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sábado, 15 de abril de 2017

Em sessão prática


A situação no grupo doutrinário apresentava anormalidades significativas. Desentendiam-se os companheiros entre si. Olvidando obrigações respeitáveis, confiavam-se a críticas acerbas. Acentuavam-se hostilidades mal-disfarçadas de cizânia, orientadas pela incompreensão. Ninguém se lembrava d’Aquele humilde e divino servidor que lavara os pés dos próprios companheiros. Cada aprendiz da comunidade chamava a si a posição de comando e o direito de julgar asperamente.
Debalde os mentores espirituais da casa convidavam à ponderação e ao entendimento recíproco.
Os operários descuidados recebiam-lhes as palavras, sem maior atenção pelas advertências educativas.
É que Cláudio e Elias, os dois abnegados diretores invisíveis do agrupamento, não se inclinavam a exortações contundentes.
Entre os desencarnados de nobre estirpe, há também fidalguia, cavalheirismo e gentileza e, na opinião deles, não deviam tratar os irmãos de trabalho como se fossem crianças inconscientes.
Certa noite em que as vibrações antagônicas se fizeram mais fortes, anulando os melhores esforços no campo da espiritualidade edificante, Elias dirigiu-se a Cláudio, sugerindo, esperançoso:
— Creio de grande eficácia a visita de alguns sofredores ao núcleo dos nossos amigos encarnados. Poderiam assim observar, de perto, os efeitos escuros da vaidade e da indisciplina. Amanhã, teremos sessão prática, de há muito tempo esperada, e admito a oportunidade de semelhante lição.
— Excelente medida! — exclamou o colega, satisfeito — não seria razoável recordar obrigações comuns, de modo direto, a cooperadores nossos que estudam o Evangelho, todos os dias. Afinal de contas, não obstante mergulhados na carne, possuem tantos deveres para com Jesus quanto nós, e, se já receberam inúmeras mensagens sobre as necessidades de ordem e concurso fraterno, como insistir com eles no serviço a fazer? O alvitre é, portanto, providencial. Traremos à reunião alguns infelizes, desviados da reta conduta. Observando-lhes os padecimentos, é provável que sintam a lição, com segurança, tornando aos rumos legítimos…
Com efeito, na, noite imediata, duas entidades perturbadas foram trazidas à sessão.
Mais de trinta frequentadores passaram a ouvir a palestra dolorosa.
O doutrinador Silvério Matoso fazia paciente esforço para acalmar os desventurados que choravam ruidosamente, através das organizações mediúnicas.
— Desgraçado de mim! — comentava um deles — sou um réprobo, amaldiçoado de todos! onde o meu equilíbrio? perdi tudo… Não tenho recursos para a locomoção, quanto antigamente!… Vivo no seio de tempestade sem bonança…
Enquanto as lágrimas lhe corriam, copiosas, da face, clamava o outro:
— Que será de mim, relegado às trevas? para onde se foram os miseráveis que me ataram ao poste do martírio? Malditos sejam!.
Acostumado à doutrinação, Matoso dizia, fraternalmente:
— Meus amigos, abstende-vos da desesperação e da revolta! confiemos no Divino Poder! Inspirado diretamente por Elias, o benfeitor espiritual que se esforçava intensamente por gravar a lição da hora, prosseguia, enérgico:
— Viveis presentemente as realidades da alma. Notastes agora que o relaxamento interior no mundo ocasiona grandes males. Desditosos todos aqueles que conhecem o bem e o não praticam! desventurados os rebeldes, os hipócritas e os indiferentes, porque a morte do corpo revela a verdade pura, e as almas transviadas não encontram senão abismos e trevas, lágrimas e tormentos. Jesus, porém, é a fonte inesgotável das bênçãos de paz renovadora. Tende calma e esperança!…
— Sou, todavia, um infame — soluçava uma das entidades comunicantes —, repetidamente escutei palavras da fé santificante e do bem salvador, mas nunca cedi a ninguém. Quis viver as minhas fraquezas, alimentá-las e defendê-las com todas as forças. Nunca ponderei, intimamente, quanto às realidades eternas. Ao alcance de meu coração, fluíam ensinamentos e socorros de toda sorte. Fui muita vez convidado ao Evangelho do Cristo; entretanto, zombei de todas as oportunidades de renovação espiritual. Considerava meus melhores amigos, no capítulo da religião, tão egoístas e mentirosos quanto eu mesmo. Agora… quantas lágrimas devo chorar, eu que desprezei a paz divina e preferi as vibrações infernais?
