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quinta-feira, 29 de abril de 2021

O ÓBULO DA VIÚVA POBRE " Seu ato foi, portanto, um ato de santidade, porque de suprema renúncia."

O ÓBULO DA VIÚVA POBRE
 
"Sentando-se Jesus em frente ao gazofilácio, observava como o povo punha ali as suas dádivas. Muitos ricos deitavam grandes quantias; chegando, porém, uma pobre viúva, lançou duas pequenas moedas, que valem um quadrante. Chamando, então, Jesus os seus discípulos, disse-lhes: Em verdade vos digo que esta pobre viúva deu mais que todos os ofertantes; pois estes deram do que lhes sobrava; ela, porém, da sua pobreza deu tudo o que possuía, tudo de que dispunha para o seu sustento".

Vendo em Jesus o Mestre, o Educador que ensina através das páginas do livro da vida fazendo do mundo uma escola, vamos considerar o fruto de sua observação, com respeito à dádiva dos ricos e à da viúva pobre. 

 Narra o texto que Jesus acompanhava o gesto daqueles que depositavam no tesouro do templo as suas ofertas. O excelso intérprete da justiça divina verificou que os homens ricos lançavam vultosas somas no gazofilácio, julgando, talvez, assegurar com seu ouro uma bela posição no reino dos céus. O que, porém, chamou a atenção dele, de modo particular, foi a insignificante oferta da viúva pobre, que deitou no cofre sacro duas moedinhas de cobre, no valor dum quadrante, ou seja, 4 centavos.

O Mestre observa a atitude daquela mulher, penetra o seu íntimo, devassa os recessos mais secretos do seu coração e predica assim aos discípulos: Em verdade vos digo que esta pobre viúva deitou mais na arca do templo que todos os ofertantes. Porque estes deram do que lhes sobrava; ela, porém, da sua pobreza deu tudo o que possuía, tudo o que tinha reservado para o seu sustento. É significativa a expressão — em verdade vos digo — com que Jesus costumava preceder as sentenças graves que proferia. Em verdade quer dizer na realidade, de fato, isto é assim, e não como os homens querem que seja, ou supõem que há de ser.

A linguagem humana é capciosa: traduz o convencionalismo de cada época; reflete a opinião sempre errônea e falsa da conceituação vigente adotada pela maioria, ou, ainda, a expressão da ignorância oficializada pelos usos e costumes sociais. Apartando-se deste círculo vicioso, o Sábio Instrutor da humanidade acentua que o seu dizer é — em verdade — isto é, fora de todo o conceito terreno eivado de dolo; fora de todo o juízo humano pronunciado levianamente, sem conhecimento de causa, na ignorância dos fatores ocultos que determinam os acontecimentos e os fenômenos que caem sob o domínio dos sentidos.

Ele estava em condições de apreciar os fatos da vida com justeza, pois que não os julgava pelas aparências, porém mediante plena compreensão dos elementos que entram em jogo para produzi-lo. Daí a sua autoridade acerca dos julgamentos que emitia e das lições que ministrava, fazendo-as preceder desta advertência: em verdade vos digo. Vejamos, agora, o que Ele, em verdade, nos ensina neste caso do óbolo da viúva pobre.

A maneira como Jesus aprecia o mérito ou demérito das nossas obras difere, sobremaneira, do critério, usado pelos homens. No episódio, que ora nos serve de tema, vemos que Ele reputou a oferenda da viúva como a maior de todas depositadas no gazofilácio. Nada obstante, foi a menor, a mais pequenina numericamente falando. Isto porque o Mestre se louvou, não nas aparências, isto é, no que se podia perceber com os sentidos, mas nos motivos íntimos que impeliram os ofertantes a lançar suas dádivas na arca do templo. Por que o fizeram eles? Quais os fatores que preponderaram no ânimo dos ricos para que dessem grandes somas?
A vaidade, talvez, porque as ofertas eram feitas publicamente; o interesse — quem sabe? — de comprar com o seu ouro a simpatia dos deuses, esperando, por esse processo, alcançar a desejada felicidade futura; ou, ainda, para serem agradáveis aos influentes sacerdotes e aos poderosos pontífices, usufrutários e desfrutadores das rendas do templo. Tais motivos, por si só, invalidam, moralmente, as mais vultosas dádivas. Os que agiram visando àqueles alvos já receberam a sua recompensa, de acordo com os planos concebidos.

Quanto à viúva, cabe-lhe o mérito da máxima sinceridade com que agiu. Essa virtude é que dá valimento ao seu gesto. Ela considerava a espórtula ao templo como um dever sagrado, portanto imprescindível. A prova do que dizemos está no esforço que fez; mais do que esforço, no sacrifício, visto como se privou do único recurso pecuniário de que dispunha, o qual se destinava ao seu próprio sustento! Seu ato foi, portanto, um ato de santidade, porque de suprema renúncia.

A soma total de todo o ouro, deitado, no decurso dos séculos, no gazofilácio do famoso templo de Jerusalém, não valia, por certo, a excelsitude do sentimento que, do fundo do coração daquela pobre mulher desprotegida, a compeliu a privar-se das suas duas únicas moedinhas, reservadas para atender à mais premente e cruel das necessidades humanas — que é o pão de cada dia.

