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sexta-feira, 28 de maio de 2021

DIMAS : ARREPENDIMENTO E RECUPERAÇÃO
















Dimas: Arrependimento e Recuperação

Aqueles terríveis dias anunciados se concretizavam.

A semana, que se iniciara festiva entre cânticos e júbilos, culminava em tragédia de hediondez.

Fazia pouco, e a sinistra caravana atravessara as ruelas estreitas de Jerusalém até alcançar o Gólgota, fora dos muros da cidade.

O madeiro tosco já se encontravam aguardando as vítimas.

A crucificação era prerrogativa de Roma, que punia com crueza os inimigos de César e do Estado.

As tricas infames e as intrigas soezes levaram o Justo a uma triste peregrinação entre Anás, Caifás e Pilatos, num enredo político-religioso que a embriaguez farisaica, amparada pelos interesses subalternos do representante do Imperador que - embora a inteireza moral do Réu - cedeu às pressões hábeis da indignidade mal disfarçada, entregando-os aos Seus inimigos.

Ele não reagia de forma alguma, como se guardasse o veredicto já adrede tomado.

Imposto no cárcere após a humilhação pública no Pretório, no dia seguinte, ao Sol ardente e entre sarcasmos e doestos dos perseguidores gratuitos, Ele carregara a Cruz, tropeçando várias vezes sob o peso do madeiro da vergonha.

Agora, a música lúgubre das marteladas empurrando os cravos enferrujados que lhe rasgavam as carnes, os tendões e ossos, provocando dores acerbas, ficaria ribombando surdamente nos ouvidos das testemunhas...

Dois ladrões faziam-lhe companhia, como a caracterizá-lo na mesma condição de bandido, Ele que era a demonstração viva da Verdade.

Ao ser erguida a cruz e colocada na cova, calçada com pedras informes, o corpo derreou no poste e as farpas pontiagudas cravaram-se-lhe nas carnes e nos músculos relaxados uns e tensos outros, após longas horas de aflição...

Um gemido dorido escapou-lhe dos lábios arroxeados, e a coroa de cardos mais se lhe cravou na cabeça empastada de suor e de sangue.

Os vândalos, que zombavam, foram acometidos por estranho presságios, enquanto que a Natureza se enlutava e vestia-se da tormenta que arrebentou com violência, causando espanto e temor.

A terra exausto do calor refrescou-se e o céu voltou à transparência anterior.

As pessoas contemplavam a cena hedionda, quando Ele disse estar com sede em um grito rouco, para que cumprisse todas as Profecias.

Deram-lhe uma esponja mergulhada em fel e aloés, presa na ponta de uma lança, que foi encostada aos Seus lábios rachado, sangrentos...

Disfarçado na turbamulta, para não se identificado, Tiago, que era Seus discípulo, acompanhava com lágrimas o trágico acontecimento e se interrogava em silêncio:

Onde o carinho de Deus para com Seu Filho? 

Não era Ele o Messias? 

Assim retribuía às atividades de amor, que Ele realizara na Terra?

Tiago não podia entender, nas suas reflexões racionais, os desígnios de Deus, pensando conforme os padrões convencionais.

Nesse comenos, olhou em derredor, procurando um rosto conhecido, de alguém que o aplaudira em dias passados, quando da entrada triunfal em Jerusalém. Não havia ninguém.

Nem sequer um dos que lhe receberam a cura, as dádivas da Sua compaixão e misericórdia.

Ninguém que houvesse acompanhado. Nem os amigos de ministério se faziam presentes, à exceção de João, que abraçava a Sua mãe, ao lado de outras mulheres, trêmulas e receosas.

Tiago não pode dominar a aflição que o tomou por inteiro e pôs-se a chorar convulsivamente.

O Mestre olhou-o compassivo, e murmurou ternas palavras nos ouvidos do seu coração.

No mesmo instante, Dimas, o ladrão que estorcegava ao Seu lado direito, procurou identificar no grupo exótico que se movimentava aos pés das cruzes, além de conhecido, e os seus olhos se cruzaram com os de sua mãe Tamar.

Pelas reminiscências, a memória evocou-lhe a infância e a adolescência na orfandade paterna bem como os sacrifícios daquela mulher extraordinária.

Foi na juventude que se iniciara na rapina, unindo-se a outros desordeiros e atirando-se aos abismos do crime.

O instinto de mãe havia percebido a mudança do filho e advertira mil vezes, sem que ele se resolvesse por qualquer mudança real, embora não lhe confirmasse as suspeitas.

Quando se tornou notória a sua infeliz conduta, ele lhe prometera e à noiva Esther, que aquela seria a última viagem às terras fabulosas do além- Jordão, para poder oferecer-lhes a segurança de um lar honrado após consorciar-se e construir a família.

De tal maneira elaborou e apresentou o plano da viagem, que as duas mulheres acreditaram...

... Agora, surpreendido pelos soldados que o haviam emboscado no desfiladeiro por onde passavam as caravanas que ele e Giestas pretendiam assaltar, foram aprisionados e ali estavam punidos.

A mãe aflita chorava, interrogando com dorido silêncio:

- Por quê, meu filho? Em que errei a tua educação?!

Afogada em lágrimas esteve a ponto de cair, quando foi amparada pela jovem companheira, Esther, a noiva inditosa.

Dimas desejou gritar, estremunhado e louco, no justo momento em que o Mestre o fitou com suavidade.

Tomado de honesto arrependimento pelas alucinações praticadas, exorou, em agonia e fé:

- Senhor, lembra-te de mim, quando entrares no paraíso.

Havia sinceridade e unção.

O arrependimento chegava-lhe na hora extrema. Reconhecia os erros e desejava reabilitação, anelava por confortar a mãezinha agônica e a noiva humilhada, mas era tarde.

Debatia-se na agonia, quando o Rabi, empapado do suor de sangue misturado ao pó, com chagas abertas como flores rubras de bordas rasgadas, lhe respondeu, misericordioso:

- Em verdade, em verdade, te digo hoje: entrarás comigo no paraíso...

Uma aragem fresca e suave passou pela alma do bandido.

Acompanhando a cena grandiloqüente, a Sua mãe percebeu a outra mulher quase desfalecida. Acercou-se-lhe com passo trôpego e interrogou-a com voz trêmula:

- É teu filho, o crucificado da direita?

- Sim, é meu filho...

- Então, mulher, se meu filho, o do meio, disse ao teu filho, que o atenderia, crê, porque meu filho é o Excelente Filho de Deus, o Seu Messias.

As duas mulheres se abraçaram, e novamente a terra tremeu, a tormenta voltou, e entre o ribombar dos trovões e o balé do relâmpago que cortava ziguezagueante as nuvens carregadas, Ele gritou:

- Está tudo consumado!
*
A Humanidade infeliz, vítima da ignomínia, tentou silenciar a Verdade que viera libertá-la, método infame utilizado pela covardia para retardar o próprio progresso.

Sempre porém, haverá oportunidade para o homem arrepender-se e recomeçar. Dimas era a última lição de arrependimento e de recuperação.
____________
(*) Lucas: 23-42.
Nota da Autora Espiritual
Do Livro : Até o Fim dos Tempos- Divaldo/Amélia Rodrigues.

sexta-feira, 16 de abril de 2021

TERIA O CHAMADO 'BOM LADRÃO IDO PARA O PARAÍSO?


"[...]A Doutrina Espírita nos ensina que apenas os Espíritos puros, que já atingiram elevado índice de perfeição, terão acesso a essas elevadas regiões[...]E' evidente que o Espírito do chamado Bom Ladrão não o acompanhou, mas passou a sentir um novo estado de Espírito; passou a desfrutar de serenidade, sentiu toda a extensão dos seus desvios e, interiormente, sentiu a necessidade do reajuste, de resgatar todo o mal que havia semeado.Com isso, em novas reencarnações, que forçosamente deveria ter no futuro, viveria num estágio melhor, experimentaria em seu coração os benefícios da paz, da serenidade e do amor, esforçando-se por redimir-se dos delitos do pretérito; passaria a conceber que na Justiça Divina não existe a promoção pela graça, ou pelo milagre, na senda evolutiva, mas Deus, em sua infinita misericórdia, lhe daria novas oportunidades, a fim de se enquadrar no rol dos homens sensatos, ponderados, que vivem num estado de paz interior e de uma relativa felicidade."






"E disse a Jesus: Senhor, lembra-te de mim, quando entrares no teu Reino,

E disse-lhe Jesus: "Em verdade te digo, que hoje estarás comigo no Paraíso."

- (Lucas, 23:42-43)


Teria o Espírito imperfeito do chamado Bom Ladrão ido para Paraíso, juntamente com o excelso Espírito de Jesus Cristo? Ele apenas proferiu algumas ligeiras palavras de simpatia, e será que isso teria sido o bastante para ele adentrar as alcandoradas regiões celestiais, da mesma maneira como o fez Jesus Cristo?


A Doutrina Espírita nos ensina que apenas os Espíritos puros, que já atingiram elevado índice de perfeição, terão acesso a essas elevadas regiões.


Entretanto, houve uma promessa emanada de Jesus: Hoje estarás comigo no Paraíso". É evidente que o Mestre, pendurado no madeiro infamante, não poderia jamais formular uma promessa em vão. Por isso, como ocorre com numerosos ensinamentos de Jesus, cumpre se deduza dessa passagem evangélica o sentido alegórico que ela encerra, interpretando-a, não pela "letra que mata", mas pelo "Espírito que vivifica".


Viver no Paraíso ou nas regiões umbralinas é simplesmente um estado consciencial. Um indivíduo que vive em constante estado de revolta, que pratica toda a sorte de maldades, que menospreza os mais comezinhos princípios da bondade e do amor, que espanca esposa e filhos, que se embriaga ou se chafurda nos vícios, que alimenta ódio contra os seus semelhantes, vive com a sua consciência num estado verdadeiramente infernal.


Não desfruta da paz de Espírito e está em constante estado de revolta interior, blasfemando contra tudo e contra todos. Por outro lado, um homem que pratica o bem sem mistura do mal, que sente o coração inundado dos sentimentos de amor ao próximo, que se rege pelas normas da brandura, da tolerância, da fraternidade, que vive em paz com os seus familiares, que abomina os vícios, os desregramentos, vive num estado conciencial de paz, de serenidade.


Com fundamento nesses dois parâmetros, pode-se afirmar que a criatura humana, mesmo aqui na Terra, pode viver no chamado Inferno ou no Paraíso.


O chamado Bom Ladrão, evidentemente, dado o gênero de vida que levava, prejudicando o seu próximo,  apropriando-se dos bens alheios e semeando a maldade e talvez até a morte, bem revelava o estado de inferioridade de seu Espírito. No entanto, condenado pela justiça dos homens a morrer na cruz, evidencia que os crimes por ele praticados eram de acentuada gravidade.


Todavia, suspenso no madeiro, sentiu, repentinamente, um sentimento de remorso, ao ver Jesus, um inocente, um expoente do amor, morrer de maneira tão infamante. Ele se condoeu; sentiu no âmago do seu coração que havia apenas praticado o mal, que não havia; amuado o seu próximo. Ao ouvir os impropérios que o outro ladrão, crucificado, dirigia a Jesus, exclamou: "E nós, na verdade, com justiça fomos condenados e estamos recebendo o que os nossos feitos mereciam; mas este nenhum mal fez."