— E eu? — exclamava o mais revoltado poderá haver trevas mais densas que as minhas? haverá dor maior que esta a devastar-me? Sinto-me desequilibrado, sem direção… Um náufrago perdido no abismo é mais feliz que eu… Rodeiam-me quadros de horror… Experimento fogo e gelo ao mesmo tempo… Podereis, acaso, compreender-me, a mim que penetrei o vale fundo da desgraça?!…
Matoso, porém, orientado espiritualmente por Elias, interferiu, solícito:
— Olvidai, meus irmãos, as algemas da vida material e ligai-vos ao Senhor, pelo coração. É indispensável extirpar a raiz dos enganos adquiridos na Terra! A vida não se resume a impressões físicas, a fantasia corporal; é vibração da eternidade, da divina eternidade! acalmai os sentimentos em desequilíbrio para recolherdes a dádiva dos conhecimentos superiores. Esquecei o mal, tornai ao caminho reto! Atravessais, agora, a zona escura das consequências do erro. É necessário renovar as próprias forças, a fim de reacenderdes a lâmpada da fé.
Assim, Matoso, devagarinho, convenceu as pobres almas desiludidas e desesperadas. Exaltou a necessidade de disciplina, com a desistência do egoísmo e da vaidade, azorragando os maus costumes e os vícios vulgares.
Em terminando a longa palestra, ambos os comunicantes se revelavam diferentes. Despediram-se, revestidos de coragem, esperança e bom ânimo.
A assembleia de ouvintes encarnados mantinha-se sob forte impressão e, entre os invisíveis, Elias e Cláudio aguardavam, ansiosos, a colheita de ensinamentos.
Teriam os circunstantes compreendido que as lições se destinavam a eles mesmos? que ainda se encontravam na carne, com sublimes oportunidades em mão? guardariam as experiências ouvidas? ponderariam sobre as lutas que aguardam os rixosos e imprevidentes, além do túmulo? modificariam as diretrizes?
Ambos os orientadores, benevolentes e sábios, esperavam a manifestação dos amigos, por identificarem o aproveitamento havido, quando a Senhora Costa quebrou o silêncio, murmurando:
— Viram vocês quanta dureza e intransigência?
— É… é… — comentou o velho Silva Torres — pregam eles numerosas peças neste mundo para chorarem no outro..
— E nós, os médiuns — acrescentou Dona Segismunda Fernandes —, devemos suportar semelhantes Espíritos como se fôssemos caixas de pancada.
— Esses infelizes não chegaram a ser identificados — observou Alberto Lima, um dos companheiros mais entusiastas do núcleo —, e foi pena. Pareciam muito cultos e, sobremaneira, versados em matéria religiosa.
— Notei, porém — aduziu outro confrade —, que se não fora a palavra convincente de Matoso teríamos sofrido desastre. Tenho a ideia de que tratamos com entidades não somente sofredoras, mas igualmente perversas.
E o próprio doutrinador da casa,, que recebera a inspiração brilhante de Elias, partilhando a conversação, afiançou, contente:
— Em suma, estou satisfeito. Guardo a convicção de que esses desventurados integram a falange perturbadora que me persegue o lar.
Elias e Cláudio, invisíveis ao raio de observação comum, entreolhavam-se com indizível desapontamento.
