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quinta-feira, 23 de agosto de 2012

A REGENERAÇÃO

Dissertações Espíritas

(MARCHA DO PROGRESSO)
(Paris, 20 de junho de 1869)
Desde longos séculos as humanidades prosseguem
uniformemente sua marcha ascendente através do tempo e do
espaço. Cada uma delas percorre, etapa por etapa, a rota do
progresso, e se diferem pelos meios infinitamente variados que a
Providência dispôs em suas mãos, são chamadas a se fundirem
todas, a se identificarem na perfeição, já que todas partem da
ignorância e da inconsciência de si mesmas para se aproximarem
indefinidamente do mesmo fim: Deus; para alcançarem a felicidade
suprema pelo conhecimento e pelo amor.
Há universos e mundos, como povos e indivíduos. As
transformações físicas da terra, que sustenta o corpo, podem
dividir-se em duas formas, assim como as transformações morais e
intelectuais que alargam o espírito e o coração.
A terra se modifica pela cultura, pelo arroteamento e
pelos esforços perseverantes dos seus possuidores e interessados;
mas, a esse aperfeiçoamento incessante devemos juntar os grandes
cataclismos periódicos, que são, para o regulador supremo, o que
são a enxada e a charrua para o lavrador.
As humanidades se transformam e progridem pelo
estudo perseverante e pela permuta de pensamentos. Instruindose
e instruindo os outros, as inteligências se enriquecem, mas os
cataclismos morais que regeneram o pensamento são necessários
para determinar a aceitação de certas verdades.
Assimilam-se sem abalos e progressivamente as
conseqüências de verdades aceitas. É preciso um concurso imenso
de esforços perseverantes para que se aceitem novos princípios.
Marcha-se lentamente e sem fadiga sobre um caminho plano, mas
é necessário reunir todas as suas forças para transpor um atalho
agreste e destruir os obstáculos que surgem. É então que, para
avançar, deve o homem quebrar necessariamente a corrente que o
liga ao pelourinho do passado, pelo hábito, pela rotina e pelo
preconceito; a não ser assim, o obstáculo fica sempre de pé, e ele
girará num círculo sem saída até que tenha compreendido que, para
vencer a resistência que obstrui a rota do futuro, não basta quebrar
armas envelhecidas e danificadas: é indispensável criar outras.
Destruir um navio que faz água por todos os lados,
antes de empreender uma travessia marítima, é medida de
prudência, mas será ainda necessário, para realizar a viagem, que se
criem novos meios de transporte. Entretanto, eis onde se encontra
atualmente certo número de homens de progresso, tanto no
mundo moral e filosófico, quanto nos outros mundos do
pensamento! Minaram tudo, tudo atacaram! As ruínas se espalham
por toda parte, mas eles ainda não compreenderam que sobre tais
ruínas é preciso edificar algo de mais sério que um
livre-pensamento e uma independência moral, independentes
apenas da moral e da razão. O nada em que se apóiam não é uma
palavra muito profunda somente por ser vazia. Assim como Deus já
não cria os mundos do nada, o homem não pode criar novas crenças
sem bases. Estas bases estão no estudo e na observação dos fatos.
A verdade eterna, como a lei que a consagra, não espera
para existir a aceitação dos homens; ela é e governa o Universo, a
despeito dos que fecham os olhos para não a ver. A eletricidade
existia antes de Galvani e o vapor antes de Papin, como a nova
crença e os princípios filosóficos do futuro existiam antes que os
publicistas e os filósofos os tivessem consagrado.
Sede pioneiros perseverantes e infatigáveis!... Se vos
chamarem de loucos como o fizeram a Salomão de Caus, se vos
repelirem como Fulton, marchai sempre, porque o tempo, esse juiz
supremo, saberá tirar das trevas os que alimentam o farol que deve,
um dia, iluminar a Humanidade inteira.
Na Terra, o passado e o futuro são os dois braços de
uma alavanca que tem no presente o seu ponto de apoio. Enquanto
a rotina e os preconceitos tiverem curso, o passado estará no
apogeu. Quando a luz se faz, a báscula balança, e o passado, que já
escurecia, desaparece para dar lugar ao futuro que irradia.
Allan Kardec

