, Marcos e Lucas mencionam os ensinamentos de Jesus sobre o Reino de Deus mais de noventa vezes, o que é bastante significativo. O evangelho de João desenvolve a idéia de crença nas noventa e nove citações, o que também nos fornece um material para reflexão.
2. O Evangelho segundo Marcos
Conforme a mais antiga tradição, esse evangelho foi escrito por João Marcos (João do hebraico, Marcos do latim), sobrinho de Pedro e primo de Barnabé.
Ao que se sabe, vivia em Jerusalém com seus pais. Supõe-se que o texto de Marcos foi o que serviu de fonte para as escrituras de Lucas e de Mateus, tendo ele próprio, por sua vez, utilizado outras fontes (Pedro, por exemplo). Foi o primeiro evangelho a ser escrito, num tempo não muito distante da destruição de Jerusalém, ocorrida no ano 70 d.C., possivelmente entre os anos 60 e 70. É um evangelho que apresenta pouca evolução da doutrina cristã, e não conduz a maiores reflexões teológicas. É provável que Marcos tenha acompanhado os acontecimentos da paixão e morte do Cristo.
Para escrever o seu evangelho, Marcos deve ter recorrido a três fontes: às suas lembranças, às recordações de pessoas que conviveram com o Mestre e aos documentos que circulavam na jovem comunidade cristã da época. A tradição informa que Marcos teria sido discípulo de Pedro, de quem teria recebido os esclarecimentos evangélicos (I Pedro, 5:13; Atos dos Apóstolos, 12:12).
O evangelho de Marcos está escrito em estilo muito simples e de pouca precisão histórica. Descuida-se da seqüência cronológica. Há muitas palavras aramaicas, revelando proximidade com os aramaísmos dos originais em que se baseou. São exemplos de aramaísmo as seguintes palavras ou expressões: boanerges (Marcos, 3:17); talita cumi (Marcos, 5:41); efeta (Marcos, 7:34);
aba (Marcos, 14:36); eloi, eloi (Marcos, l5: 34). Mostra também vestígios da tradição oral.
Há indícios de que Marcos teria redigido o seu texto em Roma. Os historiadores que defendem este ponto de vista se fundamentam nos seguintes indícios:
a) na questão sobre o divórcio (Marcos, 10: 1-12) — um problema que afligia apenas os romanos da época;
b) na utilização de palavras latinas como kenturiôn (centurião) e pretorion (tribunal), entre outras (Marcos, 6:27; 7:4; 12:42; 15:39, 44,45); c) nome latino para designar a moeda (ou óbulo) ofertada
pela viúva. (Marcos, 12:41)
O evangelho de Marcos quer mostrar que Jesus é o Messias prometido e aguardado pelos judeus. Tem como escopo apresentar Jesus como filho de Deus (Marcos, 1:11; 3:11; 15:39), sua condição divina, demonstrando que os milagres realizados por Jesus asseguravam ser ele o Messias prometido. Esclarece também
que Jesus é recebido favoravelmente pelas multidões, mas que seu messianismo, humilde e espiritual, decepciona e diminui a expectativa popular.
No propósito de nos apresentar Jesus como filho de Deus, incompreendido e rejeitado pelo povo, Marcos se preocupa menos em explanar o ensino do Mestre, fazendo poucas referências aos seus ensinamentos. Escrito em linguagem popular, de estilo vivo, o texto de Marcos deixa de lado o que interessava apenas aos Judeus, focalizando também os interesses dos pagãos recém-convertidos na fé, após a morte de Pedro e Paulo (entre os anos 62 e 63). No entanto, há no Evangelho de Marcos explicações que nem mesmo os gentios compreendiam (Marcos, 3:17; 5:41; 7:34; 10:46; 14:36; 15:34), assim como relatos de costumes judaicos (Marcos, 7:3-4; 14:12; 15:42). O autor faz poucas referências ao Antigo
Testamento. Destaca as várias emoções dos personagens (Marcos, 3:34; 8:12; 10:14, 21,32; 16:5-6). O ponto culminante do seu evangelho é a confissão de Pedro, em Cesárea (Marcos, 8:27-30) e a resposta do Cristo, que não declarara antes ser o Messias por causa do falso conceito de libertador temporal, atribuído ao enviado de Deus. Alguns autores afirmam que Marcos usou este
“segredo messiânico” para evitar explicações embaraçosas sobre o fato de ter o Cristo morrido da forma como morreu, quando deveria, no entender dos judeus, ser o libertador de um povo.
A tradição diz que a casa, citada em Atos dos Apóstolos, 12:12, pertencia a Marcos, e é a mesma onde foi celebrada a última ceia de Jesus (Marcos,14:4).
Supõe-se também que o Jardim de Getsêmani lhe pertencia, que ele (Marcos) era o homem do cântaro (Marcos, 14:13), sendo igualmente o jovem nu, retratado unicamente em seu Evangelho (Marcos,14:51-52). Marcos acompanhou Paulo e Barnabé na primeira viagem do apóstolo dos gentios — de Jerusalém à Antioquia (Atos dos Apóstolos, 13:5) —, mas não
