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quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Evangelho em Casa por Meimei

quarta  reunião
Meimei
 
      
     
         
         Naquele domingo, o segundo de maio, considerado Dia das Mães, o aposento mostrava-se adornado de flores.
         Quando Dona Zilda trouxe o jarro de água pura, sorriu imensamente feliz, percebendo que os filhos lhe haviam preparado afetuosa surpresa.
         No justo momento, Veloso penetrou no recinto, em companhia da sogra, Dona Rosália, senhora simples e amável, que abraçava os netos, Lina e Cláudio, a lhe apertarem as mãos.
         Marta compareceu logo após, e, fosse para agradar Dona Rosália ou para homenagear o Dia das Mães, Dona Júlia e Silvia entraram na sala, sendo recebidas com carinho e respeito.
 
PRECE INICIAL
 
            Vindo o silêncio, Veloso orou, sensibilizado:
 
         -Pai Celeste, nós te agradecemos a bênção do lar em que nos reúnes. Ensina-nos que ele não é apenas o retângulo de paredes que nos asila os corpos, mas o santuário que nos concedeste para aproximação de almas.
         Ajuda-nos, ó Deus de Infinita Bondade, a fim de que nossos olhos espirituais se mantenham abertos para as nossas responsabilidades em família, e aprendamos, assim, com a tua bênção, a amar-nos realmente uns aos outros. Assim seja.
 
LEITURA
 
         Terminada a oração, o chefe da casa passou o Novo Testamento a Dona Rosália, que o abriu, restituindo-o ao genro.
         Veloso fez minuciosa busca, à maneira de um examinador de pedras preciosas, procurando a mais bela, e, em seguida, leu o versículo 7, do capítulo 13, da Epístola do Apóstolo Paulo aos Romanos: “Portanto, daí a cada um o que deveis: a quem tributo, tributo; a quem imposto, imposto; a quem temor, temor; a quem honra, honra”.
         Completando a tarefa, como de hábito, o diretor do culto pediu à esposa trouxesse a estudo a parte de O Evangelho Segundo o Espiritismo, que deveria enriquecer as meditações daquela hora, e a lição extraída, ao acaso, foi a página intitulada “A Virtude”, de autoria do mensageiro Francisco Nicolau Madalena, entre as “Instruções dos espíritos”, no capítulo XVII.
 
COMENTÁRIO
 
         Falou, então, Veloso com inflexão de sentimento profundo:
         -Meus filhos; tenho hoje a minha garganta como que embargada de emoção.
         Nesta data, comemoramos o Dia das Mães.
         Diz-nos a Epístola, na palavra do Apóstolo Paulo, que nos cabe entregar a cada um aquilo que devemos e, no livro de Allan Kardec, encontramos formosa exortação à virtude.
         Lembro-me, assim, do débito irresgatável para com nossas mãezinhas, depositárias da virtude celeste. Sem elas, sem a coragem sublime com que nos acolhem nos braços, não teríamos passagem pela escola deste mundo.
         É preciso ser por si próprias dons inefáveis de Deus para suportarem os sacrifícios a que se impõem por nossa causa, em verdade, os corações maternos, para ver-nos felizes, não hesitaria em transformar-se no prato que nos alimenta, na veste nos que agasalha, nos brinquedos que nos alegram ou no leito que nos propicia repouso...
         Há preço, meus filhos, para todas as utilidades da vida, menos para o amor dos anjos maternais, que se entregam à morte, pouco a pouco, na intimidade do lar, para que possamos efetivamente viver.
         O dinheiro pode pagar o trabalho de todas as profissões conhecidas no mundo, menos o ofício das mães que se levantam com a luz da alvorada, a fim de que não nos falte pão à mesa, e que prolongam a vigília e o cansaço noite adentro, para que a enfermidade não nos domine e para que o rumor não nos perturbe o descanso...
         Em razão disso, nenhum de nós pode ou sabe recompensar-lhes o ministério que, à força de crescer em abnegação e ternura, se torna verdadeiramente divino.
         Louvaremos, pois, neste dia, essas heroínas obscuras que se escondem na luta doméstica, prometendo honrá-las o melhor que pudermos, não somente lhes cercando a presença com as flores de nosso carinho, mas também cumprindo, com lealdade, os nossos próprios deveres.
         Respeitando-as, a elas que exprimem com tanto brilho a Divina Bondade, cultivaremos no lar o primeiro campo de nossas obrigações. Sem que sejamos, ai, corretos e nobres, é impossível venhamos, algum dia, a ser corretos e nobres para com o mundo.
         Ninguém olvide que a nossa tranqüilidade e segurança, originariamente, são frutos do pesado labor de nossas mães, constantemente inclinadas à própria renunciação, a favor de nossa felicidade.
         Dir-se-ia que estão sempre dispostas a desaparecer para que nos mostremos, a se rebaixarem para que nos ergamos, a monopolizarem a dor ara que não nos escasseie alegria e também a morrer para que vivamos.
         Faremos, assim, do nosso culto de hoje uma oração gratuitória a Deus, nosso Pai Celestial, por nos haver concedido o tesouro da devoção materna neste mundo.
         E lembrar-nos-emos de todas as mães que peregrinam na Terra... Das que respiram sob dourados tetos, padecendo, quase sempre, a traição dos entes mais caros; das que se enfeitam de ouro e pérolas, trazendo, muitas vezes, o coração semelhante a uma concha de lágrimas a se lhes encravar no peito dorido; das que gemem, na soledade, sob trabalho rude, para que os filhos conquistem alimento e remédio, higiene e instrução; das que residem sob as arcadas de pontes abandonadas ou em sombrios recantos das vias públicas, estendendo as mãos à generosidade pública, a fim de que os rebentos do próprio seio não se extingam de fome; das que enlouqueceram de sofrimento no santuário doméstico, perante as cruzes que, em muitas ocasiões, esposos e filhos lhes algemem às costas, e daquelas que, soluçando, se apartaram dos filhos queridos para fia-los à cinza do túmulo... Todas são missionárias do Senhor, chorando e padecendo, servindo e amando.
         Recebam, por toda a parte, os nossos pensamentos de gratidão e carinho, e, porque não contamos com palavras adequadas à nossa necessidade de reconhecimento, peçamos à Mãe Santíssima – anjo guardião de Jesus – a todas envolva em seu manto constelado de virtudes excelsas para que nunca lhes faltem as bênçãos da paz e da alegria, seja onde for.
 
CONVERSAÇÃO
 
         Via-se que o orientador queria continuar e que a pequena assembléia desejava prosseguir ouvindo; no entanto, a emoção era visível em todos os rostos.
         Silvia, a filha mais velha, que participava do culto pela primeira, levantou-se e, abeirando-se do Senhor Veloso, beijou-lhe a mão direita que descansava nas páginas do Evangelho.
         O pai, comovido, retirou os óculos e limpou uma lágrima.
         Em seguida, pediu que fosse iniciada a conversação da noite.
         Pesava o silêncio, mas as crianças se incumbiram de rompê-lo:
         LINA – (Voltando-se para Cláudio) – Fale alguma coisa.
         CLÁUDIO – (Que estivera ausente na véspera, em busca da vovó) – Estou sentindo falta de Dona Romualda e de Milota...
         VELOSO – Fomos ontem, sábado, assistir à iniciação do culto do Evangelho, na residência dessas nossas amigas... Dona Romualda decidiu organizar o mesmo serviço; entretanto, de vez em quando estará conosco.
         LINA – Milota disse-nos que hoje ficariam em casa por ser Dia das Mães.
         D. ROSÁLIA – O culto do Evangelho em casa é uma bênção que todos devemos cultivar. O contacto com o pensamento de Nosso Senhor Jesus-Cristo ilumina os nossos próprios pensamentos. Tornamo-nos mais calmos, mais compreensivos, mais operosos e, sobretudo, mais irmãos...
         D. JÚLIA – (Dirigindo-se especialmente a Dona Rosália) – Estou muito surpreendida, pois não pensava que os espíritas dedicassem tanto amor às lições do Divino Mestre.
         D. ROSÁLIA – Minha filha, nós, na Religião Espírita, não podíamos conservar raízes diferentes das do Evangelho. Aliás, você, também cristã, embora adotando interpretações diversas da nossa, não pode esquecer que Nosso Senhor Jesus-Cristo deixou o sepulcro vazio e foi o verdadeiro restaurador da doutrina da imortalidade da alma e da comunicação dos Espíritos, entretendo-se, muito tempo, depois da morte, com os próprios discípulos.
         D. JÚLIA – Sem dúvida. Não se pode negar o fato. (Nesse momento, alguém bate à porta. O dono da casa ausenta-se e volta, esclarecendo tratar-se de assunto alusivo à sua profissão, motivo por que não introduzira o visitante na sala, marcando-lhe encontro noutro horário).
         LINA – Papai, desejo perguntar ao senhor se posso recitar para mãezinha uma quadra que aprendi ontem com uma colega na escola...
         VELOSO – como não, minha filha?
         LINA – (Levantando-se e colocando-se diante de Dona Zilda):
                   Mãezinha terna e querida,
                   Estrela sempre a brilhar,
                   Seu amor é a nossa vida
                   Na vida de nosso lar.
         CLÁUDIO – Papai, eu posso falar também?
         VELOSO – Perfeitamente, meu filho.
         CLÁUDIO – (Encaminhando-se igualmente para perto de Dona Zilda) – Mãezinha, a senhora é o tesouro de nossos corações!
         D. ZILDA – (Chorando e abraçando os filhos) – Meus filhos! Meus filhos!... Deus abençoe a todos nós.
         (Alguém bate, de novo, à porta e ergue-se Veloso para atender. Dessa vez, porém, regressa trazendo um senhor descalço, humildemente trajado, que penetrou na sala, com singelo chapéu às mãos).
         VELOSO – (Falando particularmente com Dona Zilda) –É o nosso Glicério.
         D. ZILDA – Muito bem. Boa-noite, Glicério. Sente-se conosco.
         GLICÉRRIO – Dona Zilda, apesar de muito constrangido, venho comunicar à senhora que minha mulher e meus dois filhos caíram doentes de uma só vez e estamos muitos necessitados...
         D. ZILDA – Confiemos em Deus, Glicério. Espere um pouco e, no término de nossas orações, providenciaremos o que nos seja possível.
         (O visitante toma lugar ao lado das crianças, que o acolhem com simpatia).
         D. ROSÁLIA – (Voltando-se para o genro) – Sinto bastante que Lisbela, tão febril hoje, não tenha podido vir às nossas preces.
         (A estimada senhora referia-se à jovem que a auxiliava nos serviços domésticos e que, ao chegar à residência da filha, na véspera, aí se acamara, sob a pressão de forte gripe).
         VELOSO – Lembrá-la-emos, rogando aos Benfeitores Espirituais nos ajudem a vê-la melhorada e mais forte. Além disso, depois de nossa reunião, poderemos, juntos, envolve-la nas vibrações do passe curativo.
         Lina, Cláudio e Marta solicitaram permissão para se ausentarem do aposento, alguns instantes.
         Com a aprovação de Veloso, demandaram saleta próxima e voltaram, em momentos rápidos: lina e Cláudio trazendo rosas que ofereceram a Dona Zilda e a Dona Rosália, e Marta, um lindo bolo que entregou a dona da casa.
         As senhoras homenageadas agradeceram, contentes.
         A emotividade reinante predispunha à reflexão, e, tudo, indicando que a palestra alcançava o termo, Cláudio pediu fosse Dona Rosália indicada para contar a história edificante da noite.
        