E, dirigindo-se ao Mestre, disse: "Senhor, lembra-te de mim, quando entrares no teu Reino", merecendo a promessa de Jesus: "Hoje mesmo estarás comigo no Paraíso". Espírito elevado que é, Jesus que assolava aquele seu irmão menor, viu o seu arrependimento, e, como o remorso é a porta da redenção espiritual, sentenciou: "Hoje estarás comigo no Paraíso."


E' evidente que o Espírito do chamado Bom Ladrão não o acompanhou, mas passou a sentir um novo estado de Espírito; passou a desfrutar de serenidade, sentiu toda a extensão dos seus desvios e, interiormente, sentiu a necessidade do reajuste, de resgatar todo o mal que havia semeado.


Com isso, em novas reencarnações, que forçosamente deveria ter no futuro, viveria num estágio melhor, experimentaria em seu coração os benefícios da paz, da serenidade e do amor, esforçando-se por redimir-se dos delitos do pretérito; passaria a conceber que na Justiça Divina não existe a promoção pela graça, ou pelo milagre, na senda evolutiva, mas Deus, em sua infinita misericórdia, lhe daria novas oportunidades, a fim de se enquadrar no rol dos homens sensatos, ponderados, que vivem num estado de paz interior e de uma relativa felicidade.


Com isso, estaria ele desfrutando de um "Paraíso" consciencial, quando comparado com o estado verdadeiramente infernal em que viveu na existência que havia culminado com a sua crucificação.


O Mestre não falhou em sua promessa, pois o enquadrou numa senda diferente, que o conduziria melhor na caminhada rumo a Deus, diminuindo, paulatinamente, a distância que o separava do Criador; abreviaria o tempo necessário para, realmente, adentrar as regiões elevadas dos Planos Divinos, região comumente chamada de "Paraíso".


Paulo A. Godoy

sábado, 18 de maio de 2019

Infortúnio materno



 "Cristalizada, contudo, na preguiça, qual flor inútil a viver no luxo dourado, por doze vezes pratiquei o aborto confesso… Surda aos ditames da consciência que me ordenava o apostolado maternal, expulsei de mim os antigos laços que em outro tempo se acumpliciavam comigo na delinquência, assassinando as horas de trabalho que o Senhor me havia facultado no campo feminino… E, após vinte anos de teimosia delituosa, ante o auxílio constante que me era conferido pelo Amparo Celestial, nossos Benfeitores permitiram, para minha edificação, fosse eu entregue aos resultados de minha própria escolha… Enlaçada magneticamente àqueles que a Divina Bondade me restituiria por filhos ao coração e aos quais recusei guarida em minha ternura, fui obrigada a tolerar-lhes o assalto invisível, de vez que, seis deles, extremamente revoltados contra a minha ingratidão, converteram-se em perseguidores de minha felicidade doméstica…"

                                             **

Em pleno hospital da Espiritualidade, pobre criatura estendeu-nos o olhar suplicante e rogou:

— O senhor consegue escrever para a Terra?

— Quando mo permitem — repliquei entre pesaroso e assombrado.

Quem era aquela mulher que me interpelava desse modo?

A fisionomia escaveirada exibia recordações da morte. A face inundada de pranto tinha esgares de angústia e as mãos esqueléticas e entrefechadas davam a ideia de garras em forma de conchas.

Dante não conseguiria trazer do Inferno imagem mais desolada de sofrimento e terror.

— Escreva, escreva! — repetia chorando.

— Mas escrever a quem?

— Às mulheres… — clamou a infeliz. — Rogue-lhes não fujam da maternidade nobre e digna… peço não façam do casamento uma estação de egoísmo e ociosidade…

Os soluços a lhe rebentarem do peito induziam-nos a doloroso constrangimento.

E a infeliz contou em lágrimas:

— Estive na Terra, durante quase meio século… Tomei corpo entre os homens, após entender-me com um amigo dileto que seguiu, antes de mim, no rumo da arena carnal, onde me recebeu nos braços de esposo devotado e fiel. Com assentimento dos instrutores, cuja bondade nos obtivera o retorno à escola física, comprometemo-nos a recolher oito filhinhos, oito corações de nosso próprio passado espiritual, que por nossa culpa direta e indireta jaziam nas furnas da crueldade e da indisciplina… Cabia-nos acolhê-los carinhosamente, renovando-lhes o espírito, ao hálito de nosso amor… Suportar-lhes-íamos as falhas renascentes, corrigindo-as pouco a pouco, ao preço de nossos exemplos de bondade e renúncia… Nós mesmos solicitáramos semelhante serviço… Para alcançar mais altos níveis de evolução, suplicamos a prova reparadora… Saberíamos morrer gradativamente no sacrifício pessoal, para que os associados de nossos erros diante da Lei Divina recuperassem a noção da dignidade.

 A triste narradora fez longa pausa que não ousamos interromper e continuou:

— Entretanto, casando-me com Cláudio, o amigo a que me reportei, fui mãe de um filhinho, cujo nascimento não pude evitar…

Paulo, o nosso primogênito, era uma pérola tenra em nossas mãos… Despertava em meu ser comoções que o verbo humano não consegue reproduzir… Ainda assim, acovardada perante a luta, por mais me advertisse o esposo abençoado, transmitindo avisos e apelos da Vida Superior, detestei a maternidade, asilando-me no prazer… Cláudio era compelido a gastar largas somas para satisfazer-me nos caprichos da moda… Mas a frivolidade social não era o meu crime… Nas reuniões mundanas mais aparentemente vazias pode a alma aprender muito quando resolve servir ao bem…  Cristalizada, contudo, na preguiça, qual flor inútil a viver no luxo dourado, por doze vezes pratiquei o aborto confesso… Surda aos ditames da consciência que me ordenava o apostolado maternal, expulsei de mim os antigos laços que em outro tempo se acumpliciavam comigo na delinquência, assassinando as horas de trabalho que o Senhor me havia facultado no campo feminino… E, após vinte anos de teimosia delituosa, ante o auxílio constante que me era conferido pelo Amparo Celestial, nossos Benfeitores permitiram, para minha edificação, fosse eu entregue aos resultados de minha própria escolha… Enlaçada magneticamente àqueles que a Divina Bondade me restituiria por filhos ao coração e aos quais recusei guarida em minha ternura, fui obrigada a tolerar-lhes o assalto invisível, de vez que, seis deles, extremamente revoltados contra a minha ingratidão, converteram-se em perseguidores de minha felicidade doméstica… Fatigado de minhas exigências, meu esposo refugiou-se no vício, terminando a existência num suicídio espetacular… Meu filho, ainda jovem, sob a pressão dos perseguidores ocultos que formei para a nossa casa, caiu nas sombras da alienação mental, desencarnando em tormento indescritível num desastre da via pública, e eu… pobre de mim, abordando a madureza, conheci a dolorosa tumoração das próprias entranhas…  A veste carnal, como que horrorizada de minha presença, expulsou-me para os domínios da morte, onde me arrastei largo tempo, com todos os meus débitos terrivelmente agravados, sob a flagelação e o achincalhe daqueles a quem podia ter renovado com o bálsamo de meu leite e com a bênção de minha dor…

A desditosa enferma enxugou as lágrimas com que nos acordava para violenta emoção e terminou:

— Fale de minha experiência às nossas irmãs casadas e robustas que dispõem de saúde para o doce e santo sacrifício de mãe! Ajude-as a pensar… Que não transformem o matrimônio na estufa de flores inebriantes e improdutivas, cujo perfume envenenado lhes abreviará o passo na direção das trevas… Escreva!… Diga-lhes algo do martírio que espera, além da morte, quantos quiseram ludibriar a vida e matar as horas.

A mísera doente, sustentada por braços amigos, foi conduzida a vasta câmara de repouso e, impressionados com tamanho infortúnio, tentamos cumprir-lhe o desejo e transmitir-lhe a palavra; contudo, apesar do respeito que consagramos à mulher de nosso tempo, cremos que o nosso êxito seria mais seguro se caminhássemos para um cemitério e assoprássemos a mensagem para dentro de cada túmulo.