Um Espírito que não se acredita morto


Revista Espírita, dezembro de 1859
Um dos nossos assinantes, do departamento de Loiret, ótimo médium escrevente, escreveu o que se segue sobre vários fatos de aparição que lhe foram pessoais.
"Não querendo deixar no esquecimento nenhum dos fatos que vêm em apoio da Doutrina Espírita, venho comunicar-vos novos fenômenos, dos quais sou a testemunha e o médium, e que, como o reconhecereis, concordo perfeitamente com tudo o que publicastes em vossa Revista sobre os diversos estados dos Espíritos depois de sua separação do corpo.
"Há cerca de seis meses, ocupava-me de comunicações Espíritas com várias pessoas, quando me veio o pensamento de perguntar se, entre os assistentes, encontrava-se algum médium vidente. O Espírito respondeu afirmativamente e, designando-me, acrescentou: Tu já o és, mas num grau fraco, e somente durante teu sono; mais tarde teu temperamento se modificará de tal forma, que te tornarás um excelente médium vidente, mas pouco a pouco, e primeiro somente durante o sono.
"No curso deste ano, tivemos a dor de perder três de nossos parentes. Um deles, que era meu tio, apareceu-me, algum tempo depois de sua morte, durante meu sono; teve comigo uma longa conversa, e conduziu-me ao lugar que habita, e que me disse ser o último degrau conduzindo à morada da felicidade eterna. Tive a intenção de dar-vos a explicação do que admirei nessa morada incomparável, mas tendo consultado meu Espírito familiar a esse respeito, respondeu-me: A alegria e a felicidade que experimentastes poderiam influenciar o relato que farias das maravilhosas belezas que admiraste, e tua imaginação poderia criar coisas que não existem. Espera que teu Espírito esteja mais calmo. Detive-me, pois, para obedecer ao meu guia, e não me ocuparei senão de duas outras visões que são mais positivas. Reportar-vos-ei somente as últimas palavras de meu tio. Quando admirava aquilo que me era permitido ver, ele me disse: Vais agora retornar à Terra. Eu lhe supliquei conceder-me ainda alguns instantes. -Não, disse, são cinco horas, e deves retomar o curso de tua existência. No mesmo instante despertei, e cinco horas soaram no meu relógio.
"Minha segunda visão foi a de um dos dois parentes falecidos este ano. Era um homem virtuoso, amável, bom pai de família, bom cristão, e, embora doente há muito tempo, morreu quase que subitamente, e talvez no momento em que menos nisso pensava. Seu rosto tinha uma expressão indefinível, sério, triste e feliz ao mesmo tempo. Ele me disse: Expio minhas faltas; mas tenho uma consolação, continuo a viver no meio de minha mulher e de meus filhos, e lhes inspiro bons pensamentos; orai por mim.
"A terceira visão é mais característica, e me foi confirmada por um fato material; é a do terceiro parente. Era um excelente homem, mas vivo, violento, imperioso com os domésticos, e sobretudo dando outra medida aos bens deste mundo; demasiado cético, ocupava-se mais desta vida do que da futura. Algum tempo depois de sua morte, veio à noite e se pôs a sacudir minhas cortinas com impaciência, como para me despertar. Como, disse-lhe, estás? -Sim; vim procurá-lo, porque és o único que pode responder-me. Minha mulher e meus filhos partiram para Orléans; quis segui-los, mas ninguém quis me obedecer. Disse a Pierre para fazer meus pacotes, mas não me escutou; ninguém deu-me atenção. Se pudesses vir colocar os cavalos noutra viatura e fazer meus pacotes, me prestarias grande serviço, porque poderia ir reencontrar minha mulher em Orléans. - Mas não pode fazê-lo tu mesmo? - Não, porque não sou nada elevado', desde o sono que experimentei durante minha doença, mudei muito; não sei mais onde estou; tenho um pesadelo. - De onde vens? - De B... - É do castelo? - Não! Respondeu-me com um grito de horror, e levando a mão sobre a fronte, é do cemitério! - Depois de um gesto de desespero, acrescentou: Meu caro amigo, diga a todos os meus parentes para orarem por mim, porque sou muito infeliz! - A essas palavras foi-se, e o perdi de vista. Quando ele veio procurar-me e sacudir minhas cortinas com impaciência, sua figura exprimia uma horrível alucinação. Quando lhe perguntei o que fizera para agitar minhas cortinas, ele que nada podia levantar, respondeu-me bruscamente: Com o meu sopro!
"No dia seguinte soube que sua mulher e seus filhos, efetivamente, haviam partido para Orléans."
Esta última aparição é sobretudo notável naquilo que a ilusão, que leva certos Espíritos a se crerem ainda vivos, prolongou-se neste bem mais tempo do que em casos análogos. Muito comumente, ela não dura senão alguns dias, ao passo que aqui, depois de mais de três meses, ele não se acreditava ainda morto. De resto, a situação é perfeitamente idêntica à que observamos muitas vezes. Ele vê tudo como durante sua vida; quer falar, e fica surpreso por não ser escutado; ele vaga, ou crê vagar, em suas ocupações habituais. A existência do perispírito está aqui demonstrada de um modo marcante, abstração feita da visão. Uma vez que se crê vivo, ele se vê, pois, um corpo semelhante ao que deixou; esse corpo age como o outro o faria; para ele nada parece mudado; somente ainda não estudou as propriedades de seu novo corpo; ele o crê denso e material como o primeiro, e se espanta por nada poder levantar. Encontra, todavia, na sua situação, alguma coisa estranha da qual não se dá conta: crê estar sob o império de um pesadelo; toma a morte por um sono; é um estado misto entre a vida corpórea e a vida Espírita, estado sempre penoso e cheio de ansiedade, e que tem de um e de outro. Como dissemos alhures, é a conseqüência, quase constante, de mortes instantâneas, tais como as que ocorrem por suicídio, apoplexia, suplício, combate, etc.