completa a viagem, voltando a Jerusalém (Atos dos Apóstolos, 13:13). Com Barnabé foi a Chipre (Atos dos Apóstolos, 15:39), todavia, permaneceu mais tempo com Pedro, servindo de intérprete e de secretário. Tendo participado de trabalho missionário no Egito, morreu vítima de martírio. 4, 14 e 16
3. O Evangelho segundo Mateus
O evangelho de Mateus foi escrito entre 80 e 100 d.C. Seguramente foi depois de 70, após a destruição de Jerusalém, e posterior ao Evangelho de Marcos. O texto conhecido nos dias atuais, surgiu na Palestina, escrito em grego, em bom estilo literário, para leitores de língua grega. Posteriormente foi traduzido para o latim (Vulgata). Alguns estudiosos acreditam que o texto original de Mateus foi escrito em aramaico e, mais tarde, traduzido para o grego. Se, efetivamente, esse texto existiu, foi perdido.
As linhas gerais da vida do Cristo, encontradas no evangelho de Marcos, são reproduzidas no de Mateus, mas segundo um novo plano, por que os relatos e os discursos se alternam. Por exemplo, em Mateus, 1:4, há o relato da infância e início do ministério de Jesus. Em Mateus, 5:7 vem em discurso: o sermão do monte, as bem-aventuranças e a entrada no Reino. 5
No tempo em que foi escrito, a igreja cristã já ultrapassara os limites de Israel. Mateus foi um dos apóstolos e testemunha de vários acontecimentos. Cobrador de impostos para o Império Romano, era menosprezado pelos judeus, porque consideravam impura a sua profissão. Foi o apóstolo mais intelectual do grupo dos Doze.
Percebe-se que o seu evangelho era o de um cristão vindo do judaísmo, conhecedor das Escrituras, fiel à tradição. Mateus escreve entre os judeus para judeus, procurando defender a tese de que Jesus era o Messias previsto nas escrituras.
A sua origem judaica fica evidente quando ele emprega, por exemplo, a expressão reino dos céus, em lugar de reino de Deus, já que o nome Deus não era pronunciado pelos judeus.
A narrativa do texto de Mateus dispensa explicações sobre os costumes judaicos, por serem considerados corriqueiros e do entendimento dos seus compatriotas.
Na composição literária do seu evangelho, o autor empregou como fontes o evangelho de Marcos e outros escritos particulares. Fez um trabalho de compilação bastante pessoal (é um texto rico de hebraísmos), adaptando e completando as fontes com os próprios conhecimentos. Mateus é chamado o homem dos discursos, por ser quem mais cita as fontes. Mostra aos judeus que Jesus é filho de Davi e de Abraão, portanto, o Messias de Israel. Exorta os fiéis
a aceitarem Jesus como o Messias prometido por Deus ao seu povo. Refere-se constantemente ao Antigo Testamento. Fala na universalidade da mensagem cristã, convidando judeus e não-judeus a aceitarem os seus ensinamentos. Do ponto de vista cristológico, considera Jesus como Rei, Messias que foi rejeitado
e que criou outro povo ou comunidade, que é a Ecclesia (Igreja). Emprega o termo kyrios (Senhor), enquanto os outros usam o termo Mestre. 6, 14 e 15
4. O Evangelho segundo Lucas
O médico Lucas era natural de Antioquia, fato que ele cita várias vezes nos Atos dos Apóstolos. Não foi discípulo direto do Cristo, ficando isso claro desde o início do seu texto, pois que se coloca fora das testemunhas oculares. Utilizou como fontes o evangelho segundo Marcos bem como outras particulares da região onde viveu, incluindo-se nessas últimas, documentos da época e teste
munhos dos fatos ocorridos. Lucas também teria recebido esclarecimentos de Paulo, por ocasião de um encontro em Antioquia. Paulo fala sobre Lucas em suas epístolas (Colossenses, 4:14), (Filipenses, 24) (II Timóteo, 4:11). Pode-se situar o aparecimento do evangelho de Lucas entre os anos 70 e 80 d.C.
O mérito particular do terceiro evangelho lhe vem da personalidade
muito cativante do seu autor, que nele transparece continuamente. [...] Lucas é um escritor de grande talento e uma alma delicada. Elaborou sua obra de modo original, com um esforço de informação e de ordem. (Lucas, 1:3) Seu plano reproduz as grandes linhas de Marcos, com algumas transposições ou omissões. Certos episódios são deslocados. (Lucas, 3:19-20;4:16-30; 5:1-11;6:12-19; 22:31-34)
Seu plano retoma as grandes linhas do de Marcos com algumas transposições ou omissões.
Alguns episódios são deslocados (3, 19-20; 4, 16-30; 5, 1-11; 6, 12-19; 22, 31-34 etc),
ora por preocupação de clareza e de lógica, ora por influência de outras tradições, entre as quais deve-se notar a que se reflete igualmente no quarto evangelho. Outros episódios são omitidos, seja como menos interessantes para os leitores pagãos (cf. Mc 9, 11-13), seja para evitar duplicatas (cf. Mc 12, 28-34 em comparação com Lc 10, 25-28). 7