Fonte: Contos e Apólogos
.Irmão X

sábado, 6 de julho de 2013

Conhecendo o Livro " O Céu e o Inferno " Suicidas- Parte 9

ANTOINE BELL

Era o caixa de uma casa bancária do Canadá e suicidou-se a 28 de fevereiro de 1865. Um dos nossos correspondentes, médico e farmacêutico residente na mesma cidade, deu-nos dele as informações que se seguem:
"Conhecia-o, havia perto de 20 anos, como homem pacato e chefe de numerosa família. De tempos a certa parte imaginou ter comprado um tóxico na minha farmácia, servindo-se dele para envenenar alguém. Muitas vezes vinha suplicar-me para lhe dizer a época de tal compra, tomado então de alucinações terríveis. Perdia o sono, lamentava-se, batia nos peitos. A família vivia em constante ansiedade das 4 da tarde às 9 da manhã, hora esta em que se dirigia para a casa bancária, onde, aliás, escriturava os seus livros com muita regularidade, sem que jamais cometesse um só erro. Habitualmente dizia sentir dentro de si um ente que o fazia desempenhar com acerto e ordem a sua contabilidade. Quando se afigurava convencido da extravagância das suas idéias, exclamava: - "Não; não; quereis iludir-me... lembro-me... é a verdade..."
A pedido desse amigo, foi ele evocado em Paris, a 17 de abril de 1865.
1. - Evocação. - R. Que pretendeis de mim? Sujeitar-me a um interrogatório? É inútil, tudo confessarei.
2. - Bem longe de nós o pensamento de vos afligir com perguntas indiscretas; desejamos saber apenas qual a vossa posição nesse mundo, bem como se poderemos ser-vos úteis... - R. Ah! Se for possível, ser-vos-ei extremamente grato. Tenho horror ao meu crime e sou muito infeliz!
3. - Temos a esperança de que as nossas preces atenuarão as vossas penas. Afigura-se-nos que vos achais em boas condições, visto como o arrependimento já vos assedia o coração - o que constitui um começo de reabilitação. Deus, infinitamente misericordioso, sempre tem piedade do pecador arrependido. Orai conosco. (Faz-se a prece pelos suicidas, a qual se encontra em O Evangelho segundo o Espiritismo.)
Agora, tende a bondade de nos dizer de quais crimes vos reconheceis culpado. Tal confissão, humildemente feita, ser-vos-á favorável.
- R. Deixai primeiro que vos agradeça por esta esperança que fizestes ralar no meu coração. Oh! há já bastante tempo que vivia numa cidade banhada pelo Mediterrâneo. Amava, então, uma bela moça que me correspondia; mas, pelo fato de ser pobre, fui repelido pela família. A minha eleita participou-me que desposaria o filho de um negociante cujas transações se estendiam para além de dois mares, e assim fui eu desprezado. Louco de dor, resolvi acabar com a vida, não sem deixar de assassinar o detestado rival, saciando o meu desejo de vingança. Repugnando-me os meios violentos, horrorizava-me a perpetração do crime, porém o meu ciúme a tudo sobrepujou. Na véspera do casamento, morria o meu rival envenenado, pelo meio que me pareceu mais fácil. Eis como se explicam as reminiscências do passado... Sim, eu já reencarnei, e preciso é que reencarne ainda... Oh! meu Deus, tende piedade das minhas lágrimas e da minha fraqueza!
4. - Deploramos essa infelicidade que retardou vosso progresso e sinceramente vos lamentamos; dado, porém, que vos arrependais, Deus se compadecerá de vós. Dizei-nos se chegastes a executar o vosso projeto de suicídio...
- R. Não; e confesso, para vergonha minha, que a esperança se me desabrochou novamente no coração, com o desejo de me aproveitar do crime já cometido. Traíram-me, porém, os remorsos e acabei por expiar, no último suplício, aquele meu desvario: enforquei-me.
5. - Na vossa última encarnação tínheis a consciência do mal praticado na penúltima?
- R. Nos últimos anos somente, e eis como: - eu era bom por natureza, e, depois de submetido, como todos os homicidas, ao tormento da visão perseverante da vítima, que me perseguia qual vivo remorso, dela me descartei depois de muitos anos, pelo meu arrependimento e pelas minhas preces. Recomecei outra existência - a última -que atravessei calmo e tímido. Tinha em mim como que vaga intuição da minha inata fraqueza, bem como da culpa anterior, cuja lembrança em estado latente conservara.
Mas um Espírito obsessor e vingativo, que não era outro senão o pai da minha vítima, facilmente se apoderou de mim e fez reviver no meu coração, como em mágico espelho, as lembranças do passado.
Alternadamente influenciado por ele e por meu gula, que me protegia, eu era o envenenador e ao mesmo tempo o pai de família angariando pelo trabalho o sustento dos filhos. Fascinado por esse demônio obsessor, deixei-me arrastar para o suicídio. Sou muito culpado realmente, porém menos do que se deliberasse por mim mesmo. Os suicidas da minha categoria, incapazes por sua fraqueza de resistir aos obsessores, são menos culpados e menos punidos do que os que abandonam a vida por efeito exclusivo da própria vontade.
Orai comigo para que o Espírito que tão fatalmente me obsidiou renuncie à sua vingança, e orai por mim para que adquira a energia, a força necessária para não ceder à prova do suicídio voluntário, prova a que serei submetido, dizem-me, na próxima encarnação.
Ao guia do médium: - Um Espírito obsessor pode, realmente, levar o obsidiado ao suicídio?
- R. Certamente, pois a obsessão que, de si mesma, é já um gênero de provação, pode revestir todas as formas. Mas isso não quer dizer isenção de culpabilidade. O homem dispõe sempre do seu livre-arbítrio e, conseguintemente, está em si o ceder ou resistir às sugestões a que o submetem.
Assim é que, sucumbindo, o faz sempre por assentimento da sua vontade. Quanto ao mais, o Espírito tem razão dizendo que a ação instigada por outrem é menos culposa e repreensível, do que quando voluntariamente cometida. Contudo, nem por isso se inocenta de culpa, visto como, afastando-se do caminho reto, mostra que o bem ainda não está vinculado ao seu coração.
6. - Como, apesar da prece e do arrependimento terem libertado esse Espírito da visão tormentosa da sua vitima, pôde ele ser atingido pela vingança de um obsessor na última encarnação?
- R. O arrependimento, bem o sabeis, é apenas a preliminar indispensável à reabilitação, mas não é o bastante para libertar o culpado de todas as penas. Deus não se contenta com promessas, sendo preciso a prova, por atos, do retorno ao bom caminho. Eis por que o Espírito é submetido a novas provações que o fortalecem, resultando-lhe um merecimento ainda maior quando delas sai triunfante.
O Espírito só arrosta com a perseguição dos maus, dos obsessores, enquanto estes o não encontram assaz forte para resistir-lhes. Encontrando resistência, eles o abandonam, certos da inutilidade dos seus esforços.
    Nota - Estes dois últimos exemplos mostram-nos a renovação da mesma prova em sucessivas encarnações, e por tanto tempo quanto o da sua ineficácia. Antoine BeIl patenteia-nos, enfim, o fato muito instrutivo do homem perseguido pela lembrança de um crime cometido em anterior existência, qual um remorso e um aviso. Vemos ainda por aí que todas as existências são solidárias entre si; que a justiça e bondade divinas se ostentam na faculdade ao homem conferida de progredir gradualmente, sem jamais privá-lo do resgate das faltas; que o culpado é punido pela própria falta, sendo essa punição, em vez de uma vingança de Deus, o meio empregado para fazê-lo progredir.

terça-feira, 2 de julho de 2013

DO APRENDIZADO DE JUDAS

DO  APRENDIZADO  DE  JUDAS
Irmão X
 
Não obstante amoroso, Judas era, muita vez, estouvado e inquieto. Apaixonara-se pelos ideais do Messias, e, embora esposasse os novos princípios, em muitas ocasiões surpreendia-se em choque contra eles. Sentia-se dono da Boa-Nova e, pelo desvairado apego a Jesus, quase sempre lhe tornava a dianteira nas deliberações importantes. Foi assim que organizou a primeira bolsa de fundos da. comunhão apostólica e, obediente aos mesmos impulsos, julgou servir à grande causa que abracara, aceitando a perigosa cilada. que redundou na prisão do Mestre.
Apesar dos estudos renovadores a que sinceramente se entregara, preso aos conflitos íntimos que lhe caracterizavam o modo de ser, ignorava o processo de conquistar simpatias.
Trazia constantemente nas lábios uma, referência amarga, um conceito infeliz.
Quando Levi se reportava a alguns funcionários de Herodes, simpáticos ao Evangelho, dizia, mordaz:
– São víboras disfarçadas. Sugam o erário público, bajulam sacerdotes e deixam-se pisar pelo romano dominador... A meu parecer, não passam de espiões..
O companheiro ouvia tais afirmativas, com natural desencanto, e os novos colaboradores dele se distanciavam menos entusiasmados.
Generosa amiga de Joana de Cusa ofereceu, certo dia, os recursos precisos para a caminhada do grupo, de Cafarnaum a Jerusalém. Porém, recebendo a importância, o apóstolo irrefletido alegou, ingratamente:
– Guardo a oferta; contudo, não me deixo escarnecer. A doadora pretende comprar o reino dos Céus, depois de haver gozado todos os prazeres do reino da Terra. Saiba.m todos que este ó um dinheiro impuro, nascido da iniqüidade.
Estas palavras, pronunciadas diante da benfeitora, trouxeram-lhe indefinível amargura.
Em Cesareia, heróica mulher de um paralítico, sentindo-se banhada pelos clarões do Evangelho, abriu as portas do reduto doméstico aos desamparados da sorte. Orfãos e doentes buscaram-lhe o acolhimento fraternal. O discípulo atrabiliário, no entanto, não se esquivou à, maledicência:
– E o passado dela? – clamou cruelmente – o marido enfermou desgostoso pelos quadros tristes que foi constrangido a presenciar. Francamente, não lhe aceito a conversão. Certo, desenvolve piedade fictícia para aliciar grandes lucros.
A senhora, duramente atingida pelas descaridosas insinuações, paralisou a benemerência iniciante, com enorme prejuízo para os filhos do infortúnio.
Quando o próprio Messias abençoou Zaqueu e os serviços dele, exclamou Judas, indignado, às ocultas:
– Este publicano pagará mais tarde. Escorcha, os semelhantes, rodeia-se de escravas, exerce avareza, sórdida e ainda, pretende o raiz.o divino!...
Não irá longe... Enganara o Mestre, não a mim...
Alimentando tais disposições, sofria a desconfiança de muitos. De quando em quando, via-se repelido delicadamente.
Jesus, que em silêncio lhe seguia as atitudes, aconselhava prudência, amor e tolerância. Mal não terminava,porém, as observações carinhosas, chegava Simão Pedro, por exemplo, explicando que Jeroboão, fariseu simpatizante da. Boa-Nova, parecia inclinado a ajudar o Evangelho renascente.
– Jeroboão? – advertia Judas, sarcástico – aquilo e uma raposa de unhas afiadas. Mero fingimento! Conheço-o há vinte anos. Não sabe senão explorar o próximo e amontoar dinheiro. Houve tempo em que chegou a esbordoar o próprio pai, porque o infeliz lhe desviou meia pipa de vinho!...
A verdade, porém, é que as circunstâncias, pouco a pouco, obrigaram-no a insular-se. Os próprios companheiros andavam arredios, Ninguém lhe aprovava as acusações impulsivas e as lamentações sem propósito. Apenas o Cristo não perdia a paciência. Gastava longas horas, encorajando-o e esclarecendo-o afetuosamente...
Numa tarde quente e seca, viajavam ambos, nos arredores de Nazaré, cansados de jornada comprida, quando o filho de Kerioth indagou, compungido :
– Senhor, por que motivos sofro tão pesadas humilhações? Noto que os próprios companheiros se afastam cautelosos de mim... Não consigo fazer relações duradouras. Há como que forçada separação entre meu espírito e os demais... Sou incompreendido e vergastado pelo destino...
E levantando os olhos tristes para o Divino Amigo, repetia :
– Por quê?!...
Jesus ia responder, condoído, observando que a voz do discípulo tinha lágrimas que não chegavam a cair, quando se acercaram, subitamente, de poço humilde, onde costumavam aliviar a sede. Judas que esperava ansioso aquela bênção, inclinou-se, impulsivo e, mergulhando as mãos ávidas no líquido cristalino, tocou inadvertidamente o fundo, trazendo largas placas de lodo à tona.
Oh! Oh! Que infelicidade!  - gritou em desespero.
O mestre bondoso sorriu calmamente e falou:
_ neste poço singelo, Judas, tens a lição que desejas. Quando quiseres água pura, retira-a com cuidado e reconhecimento. Não há necessidade de alvoroçar a lama do fundo e das margens. Quando tiveres sede de ternura e amor, faze o mesmo com teus amigos. Recebe-lhes a cooperação afetuosa sem cogitar do mal, a fim de que não percas o bem supremo.
Pesado silêncio caiu entre o benfeitor e o tutelado.
O apóstolo invigilante modificou a expressão do olhar, mas não respondeu.

Livro “Luz Acima”. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.