Sabemos que a separação do corpo e do perispírito se opera gradualmente, e não de modo brusco; começa antes da morte, quando esta chega pela extinção natural das forcas vitais, seja pela idade, seja pela doença, e sobretudo naqueles que, quando vivos, pressentem seu fim, e se identificam pelo pensamento com sua existência futura, de tal sorte que no instante do último suspiro ela está quase completa. Quando a morte surpreende, de improviso, um corpo cheio de vida, a separação não começa senão neste momento, e não acaba senão pouco a pouco. Enquanto existir um laço entre o corpo e o Espírito, este estará na perturbação, e se entra bruscamente no mundo dos Espíritos, sente um abalo que não lhe permite reconhecer desde logo sua situação, não mais que as propriedades de seu novo corpo; é preciso que ele tente de algum modo, e é isso que o faz crer-se ainda deste mundo.
Além das circunstâncias de morte violenta, há outras que tornam mais tenazes os laços do corpo e do Espírito, porque a ilusão, da qual falamos, se observa igualmente em certos casos de morte natural, e é quando o indivíduo viveu mais da vida material do que da vida moral. Concebe-se que seu apego à matéria o retém ainda depois da morte, e prolonga assim a idéia de que nada tem a mudar para ele. Tal é o caso da pessoa que acabamos de falar.
Notemos a diferença que há entre a situação dessa pessoa e do segundo parente: um quer ainda comandar; crê ter necessidade de suas malas, de seus cavalos, de sua viatura, para ir reencontrar sua mulher; não sabe ainda que, como Espírito, pode fazê-lo instantaneamente, ou, melhor dizendo, seu perispírito é ainda tão material que ele o crê sujeito a todas as necessidades do corpo. O outro, que viveu a vida moral, que teve sentimentos religiosos, que se identificou com a vida futura, embora surpreendido com mais improviso que o primeiro, já está desligado; disse que vive no meio de sua família, mas sabe que é um Espírito; fala à sua mulher e aos seus filhos, mas sabe que é pelo pensamento; em uma palavra, não há mais ilusão, ao passo que o outro ainda está na perturbação e nas angústias. Ele tem de tal modo o sentimento da vida real, que viu sua mulher e seus filhos partirem, e que partiram com efeito no dia indicado, o que ignorava seu parente a quem apareceu. Por outro lado, notemos uma palavra muito característica de sua parte, e que pinta bem na sua posição. A esta pergunta: De onde vens? Respondeu primeiro pelo nome do lugar onde habitava; depois a esta É do castelo? Não! Disse com pavor, é do cemitério. Ora, isso prova uma coisa, é que, não estando completo o desligamento, uma espécie de atração existia, ainda, entre o Espírito e o corpo, o que fez dizer que veio do cemitério; mas nesse momento parece começar a compreender a verdade; a própria questão parece colocá-lo no caminho chamando sua atenção para os despejos, por isso pronunciou essa palavra com terror.
Os exemplos desta natureza são muito numerosos, e um dos mais tocantes é o do suicídio da Samaritana, que reportamos no nosso número de junho de 1858. Esse homem, evocado vários dias depois de sua morte, afirmava, também, estar ainda vivo, e dizia: Entretanto, sinto os vermes me roerem, como fizemos observar na nossa relação, isso não era uma lembrança, uma vez que durante a vida não era roído pelos vermes; era, pois, o sentimento da atualidade, uma espécie de repercussão transmitida do corpo ao Espírito, pela comunicação fluídica que ainda existia entre eles. Esta comunicação não se traduz sempre do mesmo modo, mas é sempre mais ou menos penosa, e como um primeiro castigo para aquele que muito se identificou, durante sua vida, com a matéria.
Que diferença com a calma, a serenidade, a doce quietude daqueles que morrem sem remorso, com a consciência de haver bem empregado o tempo de sua estada neste mundo, daqueles que não se deixaram dominar por suas paixões! A passagem é curta e sem amargura, porque a morte é para eles o retomo do exílio para a sua verdadeira pátria. Está aí uma teoria, um sistema? Não, é o quadro que nos oferecem, todos os dias, nossas comunicações de além-túmulo, quadro cujos aspectos variam ao infinito, é onde cada um pode haurir um ensinamento útil, porque cada um nele encontra exemplos que pode aproveitar, se quer se dar ao trabalho de consultá-lo; é um espelho onde pode se reconhecer quem não está cego pelo orgulho.