            NOTA SEMANAL
 
         A bondosa vovó sorriu e falou:
         -Recordarei para nós um antigo conto de Andersen (Hans Christian Andersen, poeta e contista dinamarquês), o grande amigo das crianças. Trata-se da
 
HISTÓRIA DE UMA MÃE
 
         Havia uma sofredora mulher que velava aflita, à cabeceira do filhinho doente, quando a Morte chegou para busca-lo.
         Sem que ela pudesse ensaiar qualquer defesa, a Morte arrebatou o menino da cabana.
         Desesperada, a mãezinha saiu a gritar para reaver o pequenino, mas a Morte veloz desaparecera.
         Chorando, avançou a infeliz, estrada fora, quando, em plena noite, encontrou uma mulher que poderia encaminha-la; esta, todavia, em troca da informação, pediu-lhe cantar todas as canções com que a pobre embalava o filhinho.
         Embora em lágrimas, ela repetiu todas as cantigas com que afagava o pequenino, ao pé do berço.
         A mulher ensinou-lhe, então, que a Morte se dirigira para certo espinheiro.
         Sem vacilar, a desditosa mãezinha enlaçou-o, aquecendo-lhe os espinhos que a noite enregelara...
         Quando o seu corpo já se mostrava coberto de chagas, o espinheiro explicou que a Morte seguira no rumo de grande lago.
         A peregrina ensangüentada chegou ao lago, mas o lago fazia coleção de pérolas e, para prestar-lhe o serviço, pediu-lhe os belos olhos.
         A infortunada viajante arrancou os próprios olhos e lhes deu.
         O lago, desse modo, transportou-a, ferida e cega, para o outro lado da terra, onde a Morte costumava guardar as criancinhas.
         Era um grande cemitério, guardado por monstruosa mulher que, para ensinar-lhe o lugar exato onde a Morte aportaria naquela noite, lhe reclamou a linda cabeleira.
         Sem qualquer hesitação, ela deixou-se tosar e, logo após, quase irreconhecível, foi colocada em posição de perceber a chegada do pequeno que procurava.
         Esperou... Esperou...
         Em dado instante ouviu que a Morte regressava com os meninos que recolhera.
         Atenta, escutava as vozes diversas, qual se registrasse a presença de um bando de passarinhos, quando, dentre todas, distinguiu o choro de seu próprio filho e, apesar de cega, avançou para ele, gritando, jubilosa:
         -Meu filhinho!... Meu filhinho!... – E agarrou-o nos braços, a beija-lo, enternecidamente.
         A própria Morte, emocionada, perguntou-lhe então:
         -Como fizeste para chegar aqui, antes de mim?
         Ela, chorando e rindo, pôde apenas dizer:
         -Sou mãe.
 
            ENCERAMENTO
 
         Quando Dona Rosália terminou, todos choravam...
         Veloso, enxugando as lágrimas, conseguiu simplesmente balbuciar a prece final:
 
         -Deus de Infinita Bondade, nós te agradecemos o amor de nossas mães!... Guarda-as para sempre sob tua Bênção, conferindo-lhes a felicidade que não lhes sabemos dar.
         Louvado sejas, Pai Nosso! Assim seja.
 
*
         Depois da oração, por muito tempo, ninguém pôde articular palavra..
         Dona Zilda, no entanto, após distribuir a água fluidificada, serviu aos presentes saboroso café, acompanhado com as fatias do bolo de que Marta lhe fizera oferta.
         A seguir, rumou para o casebre de Glicério, a fim de ali ajudar no que lhe fosse possível.
 
 
Da Obra “EVANGELHO EM CASA” – Espírito: MEIMEI –
Médium: FFRANCISCO CÂNDIDO XAVIER

Evangelho em Casa-Por Meimei

segunda  reunião
Meimei
 
      
 No domingo imediato, à mesma hora, Dona Zilda preparou a mesma para o culto evangélico; entretanto, havia um problema a considerar.
         Chovia muito e Dona Romualda com a filhinha Milota, menina-moça, achava-se em cada, de visita, e, em razão do temporal, adiavam o “até logo”.
         Ouvido no assunto Veloso ponderou que o horário não devia ser modificado.
         E alegrou, sensato:
         -É sempre distinto estender aos amigos um lanche ou um café... Por que não lhe proporcionar a bênção da oração?
         Dona Zilda sorriu e, no instante preciso, Dona Romualda e Milota, consultadas, aceitaram alegremente o ensejo que se lhes oferecia.
 
PRECE INICIAL
 
         Ante o grupo, agora acrescido de mais duas pessoas, Veloso orou, sensibilizado:
 
         -Senhor Jesus, que, um dia, disseste “eu sou a luz do mundo”, ilumina-nos a visão para que venhamos a conhecer o caminho em que te possamos atender a vontade.
         Permite, ó Mestre, que os teus mensageiros nos assistam e inspirem, e sustenta-nos o espírito para que sejamos dignos de tua confiança. Assim seja.
 
LEITURA
 
         Formulada a oração, o orientador do culto entregou a Dona Romualda o exemplar do Novo Testamento, pedindo-lhe que o abrisse.
         A interpelada, curiosa, atendeu.
         Prosseguindo, Veloso procurou o trecho mais apropriado, lendo a sentença última do versículo 13, do capítulo 20, do Apocalipse: “... E foram julgados, cada um segundo a as obras”.
         Desdobrando-se a consulta, foi Cláudio quem descerrou as páginas de O Evangelho Segundo o Espiritismo, passando-o aos olhos paternos, que leram, no capítulo XVIII, inserta entre as “Instruções dos Espíritos”, a mensagem de Simeão, intitulada “Pelas suas Obras é que se reconhece o cristão”.
 