domingo, 5 de maio de 2013

Conhecendo o Livro Céu e o Inferno - Suicidas -Parte 7-Um Ateu

UM ATEU

M.J.-B.D... era um homem instruído, mas em extremo saturado de idéias materialistas, não acreditando em Deus nem na existência da alma. A pedido de um parente, foi evocado dois anos depois de desencarnado, na Sociedade Espírita de Paris.
1. - Evocação. - R. Sofro. Sou um réprobo.
2. - Fomos levados a evocar-vos em nome de parentes que, como tais, desejam conhecer da vossa sorte. Podereis dizer-nos se esta nossa evocação vos é penosa ou agradável? - R. Penosa.
3. - A vossa morte foi voluntária? - R. Sim. Nota - O Espírito escreve com extrema dificuldade. A letra é grossa, irregular, convulsa e quase ininteligível. Ao terminar a escrita encoleriza-se, quebra o lápis e rasga o papel.
4. - Tende calma, que nós todos pediremos a Deus por vós. - R. Sou forçado a crer nesse Deus.
5. - Que motivo poderia ter-vos levado ao suicídio? - R. O tédio de uma vida sem esperança.
    Nota - Concebe-se o suicídio quando a vida é sem esperança; procura-se então fugir-lhe a qualquer preço. Com o Espiritismo, ao contrário, a esperança fortalece-se porque o futuro se nos desdobra. O suicídio deixa de ser objetivo, uma vez reconhecido que apenas se isenta a gente do mal para arrostar com um mal cem vezes pior. Eis por que o Espiritismo tem seqüestrado muita gente a uma morte voluntária. Grandemente culpados são os que se esforçam por acreditar, com sofismas científicos e a pretexto de uma falsa razão, nessa idéia desesperadora, fonte de tantos crimes e males, de que tudo acaba com a vida. Esses serão responsáveis não só pelos próprios erros, como igualmente por todos os males a que os mesmos derem causa.
6. - Quisestes escapar às vicissitudes da vida... Adiantastes alguma coisa? Sois agora mais feliz? - R. Por que não existe o nada?
7. - Tende a bondade de nos descrever do melhor modo possível a vossa atual situação. - R. Sofro pelo constrangimento em que estou de crer em tudo quanto negava. Meu Espírito está como num braseiro, horrivelmente atormentado.
8. - Donde provinham as vossas idéias materialistas de outrora? - R. Em anterior encarnação eu fora mau e por isso condenei-me na seguinte aos tormentos da incerteza, e assim foi que me suicidei.
    Nota - Aqui há todo um corolário de idéias. Muitas vezes nos perguntamos como pode haver materialistas quando, tendo eles passado pelo mundo espiritual, deveriam ter do mesmo a intuição; ora, é precisamente essa intuição que é recusada a alguns Espíritos que, conservando o orgulho, não se arrependeram das suas faltas. Para esses tais, a prova consiste na aquisição, durante a vida corporal e à custa do próprio raciocínio, da prova da existência de Deus e da vida futura que têm, por assim dizer, incessantemente sob os olhos. Muitas vezes, porém, a presunção de nada admitir, acima de si, os empolga e absorve. Assim, sofrem eles a pena até que, domado o orgulho, se rendem à evidência.
9. - Quando vos afogastes, que idéias tínheis das conseqüências? Que reflexões fizestes nesse momento? - R. Nenhuma, pois tudo era o nada para mim. Depois é que vi que, tendo cumprido toda a sentença, teria de sofrer mais ainda.
10. - Estais bem convencido agora da existência de Deus, da alma e da vida futura? - R. Ah! Tudo isso muito me atormenta!
11. - Tornastes a ver vosso irmão? - R. Oh! não.
12. - E por que não? - R. Para que confundir os nossos desesperos? Exila-se a gente na desgraça e na ventura se reúne, eis o que é.
13. - Incomodar-vos-ia a presença de vosso irmão, que poderíamos atrair aí para junto de vós? - R. Não o façais, que o não mereço.
14. - Por que vos opondes? - R. Porque ele também não é feliz.
15. - Receais a sua presença, e no entanto ela só poderia ser benéfica para vós. - R. Não; mais tarde...
16. - Tendes algum recado para os vossos parentes? - R. Que orem por mim.
17. - Parece que na roda das vossas relações há quem partilhe das vossas opiniões. Quereis que lhes digamos algo a respeito? - R. Oh! os desgraçados! Assim possam eles crer em outra existência, eis quanto lhes posso desejar. Se eles pudessem avaliar a minha triste posição, muito refletiriam.
(Evocação de um irmão do precedente, que professava as mesmas teorias, mas que não se suicidou. Posto que também infeliz, este se apresenta mais calmo; a sua escrita é clara e legível.)
18. - Evocação. - R. Possa o quadro dos nossos sofrimentos ser útil lição, persuadindo-vos da realidade de uma outra existência, na qual se expiam as faltas oriundas da incredulidade.
19. - Vós, e vosso irmão que acabamos de evocar, vos vedes reciprocamente? -R. Não; ele me foge.
    Nota - Poder-se-ia perguntar como é que os Espíritos se podem evitar no mundo espiritual, uma vez que aí não existem obstáculos materiais nem refúgios impenetráveis à vista. Tudo é, porém, relativo nesse mundo e conforme a natureza fluídica dos seres que o habitam. Só os Espíritos superiores têm percepções indefinidas, que nos inferiores são limitadas. Para estes, os obstáculos fluídicos equivalem a obstáculos materiais. Os Espíritos furtam-se às vistas dos semelhantes por efeito volitivo, que atua sobre o envoltório perispiritual e fluidos ambientes. A Providência, porém, qual mãe, por todos os seus filhos vela, e por intermédio dos mesmos, individualmente, lhes concede ou nega essa faculdade, conforme as suas disposições morais, o que constitui, conforme as circunstâncias, um castigo ou uma recompensa.
20. - Estais mais calmo do que vosso irmão. Podereis dar-nos uma descrição mais precisa dos vossos sofrimentos? - R. Não sofreis aí na Terra no vosso orgulho, no vosso amor-próprio, quando obrigados a reconhecer os vossos erros?
"O vosso Espírito não se revolta com a idéia de vos humilhardes a quem vos demonstre o vosso erro? Pois bem! Julgai quanto deve sofrer o Espírito que durante toda a sua vida se persuadiu de que nada existia além dele, e que sobre todos prevalecia sempre a sua razão. Encontrando-se de súbito em face da verdade imponente, esse Espírito sente-se aniquilado, humilhado. A isso vem ainda juntar-se o remorso de haver por tanto tempo esquecido a existência de um Deus tão bom, tão indulgente. A situação é insuportável; não há calma nem repouso; não se encontra um pouco de tranqüilidade senão no momento em que a graça divina, isto é, o amor de Deus, nos toca, pois o orgulho de tal modo se apossa de nós, que de todo nos embota, a ponto de ser preciso ainda muito tempo para que nos despojemos completamente dessa roupagem fatal. Só a prece dos nossos irmãos pode ajudar-nos nesses transes.
21. - Quereis falar dos irmãos encarnados, ou dos Espíritos? - R. De uns como de outros.
22. - Enquanto nos entretínhamos com o vosso irmão, uma das pessoas aqui presentes orou por ele: - essa prece lhe foi proveitosa? - R. Ela não se perderá. Se ele agora recusa a graça, outro tanto não fará quando estiver em condições de recorrer a essa divina panacéia.
    Nota - Aqui lobrigamos um outro gênero de castigo, mas que não é o mesmo em todos os cépticos. Para este Espírito, é independente do sofrimento a necessidade de reconhecer verdades que repudiara quando encarnado. As suas idéias atuais revelam certo grau de adiantamento, comparativamente às de outros Espíritos persistentes na negação de Deus. Confessar o próprio erro é já alguma coisa, porque é premissa de humildade. Na subseqüente encarnação é mais que provável que a incredulidade ceda lugar ao sentimento inato da fé.
Transmitindo a resultante destas duas evocações à pessoa que no-las havia solicitado, tivemos dela a seguinte resposta:
"Não podeis imaginar, meu caro senhor, o grande benefício advindo da evocação de meu sogro e de meu tio. Reconhecemo-los perfeitamente. A letra do primeiro, sobretudo, é de uma analogia notável com a que ele tinha em vida, tanto mais quanto, durante os últimos meses que conosco passou, essa letra era sofreada e in-decifrável. Aí se verificam a mesma forma de pernas, da rubrica e de certas letras. Quanto ao vocabulário e ao estilo, a semelhança é ainda mais frisante; para nós, a analogia é completa, apenas com maior conhecimento de Deus, da alma e da eternidade que ele tão formalmente negava outrora. Não nos restam dúvidas, portanto, sobre a sua identidade. Deus será glorificado pela maior firmeza das nossas crenças no Espiritismo, e os nossos irmãos encarnados e desencarnados se tornarão melhores. A identidade de seu irmão também não é menos evidente; na mudança de ateu em crente, reconhecemos-lhe o caráter, o estilo, o contorno da frase. Uma palavra, sobre todas, nos despertou atenção - panacéia - sua frase predileta, a todo instante repetida.
"Mostrei essas duas comunicações a várias pessoas, que não menos se admiraram da sua veracidade, mas os incrédulos, com as mesmas opiniões dos meus parentes, esses desejariam respostas ainda mais categóricas.
"Queriam, por exemplo, que M. D... se referisse ao lugar em que foi enterrado, onde se afogou, como foi encontrado, etc. A fim de os convencer, não vos seria possível fazer nova evocação perguntando onde e como se suicidou, quanto tempo esteve submergido, em que lugar acharam o cadáver, onde foi inumado, de que modo, se civil ou religiosamente, foi sepultado? Dignai-vos, caro senhor, insistir pela resposta categórica a essas perguntas, pois são essenciais para os que ainda duvidam. Estou convencido de que darão, nesse caso, imensos resultados.
"Dou-me pressa a fim de esta vos ser entregue na sexta-feira de manhã, de modo a poder fazer-se a evocação na sessão da Sociedade desse mesmo dia... etc."
Reproduzimos esta carta pelo fato da confirmação da identidade e aqui lhe anexamos a nossa resposta para ensino das pessoas não familiarizadas com as comunicações de além-túmulo.
"As perguntas que nos pediram para novamente endereçar ao Espírito de vosso sogro, são, incontestavelmente, ditadas por intenção louvável, qual a de convencer incrédulos, visto como em vós não mais existe qualquer sentimento de dúvida ou curiosidade. Contudo, um conhecimento mais aprofundado da ciência espírita vos faria julgar supérfluas essas perguntas. Em primeiro lugar, solicitando-me conseguir resposta categórica, mostrais ignorar a circunstância de não podermos governar os Espíritos, a nosso talante. Ficai sabendo que eles nos respondem quando e como querem, e também como podem. A liberdade da sua ação é maior ainda do que quando encarnados, possuindo meios mais eficazes de se furtarem ao constrangimento moral que por acaso sobre eles queiramos exercer. As melhores provas de identidade são as que fornecem espontaneamente, por si mesmos, ou então as oriundas das próprias circunstâncias. Estas, é quase sempre inútil provocá-las. Segundo afirmais, o vosso parente provou a sua identidade de modo inconcusso; por conseguinte, é mais que provável a sua recusa em responder a perguntas que podem por ele ser com razão consideradas supérfluas, visando satisfazer à curiosidade de pessoas que lhe são indiferentes. A resposta bem poderia ser a que outros têm dado em casos semelhantes, isto é: - "para que perguntar coisas que já sabeis?"
"A isto acrescentarei que a perturbação e sofrimentos que o assoberbam devem agravar-se com as investigações desse gênero, que correspondem perfeitamente a querer constranger um doente, que mal pode pensar e falar, a historiar as minúcias da sua vida, faltando-se assim às considerações inspiradas pelo seu próprio estado.
"Quanto ao objetivo por vós alegado, ficai certo de que tudo seria negativo. As provas de identidade fornecidas são bem mais valiosas, por isso que foram espontâneas, e não de antemão premeditadas. Ora, se estas não puderam contentar os incrédulos, muito menos o fariam interrogativas já preestabelecidas, de cuja conivência poderiam suspeitar.
"Há pessoas a quem coisa alguma pode convencer. Esses poderiam ver o vosso parente, com os próprios olhos, e continuariam a supor-se vítimas de uma alucinação.
"Duas palavras ainda, quanto ao pedido que me fizestes de promover essa evocação no mesmo dia do recebimento de vossa carta. As evocações não se fazem assim de momento; os Espíritos nem sempre correspondem ao nosso apelo; é preciso que queiram, e não só isso, mas que também possam fazê-lo. É preciso, ainda, que encontrem um médium que lhes convenha, com as aptidões especiais necessárias e que esse médium esteja disponível em dado momento. É preciso, enfim, que o meio lhes seja simpático, etc. Pela concorrência dessas circunstâncias nem sempre se pode responder, e importa muito conhecê-las quando se quer praticar com seriedade e segurança."

sábado, 2 de março de 2013

OLHANDO PARA TRÁS."...Culpa quer dizer paralização das nossas oportunidades de crescimento no presente em consequência da nossa fixação doentia em comportamentos do passado..." , "...Culpar não é um método educativo... (...)Em muitas oportunidades encontramos indivíduos que teimam em culpar os outros, acreditando ser muito cômodo representar o papel de injustiçados e perseguidos. Colocam seus erros sobre os ombros das pessoas, da sociedade, da religião, dos obsessores, do mundo enfim. No entanto, só eles poderão decidir se reconhecem ou não suas próprias falhas, porque apenas dessa forma se libertarão da prisão mental a que eles mesmos se confinaram....