Os companheiros encarnados mantinham-se prontos para o comentário cintilante e vivo. Qualificavam os comunicantes, queixavam-se dos sacrifícios a que eram obrigados por semelhantes visitas, reclamavam-lhes a ficha individual, situavam-nos entre os verdugos da vida privada; todavia, não houve um só que entendesse a lição legítima da noite, nela reconhecendo uma advertência do Alto para reajustamento de roteiro, enquanto era tempo.
Ninguém percebeu que, doutrinando os Espíritos, o grupo estava sendo igualmente doutrinado.

.Irmão X
(.Humberto de Campos)
Livro: Pontos e Contos

O CALVÁRIO E A OBSESSÃO



Ele viera para "que os que não criam, cressem", e, para tanto, deveria doar a vida num supremo sacrifício.
 Sabia que os homens, sanguissedentos, diante do Seu holocausto, passariam a encarar melhor a excelência do amor, entregando-se, posteriormente, em imitação ao seu gesto.
 Para uma tão grandiosa oferenda, porém, conjugaram-se as forças díspares em luta no coração das criaturas.
 Claro que não se fariam necessárias as acusações indébitas, a fuga dos amigos, a traição. . . Aos contumazes perseguidores da verdade não faltariam argumentos e manobras hábeis com que colimariam
 as suas metas nefárias.
 Ele sabia que aquela seria a derradeira jornada a Jerusalém. . .
 Ante a algaravia com que O saudaram à entrada, não entremostrou qualquer júbilo. Enquanto os amigos encaravam os aplausos como sinal evidente de triunfo, nEle ressoavam quais prenúncios das grandes dores. . .
 A ternura e passividade de que dava mostras durante aqueles dias inquietavam os mais afoitos, os discípulos mais invigilantes, os que anelavam pela glória terrena, não obstante as incessantes demonstrações e provas de que não estabeleceria no mundo as balizas do reino de Deus, nem tão-pouco a felicidade real. . .
 A precipitação armou Judas de ansiedade, interiormente visitado pela indução hipnótica de Entidades perversas que lhe aproveitaram o desalinho da emoção, interessadas em desnaturar a mensagem e anular a força do amor pacificante.
 As mesmas mentes desarticuladas pelo ódio, contrapondo-se ao "reino do Cordeiro", ante os receios gerais, perturbaram Pedro logo após a prisão do Amigo, fazendo-o pusilânime, em face da negação que se permitiu repetidas vezes. ..
 As mesmas forças da injunção criminosa em aguerrido combate reuniram-se, açoadas pela inveja e despeito, desde o domingo do triunfo aparente, à entrada de Jerusalém, a fim de converterem o Enviado de Deus, no Excelso Crucificado. . .
 Os ódios, confraternizando com os ciúmes, espalharam injúrias que eram glosadas pela ingratidão de muitos que lhe foram comensais da ternura e receberam de Suas mãos o pábulo da vida estuante.
 Fervilhando as constrições obsidentes que se impunham, os adversários da liberdade espiritual da Terra, em desgoverno no Mundo Espiritual, dominaram os que se não armaram de vigilância e equilíbrio, tornando-se fáceis presas do anti-Cristo, a fim de que a tragédia do Gólgota se consumasse. . .
 Jesus, porém, houvera asseverado: "Quando eu for erguido atrairei todos a mim."
 Nenhuma surpresa, portanto, no Senhor, diante dos contornos volumosos da hecatombe que tomava forma contra Ele.
 Em expressiva serenidade esperou o eclodir apaixonado da força violenta dos fracos.
 A noite fria e angustiante, antes da prisão, não lhe abatera o ânimo. Içara-0 a Deus através da oração e dulcificara-O, fazendo-O atingir a plenitude da auto-doação. ..
 As hordas desenfreadas da Espiritualidade inferior galvanizam no ódio os que se permitem as licenças das paixões dissolventes.