É tido como um bom escritor pelo estilo elegante da língua (o grego) usada no prólogo, considerado um clássico da época. O próprio costume de escrever prólogos, dedicando o livro, era comum entre os grandes escritores. Corrige o grego de Marcos, substituindo termos vulgares ou banais por palavras eruditas.
À vista dos acontecimentos da época, procurou relacionar os acontecimentos narrados com fatos conhecidos da história, obedecendo a detalhes cronológicos.
Alguns estudiosos procuram ver no seu Evangelho um certo olho clínico, por ser ele um médico. Vê-se isto, por exemplo, nos episódios da sogra de Pedro, do Samaritano, da hemorroíssa.
Lucas nos apresenta Jesus como o Messias dos pobres, dos humildes, dos desprezados, dos doentes e dos pecadores. Em Lucas, 19: 10, fala em salvar o que estava perdido; em 7: 36-50, traz o relato da pecadora que banhou os pés do Cristo; em 15:1-32, narra ensinamentos sobre a ovelha ou dracma perdidos,
e o retorno do filho pródigo; em 18: 9-14, fala da prece do publicano e a do fariseu; em 16: 19-31, faz referências sobre o rico avarento e sobre o pobre Lázaro; em 11: 41; 12: 33 e em 14:13, mostra a necessidade das esmolas.
Nota-se, ainda, em Lucas, uma preocupação com a valorização das mulheres, tendo em vista o conceito que delas tinha a sociedade da época. Assim, refere-se a Ana e a Isabel; às mulheres que acompanhavam os apóstolos; a Maria e Marta de Betânia; à viúva de Naim e à mulher da multidão que exaltou a mãe de Cristo. Cita também Maria, chamada Madalena, da qual haviam saído
sete demônios, e Joana, mulher de Cuza, alto funcionário de Herodes; Susana e várias outras mulheres, que ajudavam a Jesus e aos discípulos com os bens que possuíam (Lucas, 8: 1-3). E num lugar todo especial está Maria, mãe de Jesus. Fornece muitos detalhes da vida familiar do Mestre, fato que levanta a
hipótese de Lucas ter entrevistado Maria de Nazaré. Corrige certas referências extraordinárias a respeito de Jesus, que pudessem escandalizar os não-judeus (multiplicação dos pães, sogra de Pedro, discussão no caminho etc.). Faz a genealogia de Cristo diferente da de Mateus, começando por Adão. 13, 16 e 18
5. O Evangelho segundo João
O evangelho de João só foi escrito em torno do ano 100 d.C. João é o canal de Deus para nos fazer compreender a presença de Jesus, o Verbo Divino. Esse evangelho é uma obra unitária: as partes só podem ser compreendidas na sua relação com o todo. Portanto, na leitura da obra deve-se ficar atento ao seu conjunto e não somente às unidades que a compõem, tomadas isoladamente. O
plano que estrutura o evangelho de João é espiritual e não histórico-narrativo.
A pessoa e a obra de Jesus são interpretadas por uma comunidade no seio da sua experiência de fé.
A história de Jesus no evangelho de João é apresentada como um drama composto de um prólogo, dois atos principais e um epílogo. Considerando-se o evangelho sob essa
luz, sua característica distintiva pode ser vista como seu ensinamento iluminado. 11
João proclama a messianidade de Jesus e a sua filiação divina, esclarecendo que, para ter vida, é preciso ter fé em Jesus. Os traços característicos do evangelho joanino — e que o diferenciam dos demais — mostram a forte influência de uma corrente de pensamento amplamente difundida em certos círculos do judaísmo: os ensinamentos dos essênios. Neles se atribuía importância especial ao conhecimento (gnose), expresso por meio de dualismos: luz-trevas, verdadementira, anjo da luz-anjo das trevas. João insiste na mística da unidade com o Cristo e na necessidade do amor fraterno.
Mais ainda: o quarto evangelho, mais do que os sinóticos, quer dar a entender o sentido da vida, dos gestos e das palavras de Jesus. Os acontecimentos de Jesus são sinais, cujo sentido não transpareceu logo de início, só sendo compreendido após a glorificação do Cristo (João, 2:22; 12:16; 13:7); muitas palavras de Jesus eram dotadas de significação espiritual, que não foram percebidas senão mais tarde. 8 (João, 2: 19)
Caberia ao apóstolo falar em nome de Jesus ressuscitado, recordando e ensinando aos discípulos o que Jesus lhes havia dito: “conduzi-los à verdade completa” (João, 14:26 e seguintes). Por outro lado, João nos mostra uma faceta da personalidade de Jesus, não percebida nos demais evangelistas: seus ensinamentos ocorrem no contexto da vida judaica, nas festas e no templo,
deixando claro ao povo que ele, Jesus, é o centro de uma religião renovada, em espírito e em verdade (João, 4:24).
Para o evangelista, Jesus é a Palavra (o Verbo) enviada por Deus à Terra, e deve regressar ao Pai uma vez cumprida a sua missão (João,1:1 e seguintes).