OLHANDO PARA TRÁS
"...Tal é aquele que, tendo feito mal sua tarefa, pede para recomeçá-la a fim de não perder o benefício do seu trabalho..." "... Rendamos graças à Deus que, na sua bondade, concede ao homem a faculdade da reparação e não a condena irrevogavelmente pela primeira falta" (Cap V, ítem 8)
Culpa quer dizer paralização das nossas oportunidades de crescimento no presente em consequência da nossa fixação doentia em comportamentos do passado. Quem se sente culpado se julga em "peccatum", palavra latina que quer dizer "pecado ou culpa". Logo, todos nós vestimos a densa capa da culpa desde a mais tenra infância.
Certas religiões utilizam-se frequentemente da culpa como meio de explorar a submissão de seus fiéis. Usam o nome de Deus e suas leis como provedores do mecanismo de punição e repressão, afirmando que garantem a salvação para todos aqueles que forem "tementes a Deus".
Esquecem-se, no entanto, de que o Criador da Vida é infinita Bondade e Compreensão e que sempre vê com os "olhos do amor", nunca punindo suas criaturas; na realidade, são elas mesmas que se autopenalizam, por não se renovarem nas oportunidades do livre-arbítrio e por ficarem, no presente, agarradas aos erros do passado.
Nossa atual cultura ainda é a mais grave geradora de culpa na formação educacional dos relacionamentos, seja no social, seja no familiar. No recinto do lar encontramos muitos pais induzindo os filhos à culpa: "Você ainda me mata do coração!", tática muito comum para manter sob controle uma pessoa rebelde; ou dos filhos que aprenderam a tramóia da culpa, para obter aquilo que desejam: "Os pais de minhas amigas deixam elas fazer isso".

Culpar não é um método educativo, nem tampouco gerador de crescimento, mas um meio de induzir as pessoas a não se responsabilizar por seus atos e atitudes.
Em muitas oportunidades encontramos indivíduos que teimam em culpar os outros, acreditando ser muito cômodo representar o papel de injustiçados e perseguidos. Colocam seus erros sobre os ombros das pessoas, da sociedade, da religião, dos obsessores, do mundo enfim. No entanto, só eles poderão decidir se reconhecem ou não suas próprias falhas, porque apenas dessa forma se libertarão da prisão mental a que eles mesmos se confinaram.

Dar importância às culpas é focalizar fatos passados com certa regularidade, sempre nos fazendo lembrar de alguma coisa que sentimos, ou deixamos de sentir, falamos ou deixamos de falar, permitimos ou deixamos de permitir, desperdiçando momentos valiosos do agora, quando poderíamos operar as verdadeiras bases para nosso desenvolvimento intelecto-moral.

"Ninguém que lança mão ao arado e olha para trás é apto para o reino de Deus." Olhando para trás, a alma não caminha resoluta e, conseqüentemente, não se liberta dos grilhões do passado. Todos nós fomos criados com possibilidades de acertar e errar; por isso, temos necessidade de exercitar para aprender
as coisas, de colocar as aptidões em treino, de repeti-las várias vezes entre ensaios e erros.
A culpa se estrutura nos alicerces do perfeccionismo. Alimentamos a idéia de que não seremos suficientemente bons se não fizermos tudo com perfeição. Esquecemo-nos, porém,de que todo o nosso comportamento é decorrente de nossa idade evolutiva e de que somos tão bons quanto nos permite nosso grau de evolução.

A todo momento, fazemos o melhor que podemos fazer, por estarmos agindo e reagindo de acordo com nosso "senso de realidade". O "arrependimento" resulta do quanto sabiamos fazer melhor e não o fizemos, enquanto que a culpa é, invariavelmente, a exigência de que deveríamos ter feito algo, porém não o fizemos por ignorância ou impotência.

A Divina Providência sempre "concede ao homem a faculdade da reparação e não o condena irrevogavelmente". Não há, razão, portanto, para culpar-se sistematicamente, pois ele será cobrado pelo "muito" ou pelo "pouco" que lhe foi dado, ou mesmo, "muito se pedirá àquele que muito recebeu".

Assevera Paulo de Tarso: "a mim, que fui antes blasfemo, perseguidor e injuriador, mas alcancei misericórdia de Deus, porque o fiz por ignorância, e por ser incrédulo". Tem-se, dessa forma, um ensinamento claro: a culpa é sempre proporcional ao grau de lucidez que se possui, isto é, nossa ignorância sempre nos protege.

Não guardemos culpa. Optemos pelo melhor, modificando nossa conduta. Reconheçamos o erro e não olhemos para trás, e sim, para frente, dando continuidade à nossa tarefa na Terra.

Hammed

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

A TERRA PROMETIDA


(Enviada pelo Sr. Rodolfo, de Mulhouse)
O Espiritismo se levanta e logo sua luz fecunda vai
alumiar o mundo; seu brilho magnífico protestará contra os ataques
dos interessados em conservar os abusos e contra a incredulidade
do materialismo. Os que duvidam sentir-se-ão felizes por encontrar
nesta doutrina nova, tão bela, tão pura, o bálsamo consolador que
os curará do cepticismo e os tornará aptos a melhorar e progredir,
como todas as demais criaturas. Privilegiados serão os que,
renunciando às impurezas da matéria, se lançarem em vôo rápido
até o topo das idéias mais puras e buscarem desmaterializar-se
completamente.
Povos! erguei-vos para assistir à aurora desta vida nova,
que vem para a vossa regeneração; que, enviada por Deus, vem para vos unir numa santa comunhão fraterna. Oh! como serão felizes os que, ouvindo esta voz abençoada do Espiritismo, seguirem sua bandeira e cumprirem o apostolado, que deve reconduzir os irmãos extraviados pela dúvida e pela ignorância, ou embrutecidos pelo vício!
Voltai, ovelhas desgarradas, voltai ao aprisco; levantai a
cabeça, contemplai o vosso Criador e rendereis homenagem ao seu
amor por vós. Retirai prontamente o véu que vos ocultava o
Espírito da Divindade; admirai-o em toda a sua bondade; prostrai
a face contra a terra e arrependei-vos. O arrependimento vos abrirá
as portas da felicidade: as de um mundo melhor, onde reinam o
amor mais puro, a fraternidade mais estreita, onde cada um sente
alegria na alegria do próximo.
Não sentis que se aproxima o momento em que vão
surgir coisas novas? Não sentis que a Terra está em trabalho de
parto? Que querem esses povos que se remexem, que se agitam,
que se aprestam para a luta? Por que vão combater? Para romper as
cadeias que estancam o progresso de sua inteligência, absorvem a
sua seiva, semeiam a desconfiança e a discórdia, armam o filho
contra o pai, o irmão contra o irmão, corrompem as nobres
aspirações e matam o gênio. Ó liberdade! Ó independência! nobres
atributos dos filhos de Deus, que alargais o coração e elevais a alma, é por vós que os homens se tornam bons, grandes e generosos; por vós nossas aspirações se voltam para o bem, a injustiça desaparece, os ódios se extinguem e a discórdia, envergonhada, foge e apaga seu facho, temendo irradiar seus sinistros clarões. Irmãos! escutai a voz que vos diz: Marchai! marchai para esse brilhante objetivo que vedes despontar mais além! Marchai para esse brilhante raio de luz que está à vossa frente, como a coluna luminosa adiante do povo de Israel; ele vos conduzirá à verdadeira Terra Prometida, onde reina
a eterna felicidade, reservada aos Espíritos puros. Armai-vos de
virtudes; purificai-vos das impurezas e, então a rota vos parecerá
fácil e a encontrareis coberta de flores; percorrê-la-eis com um
inefável sentimento de alegria, porque, a cada passo,
compreendereis que vos aproximais do alvo onde podeis
conquistar as palmas eternas.
Mardochée
Revista Espírita de 1861-Outubro

domingo, 20 de janeiro de 2013

NASCIMENTOS ESTRANHOS. "...Há quem nos pergunte por que motivo nascem crianças nos recintos de assistência a companheiros em tratamento de moléstias mentais. E responderemos com ligeira mostra do assunto...."


Diversos amigos, de passagem por Uberaba, deixaram-nos uma pergunta que nos tomou a atenção: “Por que
nascem crianças em lugares exclusivamente reservados aos tratamentos de doentes mentais?” Com o assunto em
pauta, em nossa reunião pública, O Livro dos Espíritos nos deu a questão 167 para estudo.
Os temas da reencarnação foram comentados. “Recomposição Espiritual”, foi a página que nosso Emmanuel
escreveu ao término das tarefas.
RECOMPOSIÇÃO ESPIRITUAL
Emmanuel
Há quem nos pergunte por que motivo nascem crianças nos recintos de assistência a companheiros em
tratamento de moléstias mentais.
E responderemos com ligeira mostra do assunto.
***
No Mais Além, certo amigo acreditou poder superar o desafio das facilidades humanas e pediu vantagens de berço no Plano Físico, a fim de cumprir elevada missão.
Ressurgiu, para logo, na linhagem de pais generosos que lhe ficharam o nome, de imediato, na posse de
avantajados recursos materiais.
Desenvolveu-se em refúgio respeitável e opulento.
Encontrou grupo familiar que estendeu apoio e compreensão.
Favorecido por educadores abnegados, senhoreou ingredientes dos mais valiosos para a formação da própria cultura.
Entretanto, em plena maioridade na experiência humana, por mais advertido fosse pelos princípios da fé que
esposara, decidiu-se pelo abuso.
Traçou infeliz caminho a si próprio.
Sulcou de sofrimento o coração dos pais, feriu companheiros, desbaratou os próprios bens, suscitou a
infelicidade de vastos agrupamentos domésticos, criou dificuldades e sombras e, por fim, precipitando-se em
desregramentos sem nome, desencarnou em lamentável posição de criminalidade.
De regresso ao Mundo Espiritual, reconheceu amigos, recordou afeições, clareou o pensamento, reformulou
pereceres, recompôs idéias e aceitou a culpa que lhe danificava a consciência.
Por mais se lhe dispensasse consolação, mais lhe doía o arrependimento.
Por mais se lhe prestassem favores, mais profundamente sentia o remorso que lhe arruinava todas as forças.
E isso, porque a apreciação de todos os fatos em si procedia dele próprio, no autojuízo a que todos nos
submetemos tão mais intensamente quanto maior o discernimento que venhamos a desfrutar.
Decorrido algum tempo de revisão e reajuste, ei-lo com o novo requerimento de que se supunha necessitado.
Rogava, agora, às autoridades superiores, difícil reencarnação em ambiente obscuro e indefinível, em que
quaisquer vantagens maciças lhe fossem sonegadas.
Foi assim que o vimos renascer, em espaço do Plano Físico totalmente consagrado ao tratamento de nossos
irmãos alienados mentais, recanto esse do qual estamos a vê-lo emergindo muito pouco a pouco, em seus
recursos espirituais, de modo a facear em futuro próximo o grave trabalho de reconquista de que se sente
sequioso, de maneira a reinstalar-se por dentro da própria alma, no respeito a si
Mesmo.
Como, pois, é fácil de entender, somos livres na escolha, mas nos resultados de nossas escolhas, quaisquer que sejam, de um modo ou de outro, com a nossa própria adesão voluntária à execução da Lei, a Lei sempre se cumprirá.