COMENTÁRIO
 
         Aquietaram-se os presentes, e Veloso comentou:
         -É importante observar como se ajustam hoje os textos lidos.O Evangelho Segundo o Espiritismo, em perfeita consonância com o Novo Testamento, pede-nos atenção para as obras.
         É que, por toda parte, vemos que Deus e o Homem se mostram associados em todas as realizações.        
         Ninguém constrói sobre o nada.
         Algo que se faz reclama algo para que se faça.
         Um engenheiro erguerá uma casa, mas, não prescinde do solo como base nem dispensa os materiais comuns para que a edificação se levante.
         Um técnico fabricará certa máquina, mas, para isso, precisará dos recursos da terra.
         Um pomicultor recolherá farta messe de furtos; contudo, necessitou valer-se do campo.
         Assim também, na esfera do pensamento.
         Um professor de música ensinará essa arte sublime aos alunos, mas, não conseguirá faze-lo a distância dos conhecimentos acumulados pelos professores que o antecederam.
         Como é fácil reconhecer, a matéria-prima para a moldagem dessa ou daquela obra, nesse ou naquele campo de trabalho de Deus, através das forças que o representam.
         É o mesmo que se Deus nos enviasse a gleba e o metal, a árvore e o fio e a experiência com eles fazemos a lavoura e a casa, a utilidade e a veste, a arte e a indústria que expressam, dessa forma, empreendimentos em que o Criador e a criatura tomam parte.
         Deus é, assim, o sócio paternal de todas as iniciativas de seus filhos, os homens e as mulheres do mundo.
         Em razão disso, a vida é responsabilidade a que não podemos fugir, porque, sendo a Natureza propriedade efetiva de Deus, ainda mesmo quando estejamos efetuando o mal, usamos o que pertence a Deus, para consuma-lo.
         Exemplifiquemos.
         Um administrador emprestará a determinado servo, larga faixa de solo para que plante a boa semente e ajude a comunidade.
         O servo, manobrando o livre-arbítrio, prevalecer-se-á intensamente da oportunidade, cultivando-a com todas as suas forças. Poderá proceder de maneira deficitária, aproveitando-a imperfeitamente, e, às vezes, abusará da concessão, seja entregando-a aos vermes destruidores, ou desviando-lhe as finalidades ao transforma-la em hospedagem de malfeitores.
         Para o bem ou para o mal, o servo está inevitavelmente ligado à obra que realizou, recebendo a paga de conformidade com o que fez.
         Se tratar o empréstimo com dignidade, receberá mais terrenos e mais recursos; contudo, se trabalhou pelo mínimo, pequenina ser-lhe-á a remuneração de si para consigo; e, se dilapidou a dádiva, empregando-a com desonestidade, carregará consigo o arrependimento e a dor moral, até que se lhe expunha a sombra da culpa.
         Veloso estampou significativa expressão e acentuou:
         -Em todas as nossas ações, gastamos o que é de Deus, para fazer o que é nosso. É desse modo que a criatura imprime a marca de si mesma onde se encontre, quer queira, quer não, e receberá sempre, conforme o ensinamento de Jesus, segundo as próprias obras.
 
CONVERSAÇÃO
 
         O diretor da equipe doméstica deu por finda a explanação, e o entendimento natural começou entre os circunstantes.
         Cláudio falou em primeiro lugar, reclamando contra a chuva abundante que caía lá fora.
         VELOSO – Meu filho, evitemos criticar a Natureza. Ainda agora, falávamos das concessões de Deus. Sol e chuva, calor e frio são processos da Providência Divina para doar-nos pão e saúde, equilíbrio e conforto.
         O temporal que surja menos agradável ao nosso ânimo significa melhoria na fonte, flor no jardim, fruto no campo e alívio à tensão atmosférica.
         Agradeçamos ao tempo, na expressão em que se manifeste, porque todo tempo e, no fundo, bênção de Deus.
         LINA – Papai, o senhor se referia à nossa obrigação de sermos bons, usando os recursos de Deus... Compreendi que Deus é sempre bondoso e que, se aparece algum mal, em nossa vida, é por nossa conta.
         VELOSO – Isso mesmo, filhinha.
         D. Zilda – Imaginemos uma enxada e um lavrador. A enxada foi concedida ao lavrador para que ele empregue no amanho do solo e, em companhia dela, atinja a colheita farta. Mas se o cultivador a utiliza por instrumento de agressão, na pessoa de um companheiro, isso ocorre sobre a responsabilidade do seu sentimento infeliz e não do programa de serviço. A enxada, que é boa, nada tem que ver com a falta cometida...
         VELOSO – Idéia muito bem lembrada. Em verdade, somos sempre nos, as criaturas humanas, quem cria o mal.
         MILOTA – (Mostrando-se desajustada) – Vocês não costumam freqüentar o cinema aos domingos?
         LINA – Papai e mãezinha julgam mais convenientes, para nós, as exibições que se faz durante o dia...
         MILOTA – Pensei que fossem contra...
         D. ZILDA  - (Sorrindo) – Não, Milota, não somos contra o cinema. Isso seria agir contra o progresso. Veloso e eu, no entanto, cremo-nos na obrigação de selecionar os filmes que nos possam tomar tempo. O cinema é poderoso fator de influência e ninguém precisa buscar exemplos infelizes.
         D. ROMUALDA – Perdoem a Milota pela intromissão. Minha filha não está percebendo a seriedade de nossa reunião e trouxe à baila um tema inoportuno. Aliás, quero acreditar que o exame do Evangelho, como está sendo feito, permite a exposição dos mais íntimos problemas que nos afligem...
         VELOSO – Sem dúvida.
         D. ROMUALDA (Desdobrando um fragmento de jornal que trazia na bolsa) – Desde a semana passada, tenho um caso que sobremaneira me preocupa. (E estendendo o noticiário) – Trata-se do Dr. Neves, meu vizinho, homem admirável por suas virtudes sociais e domésticas. Advogado correto e funcionário distinto, foi baleado na via pública.... Não sei se deva falar neste assunto aqui...
         VELOSO – Como não? Os quadros da vida, expostos na imprensa, podem e devem ser estudados respeitosamente à luz da Doutrina Espírita.
         D. ROMUALDA – Conheci o Dr. Neves. Era homem de procedimento exemplar. Soube-se que havia contrariado propósitos desonestos de uma empresa, na repartição em que servia, adquirindo, então, imerecidamente, o ódio que o abateu, sem que, até hoje, se descubra o assassino... Um acontecimento assim, tão lamentável, espanta e fere a gente... Como interpreta-lo, do ponto de vista espírita?
         VELOSO – Apenas a reencarnação poderá confortar-nos. Certamente, o Dr. Neves, em alguma de suas existências passadas, que, de momento, não podemos precisar, terá cometido um delito desses, na pessoa de alguém...
         D. ROMUALDA – Mas, estamos assim expostos a semelhante rigor? Se um homem que exterminou a vida de outro, utilizando um revólver, deverá igualmente morrer na existência seguinte, por golpes de arma da mesma espécie, jamais encerraremos a carreira do crime.
         D. ZILDA – Aliás, disse Jesus ao Apóstolo Pedro “quem fere pela espada, pela espada morrerá”. (Mateus, 26:52).
         VELOSO – Mas, o mesmo Divino Mestre ensinou que se deve perdoar setenta vezes sete, que é nossa obrigação amar os inimigos e orar em favor daqueles que nos injuriam e nos perseguem. E se disse a Pedro a exortação a que nos reportamos, inspirou o mesmo apóstolo para que deixasse em sua carta a promessa divina de que “o amor cobrirá a multidão de nossos pecados” (Pedro, 4:8), induzindo-nos dessa maneira, à “caridade ardente uns para com os outros”. Os Instrutores Espirituais ensinam-nos que o bem praticado atenua os extingue o mal que causamos a outrem, ferindo a nós mesmos. Em muitas circunstâncias, somos desculpados por nossas vítimas. Entretanto, o débito que contraímos permanece, registrado na Lei da Eterna Justiça, reclamando resgate. Em que idade o Dr. Neves sofreu o assalto a que aludimos?
         D. ROMUALDA – Aos cinqüenta.
         VELOSO – Suponhamos que ele, em uma de suas existências passadas, tenha sido o autor de um homicídio, nas mesmas condições, ao contar meio século de experiência física. Aceita essa hipótese, admitamos tenha pedido, antes de renascer no berço terreno, uma provação expiatória como a que acaba de deixar... Se vivesse incorretamente, é possível tivesse encontrado o golpe em alguma dissipação, atraindo a censura alheia em seu desfavor; todavia, cumprindo irrepreensivelmente os seus deveres, como aconteceu, foi vítima perfeita, sem ser o algoz de ninguém, adquirindo, assim larga onda de simpatia e respeito em seu benefício. Contudo, presumamos que o Dr. Neves, além das próprias obrigações, procurasse, acima de tudo, a prática do bem ao próximo, sem qualquer espírito de recompensa... Aos cinquenta de idade, por trazer na própria lama os sinais da falta cometida, provavelmente experimentaria moléstia grave, no órgão ligado ao assunto, e desencarnaria em conseqüência. E talvez, se mencionado irmão fizesse dessa mesma conduta um apostolado de abnegação incessante, no amparo aos necessitados, ao atingir meio século no corpo físico, possivelmente viria a padecer a enfermidade conseqüente, obtendo, põem, mais tempo de abençoada internação nos serviços da Terra, à maneira do devedor que consegue expressiva moratória por merecimento adquirido...
         D. ROMUALDA – Nobres conclusões! Entendemos, assim, com mais segurança, a função da dor...
         D. ZILDA – Compreendemos, então, que tanto maior seja a soma de bem que façamos, mais amplos se nos faz o crédito diante da Lei Divina.
         VELOSO – Evidentemente.
         MILOTA – Dona Zilda, que devemos classificar como sendo o bem?
         D. ZILDA – Creio, filha, que o bem real para nós será sempre fazer o bem aos outros em primeiro lugar.
         D. ROMUALDA – Bela definição.
         LINA – Mãezinha, quando tentamos dominar os nossos pensamentos de preguiça ou de insubordinação, a fim de sermos melhores para os outros, é igualmente um bem, não é?
         D. ZILDA – Bem muito grande, muito louvável.
         MARTA – (Sorrindo); – Devo comunicar ao Senhor Veloso e a Dona Zilda que, depois do nosso culto evangélico, na semana passada, Lina tem tido nova conduta para comigo. Muito afável e correta, não me oferece qualquer motivo a preocupações. Além disso, agora me auxilia quando pode, na cozinha e na limpeza.
         VELOSO – Louvado seja Deus!
 