O Soberano Intérprete da divina justiça costumava computar, no seu julgamento, os valores morais, e não somente os de ordem material, como fazem os homens. Por isso teve em maior estimação a mesquinha oferta da viúva, comparada com a opulenta doação dos ricos: estes, sem nenhum esforço deram uma insignificante parcela do muito que possuíam. O juízo humano se funda no testemunho dos sentidos. O juízo divino se baseia no critério da razão e no senso do coração. A verdade, como disse muito bem Flammarion, não está no que vemos, mas naquilo que escapa à apreciação dos nossos órgãos visuais.

A balança da excelsa justiça não pesou o ouro que os ricos deitaram no gazofilácio, mas sim, o ouro que eles retiveram em seu poder. Estabelecido o confronto, constatou que a dádiva foi exígua. No que respeita, porém, à viúva pobre, a oferta foi maravilhosa, pois que ela havia dado tudo quanto tinha. Quem dá tudo que possui dá o máximo. Não é possível haver dádiva maior. Tal o critério que Jesus empregou ao proferir a sentença: Em verdade vos digo que esta pobre viúva deu mais que todos os ricos.

Pela ordem destas considerações, ou seja, por associação natural de idéias em torno deste episódio evangélico, ocorre-nos à mente um fato que nos vem provar quanto a nossa sociedade vive divorciada dos precípuos elementos de justiça. Queremos nos referir à maneira de aquilatar-se o valor do trabalho, de onde decorre, conseqüentemente, a distribuição da riqueza. Costuma-se dividir o trabalho humano em duas categorias: o intelectual e o manual, isto é, o da inteligência e o dos músculos.
Os primeiros fazem jus a remunerações desproporcionalmente maiores que os últimos. O trabalho intelectual chega, por vezes, à culminância de um valor meramente estimativo, fora de qualquer princípio de equidade, enquanto que o labor dos músculos, quanto mais rude e mais penoso, tanto menos valia representa. Será justa semelhante maneira de julgar o produto da atividade humana? Por que motivo vale muito o esforço intelectual e vale pouco, quase nada, o esforço muscular? Será, talvez por que se empresta uma certa nobreza ao trabalho intelectual? Mas será, acaso, menos elevado ou menos nobre o trabalho manual?

Parece-nos que aqueles que arroteiam o solo, abrindo leiras para receber a semente no milagre cotidiano da multiplicação dos pães, exercem o mais humano e santo dos labores. Demais, o que cumpre considerarmos é a utilidade do trabalho executado. A significação do vocábulo trabalho, segundo os economistas, é a atividade humana empregada na produção de utilidades. Ora, o trabalho dos músculos é tão necessário à sociedade como o da inteligência. Um não é, em rigor, superior a outro, porque ambos os ramos de atividade preenchem as necessidades da vida humana.

Onde, pois, a razão de tamanha disparidade no cômputo que se faz dos produtos manuais em comparação com os intelectuais? A única explicação está em que são os intelectuais que fazem as leis e regulam a sua aplicação na sociedade. Vivemos sob o despotismo da inteligência. Daí procede a iniquidade. Sim, a iniquidade porquanto o lixeiro ou o cavoucador que despende o seu maior esforço e que, como a viúva pobre, dá tudo quanto tem, merece perceber um salário que lhe proporcione, e à sua família, relativo conforto e bem-estar. Eles têm direito à vida e aos legítimos prazeres que refrigeram e amenizam as asperezas da luta cotidiana.

O que Jesus apreciou na dádiva da viúva foi o supremo esforço que ela empregou, despojando-se de tudo que possuía, para atender às solicitações da sua crença. Por isso, e só por isso, as suas duas moedinhas de cobre valiam mais que os punhados de ouro que os nababos daquela época lançaram na arca do templo. Apliquemos este critério no valor que damos ao trabalho, e cheguemos à conclusão de que muito merece aquele que muito se esforça, aquele que faz o melhor que pode no exercício do mister que exerce, seja este de que natureza for.

Em realidade, todo o trabalho é intelectual. Os músculos são dirigidos pela inteligência. Não há labor puramente manual, pois que o homem não é máquina de função mecânica e monótona. Os que exercem os rudes misteres musculares são aqueles cuja inteligência ainda não foi educada suficientemente para lhes proporcionar um trabalho menos árduo e mais compensador.

Neste mundo, dadas as suas condições de planeta atrasado, de mundo expiatório, os que sabem mais se locupletam dos que sabem menos, sendo esta a razão das formidáveis desproporções no aquilatar-se o valor das várias modalidades de trabalho, e, como consequência, da distribuição da riqueza.

E, assim se explica a advertência do Mestre dirigida aos seus discípulos: Se a vossa justiça não for superior à dos escribas e fariseus, não entrareis no reino de Deus. A justiça que vigora neste mundo é justiça de escribas e fariseus, cujos frutos são a miséria, as rivalidades e as guerras.

Vinícius

Do Livro : Na Escola do Mestre