Livro: Caminhos de Volta
Chico Xavier, Espíritos Diversos.

sábado, 29 de dezembro de 2012

MAIOR QUE SALOMÃO. . .


“E eis aqui está quem é maior do que Salomão.”
(Lucas, 11:31)
Nínive era uma cidade cuja população vivia subvertida pela imoralidade e desregramentos de toda a sorte.
Um Espírito do Senhor apresentou-se ao médium Jonas e ordenou-lhe que fosse lançar uma advertência à sua população. Jonas obedeceu, e, visando a cidade, conclamou os seus habitantes a interromperem a prática daqueles atos escândalos, sugerindo que todos elevassem rogativas a Deus, suplicando-lhe que poupasse Nínive de uma eventual destruição.
Dizia então o médium: “Quem sabe se Deus mudará os seus desígnios e desistirá de destruir a cidade”.
O povo de Nínive aceitou a admoestação de Jonas e se penitenciou, segundo os
costumes da época, vestindo-se com sacos e assentando-se na cinza, prometendo não
mais reincidirem no erro.
Em face dessa atitude da população, Deus poupou a cidade, uma vez que ele está sempre pronto a dar novas oportunidades a seus filhos.
O médium Jonas, vendo que a cidade não fora destruída, ficou ressentido.
Segundo o seu modo de pensar passaria aos olhos da população de Nínive como
autêntico falso profeta. Essa situação levou-o a lastimar-se amargamente de ter assumido aquela incumbência.
Retirando-se, edificou uma cabana e abrigou-se nela, na expectativa de uma
reconsideração dos Céus. Pensava ele que, devido ao seu modo de pensar e ao seu
protesto, Deus voltaria atrás em seus propósitos e destruiria a cidade, dando
autenticidade às suas palavras e evitando que passasse aos olhos dos ninivitas como
embusteiro e mentiroso.
Os Espíritos do Senhor, diante desse mesquinho capricho de Jonas, resolveram propiciar-lhe um edificante ensinamento: fizeram brotar perto da cabana de Jonas uma aboboreira, a qual, crescendo, cobriu-a, produzindo agradável sombra.
Esse fato causou grande satisfação a Jonas, o qual passou a nutrir afeição pela
planta. Entretanto, logo surgiu um bichinho que cortou a aboboreira perto da raiz e ela secou-se.
Logo surgiu um sol causticamente que fez com que Jonas desmaiasse. O profeta insurgiu-se contra os Céus, protestando contra aquele ato de fazer secar a planta que o resguardava do sol.
Nisso os Espíritos do Senhor lhe ponderaram: “Tiveste compaixão da aboboreira, que surgiu sem lhe dar qualquer trabalho e para cuja efêmera vida nada fizeste. E acha razoável que Deus não tenha compaixão da grande cidade de Nínive, cuja população soma cento e vinte mil almas, sem contar os animais, e cujos
habitantes não sabem discernir entre a sua mão direita e a sua esquerda?”
O ponto alto desta passagem do Velho Testamento foi o fato de ter o povo de Nínive aceitado a advertência de Jonas e se encaminhado para a reforma, a ponto de evitar a destruição da cidade. Aproveitou Jesus essa ocorrência a fim de pôr em confronto a maleabilidade do povo de Nínive e o endurecimento do povo de Israel.
Os israelitas esperavam um Messias, entretanto o queriam nos moldes vaticinados por Moisés — “Um profeta igual a mim”. Um Cristo guerreiro e conquistador igual a Moisés e a Davi. Um Cristo que levasse a dor e a destruição a todos os povos que não comungassem com os ideais monopolistas dos escribas e
fariseus.
Quando surgiu um Cristo dócil, meigo, amoroso, fraternal, combatendo a
guerra e o ódio, os israelitas o repeliram. Passaram a exigir comprovações! Queriam
sinais. Aquele não era o Messias que eles aguardavam.
Mas o Mestre não quis dar-lhes outros sinais senão os que estava dando. Por isso exclamou: “Maligna é esta geração, ela pede um sinal; e não lhe será dado outro sinal, senão o sinal do profeta Jonas”.
O endurecimento do povo de Israel foi posto em confronto com o do povo de Nínive. Os ninivitas aceitaram Jonas e ali estava quem era maior do que Jonas.
O coração empedernido do povo de Israel repeliu o Cristo e o levou ao Calvário, apesar de ter dado ele a mais patente demonstração da sua autoridade, a despeito de enquadrar-se perfeitamente nos vaticínios de todos os antigos profetas e de estar produzindo fatos espantosos de curas de todos os matizes, de pleno
conhecimento de toda a cidade de Jerusalém.
O Mestre, por si só, era um sinal. Preenchia tudo aquilo que dele estava escrito.
Expulsava maus Espíritos, curava cegos, limpava leprosos e fazia levantar os paralíticos, e, além disso, discorria sobre a excelência do Reino de Deus. Nem assim conseguiu abalar o preconceito e o falso zelo religioso dos escribas, dos fariseus e do sumo sacerdote.
Na atualidade os homens ainda persistem na recalcitrância, não aceitando os sinais propiciados pelos Evangelhos, continuando a aguardar o advento de um Cristo moldado segundo os figurinos das velhas teologias: um Cristo intolerante, unilateral e eivado de imperfeições.
O Consolador prometido, novo sinal dos Céus, já está entre nós, personificado no Espiritismo, e com a missão primária de restabelecer todos os ensinamentos de
Jesus Cristo em seus devidos lugares.
A mensagem do Espírito de Verdade está em pleno processo de implantação na Terra e assim como “o Espírito sopra onde quer e nós não sabemos de onde vem e nem para onde vai”, segundo o dizer judicioso de Jesus a Nicodemos, essa mensagem fará com que a Humanidade descortine novos horizontes, fato novo que fará com que ele se liberte do jugo do fanatismo, dos dogmas e dos formalismos da letra que mata.
E, assim como: “a rainha de Sabá veio dos confins da Terra para apreciar a sabedoria de Salomão”, e a população de Nínive ouviu a advertência do profeta
Jonas, torna-se imperioso que demos guarida aos ensinamentos de Jesus, que é muito
maior do que Jonas e que Salomão.
Não aconteça que “os homens de Nínive” se levantem para também julgar esta
geração, pela sua inépcia e falta de assimilação dos preceitos evangélicos, contidos as
verdades reveladas há quase vinte séculos.

Os padrões Evangélicos
Paulo Alves de Godoy

Conhecendo o Livro Céu e o Inferno " Criminosos Arrependidos" parte 5: ..."Não posso acreditar que, no mundo dos Espíritos, a dor diminua pouco a pouco à força de hábito. Não. O que eu depreendo é que as vossas preces salutares me aumentaram as forças, de modo que, pelas mesmas dores, com mais resignação, eu menos sofro..."