NOTA SEMANAL
 
         Sobrevindo a quietude, Veloso perguntou a Dona Zilda se não desejava relatar algum episódio de suas tarefas pessoais ou ler alguma narrativa referente às anotações da noite.
         A esposa sorriu e respondeu:
         -Apontamento escrito não tenho, mas, lembro-me de uma história que aconteceu aqui mesmo, em nossa rua. É um acontecimento que demonstra o quanto pode a força do Evangelho de Jesus em nossa vida, para que saibamos edificar com Deus a nossa felicidade e a felicidade dos outros. Posso transmiti-lo, na forma de um conto, que intitularei:
 
O LEITEIRO CRISTÂO
 
         Dona Moema, nossa vizinha, e eu notamos que o leiteiro Calimério, de um dia para outro, modificou para melhor o produto que nos vendia.
         Fizera-se o leite excelente.
         E Dona Moema, com dois filhinhos de berço; foi a primeira a assinalar a transformação.
         Informou-me que as crianças mostravam-se tão melhoradas e tão robustas que me convidava a apelarmos, juntas, para ele, a fim de que a situação fosse mantida no mesmo nível.
         Concordei e abordamo-lo na manhã seguinte.
         -Calimério – disse Dona Moema para começar – que houve com o leite, agora tão apetitoso?
         -Dona Moema – replicou nosso entrevistado – para que eu não mude de intenção e procedimento, notifico à senhora que, no mês passado, comecei a freqüentar uma aula de Evangelho e compreendi que a ninguém mais deveria enganar.
         E, colocando o olhar ansioso em nós duas, como quem rogava a nossa aprovação, ajuntou:
         -Confesso às senhoras que, até no mês passado, sempre misturei água no leite, para aumentar o meu rendimento. Mas, desde que conheci as lições de Jesus, já não mais posso agir assim... Peço-lhes me perdoem!
 
         Confiou-se Dona Zilda a breve intervalo e, depois concluiu:
         -Estudemos o exemplo de Calimério renovado. Com os ensinos do Evangelho, fez-se correto e, fazendo-se correto, é verdadeiro benfeitor de nosso equilíbrio orgânico, pela honradez com que nos fornece o alimento.
         Quando cada um de nos estiver trabalhando com a probidade do leiteiro cristão, o mundo será o Reino Divino que teremos edificado com Deus.
 
ENCERRAMENTO
 
         A narrativa inspirou grande contentamento e formosas reflexões. Ao fim de elevados lembretes, Veloso orou para terminar:
 
         -Senhor Jesus, agradecemos-te as bênçãos desta hora e rogamos-te força para fixar as tias lições sublimes em nossa própria conduta. Ajuda-nos, Mestre, nas execuções de tua vontade. Assim seja.
 
**
         Logo após, a dona da casa serviu a água em pequeninas taças, enquanto os presentes passavam a conversar alegremente sobre a excelência do Evangelho no lar.
 
 
Da Obra “EVANGELHO EM CASA” – Espírito: MEIMEI –
Médium: FFRANCISCO CÂNDIDO XAVIER

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Seminário Apocalipse, Mitos e Verdades


Mensagem de Chico psicografada por Wagner da Paixão


Mensagem de Emmanuel através da psicofonia de Chico Xavier


Entrevista com Arnaldo Rocha e mensagem psicofonica de Chico Xavier. Confiram , vale a pena.


O sacrifício mais agradável a Deus

O Evangelho Segundo o Espiritismo


Se, portanto, quando fordes depor vossa oferenda no altar, vos lembrardes de que o vosso irmão tem qualquer coisa contra vós, — deixai a vossa dádiva junto ao altar e ide, antes, reconciliar-vos com o vosso irmão; depois, então, voltai a oferecê-la. — (S. MATEUS, cap. V, vv. 23 e 24.)
Quando diz: “Ide reconciliar-vos com o vosso irmão, antes de depordes a vossa oferenda no altar”, Jesus ensina que o sacrifício mais agradável ao Senhor é o que o homem faça do seu próprio ressentimento; que, antes de se apresentar para ser por ele perdoado, precisa o homem haver perdoado e reparado o agravo que tenha feito a algum de seus irmãos. Só então a sua oferenda será bem aceita, porque virá de um coração expungido de todo e qualquer pensamento mau. Ele materializou o preceito, porque os judeus ofereciam sacrifícios materiais; cumpria--lhe conformar suas palavras aos usos ainda em voga. O cristão não oferece dons materiais, pois que espiritualizou o sacrifício. Com isso, porém, o preceito ainda mais força ganha. Ele oferece sua alma a Deus e essa alma tem de ser purificada. Entrando no templo do Senhor, deve ele deixar fora todo sentimento de ódio e de animosidade, todo mau pensamento contra seu irmão. Só então os anjos levarão sua prece aos pés do Eterno. Eis aí o que ensina Jesus por estas palavras: “Deixai a vossa oferenda junto do altar e ide primeiro reconciliar-vos com o vosso irmão, se quiserdes ser agradável ao Senhor.”
 
(Fonte: O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. X, itens 7 e 8.)

As Penas Futuras Segundo o Espiritismo . A carne é fraca

Livro selecionado: "O Céu e o Inferno"
Capítulo VII
As Penas Futuras Segundo o Espiritismo
A carne é fraca
Há tendências viciosas que são evidentemente inerentes ao Espírito, pois que se ligam mais ao moral do que ao físico. Outras parecem antes resultar do organismo e por isso acredita-se que acarretam menos responsabilidade: tais são as predisposições à cólera, à preguiça, à sensualidade etc.
Hoje está perfeitamente reconhecido pelos filósofos espiritualistas que os órgãos cerebrais correspondentes às diversas aptidões devem o seu desenvolvimento à atividade do Espírito. Esse desenvolvimento é, assim, um efeito e não uma causa. Um homem não é músico porque tenha a bossa da música, mas ele tem essa bossa porque o seu espírito é músico.
Se a ação do Espírito influi no cérebro, deve igualmente influir sobre outras partes do organismo. O Espírito é assim o artífice do seu próprio corpo que ele modela, por assim dizer, apropriando-o às suas necessidades e à manifestação das suas tendências. Assim sendo, a perfeição corporal das raças adiantadas não seria conseqüência de criações distintas, mas o resultado do trabalho do espírito que aperfeiçoa o seu instrumento na medida em que as suas faculdades se desenvolvem.
Por uma conseqüência natural desse princípio, as disposições morais do Espírito devem modificar as funções sanguíneas, dando-lhes maior ou menor atividade, bem como provocar secreções mais ou menos abundantes da bilis ou de outros fluidos. É assim, por exemplo, que o glutão sente a boca encher-se de água ao ver comidas apetitosas. Não é a comida em si que pode excitar os orgãos do gosto, desde que não há nenhum contato. É pois o Espírito, cuja sensualidade foi despertada, que age pelo pensamento sobre esses órgãos, enquanto para outra pessoa a visão dessa comida não produz nenhum efeito.(25)
É ainda por essa mesma razão que uma pessoa sensível verte lágrimas com facilidade. Não é a existência de lágrimas em abundância que dá sensibilidade ao Espírito, mas é a sensibilidade do Espírito que provoca a secreção abundante de lágrimas. Sob a influência da sensibilidade espiritual o organismo apropriou-se a essa disposição natural do Espírito, como o do glutão se apropriou à disposição do seu Espírito.
Seguindo esta ordem de idéias, compreende-se que um espírito irascível deve impulsionar um temperamento bilioso, de maneira que um homem não é colérico por ser bilioso, mas é bilioso porque o seu Espírito é colérico. Acontece o mesmo com todas as demais disposições instintivas. Um Espírito fraco e indolente dará ao seu organismo uma condição de atonia em relação ao seu caráter, enquanto um espírito ativo e enérgico transmitirá ao seu sangue e aos seus nervos disposições bastante diferentes. A ação do Espírito sobre o físico é de tal maneira evidente, que vemos freqüentemente graves desordens orgânicas se produzirem por efeito de violentas comoções morais. A expressão comum: a emoção pôs-lhe o sangue a ferver não é tão desprovida de senso como se poderia pensar. Ora, o que poderia agitar o sangue se não o Espírito por suas disposições morais?(26)
(25) As famosas experiências de Pavlov com a salivação dos cães demonstraram, no campo da psicologia fisiológica, materialista, a verdade desta afirmação de Kardec. Os reflexos condicionados não devem o seu condicionamento à ação dos alimentos sobre os órgãos gustativos, mas ao conhecimento mental do animal aos sinais da campainha que anunciam o alimento. No homem, esse processo é mais refinado. (N. de T.)
(26) A Medicina Psicossomática, a Psicoterapêutica em geral, e atualmente a Parapsicologia vieram confirmar cientificamente, em nossos dias, através de pesquisas e experiências, a verdade desse princípio. (N. do T.)