Um encontro real entre nós dois -Hermíni C. Miranda

Um encontro real entre nós dois




De repente você se dá conta, como eu, de que acaba de ingressar no clube dos macróbios. No meu caso, 90 anos. E aí começa a perceber que o mundo não é mais aquele que você conheceu, especialmente não mais estão ali as pessoas que conheceu e amou. Quase todas desapareceram na invisibilidade. Bem sei que é uma ausência temporária, pois lá estão na dimensão espiritual à nossa espera para as emoções do reencontro. Mas que umas tantas delas deixam aberto em nós um espaço maior, isso também é verdade.
Para mim a ausência mais doída é a da querida dona Helena, minha mãe.
Talvez você se lembre que eu abri para ela um capítulo especial no livro Nossos filhos são espíritos.
Ela partiu para o outro lado da vida em 1960, aos 66 anos. Eu tinha 40.
Portanto, já se passaram cinquenta anos. Ao longo desse tempo, muita coisa aconteceu, claro. Cerca de trinta deles, participando de trabalhos mediúnicos. Duas vezes ela me enviou mensagens psicografadas e uma vez falei com ela através de médium de minha confiança. Ela me proporcionou evidências indiscutíveis, citando fatos dos quais só ela e eu sabíamos.
Recentemente – cerca de um ano ou dois – tive com ela um sonho do qual só me ficou na memória de vigília um episódio marcante. No sonho, ela veio ao meu encontro e ajoelhou-se a meus pés.  Recuperado da impactante perplexidade que a cena me suscitou, ajoelhei-me também diante dela e o trocamos um beijo saudoso, aqueles que somente ocorrem entre mãe e filho.
Bem, a historinha ainda não ficou aí concluída. Uma semana depois, recebi um e-mail de outra amiga, médium com a qual trabalhei num grupinho doméstico, do qual, entre outros queridos amigos e amigas, Deolindo Amorim sentava-se à minha esquerda e ela, à direita.
A amiga frequentava uma instituição espírita no Rio.
Dizia-me naquela carta inesperada que ao encerrarem-se os trabalhos mediúnicos da casa, aproximara-se dela uma entidade – que ela descreveu sumariamente, mas não da qual não guardara o nome. “Diga ao Herminio – pediu ela – que não foi somente um sonho. Houve um encontro real entre nós dois.”
A amiga médium, em conversa posterior comigo, ao telefone, acrescentou um detalhe que não mencionara no e-mail: o gesto dela se reportava à remota existência minha, aí pela Idade Média, quando eu lhe proporcionara a grande alegria, tornando-me sacerdote católico, sonho dela não realizado nesta vida.
Pois é, leitor/leitora.
Acho que não preciso falar de minha emoção ante esse recado.
Falo agora, porém, para encerrar esta narrativa, repetindo uma frase que usei certa vez e que assim diz:
“Se você perceber neste papel que está lendo, a marca de uma lágrima, não se preocupe. É minha.”
 