JACQUES LATOUR
(Assassino condenado pelo júri de Foix e executado em setembro de 1864)
Em reunião íntima de sete a oito pessoas, havida em Bruxelas a 13 de setembro de 1864 e à qual assistíamos, foi pedido a um médium que tomasse do lápis, sem que aliás houvéssemos feito qualquer evocação especial.
Possuído de extraordinária agitação, ei-lo a traçar caracteres muito grossos, e depois, rasgando o papel,
exclama:
“Arrependo-me! arrependo-me! Latour!”
Surpreendidos com a inesperada comunicação, de modo algum provocada, visto como ninguém pensara nesse infeliz, cuja morte até então era ignorada por uma parte dos assistentes, dirigimos ao Espírito palavras de conforto e comiseração, fazendo-lhe em seguida esta pergunta:
— Que motivo vos levou a manifestar-vos aqui, de preferência a outro lugar, quando não vos evocamos?
Responde o médium de viva voz:
Vi que, almas compassivas, teríeis piedade de mim, ao passo que outros ou me evocavam mais por curiosidade que por caridade, ou de mim se afastavam horrorizados.”
Depois começou por uma cena indescritível que não durou mais de meia hora. O médium, juntando os gestos e a expressão da fisionomia à palavra, deixava patente a identificação do Espírito com a sua pessoa; às vezes, esses gestos de cruel desespero desenhavam vivamente o seu sofrimento;
o tom da sua voz era tão compungido, as súplicas tão veementes, que ficávamos profundamente comovidos. Alguns estavam mesmo aterrorizados com a superexcitação do médium, mas nós sabíamos que a manifestação de um  ente arrependido, que implora piedade, nenhum perigo poderia
oferecer. Se ele buscou os órgãos do médium, é que melhor desejava patentear a sua situação, a fim de que
mais nos interessássemos pela sua sorte, e não como os Espíritos obsessores e possessores, que visam apoderar-se dos médiuns para os dominarem. Tal manifestação lhe fora talvez permitida não só em benefício próprio, como também para edificação dos circunstantes.
Ei-lo a exclamar:
“Oh! sim, piedade... muito necessito dela... Não sabeis o que sofro... Não o sabeis, e não podereis compreendê-lo.
É horrível! A guilhotina!... Que vale a guilhotina comparada a este sofrimento de agora? Nada! — é um instante. Este fogo que me devora, sim, é pior, porque é uma morte contínua, sem tréguas nem repouso... sem-fim!... E as minhas vítimas, ali estão ao redor, a mostrar-me os ferimentos, a perseguir-me com seus olhares...
“Aí estão, e vejo-as todas... todas... sem poder fugir- -lhes! E este mar de sangue?! E este ouro manchado de sangue?! Tudo aí está... tudo... e sempre ante meus olhos! E o cheiro de sangue... Não o sentis? Oh! Sangue e sempre sangue! Ei-las que imploram, as pobres vítimas, e eu a feri-
-las sempre... sempre... impiedosamente!... O sangue inebria-
-me... Acreditava que depois da morte tudo estaria terminado, e assim foi que afrontei o suplício e afrontei o próprio Deus, renegando-O!... Entretanto, quando me julgava aniquilado para sempre, que terrível despertar... oh! sim, terrível, cercado de cadáveres, de espectros ameaçadores, os pés
atolados em sangue!!... Acreditava-me morto, e estou vivo!
Horrendo! horrendo! mais horrendo que todos os suplícios da Terra! Ah! se todos os homens pudessem saber o que há para além da vida, saberiam também quanto custam as conseqüências do mal! Certo não haveria mais assassínios, nem criminosos, nem malfeitores! Eu só quisera que todos os assassinos pudessem ver o que eu vejo e sofro...
“Oh! então não mais o seriam, porque é horrível este sofrimento! Bem sei que o mereci, oh! meu Deus, porque também eu não tive compaixão das minhas vítimas; repelia as mãos súplices quando imploravam que as poupasse...
Sim, fui cruel, decerto, matando-as covardemente para roubá-las! E fui ímpio, e fui blasfemo também, renegando o vosso sacratíssimo Nome... Quis enganar-me, porque eu queria persuadir-me de que Vós não existíeis... Meu Deus, eu sou grande criminoso! Agora o compreendo. Mas... não tereis piedade de mim?... Vós sois Deus, isto é, a bondade, a misericórdia! Sois onipotente! Piedade, Senhor! Piedade!
Eu vo-lo peço, não sejais inexorável; libertai-me destes olhares odiosos, destes espectros horríveis... deste sangue... das minhas vítimas... olhares que, quais punhaladas, me varam o coração.
“Vós outros que aqui estais, que me ouvis, sede bondosos, almas caritativas. Sim, eu o vejo, sei que tendes piedade de mim, não é verdade? Haveis de orar por mim...
“Oh! eu vo-lo suplico, não me abandoneis como fiz outrora aos outros. Pedireis a Deus que me tire este horrível espetáculo de ante os olhos, e Ele vos ouvirá porque sois bons... Imploro, orai por mim.”
Os assistentes, sensibilizados, dirigiram-lhe palavras
de conforto e consolação. Deus, disseram-lhe, não é inflexível; apenas exige do culpado um arrependimento sincero, aliado à vontade de reparar o mal praticado. Uma vez que o vosso coração não está petrificado e que lhe pedis o perdão dos vossos crimes, a sua misericórdia baixará sobre vós.
Preciso é, pois, que persevereis na boa resolução de reparar o mal que fizestes. Certo, não podeis restituir às vítimas as vidas que lhes arrancastes, mas, se o impetrardes com fervor, Deus permitirá que as encontreis em uma nova encarnação, na qual lhes podereis patentear tanto devotamento quanto o mal que lhes fizestes. E quando a reparação lhe parecer suficiente, para logo entrareis na sua santa graça.
Assim, a duração do vosso castigo está nas vossas mãos, dependendo de vós o abreviá-lo. Comprometemo-nos a auxiliar- vos com as nossas preces e invocar para vós a assistência
dos bons Espíritos. Vamos pronunciar em vossa intenção a prece que se contém em O Evangelho segundo o
Espiritismo, referente aos Espíritos sofredores e arrependidos.
Não pronunciaremos a que se refere aos maus Espíritos, porque desde que vos arrependeis, que implorais, que renunciais ao mal, não passais para nós de um Espírito infeliz e não mau.
Feita essa prece, o Espírito continua, depois de breves instantes de calma:
“Obrigado, meu Deus!... Oh! obrigado! Tivestes piedade
de mim... Eis que se afastam os espectros... Não me abandoneis, enviai-me os vossos bons Espíritos para me sustentarem... Obrigado...
Depois desta cena o médium fica alquebrado, abatido, os membros lassos por algum tempo. A princípio, apenas tem vaga idéia do que se há passado, mas pouco a pouco vai-se lembrando de algumas das palavras que pronunciou sem querer, reconhecendo que não era ele quem falara.
No dia seguinte, em nova reunião, o Espírito tornou a manifestar-se, reencetando a cena da véspera, porém por minutos apenas, e isso com a mesma gesticulação expressiva, posto que menos violenta. Depois, tomado de agitação febril, escreveu:
“Grato às vossas preces. Experimento já uma sensível melhora. Foi tal o fervor com que orei, que Deus me concedeu um momentâneo alívio; não obstante, terei de ver ainda as minhas vítimas... Ei-las! Ei-las! Vedes este sangue?...”
(Repetiu-se a prece da véspera. O Espírito continua dirigindo- se ao médium.)
Perdoai o ter-me apossado de vós. Obrigado pelo alívio que proporcionais aos meus sofrimentos. Perdoai o mal que vos causei, mas eu tenho necessidade de me comunicar, e só vós o podeis...
“Obrigado! obrigado! que já sinto algum alívio, posto não tenha atingido o fim das provações. As minhas vítimas voltarão dentro em breve. Eis a punição a que fiz jus, mas, Deus meu, sede indulgente.
“Orai todos vós por mim, tende piedade. Latour.”
Um membro da Sociedade Espírita de Paris, que tinha orado por este infeliz, evocando-o, obteve intervaladamente as seguintes comunicações:
I
Fui evocado quase imediatamente depois da minha morte, porém não pude manifestar-me logo, de modo que muitos Espíritos levianos tomaram-me o nome e a vez. Aproveitei a estada em Bruxelas do Presidente da Sociedade de Paris, e comuniquei-me, com a aquiescência de Espíritos superiores.
Voltarei a manifestar-me na Sociedade, a fim de fazer revelações que serão um começo de reparação às minhas faltas, podendo também servir de ensinamento a todos os criminosos que me lerem e meditarem na exposição dos meus sofrimentos. É somente sobre o Espírito dos homens fracos ou das crianças que a narrativa de penas infernais pode produzir efeitos terroristas. Ora; um grande malfeitor
não é um Espírito pusilânime, e o temor de um polícia é para ele mais real que a descrição dos tormentos do inferno.
Eis por que todos os que me lerem ficarão comovidos com as minhas palavras e com os meus padecimentos, que não são ficções. Não há um só padre que possa dizer que viu o que tenho visto, porque tenho assistido às torturas dos danados. Mas, quando eu vier dizer: —“Eis o que se
passou após a minha morte, a morte do corpo; eis a minha enorme decepção ao reconhecer-me vivo, ao contrário do que supunha e tinha tomado pelo termo dos suplícios, quando
era o começo de outras torturas, aliás indescritíveis!” —então, mais de um ser estará à borda do precipício em que ia despenhar-se, e cada um dos desgraçados, desviados por mim da senda criminosa, concorrerá para o resgate das minhas faltas.
Foi-me permitido libertar-me do olhar das minhas vítimas transformadas em carrascos, a fim de comunicar
convosco; ao deixar-vos, entretanto, tornarei a vê-las e só esta idéia me causa tal sofrimento que eu não poderia descrevê-lo. Sou feliz quando me evocam, porque assim deixo o meu inferno por alguns instantes.
Orai sempre ao Senhor por mim, pedi-lhe que me liberte do olhar das minhas vítimas.
Sim, oremos juntos. A prece faz tanto bem... Estou mais aliviado; não sinto tão pesado o fardo que me acabrunha.
Vejo um resquício de esperança luzindo-me aos olhos e, contrito, exclamo: Bendita a mão do Senhor e seja feita a sua vontade!
II
O médium. — Em vez de pedir a Deus para vos furtar ao olhar das vossas vítimas, eu vos convido a pedir comigo para que vos dê a força necessária a fim de suportardes essa tortura expiatória.
Latour. — Eu preferiria livrar-me de tais olhares. Se soubésseis o quanto sofro... O homem mais insensível comover- se-ia vendo impressos na minha fisionomia, como que a fogo, os sofrimentos de minha alma. Farei, entretanto, o que me aconselhais, pois compreendo ser esse um meio de expiar um pouco mais rapidamente as minhas faltas.
É qual dolorosa operação que viesse curar um corpo gravemente adoentado. Ah! Pudessem ver-me os culpados da Terra, e ficariam apavorados das conseqüências de seus crimes, desses crimes que, ignorados dos homens, são, no entanto, vistos pelos Espíritos. Como a ignorância é fatal para tantas pessoas!
Que responsabilidade assumem os que recusam instrução às classes pobres da sociedade! Acreditam que com polícia e soldados se previnem crimes... Que grande erro!
III
Terríveis são os meus sofrimentos, porém, depois que por mim orais, sinto-me confortado por bons Espíritos, os quais me dizem tenha esperança. Compreendo a eficácia do remédio heróico que me aconselhastes e peço a Deus me dê forças para suportar esta dura expiação, aliás igual, posso
afirmá-lo, ao mal que fiz. Não quero escusar-me das minhas atrocidades; mas o certo é que, para nenhuma das minhas vítimas, salvo a precedência de alguns instantes,na morte, a dor não existia, e as que tinham terminado a provação terrena foram receber a recompensa que as aguardava.
Para mim, entretanto, ao voltar ao mundo dos Espíritos, só houve sofrimentos infernais, excetuados os curtos instantes em que me manifestava.
Em que pesem aos seus quadros terroristas, os padres só têm uma fraca noção dos verdadeiros sofrimentos que a justiça divina reserva aos infratores da lei do amor e da caridade.
Como insinuar a pessoas sensatas que uma alma, isto é, uma coisa imaterial, possa sofrer ao contacto do fogo material? É absurdo, e por isso tantos e tantos criminosos se riem desses painéis fantásticos do inferno. O mesmo porém não se dá quanto à dor moral do condenado, após a morte física. Orai para que o desespero não se aposse de mim.
IV
Muito grato vos sou pela perspectiva que me trouxestes e a cujo fim glorioso sei que devo chegar quando purificado.
Sofro muito, mas parece-me que os sofrimentos diminuem.
Não posso acreditar que, no mundo dos Espíritos, a dor diminua pouco a pouco à força de hábito. Não. O que eu depreendo é que as vossas preces salutares me aumentaram as forças, de modo que, pelas mesmas dores, com mais resignação, eu menos sofro.

O pensamento se me volve então para a última existência e vejo as faltas que teria conjurado se soubesse orar.
Hoje compreendo a eficácia da prece; compreendo o valor dessas mulheres honestas e piedosas, fracas pela carne, porém fortes pela fé; compreendo, enfim, esse mistério ignorado pelos supostos sábios da Terra. Preces! palavra que por si só provoca o riso dos espíritos fortes. Aqui os espero no mundo espiritual, e, quando a venda que encobre a verdade se romper para eles, então, a seu nuto se prosternarão aos pés do Eterno a quem desprezaram e serão felizes em se humilhar para que seus pecados e crimes
sejam revelados! Hão de compreender então a virtude da prece.
Orar é amar, e amar é orar! E eles amarão o Senhor e lhe dirigirão preces de reconhecimento e de amor, regenerados pelo sofrimento. E, pois que devem sofrer, pedirão como eu peço a força necessária ao sofrimento e à expiação.
Em deixando de sofrer, hão de orar ainda para agradecero perdão merecido por sua submissão e resignação.
Oremos, irmão, para que mais me fortaleça... Oh! obrigado à tua caridade, meu irmão, pois que estou perdoado. Deus me liberta do olhar das minhas vítimas. Oh! meu Deus! Bendito sejais vós por toda a eternidade, pela graça que me concedeis! Oh! meu Deus! Sinto a enormidade dos meus
crimes e curvo-me ante a vossa onipotência. Senhor! eu vos amo de todo o meu coração e vos suplico a graça de me permitirdes, ao vosso arbítrio, sofrer novas provações na Terra; voltar a ela como missionário da paz e da caridade, ensinando as crianças a pronunciar com respeito o vosso nome. Peço-vos que me seja possível ensinar que vos amem, a vós, Pai que sois de todas as criaturas. Obrigado, meu Deus! Sou um Espírito arrependido, e sincero é o meu arrependimento.
Tanto quanto meu impuro coração pode comportá-lo, eu vos amo com esse sentimento que é pura emanação da vossa divindade. Irmão, oremos, pois meu coração transborda de reconhecimento. Estou livre, quebrei os grilhões, não sou mais um réprobo.
Sou um Espírito sofredor, mas arrependido, a desejar que o meu exemplo pudesse conter nos umbrais do crime todas as mãos criminosas que vejo prestes a levantarem-se.
Oh! para trás, recuai, irmãos, pois as torturas que preparais serão atrozes! Não acrediteis que o Senhor se
deixará tão prontamente submeter à prece dos seus filhos.
São séculos de torturas que vos esperam.
O guia do médium. — Dizes que não compreendes as palavras do Espírito. Procura ter uma idéia da sua emoção e do seu reconhecimento para com o Senhor, coisas que ele acredita não poder testemunhar melhor do que tentando demover todos esses criminosos por ele vistos, mas que tu não podes ver. Aos ouvidos desses, quereria ele que chegassem as suas palavras; mas o que te não disse ele, porque o ignora ainda, é que lhe será permitido o início de missões reparadoras. Irá para junto dos que lhe foram cúmplices,
procurando inspirar-lhes arrependimento, implantando em seus corações o gérmen do remorso.
Freqüentemente se vêem na Terra pessoas, tidas por honestas, lançarem-se aos pés de um sacerdote para se acusarem de um crime.
É o remorso quem lhes dita a confissão da culpa. Pois se o véu que te encobre o mundo invisível se desfizesse, verias muitas vezes o Espírito cúmplice ou instigador de um crime, tal como o fará Jacques Latour, inspirando o remorso ao Espírito encarnado, no afã de reparar a própria falta.