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Capítulo VII
As Penas Futuras Segundo o Espiritismo
A carne é fraca (continuação)
Pode-se admitir que o temperamento é, pelo menos em parte, determinado pela natureza do Espírito, que é causa e não efeito. Dizemos em parte porque há casos em que o físico influi evidentemente sobre o moral. É quando um estado mórbido ou anormal é determinado por uma causa externa, acidental, independente do Espírito, como a temperatura, o clima, os vícios hereditários que influem na constituição, um mal-estar passageiro, etc. O moral do Espírito pode então ser afetado nas suas manifestações pelo estado patológico, sem que a sua natureza própria seja por isso modificada.
Desculpar-se dos seus defeitos com a fraqueza da carne é, pois, lançar mão de um sofisma para escapar à responsabilidade. A carne só é fraca quando o Espírito é fraco, o que inverte a questão e deixa ao Espírito a responsabilidade de todos os seus atos. A carne, que não tem pensamento nem vontade, jamais prevalece sobre o Espírito, que é o ser pensante e dotado de vontade. É o Espírito que dá à carne as qualidades correspondentes aos seus instintos, como um artista imprime na sua obra material o selo do seu gênio. O Espírito liberto dos instintos da animalidade modela um corpo que não é mais um tirano das suas aspirações de espiritualização. É então que o homem come para viver, porque viver é uma necessidade, mas não vive para comer.
A responsabilidade moral dos nossos atos na vida permanece, portanto, inteiramente nossa. Mas a razão nos diz que as conseqüências dessa responsabilidade devem estar em relação com o desenvolvimento intelectual do Espírito. Quanto mais ele for esclarecido, menos desculpável será, porque com a inteligência e o senso moral nascem as noções do bem e do mal, do justo e do injusto.(27)
Esta lei explica os insucessos da Medicina em certos casos. Desde que o temperamento é um efeito e não causa, os esforços feitos para modificá-lo são necessariamente embaraçados pelas disposições morais do Espírito, que opõe uma resistência inconsciente e neutraliza a ação terapêutica. É pois sobre a causa primeira que se deve agir. Dai, se possível, coragem ao poltrão e vereis cessarem os efeitos fisiológicos do medo.(28)
Isto prova mais uma vez a necessidade, para a arte de curar, de levar em conta a ação do elemento espiritual sobre o organismo. (Ver Revista Espírita de Março de 1869).

(27) Kardec deixa de lado, nesse texto, o problema das influenciações espíritas na conduta humana, para acentuar a responsabilidade individual e intransferível de cada um na prática dos seus atos. Mesmo porque as influências espíritas dependem das condições morais do homem. Assim como não podemos atribuir à carne as nossas imperfeições, também não podemos atribuí-Ias aos nossos inimigos ou perseguidores invisíveis. Pois eles só conseguem agir sobre nós na medida em que correspondemos aos seus estímulos. Sem a nossa aceitação, as suas sugestões e até mesmo os seus impulsos não produzem efeito. (N. do T.)
(28) Esta posição espírita coincide hoje plenamente com a posição das Ciências no campo da Medicina. Bastaria o desenvolvimento da Medicina Psicossomática para demonstrá-lo. Mas o avanço da Parapsicologia vai mais longe, abrindo caminho para a compreensão do problema da influenciação espiritual e das conseqüências da reencarnação na vida presente. Leia-se a respeito o livro La Guerison par Ia pensée, de Robert Tocquet, Paris, 1970, e o livro 20 Casos Sugestivos de Reencarnação, de lan Stevenson, tradução da Editora Edicel, Brasília (DF), 1970. (N. do T.)