Trata-se de uma missão que consiste em anunciar aos homens os mistérios divinos: Jesus é a testemunha do que viu e ouviu junto ao Pai (João, 3:11 e seguintes). Jesus é a Água Viva (João,7:37). É a Luz do mundo (João, 8:12).
Jesus é o Bom Pastor (João, 10:1-18) e é também o Caminho, a Verdade e a Vida. (João, 14:6)
João se move assim acima dos testemunhos dos outros escritores do evangelho, explorando a natureza de Jesus em relação a Deus e à humanidade, e os fundamentos para a crença cristã e para a vida espiritual, que é a sua conseqüência. Jesus, no retrato de João,
é ao mesmo tempo um com o Pai e um com sua igreja na Terra. 12
Há detalhes, no quarto evangelho, que nos fazem supor haja entre o
apóstolo e Jesus uma maior proximidade. Por exemplo, ao descrever o encontro do Mestre com Nicodemos, (João 3:1-15) o evangelista nos transmite a certeza de estar presente, testemunhando a conversa. Uma testemunha que talvez estivesse à porta, como quem se encontra à espreita, até surpreender o
esclarecedor colóquio entre o Rabi Galileu e o doutor da lei. Noutro momento, quando narra o episódio das Bodas de Caná (João 2:1-12), João parece reviver o adolescente maravilhado, colocado perante o Rabi pleno de sabedoria, que abençoa a união matrimonial com sua luminosa presença.
Em outras passagens evangélicas a presença de João é percebida claramente, como se ele fosse a sombra de Jesus: acompanha o Rabi na íngreme subida de 562 metros (Lucas, 9:28-36) até o cume do monte Tabor. Após as quatro horas de marcha, dorme junto a Pedro e Tiago. Na madrugada que avança, escuta vozes que vibram no ar. A sublime visão de Jesus, vestido de luz o faria, mais tarde, evocar a cena inesquecível, ao iniciar a sua narrativa
evangélica: “Nele estava a vida e a vida era a luz dos homens; a luz resplandece nas trevas e as trevas não a compreenderam.” (João, 1:4-5)
Finalmente, é oportuno lembrar que a promessa do advento do Consolador consta apenas do Evangelho de João, que assim nos transmite o feliz anúncio de Jesus: “Se me amardes, guardareis os meus mandamentos. E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre. O
Espírito da verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê nem o conhece; mas vós o conheceis, porque habita convosco, e estará em vós. Não vos deixarei órfãos; voltarei para vós. Mas, quando vier o Consolador, que eu da parte do Pai vos hei de enviar, aquele Espírito da verdade, que procede do Pai, testificará de mim. E vós também testificareis, pois estivestes comigo desde
o princípio.” (João, 14:15-18; 15:26-27)
1. BIBLIA DE JERUSALÉM. São Paulo: Paulus, 2002, p. 1689.
2. ______. p. 13.
3. ______. p. 1692-1693.
4. ______. (O evangelho segundo são Marcos), p. 1696.
5. ______. (O evangelho segundo são Mateus), p. 1694.
6. ______. p. 1698.
7. ______. (O evangelho segundo são de Lucas), p. 1699.
8. ______. (O evangelho segundo são João), p. 1835-1836.
9. BATTAGLIA, O. Introdução aos evangelhos – um estudo histórico-crítico.
Rio de Janeiro, Vozes, 1984, p. 19 a 21.
10. DENIS, Léon. Cristianismo e espiritismo. Tradução de Leopoldo Cirne. 9.
ed. Rio de Janeiro: 2004. Cap. 1 (Origem dos evangelhos) p. 25-26.
11. DICIONÁRIO DA BÍBLIA.VOL. 1. As pessoas e os lugares. Organizado
por Bruce M. Metzger e Michael Coogan. Tradução de Maria Luiza X. de
A. Borges. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002, p. 156.
12. ______. p. 157.
13. ______. p.193-194.
14. ______. p. 197-198.
15. MACEDO, Roberto. Vocabulário histórico geográfico dos romances de
Emmanuel. 2.ed. Rio de Janeiro: FEB, 1994, p 78-79.
16. http://www.fatheralexander.org/booklets/portuguese/bible6_p.htm
17. http://www.geocities.com/Athens/Agora/1417/Biblia/Lucas.htm1
18. http://www.ifcs.ufrj.br/~frazao/apocnt.htm
19. http://www.pt.wikipedia.org/wiki/livros_ap%C3%B3crifos
20. http://www.vivos.com.br/197.htm
REFERÊNCIAS
EADE - Roteiro 6 - A escritura dos Evangelhos. Os evangelistas
145
Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita
Realizar um amplo debate a respeito do assunto
desenvolvido no Roteiro, procurando destacar
o trabalho executado pelos evangelistas.
ORIENTAÇÕES AO MONITOR
Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita
E falou-lhe de muitas coisas por parábolas,
dizendo: Eis que o semeador saiu a semear. E,
quando semeava, uma parte da semente caiu ao
pé do caminho, e vieram as aves e comeram-na;
e outra parte caiu em pedregais, onde não havia
terra bastante, e logo nasceu, porque não tinha
terra funda. Mas, vindo o sol, queimou-se e secou-
se, porque não tinha raiz. E outra caiu entre
espinhos, e os espinhos cresceram e sufocaramna.
E outra caiu em boa terra e deu fruto: um,
a cem, outro, a sessenta, e outro, a trinta.
Mateus,13:3-8.