Artigo do Correio Fraterno.

O meu único encontro com Herculano Pires




Cirso Santiago
Fui e sou admirador do professor José Herculano Pires, Acompanhei grande parte de seu trabalho através do rádio, da televisão, do livro e do jornal. Ainda hoje, quando já não o temos carnalmente entre nós, ampliando seu discurso, busco com renovado interesse suas obras para aprender, reciclar ou sedimentar conceitos. E a cada pesquisa descubro mais e mais sua grandeza. E dos escaninhos de minha memória saltam logo as palavras judiciosas do escritor Mário Graciotti:
"De que distância, de que regiões, de que época virá esse espírito que se instalou na engrenagem somática de um dos mais curiosos fenômenos intelectuais do Brasil nascente, o poeta, o jornalista, o escritor, o filósofo Herculano Pires?"
"A constante e invariável temática que flui de sua bela inteligência e de seu grande coração revela uma diretiva uniforme e impressionante, da qual podemos discordar, aqui ou ali, mas difícil se nos torna relegá-la a plano secundário." (1)
Foi no dia 9 de março de 1979, às 21hl5, que tombou esse Altaneiro Jequitibá do Espiritismo em terras brasileiras. Caiu seu corpo físico vitimado por um enfarto, mas sua essência, o Espírito Herculano Pires, continuou em pé, vibrante e dinâmico como dantes. Prova isto, sua manifestação mediúnica logo após seu desencarne, conforme registro na edição n.° 100 deste jornal. O Grupo Espírita Caírbar Schutel, que há anos funciona na casa da família Pires, estava reunido naquela noite e o professor ali compareceu testemunhando a continuidade da vida, a exemplo do que já fizeram outros espíritos de grande envergadura moral. Diz o articulista: "Alguns familiares, que não participavam da sessão, levaram o professor para o hospital, mas em silêncio, a fim de que o trabalho mediúnico prosseguisse. Terminada a sessão foram lidas duas mensagens psicografadas; uma, sem assinatura e que atribuímos a Caírbar Schutel (patrono do grupo) referia-se, claramente, ao desencarne e a outra do próprio Herculano Pires e dirigida à sua esposa, dona Virgínia." (grifei)
Faz 10 anos, portanto, que o professor Herculano Pires, a quem carinhosamente se atribui o cognome LÉON DENIS BRASILEIRO, partiu para outra dimensão: a dimensão cósmica do Espírito. E sua ausência no movimento espírita é e sempre será relevante.
Por falta de oportunidade, não gozei do seu convívio. Teria me enriquecido muito se isto tivesse sido possível, não há dúvida! Tivemos apenas um encontro. Mas este, por minha exclusiva culpa, foi prejudicado. Aconteceu há coisa de 20 anos, quando desabrochava em mim a mediunidade psicográfica. Com a natural insegurança do médium em desenvolvimento nascente, vivia à procura de quem pudesse ler e opinar sobre as páginas mediúnicas que recebia. Os que estavam à minha volta e que me poderiam prestar esse serviço, ou exageravam nas avaliações elogiosas ou negavam qualquer palavra com medo de melindrar-me ou, quem sabe, para não se comprometer com a minha "obsessão"...
Preocupado com o fenômeno que em mim se realizava e com a lisura doutrinária das páginas que me eram ditadas, continuava a buscar orientações. Fui à Federação Espírita do Estado de São Paulo. Ali, um conhecido confrade, depois de uma passada de olhos no escrito que levei, disse: "Procure o professor Herculano Pires!"
Soube mais tarde que o professor Herculano estaria, certo dia, palestrando e autografando livros num centro daqui do ABC paulista. Não perdi a oportunidade. Após a palestra, procurei falar-lhe. Mas os "vigilantes" não me permitiam aproximar. Comprei então um livro e entrei na fila para colher seu autógrafo e passar-lhe uma mensagem com um bilhete em anexo, em que lhe expunha o meu desejo. No último momento, um "vigilante" ainda tentou frustrar o meu intento. Insisti, intransigente... O professor não entendeu, e nem poderia entender, minha ansiedade. Levantou os olhos do trabalho que realizava e olhou-me com um ar mesclado de espanto e piedade que jamais se apagará de minha memória. Terá pensado numa obsessão? Talvez! O que tenho certeza é que não gostou, e com justa razão, da minha momentânea indisciplina. Percebendo, no entanto, o envelope que eu segurava na mão estendida, recolheu-o a um dos seus bolsos e meneou sua grande cabeça, como a me dizer: "Verificarei depois!"
Sai contente... Mas nunca recebi resposta do professor àquela minha solicitação. Talvez tenha sido por falta de tempo. Foi sempre um homem muito ocupado e, quem sabe, minha preocupação não seria das mais urgentes. Seja como for, perdi a oportunidade de sua abalizada opinião.
Mas hoje, depois de militar vários anos na Redação deste jornal, compreendo melhor a fuga daqueles a quem se pede uma crítica desapaixonada ao nosso trabalho. É que embora a sinceridade com que muitas vezes se formula esse desejo, são poucos ainda os que entre nós estão prontos para aceitar qualquer crítica à sua realização, mormente quando esta é mediúnica. É o professor Herculano sabia disso com muito mais lucidez do que a que suponho ter hoje. E por isso, certamente, considerou que sua opinião não seria bem absorvida por mim naquela altura (e hoje seria? Ah!... dúvida cruel). Silenciou, porque, embasado em sua larga experiência, sentiu que eu, como tantos, não estava apto para compreender que a crítica, independente do seu teor ser-nos favorável ou não, quando bem aproveitada pelo uso da razão, funciona sempre à maneira de um buril que, guiado por compenetrada inteligência, acaba por libertar, pouco a pouco, a preciosa gema da crosta desvaliosa.
Obrigado professor Herculano. Valeu o nosso único encontro. Valeu seu silêncio-crítico que me tem levado a raciocinar muito sobre as minhas tarefas com o desejo de acertar. Registrar esse fato foi à maneira que encontrei para prestar-lhe minha singela homenagem nesse marco de sua passagem para o "outro mundo".
Nota: (1) Texto constante do prefácio do livro Barrabás e o Relato de Judas, de J. Herculano Pires.