IV. SÓCRATES E PLATÃO, PRECURSORES DA DOUTRINA CRISTÃ E DO ESPIRITISMO

IV. SÓCRATES E PLATÃO, PRECURSORES DA DOUTRINA CRISTÃ E DO ESPIRITISMO
Da suposição de que Jesus devia conhecer a seita dos Essênios, seria errado concluir que ele bebeu nessa seita a sua doutrina, e que, se tivesse vivido em outro meio, professaria outros princípios. As grandes idéias não aparecem nunca de súbito. As que tem a verdade por base contam sempre com precursores, que lhes preparam parcialmente o caminho. Depois, quando o tempo é chegado, Deus envia um homem com a missão de resumir, coordenar e completar os elementos esparsos, com eles formando um corpo de doutrina. Dessa maneira, não tendo surgido bruscamente, a doutrina encontra, ao aparecer, espíritos inteiramente preparados para a aceitar. Assim aconteceu com as idéias cristãs, que foram pressentidas muitos séculos antes de Jesus e dos Essênios, e das quais foram Sócrates e Platão os principais precursores.
Sócrates, como o Cristo, nada escreveu, ou pelo menos nada deixou escrito. Como ele, morreu a morte dos criminosos, vítima do fanatismo, por haver atacado as crenças tradicionais e colocado a verdadeira virtude acima da hipocrisia e da ilusão dos formalismos, ou seja: por haver combatido os preconceitos religiosos. Assim como Jesus foi acusado pelos Fariseus de corromper o povo com os seus ensinos, ele também foi acusado pelos Fariseus do seu tempo _ pois que os tem havido em todas as épocas, _ de corromper a juventude, ao proclamar o dogma da unicidade de Deus, da imortalidade da alma e da existência da vida futura. Da mesma maneira porque hoje não conhecemos a doutrina de Jesus senão pelos escritos dos seus discípulos, também não conhecemos a de Sócrates, senão pelos escritos do seu discípulo Platão. Consideramos útil resumir aqui os seus pontos principais, para demonstrar sua concordância com os princípios do Cristianismo.
Aos que encarassem este paralelo como uma profanação, pretendendo não ser possível haver semelhanças entre a doutrina de um pagão e a do Cristo, responderemos que a doutrina de Sócrates não era pagã, pois tinha por finalidade combater o paganismo, e que a doutrina de Jesus, mais completa e mais depurada que a de Sócrates, nada tem a perder na comparação. A grandeza da missão divina do Cristo não poderá ser diminuída. Além disso, trata-se de fatos históricos, que não podem ser escondidos. O homem atingiu um ponto em que a luz sai por si mesma debaixo do alqueire e o encontra maduro para enfrentar. Tanto pior para os que temem abrir os olhos. É chegado o tempo de encarar as coisas do alto e com amplitude, e não mais do ponto de vista mesquinho e estreito dos interesses de seitas e de castas.
Estas citações provarão, além disso, que, se Sócrates e Platão pressentiram as idéias cristãs, encontram-se igualmente na sua doutrina os princípios fundamentais do Espiritismo.
(1) A Morte de Jesus, que se diz escrita por um irmão essênio, é um livro completamente apócrifo, escrito a serviço de determinada opinião, e que traz em si mesmo a prova da sua origem moderna.
RESUMO DA DOUTRINA DE SÓCRATES E PLATÃO
I _ O homem é uma alma encarnada. Antes de sua encarnação, ela existia junto aos modelos primordiais, às idéias do verdadeiro, do bem e do belo. Separou-se delas ao encarnar-se, e lembrando seu passado, sente-se mais ou menos atormentada pelo desejo de a elas voltar.
Não se pode enunciar mais claramente a distinção e a independência dos dois princípios, o inteligente e o material. Além disso, temos aí a doutrina da preexistência da alma; da vaga intuição que ela conserva, da existência de outro mundo, ao qual aspira; de sua sobrevivência à morte do corpo; de sua saída do mundo espiritual, para encarnar-se; e da sua volta a esse mundo, após a morte. É, enfim, o germe da doutrina dos anjos decaídos.
II _ A Alma se perturba e confunde, quando se serve do corpo para considerar algum objeto; sente vertigens, como se estivesse ébria, porque se liga a coisas que são, por sua natureza, sujeitas a transformações. Em vez disso, quando contempla sua própria essência, ela se volta para o que é puro, eterno, imortal, e sendo da mesma natureza permanece nessa contemplação tanto tempo quanto possível. Cessam então as suas perturbações, e esse estado da alma é o que chamamos de sabedoria.
Assim, o homem que considera as coisas de baixo, terra à terra, do ponto de vista material, vive iludido. Para apreciá-las com justeza, é necessário vê-las do alto, ou seja, do ponto de vista espiritual. O verdadeiro sábio deve, portanto, de algum modo, isolar a alma do corpo, para ver com os olhos do espírito. É isso o que ensina o Espiritismo (Cap. II, nº 5).
III _ Enquanto tivermos o nosso corpo e a nossa alma se encontrar mergulhada nessa corrupção, jamais possuiremos o objeto de nossos desejos: a verdade. De fato, o corpo nos oferece mil obstáculos, pela necessidade que temos de cuidar dele; além disso, ele nos enche de desejos, de apetites, de temores, de mil quimeras e de mil tolices, de maneira que, com ele, é impossível sermos sábios por um instante. Mas, se nada se pode conhecer puramente enquanto a alma está unida ao corpo, uma destas coisas se impõe: ou que jamais se conheça a verdade, ou que se conheça após a morte. Livres da loucura do corpo, então conversaremos, é de esperar-se, com homens igualmente livres, e conhecermos por nós mesmos a essência das coisas. Eis porque os verdadeiros filósofos se preparam para morrer, e a morte não lhes parece de maneira alguma temível. (O Céu e o Inferno, Iª parte, cap. 2º, e IIª parte, cap. 1º)
Temos aí o princípio das faculdades da alma obscurecidas pela mediação dos órgãos corporais, e da expansão dessas faculdades depois da morte. Mas trata-se, aqui, das almas evoluídas, já depuradas; não acontece o mesmo com as almas impuras.
IV _ A alma impura, nesse estado, encontra-se pesada, e é novamente arrastada para o mundo visível, pelo horror do que é invisível e imaterial. Ela erra, então, segundo se diz, ao redor dos monumentos e dos túmulos, junto dos quais foram vistos às vezes fantasmas tenebrosos, como devem ser as imagens das almas que deixaram o corpo sem estar inteiramente puras, e que conservam alguma coisa da forma material, o que permite aos nossos olhos percebê-las. Essas não são as almas dos bons, mas as dos maus, que são forçadas a errar nesses lugares, onde carregam as penas de sua vida passada, e onde continuam a errar, até que os apetites inerentes à sua forma material as devolvam a um corpo. Então, elas retomam sem dúvida os mesmos costumes que, durante a vida anterior, eram de sua predileção.
Não somente o princípio da reencarnação está aqui claramente expresso, mas também o estado das almas que ainda estão sob o domínio da matéria é descrito tal como o Espiritismo o demonstra, nas evocações. E há mais, pois, afirma-se que a reencarnação é uma conseqüência da impureza da alma, enquanto as almas purificadas estão livres dela. O Espiritismo não diz outra coisa, apenas acrescenta que a alma que tomou boas resoluções na erraticidade, e que tem conhecimentos adquiridos, trará menos defeitos ao renascer, mais virtudes e mais idéias intuitivas do que na existência precedente, e que, assim, cada existência marca para ela um progresso intelectual e moral. (O Céu e o Inferno, IIª parte: exemplos).
V _ Após a nossa morte, o gênio (daimon, démon) que nos havia sido designado durante a vida, nos leva a um lugar onde se reúnem todos os que devem ser conduzidos ao Hades, para o julgamento. As almas, depois de permanecerem no Hades o tempo necessário, são reconduzidas a esta vida, por numerosos e longos períodos.
Esta é a doutrina dos Anjos guardiães ou Espíritos protetores, e das reencarnações sucessivas, após intervalos mais ou menos longos de erraticidade.
VI _ Os demônios preenchem o espaço que separa o Céu da Terra; são os laços que ligam o Grande Todo consigo mesmo. A divindade não entra jamais em comunicação direta com os homens, mas é por meio dos demônios que os deuses se relacionam e conversam com eles, seja durante o estado de vigília, seja durante o sono.