sábado, 30 de março de 2013

Aprendendo com o Livro dos Espíritos questão 87

 
 
No espaço infinito há mesmo divisões que se interpõem aos Espíritos que ali se radicaram por necessidade, sem condições de visitarem outras comunidades, porém essas, como que prisão, são transitórias; o tempo lhes dará meios, juntamente com o esforço próprio, de se libertarem, tendo o espaço como a sua própria casa, sendo cidadãos universais. Para os Espíritos puros não existem barreiras e eles visitam todos os reinos como se fossem o seu próprio ninho familiar. Mas, para tanto, haveremos de vencer a nós mesmos, iluminando a nossa consciência, aparando as nossas arestas e convertendo os nossos impulsos de ódio, ciúme, orgulho e egoísmo em amor, Àquele que Se transmuta em sol e faz livre os sentimentos, para que a caridade tenha trânsito desimpedido, com todas as suas nuances.
É de se notar que na Terra há igualmente muitas divisões, onde o inferior não tem acesso ao superior, no entanto, este pode transitar em todos os outros. Devemos buscar a superioridade, que deve ser patrimônio comum de todas as criaturas, conquista de todos os seres, pelo esforço individual. Os Espíritos povoam verdadeiramente o espaço infinito, reunindo-se por vezes, em sociedade, como convivem com os homens de maneira que muitos desconhecem. Eles estão ligados à Terra por compromissos assumidos de ajudar os encarnados nas suas necessidades, e trabalham incessantemente, dando-lhes intuição das coisas correias da vida; entretanto, se fecharem os ouvidos à transmissão de ideias nobres, abrir-se-á campo propício para a manifestação das trevas, que também têm como moradia a Terra, por ela ser o lar mais afeito às suas aspirações.

Aprendendo com o Livro dos Espíritos questão 86

 
 
Não pode existir violência em campo algum de vida. A lei nos pede respeito aos direitos dos outros, principalmente pelo que eles expressam na escala da evolução espiritual. Há alguns espiritualistas que perguntam: Por que existe o plano físico? O Espírito não poderia evoluir sem investir-se da matéria? Isso não nos compete responder, mas podemos analisar desta maneira: sendo Deus a Inteligência Suprema, a Perfeição sem mescla, não iria fazer o mundo físico sem necessidade. Logo que foi feito, necessitamos dele. Esta é a lógica. Qual a necessidade que temos e a posição que adotamos, para julgar o Criador? Precisamos do estágio na matéria bruta, como porta para o despertamento gradativo das nossas qualidades, e um mundo de certa forma está interligado com o outro, às vezes de maneira que se desconhece, mas um é motivo de trabalho e experiências para o outro, na pauta das escalas espíritas.
 

Aprendendo com o livro dos espíritos questão 85

 
“O mundo espírita, que preexiste e sobrevive a tudo.”
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Comentários de Miramez
 
Os luminares que ditaram O Livro dos Espíritos, disseram que os Espíritos povoam o espaço infinito, dando início a uma nova era de conhecimento sobre o mundo espiritual. No entanto, sendo o espiritismo uma filosofia religiosa e científica, elástica, adotando o progresso como necessidade para a paz de todas as criaturas, a sua revelação é contínua. Os Espíritos Superiores sopram onde quer que seja, trazendo novos ensinamentos e desvendando novos segredos sobre aquilo que existe no mundo espiritual. E bom que se observe quantas notícias já chegaram à Terra depois da codificação da Doutrina dos Espíritos, em uma seqüência grandiosa, e esses ditados estão sendo supervisionados pelos luminares encarregados de falar com os homens, pelos processos da mediunidade, fenômenos que, embora sejam de todos os tempos, evidenciam-se cada vez mais.
Existem, portanto, no plano espiritual, cidades, colônias, edifícios e casas de todos os tipos, de conformidade com as necessidades espirituais, destacando os motivos educacionais de todos os seres. E ainda existem outras coisas, que somente o tempo poderá revelar, obedecendo às necessidades dos Espíritos que se reúnem, por sintonia, nesses lugares abençoados. Tudo que se faz nesses sítios de luz é por ordem da Divina Sabedoria, e usa-se a mesma matéria, de forma diferente da que se aplica na Terra, por ser ela rarefeita e obediente aos pensamentos, capazes de movimentá-la com toda a maestria, dando-lhe tonalidades que se desejar e construindo as moradias que se lhe convierem. Existem igualmente jardins, lavouras etc.. Também existem regiões no astral onde se congregam os animais fora da forma física, que também são utilizados como se usa na Terra, para que eles sintam a presença do Espírito, e destes absorvam algo que lhes sirva para o próprio despertamento. No entanto, nem todos são usados nos trabalhos; depende do estágio de cada um e de cada espécie.