Correio Fraterno no 219  março de 1989
http://www.correiofraterno.com.br/acervo/decada-de-80/46-no219-mar-1989-no219-mar-1989-/158-o-meu-o-encontro-com-herculano-pires

Filhos


Nasce a criança, trazendo consigo o patrimônio moral que lhe
marca a individualidade antes do renascimento no plano físico; no
entanto, receberá os reflexos dos pais e dos mestres que lhe imprimirão
à nova chapa cerebral as imagens que, em muitas ocasiões,
lhe influenciarão a existência inteira.
Indiscutivelmente, a instrução espera-lhe o espírito em nova
fase, enriquecendo-lhe o caminho nesse ou naquele mister; contudo,
importa reconhecer que a palavra escrita, em confronto com a
palavra falada ou com o exemplo direto, revela poderes de repercussão
menos vivos, mormente quando torturada entre os preconceitos
da forma gramatical.
É que a voz e a ação prática jazem impregnadas do magnetismo
indutivo que se desprende da reflexão imediata, operando
significativas transformações para o bem ou para o mal, segundo
a natureza que lhes personaliza as manifestações.
As crianças confiadas na Terra ao nosso zelo são portadoras
de aparelhagem neurocerebral completamente nova em sua estrutura
orgânica, à feição de câmara fotográfica devidamente habilitada
a recolher impressões. A objetiva, que na máquina dessa
espécie é constituída por um sistema de lentes apropriadas, capazes
de colher imagens corretas sobre recursos sensíveis, é representada
na mente infantil por um espelho renovado em que se
conjugam visão e observação, atenção e meditação por lentes da
alma, absorvendo os reflexos das mentes que a rodeiam e fixandoos
em si própria, como elementos básicos de Conduta.
Os pequeninos acham-se, deste modo, à mercê dos moldes
espirituais dos que lhes tecem o berço ou que lhes asseguram a
escola, assim como a argila frágil e viva ante as idéias do oleiro.
Não podemos, pois, esquecer na Terra que nossos filhos, embora
carreando consigo a sedimentação das experiências passadas,
em estágios anteriores na gleba fisiológica, são companheiros que
nos retomam transitoriamente o convívio, quase sempre para se
reajustarem conosco, aos impositivos da Lei Divina, necessitados
quanto nós mesmos, de provas e ensinamentos, no que tange ao
trabalho da regeneração desejada.
Excetuados aqueles que transcendem os nossos marcos evolutivos,
à face da missão particular de que se investem na renovação
do ambiente comum, todos eles nos sofrem os reflexos, assimilando
impressões entranhadamente perduráveis que, às vezes, lhes
acompanham os passos desde a meninice até a morte do corpo
denso.
Tratá-los à conta de enfeites do coração será induzi-los a funestos
enganos, porquanto, em se tornando ineficientes para a luta
redentora, quando se lhes desenvolve o veículo orgânico facilmente
se ajustam ao reflexo dominante das inteligências aclimatadas
na sombra ou na rebeldia, gravitando para a influência do
pretérito que mais deveríamos evitar e temer.
É assim que toda criança, entregue à nossa guarda, é um vaso
vivo a arrecadar-nos as imagens da experiência diária, competindo-
nos, pois, o dever de traçar-lhe noções de justiça e trabalho,
fraternidade e ordem, habituando-a, desde cedo, à disciplina e ao
exercício do bem, com a força de nossas demonstrações, sem,
contudo, furtar-lhe o clima de otimismo e esperança. Acolhendoa,
com amor, cabe-nos recordar que o coração da infância é urna
preciosa a incorporar-nos os reflexos, troféu que nos retratará no
grande futuro, no qual passaremos todos igualmente a viver, na
função de herdeiros das nossas próprias obras.