A palavra daimon, da qual se originou demônio, não era tomada no mau sentido pela Antigüidade, como entre os modernos. Não se aplicava essa palavra exclusivamente aos seres malfazejos, mas aos Espíritos em geral, entre os quais se distinguiam os Espíritos menos elevados, ou demônios propriamente ditos, que se comunicavam diretamente com os homens. O Espiritismo ensina também que os Espíritos povoam o espaço; que Deus não se comunica com os homens senão por intermédio dos Espíritos puros, encarregados de nos transmitir a sua vontade; que os Espíritos se comunicam conosco durante o estado de vigília e durante o sono. Substitui a palavra demônio pela palavra Espírito, e tereis a doutrina espírita; ponde a palavra anjo, e tereis a doutrina cristã.
VII _ A preocupação constante do filósofo (tal como o compreendem Sócrates e Platão) é a de ter o maior cuidado com a alma, menos em vista desta vida, que é apenas um instante, do que em vista da eternidade. Se a alma é imortal, não é sábio viver com vistas à eternidade?
O Cristianismo e o Espiritismo ensinam a mesma coisa.
VIII _ Se a alma é imaterial, ela deve passar, após esta vida, para um mundo igualmente invisível e imaterial, da mesma maneira que o corpo, ao se decompor, retorna à matéria. Importa somente distinguir bem a alma pura, verdadeiramente imaterial, que se nutre, como Deus, da ciência e de pensamentos, da alma mais ou menos manchada de impurezas materiais, que a impede de elevar-se ao divino, retendo-a nos lugares de sua passagem pela Terra.
Sócrates e Platão, como se vê, compreendiam perfeitamente os diferentes graus de desmaterialização da alma. Eles insistem sobre as diferenças de situação que resultam para ela, de sua maior ou menor pureza. Isso que eles diziam por intuição, o Espiritismo o prova, pelos numerosos exemplos que nos põe diante dos olhos (O Céu e o Inferno, IIª parte).
IX _ Se a morte fosse a dissolução total do homem, isso seria de grande vantagem para os maus, que após a morte estariam livres, ao mesmo tempo, de seus corpos, de suas almas e de seus vícios. Aquele que adornou sua alma, não com enfeites estranhos, mas com os que lhes são próprios, ele somente poderá esperar com tranqüilidade a hora de sua partida para o outro mundo.
Em outros termos, quer dizer que o materialismo, que proclama o nada após a morte, seria a negação de toda a responsabilidade moral ulterior, e por conseguinte um estímulo ao mal; que o malvado tem tudo a ganhar com o nada; que o homem que se livrou dos seus vícios e se enriqueceu de virtudes é o único que pode esperar tranqüilamente o despertar na outra vida. O Espiritismo nos mostra, pelos exemplos que diariamente nos põe ante os olhos, quanto é penosa para o malvado a passagem de uma para a outra vida, a entrada na vida futura (O Céu e o Inferno, IIª parte, cap. 1º).
X _ O corpo conserva os vestígios bem marcados dos cuidados que se teve com ele ou dos acidentes que sofreu. Acontece o mesmo com a alma. Quando ela se despoja do corpo, conserva os traços evidentes de seu caráter, de seus sentimentos, e as marcas que cada um dos seus atos lhe deixou. Assim, a maior desgraça que pode acontecer a um homem, é a de ir para o outro mundo com uma alma carregada de culpas. Tu vês, Calicles, que nem tu, nem Polus, nem Górgias, poderíeis provar que se deve seguir outra vida que nos seja mais útil, quando formos para lá. De tantas opiniões, a única que permanece inabalável é a de que mais vale sofrer que cometer uma injustiça, e que antes de tudo devemos aplicar-nos, não a parecer, mas a ser um homem de bem. (Conversações de Sócrates com os discípulos na prisão).
Aqui se encontra outro ponto capital, hoje confirmado pela experiência, segundo o qual a alma não purificada conserva as idéias, as tendências, o caráter e as paixões que tinha na Terra. Esta máxima: mais vale sofrer do que cometer uma injustiça, não é inteiramente cristã? É o mesmo pensamento que Jesus exprime por esta figura: "Se alguém te bater numa face, oferece-lhe a outra". (Cap. XII, Mateus, V: 38-42 e nº 7 e 8).
XI _ De duas, uma: ou a morte é a destruição absoluta, ou é a passagem de uma alma para outro lugar. Se tudo deve extinguir-se, a morte é como uma dessas raras noites que passamos sem sonhar e sem nenhuma consciência de nós mesmos. Mas se a morte é apenas uma mudança, a passagem para um lugar em que os mortos devem reunir-se, que felicidade a de ali reencontrar os nossos conhecidos! Meu maior prazer seria o de examinar de perto os habitantes dessa morada, e dentre eles distinguir, como aqui, os que são sábios dos que crêem sê-lo e não o são. Mas já é tempo de partirmos, eu para morrer e vós para viver. (Sócrates a seus julgadores).
Segundo Sócrates, os homens que viveram na Terra encontram-se depois da morte e se reconhecem. O Espiritismo no-los mostra continuando suas relações, de tal maneira que a morte não é uma interrupção, nem uma cessação da vida, mas uma transformação, sem solução de continuidade.
Sócrates e Platão, se tivessem conhecido os ensinamentos que o Cristo daria quinhentos anos mais tarde, e os que o Espiritismo hoje nos dá, não teriam falado de outra maneira. Nisso, nada há que nos deva surpreender, se considerarmos que as grandes verdades são eternas, e que os Espíritos adiantados devem tê-las conhecido antes de vir para a Terra, para onde as trouxeram. Se considerarmos ainda que Sócrates, Platão, e os grandes filósofos do seu tempo, podiam estar, mais tarde, entre aqueles que secundaram o Cristo na sua divina missão, sendo escolhidos precisamente porque estavam mais aptos do que outros a compreender os seus sublimes ensinos. E que eles podem, por fim, participar hoje da grande plêiade de Espíritos encarregados de vir ensinar aos homens as mesmas verdades.
XII _ Não se deve nunca retribuir a injustiça com a injustiça, nem fazer mal a ninguém, qualquer que seja o mal que nos tenham feito. Poucas pessoas, entretanto, admitem esse princípio, e as que não concordam com ele só podem desprezar-se umas às outras.
Não é este o princípio da caridade, que nos ensina a não retribuir o mal com o mal e a perdoar aos inimigos?
XIII _ É pelos frutos que se conhece a árvore. É necessário qualificar cada ação segundo o que ela produz: chamá-la má quando a sua conseqüência é má, e boa quando produz o bem.
Esta máxima: "É pelos frutos que se reconhece a árvore", encontra-se textualmente repetida, muitas vezes, no Evangelho.
XIV _ A riqueza é um grande perigo. Todo homem que ama a riqueza, não ama nem a ele nem ao que possui, mas a uma coisa que é ainda mais estranha do que aquilo que ele possui. (Cap. XVI).
XV _ As mais belas preces e os mais belos sacrifícios agradam menos à Divindade, do que uma alma virtuosa que se esforça por assemelhar-se a ela. Seria grave que os deuses se interessassem mais pelas nossas oferendas do que pelas nossas almas. Dessa maneira, os maiores culpados poderiam conquistar os seus favores. Mas não, pois só são verdadeiramente sábios e justos os que, por suas palavras e seus atos, resgatam o que devem aos deuses e aos homens. (Cap. X, nº 7 e 8).
XVI _ Chamo de homem vicioso ao amante vulgar, que ama mais ao corpo que à alma. O amor está por toda a natureza, e incita-nos a exercer a nossa inteligência: encontramo-lo até mesmo no movimento dos astros. É o amor que adorna a natureza com suas ricas alfombras: ele se enfeita e fixa a sua morada onde encontra flores e perfumes. É ainda o amor que traz a paz aos homens, a calmaria ao mar, o silêncio aos ventos e o sossego à dor.
O amor, que deve unir os homens por um sentimento de fraternidade, é uma conseqüência dessa teoria de Platão sobre o amor universal, como lei da natureza. Sócrates, tendo dito que "o amor não é um deus nem um mortal, mas um grande demônio", ou seja, um grande Espírito que preside ao amor universal; esta afirmação lhe foi sobretudo imputada como crime.
XVII _ A virtude não pode ser ensinada; ela vem por um dom de Deus aos que a possuem.
É quase a doutrina cristã sobre a graça. Mas se a virtude é um dom de Deus, é um favor, e pode perguntar-se por que ela não é concedida a todos? De outro lado, se ela é um dom, não há mérito de parte daquele que a possui. O Espiritismo é mais explícito. Ele ensina que aquele que a possui, a adquiriu pelos seus esforços nas vidas sucessivas, ao se livrar pouco a pouco das suas imperfeições. A graça é a força que Deus concede a todo homem de boa-vontade, para se livrar do mal e fazer o bem.
XVIII _ Há uma disposição natural, em cada um de nós, para nos apercebermos bem menos dos nossos defeitos, do que dos defeitos alheios.
Capítulo XXIII • Moral Estranha
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Controle Universal do Ensino dos Espíritos