Conhecendo o Livro o Céu e o Inferno parte 5-"...A intenção de não faltar aos deveres era, efetivamente, honrosa, e lhes será levada em conta mais tarde, mas o verdadeiro mérito consistiria na resistência, tendo eles procedido como o desertor que se esquiva no momento do perigo..." ,



Duplo Suicídio por Amor e por Dever
É de um jornal de 13 de junho de 1862 a seguinte narrativa:
"A jovem Palmira, modista que residia com seus pais, era dotada de aparência encantadora e de caráter afável. Por isso também muito requestada a sua mão. Entre todos os pretendentes ela escolheu o Sr. B., que lhe retribuía essa preferência com a mais viva das paixões. Não obstante essa afeição, por deferência aos pais, Palmira consentiu em desposar o Sr. D., cuja posição social se afigurava mais vantajosa do que a do seu rival.
Os Srs. B. e D. eram amigos íntimos e posto não houvesse entre eles quaisquer relações de interesse, jamais deixaram de se avistar. O amor recíproco de B. e Palmira, que passou a ser a Sra. D., de modo algum se atenuara e como se esforçassem ambos por contê-lo, aumentava-se ele de intensidade na razão direta daquele esforço.
Visando extingui-lo, B. tomou o partido de se casar, e desposou, de fato, uma jovem possuidora de eminentes predicados, fazendo o possível por amá-la.
Cedo, contudo, percebeu a impossibilidade do expediente. Decorreram quatro anos sem que B. ou a Sra. D. faltassem aos seus deveres.
O que padeceram, só eles o sabem, pois D., que estimava deveras o seu amigo, atraía-o sempre ao seu lar, insistindo para que nele ficasse quando tentava retirar-se.
Aproximados um dia por circunstâncias fortuitas e independentes da própria vontade os dois amantes deram-se ciência do mal que os torturava e acharam que a morte era, no caso, o único remédio que se lhes antolhava. Assentaram que se suicidariam juntamente, no dia seguinte, em que o Sr. D., estaria ausente de casa mais prolongadamente.
Feitos os últimos preparativos, escreveram longa e tocante missiva, explicando a causa da sua resolução, para não prevaricarem. Essa carta terminava pedindo que lhes perdoassem e, mais, que os enterrassem na mesma sepultura.
De regresso à casa, o Sr. D. encontrou-os asfixiados. Respeitou-lhes os últimos desejos, e, assim, não consentiu fossem os corpos separados no cemitério."
Sendo esta ocorrência submetida à Sociedade de Paris, como assunto de estudo, um Espírito respondeu:
"Os dois amantes suicidas não vos podem responder ainda. Vejo-os imersos na perturbação e aterrorizados pela perspectiva da eternidade. As conseqüências morais da falta cometida lhes pesarão por migrações sucessivas, durante as quais suas almas separadas se buscarão incessantemente, sujeitas ao duplo suicídio de se pressentirem e desejarem em vão.
Completada a expiação, ficarão reunidos, no seio do amor eterno. Dentro de oito dias, na próxima sessão, podereis evocá-los. Eles aqui virão sem contudo se avistarem, porque profundas trevas os separarão por muito tempo."
1. Evocação da suicida. — Vedes o vosso amado, com o qual vos suicidastes?
R. Nada vejo, nem mesmo os Espíritos que comigo erram neste mundo. Que noite! Que noite! E que véu espesso me circunda a fronte!
2. Que sensação experimentastes ao despertar no outro mundo?
R. Singular! Tinha frio e escaldava. Tinha gelo nas veias e fogo na fronte! Coisa estranha, conjunto inaudito! Fogo e gelo pareciam consumir-me! E eu julgava que ia sucumbir uma segunda vez!...
3. Experimentais qualquer dor física?
R. Todo o meu sofrimento reside aqui, aqui...
— Que quereis dizer por aqui, aqui?
R. Aqui no meu cérebro, aqui no coração...
É provável que, visível, o Espírito levasse a mão à cabeça e ao coração.
4. Acreditais na perenidade dessa situação?
R. Oh! Sempre! Sempre! Ouço às vezes risos infernais, vozes horríficas que bradam sempre assim!
5. Pois bem, podemos com segurança dizer-vos que nem sempre assim será. Pelo arrependimento obtereis o perdão.
R. Que dizeis? Não ouço.
6. Repetimos que os vossos sofrimentos terão um termo, que os podereis abreviar pelo arrependimento, sendo-nos possível auxiliar-vos com a prece.
R. Não ouvi, além de sons confusos, mais que uma palavra. Essa palavra é — graça! Seria efetivamente graça o que pronunciastes? Falastes em graça, mas sem dúvida o fizestes à alma que por aqui passou junto de mim, pobre criança que chora e espera.
Uma senhora, presente à reunião, declarou que fizera fervorosa prece pela infeliz, o que sem dúvida a comoveu, e que de fato, mentalmente, havia implorado em seu favor a graça de Deus.
7. Dissestes estar em trevas e nada ouvir?
R. Me é permitido ouvir algumas das vossas palavras, mas o que vejo é apenas um crepe negro, no qual de quando em quando se desenha um semblante que chora.
8. Mas, uma vez que ele aqui está sem o avistardes, nem sequer vos apercebeis da presença do vosso amado?
R. Ah! Não me faleis dele. Devo esquecê-lo presentemente para que do crepe se extinga a imagem retratada.
9. Que imagem é essa?
R. A de um homem que sofre e cuja existência moral na Terra aniquilei por muito tempo.
Da leitura dessa narrativa logo se depreende haver neste suicídio circunstâncias atenuantes, encarando-o como ato heróico provocado pelo cumprimento do dever. Mas reconhecesse, também, que, contrariamente ao julgado, longa e terrível deve ser a pena dos culpados por se terem voluntariamente refugiado na morte para evitar a luta. A intenção de não faltar aos deveres era, efetivamente, honrosa, e lhes será levada em conta mais tarde, mas o verdadeiro mérito consistiria na resistência, tendo eles procedido como o desertor que se esquiva no momento do perigo.
A pena consistirá, como se vê, em se procurarem debalde e por muito tempo, quer no mundo espiritual, quer noutras encarnações terrestres; pena que ora é agravada pela perspectiva da sua eterna duração. Essa perspectiva, aliada ao castigo, faz que lhes seja defeso ouvirem palavras de esperança que porventura lhes dirijam. Aos que acharem esta pena longa e terrível, tanto mais quanto não deverá cessar senão depois de várias encarnações, diremos que essa duração não é absoluta, mas depende da maneira porque suportarem as futuras provações, além do que podem eles ser auxiliados pela prece. E serão assim, como todos, os árbitros do seu destino. Não será isso, ainda assim, preferível à eterna condenação, sem esperança, a que ficam irrevogavelmente submetidos segundo a doutrina da Igreja, que os considera votados ao inferno e para sempre, a ponto de lhes recusar, com certeza por inúteis, as últimas preces?