 Sempre se repetirão aquelas cenas nos linchamentos das ruas, nas prisões arbitrárias, nas injustiças tornadas legais, quando as massas afluem aos espetáculos hediondos e se asselvajam, tornando-se homicidas incomparáveis. . .
 Como podiam aquelas gentes desconhecer a brandura do Pastor Divino, esquecer Suas concessões e "prodígios"?
 Como puderam selar os lábios aqueles beneficiários da Sua misericórdia e complacência, ante a arbitrariedade dos crimes que presenciavam?
 A covardia moral, abrindo as faculdades psíquicas ao intercâmbio com os Espíritos imperfeitos e obsessores, todo o bem recebido negou, a fim de poupar-se. Transformou o inocente em algoz, em revolucionário desnaturado e elegeu o crime como elemento de justiça. O grande espetáculo da loucura coletiva se aproxima do Calvário. A obsessão coletiva, como tóxico morbífico, domina os participantes da inominável atuação infeliz.
 Ele não se defende, não reclama, nada pede. Submete-se e confia em Deus.
 As aragens da Natureza, de raro em raro na tarde abafada, saturam-se das vibrações do desespero e do ódio que assomam e dominam os corações entenebrecendo as mentes e explodindo no ar.
 Sempre os homens exigirão uma vítima para a sanha dos seus tormentos.
 Jesus é o exemplo máximo, o ideal para a consunção do desar que vencerá os séculos como a mais horrenda explosão coletiva que pastará à História.
 No bárbaro espetáculo, os pretensos dominadores da Erraticidade inferior crêem-se vitoriosos. . . Supõem estabelecidos os parâmetros dos seus domínios no mundo.
 No entanto, quando o clímax da tarde de horror atemoriza as testemunhas da tragédia, Ele relanceia o olhar dorido e lobriga apenas João, Sua mãe e as poucas mulheres abnegadas aos pés da Cruz, fiéis, macerados e intimoratos, confiando. . .
 É o bálsamo da alegria que Iene as imensas exulcerações que O dilaceram.
 Nem todos desertaram. A fúria possessiva da treva não alcançara os que tiveram acesa a luz da abnegação e do amor.
 Olhou além e mais profundamente os presentes e os que se refugiaram longe deles, os que armaram as cenas, os que se locupletam em gozos mentirosos sobre a fugidiça vitória. Seu olhar penetrou os promotores reais do testemunho, aqueles que transitavam livres das roupagens físicas. . .
 No ápice da dor arquejante, bradou Jesus:
— "Perdoa-os, meu Pai! Eles não sabem o que fazem."
 A sinfonia patética logrou, então, o máximo. Toda a orquestração de dor converteu-se em musicalidade de esperança e amor.
 Ele não perdoava apenas os crucificadores, mas, também, os desertores, os negadores, os receosos e pusilânimes, os ingratos e maledicentes, os insensatos e rebeldes... Na imensa gama dos acolhidos pelo Seu perdão, alcançava os promotores desencarnados dos mil males que engendraram nos homens a prova das suas mazelas e o agravamento das suas penas. . .
 Sua voz alcançou os penetrais do Infinito e lucilou nos báratros das consciências inditosas dos anti-Cristos de todos os tempos, abrindo-lhes os braços da oportunidade ao recomeço e à redenção.
A conspiração para que se consumasse o holocausto do Calvário, em que o Filho de Deus testemunhou seu amor pelos homens, foi tramada pelos inimigos impenitentes desencarnados, vencidos pelo despeito na luta pela vitória da violência com que sintonizaram os transitórios donatários da posição governamental e religiosa da Terra, como daqueles que se lhe entregaram a soldo.
 O perdão doado da culminância da Cruz é a aliança inquebrável da união do Seu amor com todos nós, os caminhantes retardatários da via da evolução, convocando-nos à perene vigilância contra a obsessão e qualquer natureza que nos sitia e persegue implacavelmente. . .
 Amélia Rodrigues