Livro selecionado: "O Evangelho Segundo o Espiritismo"
II Autoridade Da Doutrina Espírita
Controle Universal do Ensino dos Espíritos
Se a doutrina espírita fosse uma concepção puramente humana, não teria como garantia senão as luzes daquele que a tivesse concebido. Ora, ninguém neste mundo poderia ter a pretensão de possuir, sozinho, a verdade absoluta. Se os Espíritos que a revelaram se houvessem manifestado a apenas um homem, nada lhe garantiria a origem, pois seria necessário crer sob palavra no que dissesse haver recebido os seus ensinos. Admitindo-se absoluta sinceridade de sua parte, poderia no máximo convencer as pessoas do seu meio, e poderia fazer sectários, mas não chegaria nunca a reunir a todos.
Deus quis que a nova revelação chegasse aos homens por meio mais rápido e mais autêntico. Eis porque encarregou os Espíritos de a levarem de um pólo ao outro, manifestando-se por toda parte, sem dar a ninguém o privilégio exclusivo de ouvir a sua palavra. Um homem pode ser enganado e pode enganar-se a si mesmo, mas não aconteceria assim, quando milhões vêem e ouvem a mesma coisa: isto é uma garantia para cada um e para todos. Demais, pode fazer-se desaparecer um homem, mas não se faz desaparecerem as massas; podem-se queimar livros, mas não se podem queimar Espíritos. Ora, queimem-se todos os livros, e a fonte da doutrina não será menos inesgotável, porque não se encontra na Terra, surge de toda parte e cada um pode captá-la. Se faltarem homens para a propagar, haverá sempre os Espíritos, que atingem a todos e que ninguém pode atingir.
São realmente os próprios Espíritos que fazem a propaganda, com a ajuda de inumeráveis médiuns, que eles despertam por toda parte. Se houvesse um intérprete único, por mais favorecido que esse fosse, o Espiritismo estaria apenas conhecido. Esse intérprete, por sua vez, qualquer que fosse a sua categoria, provocaria a prevenção de muitos; não seria aceito por todas as nações. Os Espíritos, entretanto, comunicando-se por toda parte, a todos os povos, a todas as seitas e a todos os partidos, são aceitos por todos. O Espiritismo não tem nacionalidade, independe de todos os cultos particulares, não é imposto por nenhuma classe social, visto que cada um pode receber instruções de seus parentes e amigos de além-túmulo. Era necessário que assim fosse, para que ele pudesse conclamar todos os homens à fraternidade, pois se não se colocasse em terreno neutro, teria mantido as dissenções, em lugar de apaziguá-las.
Esta universalidade do ensino dos Espíritos faz a força do Espiritismo, e é ao mesmo tempo a causa de sua tão rápida propagação. Enquanto a voz de um só homem, mesmo com o auxílio da imprensa, necessitaria de séculos para chegar aos ouvidos de todos, eis que milhares de vozes se fazem ouvir simultaneamente, em todos os pontos da Terra, para proclamar os mesmos princípios e os transmitir aos mais ignorantes e aos mais sábios, a fim de que ninguém seja deserdado. É uma vantagem de que não pôde gozar nenhuma das doutrinas aparecidas até hoje. Se, portanto, o Espiritismo é uma verdade, ele não teme nem a má vontade dos homens, nem as revoluções morais, nem as transformações físicas do globo, porque nenhuma dessas coisas pode atingir os Espíritos.
Mas não é esta a única vantagem que resulta dessa posição excepcional. O Espiritismo ainda encontra nela uma poderosa garantia contra os cismas que poderiam ser suscitados, quer pela ambição de alguns, quer pelas contradições de certos Espíritos. Essas contradições são certamente um escolho, mas carregam em si mesmas o remédio ao lado do mal.
Sabe-se que os Espíritos, em conseqüência das suas diferenças de capacidade, estão longe de possuir individualmente toda a verdade; que não é dado a todos penetrar certos mistérios; que o seu saber é proporcional à sua depuração; que os Espíritos vulgares não sabem mais do que os homens; que há, entre eles, como entre estes, presunçosos e falsos sábios, que crêem saber aquilo que não sabem; sistemáticos, que tomam suas próprias idéias pela verdade; enfim, que os Espíritos da ordem mais elevada, que são completamente desmaterializados, são os únicos libertos das idéias e das preocupações terrenas. Mas sabe-se também que os Espíritos embusteiros não têm escrúpulos para esconder-se atrás de nomes emprestados, a fim de fazerem aceitar suas utopias. Disso resulta que, para tudo o que está fora do ensino exclusivamente moral, as revelações que alguém possa obter são de caráter individual, sem autenticidade, e devem ser consideradas como opiniões pessoais deste ou daquele Espírito, sendo imprudência aceitá-las e propagá-las levianamente como verdades absolutas.
O primeiro controle é, sem contradita, o da razão, ao qual é necessário submeter, sem exceção, tudo o que vem dos Espíritos. Toda teoria em contradição manifesta com o bom senso, com uma lógica rigorosa, com os dados positivos que possuímos, por mais respeitável que seja o nome que a assine, deve ser rejeitada. Mas esse controle é incompleto para muitos casos, em virtude da insuficiência de conhecimentos de certas pessoas, e da tendência de muitos, de tomarem seu próprio juízo por único árbitro da verdade. Em tais casos, que fazem os homens que não confiam absolutamente em si mesmos? Aconselham-se com os outros, e a opinião da maioria lhes serve de guia. Assim deve ser no tocante ao ensino dos Espíritos, que nos fornecem por si mesmos os meios de controle.
A concordância no ensino dos Espíritos é portanto o seu melhor controle, mas é ainda necessário que ela se verifique em certas condições. A menos segura de todas é quando um médium interroga por si mesmo numerosos Espíritos sobre uma questão duvidosa. É claro que, se ele está sob o império de uma obsessão, ou se tem relações com um Espírito embusteiro, este Espírito pode dizer-lhe a mesma coisa sob nomes diferentes. Não há garantia suficiente, da mesma maneira, na concordância que se possa obter pelos médiuns de um mesmo centro, porque eles podem sofrer a mesma influência.
A única garantia segura do ensino dos Espíritos está na concordância das revelações feitas espontaneamente, através de um grande número de médiuns, estranhos uns aos outros, e em diversos lugares.
Compreende-se que não se trata aqui de comunicações relativas a interesses secundários, mas das que se referem aos próprios princípios da doutrina. A experiência prova que, quando um novo princípio deve ser revelado, ele é ensinado espontaneamente, ao mesmo tempo, em diferentes lugares, e de maneira idêntica, senão na forma, pelo menos quanto ao fundo. Se, portanto, apraz a um Espírito formular um sistema excêntrico, baseado em suas próprias idéias e fora da verdade, pode-se estar certo de que esse sistema ficará circunscrito, e cairá diante da unanimidade das instruções dadas por toda parte, como já mostraram números exemplos. É esta unanimidade que tem posto abaixo todos os sistemas parciais surgidos na origem do Espiritismo, quando cada qual explicava os fenômenos a seu modo, antes que se conhecessem as leis que regem as relações do mundo visível com o mundo invisível.
Esta é a base em que nos apoiamos, para formular um princípio da doutrina. Não é por concordar ele com as nossas idéias, que o damos como verdadeiro. Não nos colocamos, absolutamente, como árbitro supremo da verdade,e não dizemos a ninguém: "Crede em tal coisa, porque nós vo-la dizemos". Nossa opinião não é, aos nossos próprios olhos, mais do que uma opinião pessoal, que pode ser justa ou falsa, porque não somos mais infalíveis do que os outros. E não é também porque um princípio nos foi ensinado que o consideramos verdadeiro, mas porque ele recebeu a sanção da concordância.
Na nossa posição, recebendo as comunicações de cerca de mil centros espíritas sérios, espalhados pelos mais diversos pontos do globo, estamos em condições de ver quais os princípios sobre que essa concordância se estabelece. É esta observação que nos tem guiado até hoje, e é igualmente ela que nos guiará, através dos novos campos que o Espiritismo está convocado a explorar. É assim que, estudando atentamente as comunicações recebidas de diversos lugares, tanto da França como do exterior, reconhecemos, pela natureza toda especial das revelações, que há uma tendência para entrar numa nova via, e que chegou o momento de se dar um passo à frente. Essas revelações, formuladas às vezes com palavras veladas, passaram quase sempre despercebidas para muitos daqueles que as obtiveram, e muitos outros acreditaram tê-las recebido sozinhos. Tomadas isoladamente, elas seriam para nós sem valor; somente a coincidência lhes confere gravidade. Depois, quando chega o momento de publicá-las, cada um se lembrará de haver recebido instruções no mesmo sentido. É esse o movimento geral que observamos e estudamos, com a assistência dos nossos guias espirituais, e que nos ajuda a avaliar a oportunidade de fazermos uma coisa ou de nos abstermos.
Esse controle universal é uma garantia para a unidade futura do Espiritismo, e anulará todas as teorias contraditórias. É nele que, no futuro, se procurará o criterium da verdade. O que determinou o sucesso da doutrina formulada no O Livro dos Espíritos e no O Livro dos Médiuns, foi que, por toda parte, cada qual pode receber, diretamente dos Espíritos, a confirmação do que eles afirmavam. Se, de todas as partes, os Espíritos os contradissessem, esses livros teriam, após tão longo tempo, sofrido a sorte de todas as concepções fantásticas. O apoio mesmo da imprensa não os teria salvo do naufrágio, enquanto que, privados desse apoio, não deixaram de fazer rapidamente o seu caminho, porque tiveram o dos Espíritos, cuja boa vontade compensou, com vantagem, a má vontade dos homens. Assim acontecerá com todas as idéias emanadas dos Espíritos ou dos homens, que puderem suportar a prova desse controle, cujo poder ninguém pode contestar.
Suponhamos, portanto, que alguns Espíritos queiram ditar, com qualquer título, um livro de sentido contrário; suponhamos mesmo que com intenção hostil, e com o fim de desacreditar a doutrina, a male volência suscitasse comunicações apócrifas. Que influência poderiam ter esses escritos, se eles são desmentidos de todos os lados pelos Espíritos? É da adesão desses últimos que se precisa assegurar, antes de lançar um sistema em seu nome. Do sistema de um só, ao sistema de todos, há a distância da unidade ao infinito. Que podem, mesmo, todos os argumentos dos detratores contra a opinião das massas, quando milhões de vozes amigas, vindas do espaço, chegam de todas as partes do Universo, e no seio de cada família os repelem vivamente? A experiência já não confirmou a teoria, no tocante a este assunto? Que foi feito de todas essas publicações que deviam, segundo afirmavam, destruir o Espiritismo? Qual delas conseguiu, pelo menos, deter-lhe a marcha? Até hoje não se havia considerado a questão desse ponto de vista, sem dúvida um dos mais graves? Cada um contou consigo mesmo, sem contar com os Espíritos.
O princípio da concordância é ainda uma garantia contra as alterações que, em proveito próprio, pretendessem introduzir no Espiritismo as seitas que dele quisessem apoderar-se, acomodando-o à sua maneira. Quem quer que tentasse fazê-lo desviar de seu fim providencial fracassaria, pela bem simples razão de que os Espíritos, através da universalidade dos seus ensinos, farão cair toda modificação que se afaste da verdade.
Resulta de tudo isto uma verdade capital: é que quem desejasse atravessar-se na corrente de idéias estabelecida e sancionada, poderia provocar uma pequena perturbação local e momentânea, mas jamais dominar o conjunto, mesmo no presente, quanto menos no futuro.
E resulta mais, que as instruções dadas pelos Espíritos, sobre os pontos da doutrina ainda não esclarecidos, não teriam força de lei, enquanto permanecessem isoladas, só devendo, por conseguinte, ser aceita sob todas as reservas, a título de informações.
Daí a necessidade da maior prudência na sua publicação, e no caso de julgar-se que devem ser publicadas, só devem ser apresentadas como opiniões individuais, mais ou menos prováveis, mas tendo, em todo o caso, necessidade de confirmação. É esta confirmação que se deve esperar, antes de apresentar um princípio como verdade absoluta, se não se quiser ser acusado de leviandade ou de credulidade irrefletida.
Os Espíritos Superiores procedem, nas suas revelações, com extrema prudência. Só abordam as grandes questões da doutrina de maneira gradual, à medida que a inteligência se torna apta a compreender as verdades de uma ordem mais elevada, e que as circunstâncias são propícias para a emissão de uma idéia nova. Eis porque, desde o começo, eles não disseram tudo, e nem o disseram até agora, não cedendo jamais à impaciência de pessoas muito apressadas, que desejam colher os frutos antes de amadurecerem. Seria, pois, inútil, querer antecipar o tempo marcado pela Providência para cada coisa, porque então os Espíritos verdadeiramente sérios recusam-se positivamente a ajudar. Os Espíritos levianos, porém, pouco se incomodando com a verdade, a tudo respondem. É por essa razão que, sobre todas as questões prematuras, há sempre respostas contraditórias.
Os princípios acima não são o resultado de uma teoria pessoal, mas a forçosa conseqüência das condições em que os Espíritos se manifestam. É evidente que, se um Espírito diz uma coisa num lugar, enquanto milhões dizem o contrário por toda parte, a presunção de verdade não pode estar com aquele que ficou só, e nem aproximar-se da sua opinião, pois pretender que um só tenha razão, contra todos, seria tão ilógico de parte de um Espírito como de parte dos homens. Os Espíritos verdadeiramente sábios, quando não se sentem suficientemente esclarecidos sobre uma questão, não a resolvem jamais de maneira absoluta. Declaram tratar do assunto de acordo com a sua opinião pessoal, e aconselham esperar-se a confirmação.
Por maior, mais bela e justa que seja uma idéia, é impossível que reúna, desde o princípio, todas as opiniões. Os conflitos que dela resultam são a conseqüência inevitável do movimento que se processa, e são mesmo necessários, para melhor fazer ressaltar a verdade. É também útil que eles surjam no começo, para que as idéias falsas sejam mais rapidamente desgastadas. Os espíritas que revelam alguns temores devem ficar tranqüilos. Todas as pretensões isoladas cairão, pela força mesma das coisas, diante do grande e poderoso criterium do controle universal.
Não será pela opinião de um homem que se produzirá a união, mas pela unanimidade da voz dos Espíritos. Não será um homem, e muito menos nós que qualquer outro, que fundará a ortodoxia espírita. Nem será tampouco um Espírito, vindo impor-se a quem quer que seja. É a universalidade dos Espíritos, comunicando-se sobre toda a Terra, por ordem de Deus. Este é o caráter essencial da doutrina espírita, nisto está a sua força e a sua autoridade. Deus quis que a sua lei fosse assentada sobre uma base inabalável, e foi por isso que não a fez repousar sobre a cabeça frágil de um só.
É diante desse poderoso areópago, que nem conhece o conluio, nem as rivalidades ciumentas, nem o sectarismo, nem as divisões nacionais, que virão quebrar-se todas as oposições, todas as ambições, todas as pretensões à supremacia individual, que nós quebraríamos nós mesmos, se quiséssemos substituir esses decretos soberanos por nossas próprias idéias. Será ele somente que resolverá todas as questões litigiosas, que fará calar as dissidências e dará falta ou razão a quem de direito. Diante desse grandioso acordo de todas as vozes do céu, que pode a opinião de um homem ou de um Espírito? Menos que uma gota d'água que se perde no oceano, menos que a voz de uma criança abafada pela tempestade.
A opinião universal, eis portanto o juiz supremo, aquele que pronuncia em última instância. Ela se forma de todas as opiniões individuais. Se uma delas é verdadeira, tem na balança o seu peso relativo; se uma é falsa, não pode sobrepujar as outras. Nesse imenso concurso, as individualidades desaparecem, e eis aí um novo revés para o orgulho humano.
Esse conjunto harmonioso já se esboça; portanto, este século não passará antes que ele brilhe em todo o seu esplendor, de maneira a resolver todas as incertezas; porque daqui para diante vozes poderosas terão recebido a missão de se fazerem ouvir, para reunir os homens sob a mesma bandeira, uma vez que o campo esteja suficientemente preparado. Enquanto isso, aquele que flutuar entre dois sistemas opostos poderá observar em que sentido se forma a opinião geral: é o indício seguro do sentido em que se pronuncia a maioria dos Espíritos, dos diversos pontos sobre os quais se comunicam; é um sinal não menos seguro de qual dos dois sistemas predominará.
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