quinta-feira, 28 de março de 2013

Muito Será Perdoado a Quem Muito Amou

Muito Será Perdoado a Quem Muito Amou

Artigo publicado no jornal "Unificação" - Ano XIV - Agosto de 1966 - Número 161

E eis que uma mulher da cidade, uma pecadora, sabendo que ele estava à mesa em casa do fariseu, levou um vaso de alabastro com ungüento.
E, chorando, começou a regar-lhe os pés com lágrimas, e enxugá-los com os cabelos; e beijava-lhe os pés, e ungia-lhes com o ungüento.
Quando isto viu o fariseu que o tinha convidado, falava consigo, dizendo: Se este fora profeta, bem saberia quem e qual é a mulher que lhe tocou, pois é uma pecadora.
E respondendo, Jesus, disse-lhe: Simão, uma coisa tenho a dizer-te. E ele disse: Dize-a, Mestre.
Um certo credor tinha dois devedores: um lhe devia quinhentos dinheiros, e o outro cinqüenta.
E, não tendo eles com que pagar, perdoou-lhes a ambos. Dize, pois: qual deles o amara mais?
E Simão, respondendo, disse: Tenho para mim que é aquele a quem mais perdoou. E ele disse: julgaste bem.
E voltando-se para a mulher, disse a Simão: Vês tu esta mulher? Entrei em tua casa, e não me deste água para os pés; mas esta regou-me os pés com lágrimas e me enxugou com os seus cabelos.
Não me deste ósculo, mas esta, desde que entrou, não tem cessado de me beijar os pés.
Não me ungiste a cabeça com óleo, mas esta ungiu-me os pés com ungüento.
E por isso te digo que os seus muitos pecados lhe são perdoados, porque muito amou: mas aquele a quem pouco é perdoado pouco ama”.
(Lucas, 7:37-47).