Pensamento e Vida
Emmanuel-Chico Xavier

Saúde


A saúde é assim como a posição de uma residência que denuncia as condições do morador, ou de um instrumento que reproduz
em si o zelo ou a desídia das mãos que o manejam.
A falta cometida opera em nossa mente um estado de perturbação, ao qual não se reúnem simplesmente as forças desvairadas de nosso arrependimento, mas também as ondas de pesar e acusação da vítima e de quantos se lhe associam ao sentimento, instaurando
desarmonias de vastas proporções nos centros da alma, a percutirem sobre a nossa própria instrumentação.
Semelhante descontrole apresenta graus diferentes, provocando lesões funcionais diversas.
A cólera e o desespero, a crueldade e a intemperança criam zonas mórbidas de natureza particular no cosmo orgânico, impondo às células a distonia pela qual se anulam quase todos os recursos de defesa, abrindo-se leira fértil à cultura de micróbios patogênicos
nos órgãos menos habilitados à resistência.
É assim que, muitas vezes, a tuberculose e o câncer, a lepra e a ulceração aparecem como fenômenos secundários, residindo a causa primária no desequilíbrio dos reflexos da vida interior.
Todos os sintomas mentais depressivos influenciam as células em estado de mitose, estabelecendo fatores de desagregação.
Por outro lado, importa reconhecer que o relaxamento da nutrição constrange o corpo a pesados tributos de sofrimento.
Enquanto encarnados, é natural que as vidas infinitesimais que nos constituem o veículo de existência retratem as substâncias que ingerimos. Nesse trabalho de permuta constante adquirimosimensa quantidade de bactérias patogênicas que, em se instalando
comodamente no mundo celular, podem determinar moléstias infecciosas de variegados caracteres, compelindo-nos a recolher,
assim, de volta, os resultados de nossa imprevidência.
Mas não é somente aí, no domínio das causas visíveis, que se originam os processos patológicos multiformes.
Nossas emoções doentias mais profundas, quaisquer que sejam, geram estados enfermiços.
Os reflexos dos sentimentos menos dignos que alimentamos voltam-se sobre nós mesmos, depois de convertidos em ondas mentais, tumultuando o serviço das células nervosas que, instaladas na pele, nas vísceras, na medula e no tronco cerebral, desempenham as mais avançadas funções técnicas; acentue-se, ainda, que esses reflexos menos felizes, em se derramando sobre o córtex encefálico, produzem alucinações que podem variar da fobia oculta à loucura manifesta, pelas quais os reflexos daqueles companheiros encarnados ou desencarnados, que se nos conjugam ao modo de proceder e de ser, nos atingem com sugestões destruidoras, diretas ou indiretas, conduzindo-nos a deploráveis fenômenos de alienação mental, na obsessão comum, ainda mesmo quando no jogo das aparências possamos aparecer como pessoas espiritualmente sadias.
Não nos esqueçamos, assim, de que apenas o sentimento reto pode esboçar o reto pensamento, sem os quais a alma adoece pela carência de equilíbrio interior, imprimindo no aparelho somático os desvarios e as perturbações que lhe são conseqüentes.

Livro Pensamento e Vida
Emmanuel -Chico Xavier