Teu guia protetor.
Mais tarde, o médium de Bruxelas, o mesmo que recebera o primeiro ditado, obteve o seguinte:
“Nada mais receeis de mim, que estou tranqüilo, em que pese ao sofrimento que ainda tenho. Vendo o meu arrependimento, Deus teve compaixão de mim. Agora sofro por causa desse arrependimento, que me demonstra a enormidade dos meus crimes. Bem aconselhado na vida, eu não teria jamais praticado todo esse mal, mas, sem repressão, obedeci cegamente aos meus instintos. Se todos os homens
pensassem mais em Deus, ou, antes, se nele acreditassem, tais faltas não seriam cometidas.
“Falha é, porém, a justiça dos homens; uma falta muita vez passageira leva o homem ao cárcere, que não deixa de ser um foco de perversão. Daí sai ele completamente corrompido pelos maus exemplos e conselhos. Dado porém que a sua índole seja boa e forte para se não corromper,
ainda assim, de lá saído, ele vai encontrar fechadas todas as portas, retraídas todas as mãos, indiferentes todos os corações! Que lhe resta pois? O desprezo, a miséria, o abandono e o desespero, se é que o assistem boas resoluções de se corrigir. Então a miséria o leva aos extremos, e assim é
que também ele se toma de desprezo por seu semelhante, assim é que o odeia e perde a noção do bem e do mal, por isso que repelido se encontra, a despeito das suas boas intenções. Para angariar o necessário, rouba, mata às vezes, e depois... depois o executam! Meu Deus, ao ser presa novamente das minhas alucinações, sinto que a vossa mão se estende por sobre mim; sinto que a vossa bondade me
envolve e protege.
“Obrigado, meu Deus! na próxima existência empregarei toda a minha inteligência no socorro aos desgraçados que sucumbiram, a fim de os preservar da queda. Obrigado a vós que não desdenhais de comunicar comigo; nada receeis, pois bem o vedes, eu não sou mau. Quando pensardes em mim, não vos figureis o meu retrato pelo que de mim vistes, mas o de uma alma angustiada que agradece a
vossa indulgência.
“Adeus; evocai-me ainda e orai a Deus por mim.
Latour.”

(Estudo sobre o Espírito de Jacques Latour)
Não se pode desconhecer a profundeza e a alta significação de algumas das frases encerradas nessa comunicação.
Além disso, ela oferece um dos aspectos do mundo dos Espíritos em castigo, pairando ainda assim sobre ele a misericórdia divina. A alegoria mitológica das Eumênides não é tão ridícula como parece, e os demônios, carrascos oficiais do mundo invisível, que as substituem perante as
modernas crenças, são menos racionais com seus cornos e forcados, do que estas vítimas que servem elas próprias ao castigo do culpado.
Admitindo-se a identidade deste Espírito, talvez se estranhe tão pronta mudança do seu moral. É o caso da ponderação já feita, de que pode um Espírito brutalmente mau ter em si melhores predicados do que o dominado pelo orgulho ou pela hipocrisia. Esta reversão a sentimentos mais benéficos indica uma natureza mais selvagem que perversa, à qual apenas faltava boa direção. Comparando esta linguagem com a de outro Espírito, adiante consignada sob
a epígrafe: castigo pela luz, é fácil concluir qual dos dois seja mais adiantado moralmente, apesar da disparidade de instrução e hierarquia social, obedecendo um ao natural instinto de ferocidade, a uma espécie de superexcitação, ao passo que o outro empresta à perpetração dos seus crimes a calma e sangue-frio inerentes às lentas e obstinadas combinações, afrontando ainda depois de morto o castigo, por
orgulho. Este sofre e não o confessa, ao passo que aquele prontamente se submete. Também por aí podemos prever qual deles sofrerá por mais tempo.
Diz o Espírito de Latour: “Eu sofro por causa desse arrependimento, que me demonstra a extensão dos meus crimes.”
Aí está um pensamento profundo. O Espírito só compreende a gravidade dos seus malefícios depois que se
arrepende.
O arrependimento acarreta o pesar, o remorso, o sentimento doloroso, que é a transição do mal para o bem, da doença moral para a saúde moral. É para se furtarem a isso que os Espíritos perversos se revoltam contra a voz da consciência, quais doentes a repelirem o remédio que os há de curar. E assim procuram iludir-se, aturdir-se e persistir no mal. Latour chegou a esse período no qual se extingue o
endurecimento, acabando por ceder. Entra-lhe o remorso pelo coração, o arrependimento o assedia, e, compreendendo o mal que fez, vê a sua degradação e sofre dela. Eis por
que ele diz: “Sofro por causa desse arrependimento.” Na precedente encarnação, ele devia ter sido pior que na última, visto que, se se tivesse arrependido como agora, melhor lhe teria sido a vida subseqüente. As resoluções, por ele ora tomadas, influirão sobre a sua vida terrestre no futuro; e a encarnação que teve nem por ser criminosa deixou de assinalar-lhe um estádio de progresso. E é muito provável que antes de a iniciar ele fosse na erraticidade um desses muitos Espíritos rebeldes, obstinados no mal. A muitas pessoas ocorre perguntar qual seja o proveito dessa anterioridade de existência, desde que dela nos não lembramos
e nem temos idéia do que fomos nem do que fizemos.
Esta questão está assaz liquidada pela razão de que tal lembrança seria inútil, visto como de todo apagado o
mal cometido, sem que dele nos reste um traço no coração, também com ele não nos devemos preocupar.
Quanto aos vícios de que porventura não estejamos inteiramente despojados, nós os conhecemos pelas nossas tendências atuais, e para elas é que devemos voltar todas as atenções. Basta saber o que somos, sem que seja necessário
saber o que fomos.
Se considerarmos as dificuldades que há na existência para a reabilitação do Espírito, por maior que seja o seu arrependimento, as reprovações de que se torna objeto, devemos louvar a Deus por ter cerrado esse véu sobre o passado.
Condenado a tempo ou absolvido que fosse, os antecedentes de Latour fá-lo-iam um enjeitado da sociedade.
Quem o acolheria com intimidade, apesar do seu arrependimento?
Entretanto, as intenções que ora patenteia, como Espírito, nos dão a esperança de que venha a ser na
próxima encarnação um homem honesto e estimado. Suponhamos que soubessem que esse homem honesto fora Latour, e a reprovação continuaria a persegui-lo. Esse véu sobre o passado é que lhe franqueia a porta da reabilitação, porque pode sem receio e sem pejo ombrear-se com os mais
honestos. Quantos há que desejariam poder apagar da memória de outrem certas fases da própria vida?
Qual a doutrina que melhor se concilia com a bondade e justiça de Deus? Demais, esta doutrina não é uma teoria, porém o resultado de observações. Por certo não foram os Espíritos que a imaginaram, porém eles viram e observaram as situações diferentes que muitos Espíritos apresentam, e daí o procurarem explicá-las, originando-se então a doutrina.
Aceitaram-na, pois, como resultante dos fatos, e ainda por lhes parecer mais racional que todas as emitidas até hoje relativamente ao futuro da alma.
Não se pode recusar a estas comunicações um grande fundo moral. O Espírito poderia ter sido auxiliado nesses raciocínios e, sobretudo, na escolha das suas expressões, por outros mais adiantados; mas o fato é que estes apenas influem na forma, que não na essência, e jamais fazem que
o Espírito inferior esteja em contradição consigo mesmo.
Assim é que em Latour poderiam ter poetizado a forma do arrependimento, mas não lho insinuaram contra sua vontade, porque o Espírito tem o seu livre-arbítrio.
Em Latour lobrigaram o gérmen dos bons sentimentos e por isso o auxiliaram a exprimir-se, contribuindo assim para desenvolvê-lo, ao mesmo tempo que em seu favor imploravam
comiseração.
Que há de mais digno, mais moralizador, capaz de impressionar mais vivamente, do que o espetáculo deste grande criminoso exprobrando-se a si mesmo o desespero e os remorsos?
Desse criminoso que, perseguido pelo incessante olhar de suas vítimas e torturado, eleva a Deus o pensamento implorando misericórdia? Não será isso um exemplo salutar para os culpados? Posto que simples e desprovidos de fantasmagóricas encenações, compreende-se a natureza
dessas angústias, porque elas, apesar de terríveis, sãoracionais.
Poder-se-ia talvez estranhar tão grande transformaçãonum homem como Latour... Mas por que havia de ser
inacessível ao arrependimento? Por que não possuir tambémele a sua corda sensível? O pecador seria, pois, votadoao mal eternamente? Não lhe chegaria, por fim, um momento
em que a luz se lhe fizesse nalma? Era justamenteessa hora que chegara para Latour; e ali está precisamente
o lado moral dos seus ditados; é a compreensão que ele temdo seu estado, são os seus pesares, os seus planos de reparação,que tornam tais mensagens eminentemente instrutivas.
Que haveria de extraordinário se Latour confessasse um arrependimento sincero antes da morte, se dissesse
antes da morte o que veio dizer depois? Não há, quanto a isso, inúmeros exemplos? Uma regeneração antes da morte passaria, aos olhos do maior número dos seus iguais, por fraqueza; mas essa voz de além-túmulo é seguramente a revelação daquilo mesmo que os aguarda. Ele está em absoluto com a verdade, quando afirma ser o seu exemplo mais eficaz que a perspectiva das chamas do inferno, e até
do cadafalso.
Por que não lhes ministrar esses sentimentos no cárcere?
Eles fariam refletir, do que aliás já temos alguns exemplos.
Mas como crer nas palavras de um morto, quando ninguém acredita que para além da morte não esteja tudo
acabado? Entretanto, dia virá em que se reconheça esta verdade: — os mortos podem vir instruir os vivos.
Outras muitas instruções importantes se podem tirar dessas comunicações; assim, a confirmação deste princípio de eterna justiça, pelo qual ao culpado não basta o arrependimento
apenas, sendo este o primeiro passo para a reabilitação que atrai a divina misericórdia. O arrependimento é o prelúdio do perdão, o alívio dos sofrimentos, mas porque Deus não absolve incondicionalmente, faz-se mister
a expiação, e principalmente a reparação. Assim o entende Latour, e para tanto se predispõe. Se compararmoseste criminoso àquele de Castelnaudary, veremos ainda uma
diferença nos castigos. Naquele o arrependimento foi tardio,e, conseqüentemente, mais longa a pena. Além disso,essa pena era quase material, ao passo que para Latour o foi antes moral, porque, como acima dissemos, havia grandediferença intelectual entre eles.
Ao outro, impunha-se coisa que pudesse ferir-lhe os sentidos obliterados; mas é preciso notar que as penas
morais não serão menos pungentes para todo aquele que esteja em condições de compreendê-las. Podemos inferi-lo dos clamores do próprio Latour, que não são de cólera, mas antes a expressão dos remorsos, de perto seguidos de arrependimento e desejo de reparação, visando o progresso.