Os evangelistas Mateus e Marcos, narrando a mesma ocorrência, afirmaram que os apóstolos de Jesus, ali presentes, se indignaram com aquele desperdício de ungüento, ponderando que o melhor seria vendê-lo por bom preço, fazendo com que o produto da venda fosse revertido em favor dos pobres. O Mestre, discordando desse modo de pensar dos seus discípulos esclareceu: “ela fez uma boa ação. Porquanto sempre tendes convosco os pobres, mas a mim não me haveis de ter sempre. Em verdade vos digo que, onde quer que este Evangelho for pregado, em todo o mundo, também será referido o que ela fez, para memória sua”.
Os apóstolos não sentiam, em toda a sua extensão, o que se passava no coração de Maria de Betânia, e, em vez de compreender o significado daquele gesto, preferiram antes criticar a perda daquele ungüento de alto valor.
A virtude coexiste com o amor. Aquela mulher, em cujo coração existia o amor em potencial, começava a aninhar no recesso de sua alma uma forma de virtude que não podia ser vista ou sentida, nem pelos apóstolos, nem pelo fariseu Simão, dada a montanha de preconceitos que mantinham dentro de si, mas que o olho bom do Divino Pastor via e compreendia em toda a sua plenitude.
Os espíritos nos ensinam que o ser encarnado se depara com duas alternativas nos tramites da sua evolução espiritual, para cujo discernimento goza do livre-arbítrio; ou faz com que sua evolução se processe normalmente pelas pautas do amor, ou terá que fazê-lo, violentamente, sob o guante da dor.
A lei inflexível do progresso não permite que o espírito permaneça indefinidamente na ociosidade, menosprezando as dádivas generosas que a Justiça Divina, por excesso de misericórdia lhe concede, e que representam inequívoca demonstração do exuberante amor de Deus para com suas criaturas. O espírito terá que demandar, inexoravelmente, as culminâncias dos planos espirituais, através dos renascimentos sucessivos na carne.
A sublimidade do gesto daquela mulher, ungindo os pés de Jesus, retratava, em toda a sua profundeza, os anseios por uma vida pautada nos maravilhosos preceitos daquele manso Cordeiro de Deus, que percorria as províncias da Judéia sugerindo aos homens que porfiassem em entrar pela porta estreita das responsabilidades e da observância das leis morais recebidas por Moisés, no alto do Sinai, e ratificadas por Jesus Cristo, repelindo o acesso à porta larga das satisfações dos gozos mundanos.
Dirigindo-se à mulher, e afirmando que “os seus muitos pecados lhe eram perdoados”, não estava, logicamente, nas cogitações do Mestre, dar demonstração de uma exceção na lei ou de um tratamento unilateral no quadro da Justiça Divina.
É óbvio que, procedendo daquela forma, o Cristo não derrogou qualquer lei divina e nem premiou um espírito em quem não havia mérito.
No desenvolvimento daquela passagem evangélica, o Senhor deixou bem patenteado que os sofrimentos inenarráveis daquela criatura, retemperada pelo remorso, haviam transmudado os seus sentimentos, assim como o fogo aplicado ao cadinho faz com que o ferro se derreta e adquira novas formas. Os seus padecimentos físicos e morais, sob a influência do remorso retificador, fizeram com que todos os sentimentos inferiores que haviam se aninhado no recôndito da sua alma, cedessem lugar a uma forma irrestrita de amor, que foi enaltecida por Jesus.
O Senhor sondava as profundezas dos corações humanos e, no caso específico daquela mulher via retratado, em seu íntimo, todo um mundo de dor querendo tomar a configuração de um sentimento nobre. O amor havia coberto toda uma multidão de pecados, e Maria de Betânia produzindo aquele fato grandioso de ungir os seus pés, derramar neles as suas lágrimas e enxugá-los com os seus cabelos, deu efusiva demonstração do seu estado de alma.
Eis aí o poder maravilhoso do Evangelho, que opera as transformações mais inconcebíveis para o gênero humano: fazendo com que, na mesma existência física, uma criatura deixe de se chafurdar nos vícios para dar inicio a um processo de auto-reforma.
Maravilhosa explosão de fé propiciada por uma mulher pecadora, que sentia no recesso da sua alma toda a iniqüidade reinante nos corações dos homens e se predispunha a procurar aquele que é o Caminho, a Verdade e a Vida, a fim de que ele lhe desse uma certeza de que nem tudo estava perdido. Procedendo daquela maneira, a mulher procurava fazer ressaltar a sublime sinceridade do seu arrependimento e a sua firme disposição de lutar pela sua própria reabilitação.
A reforma de Maria foi decisiva e a comprovação da mesma temo-la em um fato ocorrido posteriormente e narrado em Lucas 11:38-41, onde está descrito que Jesus, visitando a casa de Lázaro, Maria se pôs a zelar pelas aparências do lar, e como Maria se comprazia unicamente em ouvir os ensinos do Mestre, Marta obtemperou: Mestre não se te dá de que minha irmã me deixe servir só? A que o Senhor respondeu: Marta, Marta está ansiosa e afadigada com muitas coisas. Mas uma só é necessária: e Maria escolheu a boa parte, a qual não lhe será tirada.
A falência da alma é transitória e dura apenas o suficiente para um adequado amadurecimento da razão, pois, quando o espírito encarnado aquilata o quanto perde por transigir com o erro, e vê, de relance, toda a majestosidade de um plano de progresso incessante, onde os espíritos bons são os despenseiros da vontade de Deus, deixa de lado todas as formas de viciações, de inércia, de titubeações, para se integrar, de uma vez para sempre, no sistema que leva a criatura ao Criador de um modo eficiente.
Assim como a ovelha transviada ouve a voz de seu pastor, Maria de Betânia ouviu a voz do Mestre apregoando em sua cidade e anunciando o reino de Deus. Como decorrência decidiu palmilhar o caminho por ele ensinado, todo ele entrecortado de promessas vivas de um Pai generoso e bom que não quer a perda de nenhuma de suas ovelhas, e que através dos ensinos propiciados pela parábola do filho pródigo, deseja que todas as ovelhas voltem para o redil, para que um dia, no decurso dos séculos, haja um só rebanho e um só pastor, em cujo seio imperará a paz, a concórdia, a fraternidade e o amor em suas expressões mais sublimadas, e onde reinará a certeza de que não haverá mais quedas e que todas as lágrimas serão enxugadas.